terça-feira, 10 de março de 2015

Considerações sobre o dia 15 de março

Dois artigos comentam sobre a manifestação do dia 15 de março:
 
 
Por Murilo Rocha - Jornal O Tempo:
 
E a tal marcha vem aí:
 
Está marcada para o domingo, dia 15 de março, em todo o país a tal da marcha “cívica”. A gestação do movimento começou ainda no ano passado, logo após a vitória de Dilma Rousseff (PT) sobre Aécio Neves (PSDB) na briga pela Presidência da República. Era uma ação com viés revanchista, uma tentativa de criar nas ruas um clima de insatisfação contra o governo do PT.

Agora, às vésperas da marcha, a ação de incitar um ambiente para um golpe de Estado ainda se faz presente, mas perdeu força pela multiplicidade de alvos e pela própria superficialidade dos argumentos de seus idealizadores. O governo do PT, é verdade, vai mal, e não é de hoje. A crise econômica e política é consequência de alianças espúrias e também de uma série de ações equivocadas do Planalto.

Mas quem vai para a rua no domingo, provavelmente, fantasiado com a camisa da seleção brasileira, aquela da Nike de mais de R$ 250, tem certeza – ou pelo menos finge ter – da culpa do PT sobre toda a infelicidade de sua vida. Afinal, se o IPTU subiu, a culpa é da Dilma. Se o seu time perdeu, a culpa é da Dilma. Até os mandos e desmandos do Legislativo – leia-se Câmaras municipais, Assembleias estaduais e o Congresso – são culpa da Dilma. E quando a culpa não recai sobre a presidente, a responsabilidade vai para Lula e até para o Lulinha. Este último, vem se tornando – pelo menos na cabeça de alguns lunáticos – o dono do Brasil. A cada dia proliferam mais e mais boatos e informações sobre as posses do filho do ex- presidente, mas não se prova nada .

Nunca houve-se tantos meios – e-mail, WhatsApp, Facebook... – para se desinformar tanto. Na semana passada, por exemplo, circulava nos smartphones de parte da população a gravação de um suposto informante sobre uma reação ao movimento de impeachment de Dilma. Forças Armadas de países como Bolívia e Venezuela estariam prontas para invadir o Brasil e se aliar a militares de esquerda (?) para proteger a presidente e evitar ações contra o seu mandato. Para alguém mais sensato, logicamente, se tratava de uma piada de mau gosto. Mas, infelizmente, bom senso anda em falta no mercado, e muita gente hoje ainda embarca nessas ondas de boataria, seja por ingenuidade ou puro oportunismo mesmo.

Retornando à marcha “cívica”, ela sem dúvida é legítima do ponto de vista do direito de se expressar, pois protestar é importante e não há dúvida sobre o mau momento vivido pelo país. Porém é fundamental também ter discernimento e espírito crítico para não ser apenas uma marionete a repetir um discurso velho e reacionário, como essa história da volta dos militares ao poder.
 
11046958_10202397561100236_7637983983354472515_n
 
Blog da Kika Castro
 
15 de março: Eu não vou

Vi o banner acima ontem, pela primeira vez, no Facebook. Não sei quem o criou. Eu gostei, compartilhei pelo Twitter, e, duas horas depois, mais de 150 pessoas tinham compartilhado meu compartilhamento. (E assim continuou nas horas seguintes, mas parei de contar.)
Então, fiquei com a impressão de que nem todo mundo bateu panela e gritou “Fora Dilma” na janela de casa no último domingo
Escrevi o seguinte, antes de compartilhar: “Democracia é aceitar o que uma maioria quis e trabalhar/cobrar para que dê certo para todos. Quatro anos depois, escolher livremente o candidato favorito, mais uma vez. E assim por diante
 
Claro que, dentro do “cobrar”, do parágrafo acima, cabe também protestar. É legítimo protestar. É legítimo fazer buzinaço, panelaço, vaiar e xingar (embora, que pena, muitos tenham optado por xingar baixarias contra a presidente da República, em pleno Dia Internacional da Mulher). Tudo isso, felizmente, é permitido e só pode acontecer porque ainda vivemos numa democracia.
 
Quando há reclamação e crítica, o governante da vez se preocupa e busca uma reação para agradar àquela parcela, para a qual ele também governa, e que está demonstrando insatisfação.
 
O que me preocupa é quando tentam fortalecer o discurso do impeachment, sem nenhum respaldo para isso. Não consigo deixar de pensar no Fluminense: é tentar mudar um resultado por meio do tapetão, ou seja, sem respeitar as regras vigentes e, neste caso, sem respeitar a maioria.
 
Dilma saindo, por um impeachment nonsense, quem assumiria em seu lugar? Michel Temer, o vice-presidente, que é do PMDB. Mesmo partido de Renan Calheiros e Eduardo Cunha, que dispensam apresentações.
 
O pior é que não é nem isso que quer um grupelho que estava quieto há 30 anos e, com esta gritaria, voltou a ressurgir das trevas. Esse grupo, que já tem milhares de seguidores só em uma comunidade do Facebook, defende nada mais nada menos que a intervenção militar. [Não vou colocar o link para a comunidade, por motivos óbvios].
 
E aí, bye-bye panelaço, buzinaço e o escambau. Que seria do futuro? Imprevisível. E não algo que possa ser planejado ou reformulado num novo pleito, em quatro anos, como acontece hoje. O horizonte passa a ser obscuro quando deixamos de viver numa democracia. Assim como essa instabilidade do período pré-tapetão também dificulta qualquer possibilidade de tomar rumos que melhorem o Brasil. Vira só uma grande histeria, cada dia mais radical e intolerante, e menos aberta a divergências.
 
É isso que você quer? Eu não. Por isso, me abstenho de participar dessa marcha do dia 15. Não pela marcha em si: é muito válido criticar a presidente, que está deixando muita gente insatisfeita, inclusive vários que são até filiados ao seu partido, o PT. Mas pelos que estão se aproveitando da marcha para gerar histeria e, com a histeria, criar o ambiente certo para um golpe, como aconteceu há 50 anos no Brasil (e, também daquela vez, começou com “marchas”). Sou otimista demais pra embarcar nesta canoa furada
 
 



Nenhum comentário:

Postar um comentário