sábado, 28 de setembro de 2013

PÉRET E BURLE MARX ( Parte II ) NA RESTAURAÇÃO DO SANTUÁRIO DE CONGONHAS (1973-1974)



Por  Luiz Ricardo Péret



Dando sequência a matéria sobre a segunda grande restauração do Conjunto Arquitetônico do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos (1973-1974), nesta segunda parte, apresento fotos que registraram momentos importantes das obras de restauração do Santuário.

 O arquiteto e diretor executivo do IEPHA/MG  Luciano Amédée Péret (ao centro), responsável pelas obras de restauração do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos com o paisagista Roberto Burle Marx, responsável pelo ajardinamento (à direita) e o funcionário Rafael (à esquerda) - Foto: Assis Alves Horta -








As fotos, a seguir, são de autoria do fotógrafo Assis Alves Horta.
Ao lado, Assis dá uma pausa em seu trabalho para ser fotografado - Congonhas, 1973.

 












Início do calçamento no Jardim dos Passos 






Obras no Jardim dos Passos e vista dos andaimes nas capelas







 







Jardim do Passos, terraplanagem para grama. Observa-se também capela em reforma e as casas do Beco dos Canudos, uma das vias do entorno do Santuário, que passou também por reforma. 
















Início do calçamento da Praça da Basílica









           Reforma do telhado da Basílica 

















Vista de outro ângulo a reforma do telhado da Basílica.
 Reconstrução do muro divisório com o Beco dos Canudos                Reforma da Capela 6
Muro que liga o 1º Passo ao 2º visto pelo Beco dos Canudos 



Calçamento e ajardinamento dos Passos





No próximo artigo, a última parte sobre a segunda grande restauração do Santuário de Congonhas, com fotos da conclusão das obras.

O trabalho de especialistas e de vários outros trabalhadores, muitos no anonimato (aqui representados pelo Rafael)  vem ao longo dos anos contribuindo para a conservação, proteção e preservação do patrimônio histórico.    


Fonte: Acervo Luciano Amédée Péret            


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

FREI CLÁUDIO: O ARTESÃO DA FÉ FAZ 80 ANOS

 Hoje,  Frei Cláudio comemora 80 anos de idade. Faço um breve comentário sobre aquele que é referência para muitos e que vem nos ensinando, ao longo de tantos anos, como vivenciar a fé.
 A sua sensibilidade religiosa e generosidade ética renova  a nossa fé cada vez que assistimos a sua missa.  Parabéns Frei Cláudio e obrigado!


Por Luiz Ricardo Péret

 


Frei Cláudio Van Balen : 80 anos. Uma vida de dedicação, sendo 46 anos dedicados à Igreja do Carmo. Em todos esses anos o que não lhe falta é coragem. A sua visão clara e objetiva nos ensina e nos convida à uma religiosidade  autêntica - baseada em um jeito transparente de viver a fé cristã - sem medos, sem crendice, sem culpa. Um humanismo que resulta, principalmente em cidadania amorosa.. Sua  vivência nos inspira. A seguir, algumas reflexões do Frei Cláudio:

¨ Forma camuflada do mal: separar vivência da fé da realidade¨.

¨ Adorar a Deus exige inconformismo frente a tudo que desumaniza ¨.

¨ É vedado a cada um e à Igreja, em seu conjunto, fechar-se em si mesmo, reconhecendo a presença real de Cristo em cada pessoa, em cada povo, cultura e religião ¨.

¨ Não foi o pecado que tornou Jesus necessário, mas ele veio para salientar a total gratuidade de Deus com a humanidade¨.

¨Quanto mais se aloja Deus no Céu e se desliga a religião da experiência cotidiana, mais nos distanciamos de Deus. O Reino com sua Boa Nova acontece quando a história progride na confraternização, em clima de busca, diálogo, cooperação e paz ¨.

¨Deus se aloja na tessitura das relações justas e fraternas que somos chamados a construir ¨.

¨A verdade e a Salvação não se prendem dentro dos muros de um severo dogmatismo nem dentro de um moralismo opressor¨.

¨Santidade não é algo que , primariamente, se concentra em devocionalismo e num modelo sagrado de viver mas, antes, tem a ver com um engajamento ativo a favor das causas como libertação, direitos humanos e justiça que geram paz ¨.

¨Culto a Deus é vivência de relações em clima de solidariedade. O lugar do encontro com Deus é o cotidiano da própria vida¨.

¨Celebrar a fé que dá boa qualidade às relações : relações fraternas, dignas¨.

¨A Mesa da Eucaristia  deve ser de acolhida e não de exclusão. Todo mundo é convidado¨.

¨Todos incluídos, nos reconhecemos convidados à Mesa do Senhor - Jesus , nosso guia, muito honrados, nos sentimos comensais. Eis o sinal de quem se faz doação, fonte de inclusão: Vida vence a morte, compaixão inclui excluídos - Com Jesus na solidariedade da partilha. Felizes de nós, convidados à Ceia do Senhor - Seja a comunhão nosso abraço / na paz de Deus. Amém




A seguir, a reportagem do Jornal Estado de Minas (26/09/2013) :

Por Sandra Kiefer


Frei vem do latim frater, que quer dizer amigo. E não poderia haver melhor título eclesiástico do que esse para assinalar a missão de Cláudio van Balen, que completa 80 anos nesta quinta-feira, 46 deles dedicados à Paróquia Nossa Senhora do Carmo, uma das mais atuantes da capital, na comunidade do Carmo-Sion. Com sermões engajados e muitas vezes controversos, o religioso conquistou uma legião de fiéis admiradores, sobretudo por estimular a prática de ações sociais e por ousar enfrentar assuntos polêmicos, tanto para a Igreja Católica quanto para a ciência, como aborto, eutanásia, homossexualismo, divórcio e até a transposição do Rio São Francisco, tema que virou presépio na igreja. Mesmo que suas posições não sejam consenso, a palavra de frei Cláudio é tão contundente que nem aqueles que discordam dele são capazes de permanecer indiferentes.

Do alto da firmeza de posições consolidada em seus 80 anos, frei Cláudio está em busca de leveza, conforme confessa na reflexão do boletim da missa do último domingo, na qual paroquianos amigos prepararam homenagem antecipando a celebração do aniversário. “Prosseguirei na caminhada, sendo este o objetivo: deixar alguma flor neste planeta no qual nasci, aprendi, recebi tanto, convivi e pelejei, vencendo obstáculos e colhendo bons frutos”, assinalou, no folheto. Em outro trecho, porém, o religioso desconfia da própria capacidade de se manter sereno. Como diz um colega padre, que o acompanha à distância, no anonimato: “Frei Cláudio é admirável, admirável, admirável… mas tem o temperamento explosivo”.

Coube ao garoto Jildert – nome civil de batismo na Holanda – a escolha de vir para o Brasil aos 16 anos, ainda na condição de seminarista, com um grupo de sete jovens holandeses, estudantes carmelitas da Ordem dos Irmãos da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo. Dos oito, quatro concluíram a formação sacerdotal. Desses, dois perseveraram no sacerdócio. Frei Cláudio é o único sobrevivente no Brasil. Após dois anos de estudo ginasial em Itu (SP), um ano de estágio em Mogi das Cruzes (SP), três de filosofia e quatro de teologia em São Paulo, frei Cláudio também se formou em letras clássicas. Foi ordenado em dezembro de 1959. De 1960 a 1964, quando se encontrava em Roma, preparando-se para o doutorado em teologia dogmática, conviveu com o clima de renovação que iria desembocar no Concílio Vaticano II. Ele conta que, na ocasião, teve a oportunidade de presenciar “uma significativa – embora passageira – mudança na Igreja Católica, em doutrina e pastoral”.

No retorno ao Brasil, depois de rápida passagem de três anos por São Paulo, foi transferido para Belo Horizonte, onde daria aulas de teologia e trabalharia na paróquia do Carmo, onde permanece até hoje. Em 2010, a informação de que o afastamento de frei Cláudio para outra cidade era cogitado foi o bastante para desencadear intensa mobilização na comunidade, que reagiu com o poder de 13 mil nomes lançados em um abaixo-assinado, além de encher, ainda mais, as missas do religioso. Teriam motivado o movimento para afastá-lo atitudes que fugiriam aos padrões da Arquidiocese de Belo Horizonte. Entre as principais fontes de incômodo estaria o boletim distribuído nas missas, totalmente reescrito por ele. Nas demais paróquias, a celebração segue um roteiro pré definido pela Cúria Metropolitana.
Por fim, o religioso concordou com a saída diplomática: se aposentaria por idade do posto de pároco (acima de 75 anos), sendo substituído na função por frei Evaldo Xavier Gomes. Mas, a pedido dos fiéis, frei Claúdio continua a responder pela missa das 11h do domingo, como vigário. “Muitos padres ainda dizem por aí que minha missa não é válida”, reconhece. De acordo com a Cúria Metropolitana de BH, a Paróquia Nossa Senhora do Carmo é administrada por meio de congregação religiosa, que conta com governo próprio. Portanto, mudanças internas passam pelo discernimento dos próprios carmelitas.
Poucos sabem, porém, que frei Cláudio briga pela modernização do folheto da missa desde a década de 1960. A contenda iniciou-se dois anos depois do Concílio Vaticano II (1962-65), que liberou o emprego do português no início e no fim das celebrações, preservando o latim apenas na parte central do folheto. “Já na metade do ano de 1967, decidimos rezar a missa toda em português. Não tinha sentido insistir em uma língua que ninguém mais entendia. O povo bateu palmas, mas o bispo exigiu explicações. Meio ano depois, em 1968, chegou a ordem de Roma dispensando o uso do latim”, revela o religioso, autor de dezenas de livros e adepto da Teologia da Libertação – corrente sem consenso dentro do catolicismo que surgiu na América Latina, na década de 1960, com forte conotação socioeconômica e política e que defende a atuação da Igreja sobretudo em defesa dos menos favorecidos.

Caráter formado na dureza da 2ª Guerra
Frei Cláudio não poderia ser diferente do que é. De certa forma, suas posturas refletem algo de sua experiência iniciada na Holanda, durante os conflitos da Segunda Guerra Mundial. Aos 10 anos, viu seu pai fazer buracos no silo para esconder jovens que se negavam a colaborar com o Exército alemão. Com o país ocupado pelos nazistas, o frade revela ter ficado muito impressionado com a atitude do então vigário local. Do púlpito, ele insistia para que ninguém colaborasse com o regime de Hitler. Devido às suas mensagens, passou três anos em um campo de concentração nazista.

Fatos e exemplos como esses deixaram marcas profundas no religioso, que, mais tarde, já no Brasil, pregaria contra injustiças e violências do regime militar. “O leite bebido na infância produz, mais tarde, seus efeitos”, observa o religioso, que continua jovem no idealismo que propaga. Durante a ditadura militar, a Igreja do Carmo continuou a funcionar como casa aberta, abrigando reuniões de estudantes das mais diversas frentes de militância política.

Conta o frade: “Certa vez, um grupo de sete rapazes e moças, acusados de iniciativas subversivas, presos e torturados em Juiz de Fora, fizeram chegar a nós o relato do que haviam sofrido. Um dos acusados, preso e maltratado, citou meu nome como facilitador dessa ‘subversão’. Fui ouvido no Dops, xingado e ameaçado, porém prova não foi encontrada, além da palavra do rapaz torturado”.

PAPA
Quanto à escolha do cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, eleito papa Francisco, frei Cláudio considera que a Igreja Católica está entrando no bom caminho. “Na teologia, o papa bebeu de uma fonte antiga, da qual todos nós – os mais antigos – bebemos também. Felizmente, quanto à pastoral, o papa Francisco tem um jeito bem aberto. Há quem observe que ele fala e faz o que estamos ouvindo e fazendo, na paróquia, há 40 anos. Ainda bem”, suspira.
Entre as “modernidades” adotadas pelo frade carmelita no ritual da missa, estão o repartir da comunhão também com pessoas separadas que se casaram de novo. Ele argumenta que a mesa da Eucaristia deve ser de acolhida e não de exclusão.

Frei Cláudio chega a se exaltar ao descrever o quadro da Santa Ceia, que costuma encimar a mesa da sala de jantar de inúmeras casas católicas em Minas. “Afinal, na Primeira Eucaristia, em uma ponta da mesa estava Judas, que iria trair; na outra ponta, Pedro, que iria negar; e o restante da turminha que iria abandonar Jesus, na hora da condenação. Além do mais, até o papa, ao rezar a missa, na hora da comunhão, também reconhece: ‘Não sou digno de que entreis em minha morada’. Ora, se ninguém é digno, o problema não é a dignidade, mas o convite, que é universal”, defende. “Ninguém é digno, mas todo mundo é convidado.”

Artesão da fé
Em 21 de outubro será lançado o livro Cláudio van Balen: Artesão da fé, de autoria do padre Mauro Passos e do ambientalista Cláudio Guerra, amigos do frade. A obra detalha um pouco mais da trajetória do religioso, sua infância na Holanda e as atividades sociais da Igreja do Carmo, referência no país. “Sabe do que mais gosto em frei Cláudio? Da sua alma livre, sem narcisismo e sem amarras. Ele é o que é. Eu queria ser assim”, confessa uma entre os 800 voluntários dos mais de 50 projetos sociais da Igreja do Carmo, entre serviços jurídicos, médicos e psicológicos, que atendem a 20 mil pessoas por mês. Diariamente, ela segue de ônibus de um bairro vizinho até o Sion para se inspirar no exemplo de vida do religioso.


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A mídia nos representa?



Com que direito o jornal Estado de Minas se intitula representante legítimo de todos os habitantes do estado? Esse ou qualquer outro veículo de comunicação não pode se colocar como porta-voz da opinião pública. É porta-voz da opinião publicada deles.
O artigo de Rodrigo Martins, na revista Carta Capital desta semana analisa bem o tema.    





Por Rodrigo Martins


 Parecia uma carta de indepen­dência ou um ultimato antes da declaração de guerra. Na ma­nhã da quarta-feira 18, o jornal Estado de Minas se arvorava no papel de representante legítimo dos 19 milhões de habitantes do estado. Em edi­torial de primeira página, o jornal investia contra o ministro Celso de Mello, que dali a horas decidiria o futuro de 11 con­denados no processo do "mensalão". "Nas ruas de Belo Horizonte, parte expressiva da população tende a considerar a aceita­ção dos embargos como decepcionante. Pior: um aceno à impunidade", afirma­va o texto. No dia seguinte, como tantos veículos de comunicação, o diário mi­neiro não esconderia a insatisfação com a "prorrogação" da análise do processo. O carioca O Globo iria além. "STF mantém a impunidade de mensaleiros até 2014", cravou na capa. Em tom uníssono, a mídia lamentou o "divórcio" entre o Supremo Tribunal Federal e a "opinião pública".
Mas qual opinião pública? "A do próprio jornal, oras", avalia, sem rodeios, o soció­logo Venício de Lima, professor da UnB e dedicado aos estudos da mídia. "Desde meados do século passado, os principais grupos de mídia reivindicam a represen­tação da opinião pública em detrimento dos canais institucionais da democracia representativa, como partidos, governos e Congresso. Isso porque a imprensa tem o papel de mediar a comunicação, fazer a ponte entre o publico e as instâncias de de­bate político." Com um problema, ressalta: "Ao mesmo tempo que fazem essa mediação, esses grupos são atores políticos, de­fensores de seus próprios interesses e dos de seus financiadores. Em nenhum lugar do mundo a mídia pode se colocar como porta-voz da opinião pública. Menos ain­da no Brasil, marcado pela forte concen­tração dos meios de comunicação, um oli­gopólio de interesses muito particulares".
A avaliação de Lima é compar­tilhada pela cientista políti­ca Vera Chaia, professora da PUC-SP. "A mídia não foi elei­ta, não tem representatividade, não pode falar em nome do conjunto da população. O que pode medir a opinião pública são as pesquisas, e mesmo as­sim é preciso olhar para elas com cer­ta desconfiança, pois normalmente di­recionam o entrevistado a se manifes­tar sobre as pautas predeterminadas pe­la mídia", avalia a docente. "Ainda mais descabido é pressionar um juiz a deci­dir conforme o clamor popular. Um mi­nistro da Suprema Corte tem de julgar com base na Constituição, na defesa do ordenamento jurídico."
Marcus Figueiredo, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj, ressalta que o conceito de "opi­nião pública" está no singular não por acaso. "Ela só se manifesta quando há consenso na sociedade. E do interesse do conjunto da população, por exem­plo, ter um sistema de transporte pú­blico bom e confiável. Não interessa se boa parte da população tem automóvel particular. A mobilidade urbana depen­de de sistemas de transporte coletivo", afirma. "Portanto, podemos dizer que a opinião pública é favorável ao combate à corrupção, mas daí a dizer que é contra os embargos dos réus do "mensalão" são outros quinhentos, O que estava em jo­go ali não era esse único processo, e sim a validade de um recurso jurídico. Até porque, amanhã ou depois, o dono des­se jornal que fala em nome da opinião pública pode estar no banco dos réus e sentir que o seu direito à ampla defesa foi cerceado pelo STF lá atrás."
Para tentar assumir oposto de legíti­ma representante da opinião pública, a mídia costuma desqualificar as demais instâncias políticas da democracia, sus­tenta o historiador Aloysio Castelo de Carvalho, professor da UFF. "Os jor­nais se apresentam como uma voz mais autêntica por não ter envolvimento di­reto no processo eleitoral, e exploram o desgaste que existe entre os políticos eleitos e a população representada. Em países com democracia mais consolida­da, há um equilíbrio maior nessa relação entre a mídia e as instituições políticas. Uma responde à outra, sobretudo nos casos de desvio de conduta. Aqui, não. Além disso, não há uma tradição de plu­ralidade de pensamento na mídia brasi­leira. Boa parte da população tem a sua voz ignorada pelos jornais."
Autor de um livro sobre o tema. Carvalho cita o exemplo da articulação de dezenas de emissoras de rádio, dos Diários Associados e dos jornais cario­cas O Globo e Jornal do Brasil pela de­posição do presidente João Goulart. Criada em 1963, a cinicamente autointitulada "Rede da Democracia" se colo­cava como porta-voz da opinião públi­ca e exigia a intervenção dos militares contra a suposta ameaça comunista no País, " Praticamente, não havia oposição nos meios de comunicação a esse proje­to, que resultou no golpe de 1964 e em uma ditadura de 21 anos."
O alardeado "divórcio" entre o Judiciário e a opinião públi­ca é outra invenção, sustenta Fernando Filgueiras, professor de Ciência Política da UFMG e coordenador do Centro de Referenciado Interesse Público. "Nunca existiu esse casamento, até porque a população nu­tre profunda desconfiança em relação ao Judiciário." Em artigo publicado na revista acadêmica Brazilian Political Science Review, ele apresenta uma pesquisa feita em 2012 com mais de 1,2 mil entrevistados em Belo Horizonte, Goiânia, Porto Alegre e Recife. A des­confiança atinge todas as instituições: Presidência da República, Congresso Nacional, forças policiais... Mas tam­bém o Judiciário, visto com suspeição por 48,7%. As razões são claras: 61,4% não acreditam que os cidadãos são tra­tados de forma igual, e 51,7% avaliam que os juízes tomam decisões influen­ciadas por políticos, empresários e ou­tros interesses.

HÁ UMA RAZÃO PARA OPINIÃO PÚBLICA SER UMA PALAVRA NO SINGULAR, DIZ MARCUS FIGUEIREDO. "ELA SÓ SE MANIFESTA QUANDO HÁ CONSENSO NA SOCIEDADE." OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO NÃO FORAM ELEITOS, LEMBRA VERA CHAIA.     

sábado, 21 de setembro de 2013

PÉRET E BURLE MARX NA RESTAURAÇÃO DO SANTUÁRIO DE CONGONHAS (1973-1974) - PARTE I -




Por Luiz Ricardo Péret



                                      Péret e Burle Marx  -  foto: Assis Alves Horta (1973)
                                        
Em razão de seu expressivo acervo de arte barroca, o Santuário do Bom Jesus de Matozinhos, pertencente ao município de Congonhas-MG, foi inscrito no Livro do Tombo das Belas Artes, em 1939, pelo  antigo SPHAN, hoje Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN. O conjunto foi construído em várias etapas, nos séculos XVIII e XIX, por vários  mestres, artesãos e pintores,  como Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho e Manuel da Costa Ataíde. O Santuário é um conjunto arquitetônico  e paisagístico formado por uma Basílica, um Adro com esculturas de Doze Profetas, em pedra sabão,  e Seis Capelas que compõem  o Jardim dos Passos, que representam a Via Sacra com belíssimas imagens esculpidas em cedro por Aleijadinho.  O Santuário é testemunho vivo de um Brasil que foi colonial e se fez um estilo de arte.

No decorrer desses anos, o conjunto arquitetônico e de imagens, conseguiu preservar a memória de tão importante período histórico. As obras  do conjunto arquitetônico e paisagístico do Santuário e as obras barrocas de Aleijadinho, graças a algumas reformas que se fizeram e se fazem  ao longo do tempo, ainda se encontram em bom nível de conservação.

A primeira grande restauração do Santuário foi realizada pelo SPHAN, em 1957, focada no interior das Capelas dos Passos e em suas esculturas, a restauração conseguiu remover camadas superpostas de tintas que mascaravam a obra original de Aleijadinho e Mestre Ataíde. Em julho de 1957, o Santuário foi elevado à condição de Basílica Menor, oferecendo maior incentivo à devoção a Bom Jesus de Matozinhos.

Em 1973, iniciou-se uma segunda grande restauração pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais - IEPHA/MG, em convênio com o IPHAN.
Foram realizadas obras de conservação, restauração e proteção do conjunto arquitetônico e paisagístico do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos de Congonhas. O responsável pelas obras de restauração foi o arquiteto e diretor executivo do IEPHA/MG  Luciano Amédée Péret e o projeto de  ajardinamento na Praça da Basílica a cargo de Roberto Burle Marx  ( fotos : Péret e Burle Marx no Santuário de Congonhas).  
As obras de restauração do Conjunto Arquitetônico e o novo Jardim dos Passos foram concluídas em junho de 1974. 

A década de 70, portanto,  foi marcada  pela atuação conjunta de dois grandes especialistas, para preservar a imponência da arquitetura, arte e beleza do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos, reunindo  a obra prima de Aleijadinho e constituindo-se em um museu a céu aberto.



                                         Roberto Burle Marx e Luciano Amédée Péret
     supervisionando as obras de restauração do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos  
                                              foto: Assis Alves Horta  ( 1973)


No próximo artigo sobre este tema leia mais informações e veja mais fotos das obras da 2ª grande restauração do Santuário de Congonhas (1973-1974).



   Em 1985, o conjunto arquitetônico  e escultórico do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos foi           elevado pela Unesco a Monumento Mundial e Patrimônio Histórico da Humanidade.

                                                                                
    Capelas de Congonhas e a Basílica do Bom Jesus
         de Matozinhos ao fundo  -   foto: wiki.org  



Fontes:

- Acervo Luciano Amédée Péret

-iphan.gov.br

 - htp;//repositório.ufla.br . Evolução Histórico Cultural e Paisagístico da Praça da Basílica de Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas-MG. Dissertação  de Mestrado de Luiza de Castro Juste. Universidade Federal de Lavras. 

- wikipedia.org/wiki/congonhas



sábado, 14 de setembro de 2013

Palácio dos Despachos



Projetado pelo arquiteto Luciano Amédee Péret e construído pelo engenheiro Alberto Bouchardet Filho, o Palácio dos Despachos foi inaugurado em 24 de outubro de 1967, durante a gestão do governador Israel Pinheiro.
O Palácio dos Despachos foi construído para abrigar o serviço administrativo do Estado, uma vez que o espaço do Palácio da Liberdade se tornou insuficiente para a acomodação de um número elevado de pessoal.
O prédio apresenta características da arquitetura modernista, com andares livres e estrutura autônoma. A fachada é protegida da insolação por brise-soleil e o acabamento no hall principal é em mármore Marta Rocha.
 Durante décadas, o Palácio dos Despachos foi marcado por importantes atos e decisões governamentais. O prédio faz parte do complexo do Palácio da Liberdade.


Foto: Osvaldo Afonso


Ainda no Palácio dos Despachos, encontramos uma obra do pintor Candido Portinari (1903-1962). O Painel Civilização Mineira (1959), é uma alegoria à mudança da capital mineira de Ouro Preto para Belo Horizonte.
Desde 1966, o painel está em exposição no salão de entrada do Palácio dos Despachos, sede da Secretaria de Estado de Governo.

Em 1977, o Conjunto do Palácio da Liberdade, que abrange o Palácio da Liberdade, o Palácio dos Despachos, a Capela de Santana e os jardins, onde estão  contemplados a estufa, o lago e o quiosque, foi incluído  no tombamento do ¨Conjunto Arquitetônico e Paisagístico da Praça da Liberdade¨ pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico  e Artístico  de Minas Gerais - IEPHA.





Palácio dos Despachos

Com a transferência da sede do Governo para a Cidade Administrativa, foi assinado, em 2011, um protocolo de intenção que prevê a implantação  da Casa Fiat de Cultura no  Palácio dos Despachos, antiga sede administrativa do governo de Minas, anexo ao histórico Palácio da Liberdade. A Casa Fiat de Cultura passará a ser um dos equipamentos que integrará o Circuito Cultural Praça da Liberdade. O prédio passará por uma reestruturação e adequação às diretrizes museológicas contemporâneas para receber as exposições e o público da Casa Fiat de Cultura.
Será um importante espaço para discussão e exposição das artes no Brasil. Será oferecida programação gratuita à população. Abrigará grandes mostras internacionais de artes plásticas e apresentações inéditas  de acervos brasileiros, com debates acadêmicos e programas educativos.

Fontes:
governo.mg.gov.br/cidadão/complexo-arquitetônico-dos-palácios
casafiat.com.br

terça-feira, 10 de setembro de 2013

O Fiasco e o Bom Senso


Não é racional pensar que, no atual contexto político em que vivemos, a solução para nossos problemas nascerá da depredação de pontos de ônibus, destruição de concessionárias  e saques a lojas de roupa.
Estudante de arquitetura é preso por depredar a Prefeitura


Por  Miguel do Rosário
Algumas considerações sobre o 7 de setembro
Talvez possamos usar a velha filosofia para explicar o fiasco das manifestações no dia 7 de setembro. Heráclito de Éfeso advertia que jamais podemos entrar no mesmo rio, pois as águas serão diferentes e nós mesmos também já somos outros.
O plano de repetir no último dia 7 as “jornadas de junho” quis o impossível. As pessoas não eram as mesmas. Talvez fossem os mesmos indivíduos, com os mesmos nomes, dispostos a voltar à rua portando os mesmos cartazes que portaram em junho. Mas estavam diferentes, com novos pensamentos, novas desconfianças, novas estratégias. E quando olharam para as ruas, também não reconheceram o que antes lhes parecera tão convidativo. A histeria conservadora poluiu as águas daquele rio, e as pessoas desistiram de nadar.
Passado o susto, mergulhemos sem medo no coração da polêmica. As manifestações de junho dividiram corações e mentes, na própria esquerda. Todos os radicalismos ganharam um prestígio súbito e surpreendente. Pessoas até então pacatas, com opiniões moderadas e democráticas, de repente passaram a defender o quebra-quebra e a violência.
Todas as frustrações contra a democracia e contra as instituições políticas, acumuladas desde o fim da ditadura, vieram à tôna, com extrema virulência. Colaborou para isto, certamente, a omissão do Estado na propagação de valores propriamente democráticos, somada à campanha frenética dos grupos de mídia, poderosos herdeiros do regime militar, para desqualificar o sistema político.
É uma campanha bem feita, inteligente, que surte efeito nas melhores cabeças. Muitas vezes, aliás, é melhor assimilada pelas pessoas mais instruídas.
O que não significa, naturalmente, que as instituições não sejam passíveis de crítica, não sejam problemáticas, e que a corrupção não seja um dos grandes problemas nacionais.
Entretanto, não é racional pensar que, no atual contexto político em que vivemos, a solução para nossos problemas nascerá da depredação de pontos de ônibus, destruição de concessionárias e saques a lojas de roupa. Esse tipo de coisa só tem um valor compreensivelmente catártico em momentos de fúria antirracista ou em situação de catástrofe social. Admitir que manifestações políticas antigoverno tem direito de apelar à violência é abrir caminho para o caos. Porque aí todo grupo de oposição, mesmo durante o governo mais correto socialmente, se sentirá no direito de agir igual, gerando uma cultura de “vendeta” que levará a maioria a defender uma solução autoritária para reestabelecimento da ordem.
Não se trata de criminalizar a violência popular, nem apelar a um pacifismo radical que flerte com a resignação, mas sim de valorizar a inteligência e prestigiar a democracia.
É inegável que o brasileiro se tornou mais intolerante, e que as ondas de violência continuam repercutindo pelo corpo social. Há pouco, um problema nos trens do Rio gerou uma tal onda de fúria que as pessoas incendiaram vários vagões. Tais coisas agora são comuns em todas as capitais. O anúncio de uma paralisação ou greve de motoristas deflagram rapidamente movimentos para depredar os coletivos.
Aí sim é necessário compreensão, porque apesar de violentas, são manifestações absolutamente focadas. Se as pessoas sofrem a humilhação cotidiana de enfrentar um transporte público sem nenhum conforto, a humilhação se converte em ira quando se vêem desamparadas pelo mesmo serviço, largadas numa rodoviária. São trabalhadores cansados e famintos que só queriam voltar para casa.
Mesmo compreendendo, todavia, não podemos nos deixar levar por um cinismo tão grande, travestido de “visão política”, que nos faça apoiar esse tipo de ação. Por que são ações fundamentalmente estúpidas. Se o serviço de transporte é ruim, certamente não é depredando a estação e os veículos que ele irá melhorar. Ao contrário, o sofrimento apenas irá aumentar. Se há motivo para protesto, o povo deve reagir com inteligência, visando o seu próprio bem estar, e não o contrário.
Quebrar estações de trens não melhorará o transporte público, assim como destruir hospitais não resultará em melhores serviços de saúde.
O brasileiro precisa ser estimulado a participar mais da construção da cidadania. Em vários países desenvolvidos, as famílias participam de projetos coletivos para ajudar a escola pública e os postos de saúde do bairro. O cidadão tem que ajudar o Estado. De que adianta jogar lixo nas ruas e depois fazer passeatas contra a prefeitura pedindo mais limpeza? A lei da transparência, sancionada pela presidente Dilma, permite aos cidadãos checarem as despesas de qualquer órgão estatal; de posse de comprovantes que identificam desvios, podem protestar com foco e objetivo.
Qual o sentido em exigir serviços públicos melhores de um lado, e sonegar impostos, de outro?
Neste 7 de setembro, por exemplo, um grupo de jovens mascarados de classe média destruiu o elevador do metrô do Largo do Machado, prejudicando todas as pessoas com dificuldade para usar escadas rolantes, como cadeirantes e idosos. Qual o sentido disso?
Precisamos ser tolerantes com esse redespertar da consciência política. Ela nasce gritando, disforme e faminta. Logo adquirirá hábitos mais civilizados e democráticos. Mas temos que incentivar que esta consciência amadureça rápido, e se torne mais inteligente e responsável. Quanto mais crítica, aguda, politizada a consciência do povo, mais necessário (e eficaz) que seja prudente e civilizada.
É triste constatar a quantidade de intelectuais metidos a black bocs que, ao invés de estimular soluções concretas e inteligentes, se comprazem em ver o circo pegar fogo. Também estes foram derrotados no último dia 7. O povo vê com bons olhos o surgimento de uma postura mais crítica, mas felizmente ainda guarda o bom senso de não apoiar uma violência idiota e sem foco.
 

sábado, 7 de setembro de 2013

TEATRO DE SABARÁ: a partir de 1970, o espetáculo continua


Folder produzido e distribuído pelo Governo do Estado de Minas Gerais na época da reinauguração do Teatro de Sabará, com o título: O espetáculo continua - Teatro de Sabará 1818 / 1970.





Quem passa pelas ruas históricas de Sabará, por descuido, pode não perceber a existência de um interessante teatro aberto gratuitamente a visitação que corresponde a um dos mais importantes espaços turísticos da cidade.
Pode-se dizer que é uma jóia, que por fora não chama tanta atenção, mas por dentro surpreende com seus três andares distribuídos entre camarotes com cadeiras em palhinha, estrutura interna em madeira, forro em treliça com boa iluminação e acústica.



A construção idealizada por Francisco da Costa Lisboa apresenta externamente a aparência típica das construções civis coloniais.


O TEATRO

Sabe-se que a primeira Casa da Ópera da Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabarabuçu foi construída em 1770, mas, a partir de 1783, já estava completamente abandonada, já que as apresentações teatrais passaram a ser executadas em um palco de madeira construído em uma praça pública.
A atual Casa da Ópera, também conhecida como Teatro Municipal, foi inaugurada em 1818 através de um imenso esforço da população local


¨Foi inaugurado como Casa de ópera de Sabará e é o segundo teatro mais antigo do Brasil. O primeiro é o de Ouro Preto, também em Minas Gerais. A primeira peça apresentada foi "Maria Teresa, a imperatriz da áustria e Selo d'amor". Nessa época também estava sendo comemorado o nascimento da princesa de Beira, a infanta dona Maria da Glória.

O teatro de arquitetura barroca foi idealizado por Francisco da Costa Lisboa e sua construção foi feita e financiada pelos moradores da cidade sem nenhuma ajuda oficial. Esse pequeno teatro foi palco de excelentes atuações, especialmente do público que em 1831, quando Dom Pedro I fez ali sua visita, a excelente acústica do local fez o imperador perceber como sua presença na casa deixava o povo descontente. E o ponto culminante foi no momento das homenagens: após o "Viva o imperador Dom Pedro I", podia-se ouvir com clareza a frase "Enquanto for constitucional", falada pelo coronel Pedro Gomes Nogueira, que liderava junto com o padre Mariano de Sousa, o grupo dos constitucionalistas, de oposição ao imperador. Esse fato, interrompeu a visita de Dom Pedro I à Minas Gerais e antecipou sua volta à corte. A família real só voltaria ao Teatro de Sabará em 1881, durante a estada de Dom Pedro II em Sabará.

O Teatro Municipal de Sabará não era palco somente de espetáculos mas ali também eram levadas as questões sociais da época. Bento Epaminondas criou, em ficção, a libertação dos escravos das minerações inglesas. A montagem teve o nome de "A vingança do escravo", de grande sucesso e várias apresentações. Uma das noites, após a encenação, Epaminondas viu-se em uma séria discussão com o diretor da Companhia de Mineração Cocais, que exigia explicações sobre a apresentação que acabara de ver.

As peças apresentadas muitas vezes eram longas e nem isso afugentava o público que levava travesseiros, cobertores e trocas de roupas para as crianças. Essas famílias geralmente eram acompanhadas por escravas. Quando saiam do teatro, já de manhã, encontravam os amigos e vizinhos para a missa das 5 horas da manhã de domingo.

No início do século XX, com o surgimento do cinema, o teatro foi adaptado e transformou-se em Cine-Teatro Borba Gato, 1915. Após 50 anos como cinema a casa foi fechada dando lugar a um bar que teve vida curta¨.
Fonte:.allboutarts.com.br/defaut.aspx


A partir de 1970: O ESPETÁCULO CONTINUA



Aspecto geral da sala de espetáculos, mostrando a estrutura leve e graciosa dos camarotes


Autêntica  relíquia de uma gloriosa  e romântica  fase  da história  de Minas, o Teatro de Sabará  foi, em 1970, totalmente restaurado. Aberto em 1818, sua construção é atribuída ao coronel Pedro Gomes Nogueira e ao padre Mariano de Souza e Silvino, duas importantes figuras da velha Sabará.  

Com sua forma ogival, seu palco, camarotes e plateia, o Teatro de Sabará - cuja construção sofreu, uma nítida influência italiana - conheceu noites de grande gala em meados  do século XIX, quando famosas companhias se apresentaram  com seus dramas e comédias para uma  população ávida de divertimento.

Testemunha  da própria história de Minas, o Teatro de Sabará viveu seu período de maior glória de 1840 a 1870, mas, em 1831, já virá o Imperador Pedro I, sentir o descontentamento do povo, que, certa noite, ao saudá-lo no camarote Imperial do segundo andar, não ficara só no ¨Viva o Imperador¨ , mas completara em coro: ¨Enquanto for constitucional ¨.

Divertindo e educando, o Teatro viu o tempo passar. No século XX veio a decadência. O teatrinho tentou lutar, resistir, mas a ação do tempo foi mais forte. Primeiro, virou cinema. Mais tarde suas portas foram fechadas. Não havia mais os aplausos frenéticos. As palmas  no correr final do pano foram substituídas pelo silêncio do abandono. O Teatro de Sabará estava condenado à ruína, uma simples peça do passado sob o olhar curioso das novas gerações.

Por determinação do Governador Israel Pinheiro, a velha e simpática casa de espetáculos voltou a ser inserida no panorama artístico  de Minas. 

Sua restauração ficou a cargo  da Secretaria de Viação e Obras Públicas, cabendo ao arquiteto Luciano Amédée Péret a responsabilidade de planificá-la e dirigi-la em todas as fases de trabalho. Foram dois anos  de trabalho para recuperar o Teatro de Sabará.

A restauração não foi fácil: exigiu exaustivas pesquisas, pois o prédio tinha de guardar em sua nova forma a perfeita semelhança com o teatro inaugurado em 1818. Com seus 62 camarotes e sua plateia, onde 400 pessoas podem ser instaladas, o novo Teatro de Sabará mantém  absoluta fidelidade à construção primitiva. Sua estrutura foi totalmente revista e reforçada. Sua decoração é exatamente a mesma vista e sentida pelos que alí se divertiram no século XIX.   
 ( fonte: Folder ¨O Espetáculo continua¨ , distribuído pelo Governo do Estado de Minas Gerais, na época da reinauguração) 







O Teatro de Sabará foi reinaugurado em fevereiro de 1970.



Vista das frisas com forros de esteira de taquara. Destaque para a estrutura interna de madeira original, recuperada na restauração dos anos 70




Escadaria de acesso aos camarotes. Nota-se a superposição entre as áreas de circulação e de permanência do público




Detalhe de um dos corredores internos. À direita, óculo quadrilobado para iluminação do acesso às galerias



Aldraba metálica da porta do vestíbulo

. fotos: www.ctac.gov.br/tdb/portugues/teatro



 

fotos: Peter Janzon

foto: Ricardo de Moura Faria


O Teatro de Sabará é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional. 

¨A história é tão plural quanto as múltiplas expressões de memória. Manter vivo um teatro é contribuir de forma viva para que uma das grandes expressões dos sentimentos humanos não despareça. Luciano Amédée Péret contribuiu com essa restauração para que as memórias dos espetáculos da vida não se perdessem¨.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

A Teologia da libertação e a Igreja que precisa de todos

A questão dos pobres é, em perspectiva evangélica, a grande questão.

Por Ugo Sartorio


Com um papa latino-americano, a Teologia da Libertação não podia permanecer por muito tempo no cone de sombra em que foi relegada há alguns anos, ao menos na Europa. Posta fora de jogo por um duplo preconceito: aquele de que ela ainda não metabolizou a fase conflituosa de meados dos anos 1980, muito enfatizada pela mídia, e faz dela uma vítima do Magistério romano; e o preconceito engessado na rejeição de uma teologia considerada muito de esquerda e, portanto, tendenciosa.

É preciso acrescentar o fato de que alguns chegaram até a dar por morta e sepultada a Teologia da Libertação, fruto de uma época que se concluiria finalmente com a queda do Muro de Berlim (1989) e a implosão do império soviético ligado à ideologia marxista.
Curiosa, a propósito, é a reação de um dos maiores expoentes desse filão teológico, o peruano Gustavo Gutiérrez, relatada por Luiz Carlos Susin: "O conhecido teólogo peruano lamentou-se com o seu proverbial senso de ironia, dizendo que, se a Teologia Libertação está morta, ele não foi convidado para o funeral. Ele acrescenta que, se fosse verdade, ele ficaria muito contente, porque isso significaria que teríamos chegado a viver em um mundo justo, no reino de Deus, o reino da liberdade escatológica, e não devemos mais sustentar o esforço da luta e da fidelidade, sempre tentada e fatigante, para conquistar a libertação" (Silvia Scatena, Luiz Carlos Susin e Sandro Gallazzi, Chiesa e teologia in America Latina, Pádua: Messaggero, 2013, p. 51-52).

O mesmo Gutiérrez, no livro que estamos apresentando, esclarece que 1989 é, seguramente, paradigmático para a relação entre Oriente e Ocidente, já que, por muitos anos, a história ficou bloqueada nesse eixo, mas que, no entanto, a teologia da libertação não está interessada na pobreza dos países do Oriente. Ela se move, ao contrário, a partir da desumana situação de pobreza na América Latina e no Caribe, que não parece ter se mitigado significativamente nas últimas décadas e que exige ser lida à luz da fé. "Estado de coisas e teologia – esclarece Gutiérrez sem rodeios – que, substancialmente, têm pouco a ver com o colapso do socialismo real" (p. 46).

Em todo caso, ainda em 2002, o teólogo Robert J. Schreiter descrevia a teologia, melhor, as teologias da libertação "entre resistência e reconstrução" (cf. The New Catholicity, Orbis Books, p. 98-115), portanto, em busca de identidade dentro de contextos mudados. E não é possível deixar de levar em conta que, na América Latina, como ainda há 30 anos ilustrava o teólogo jesuíta argentino Juan Carlos Scannone (cf. Problemi e prospettive di teologia dogmatica, Bréscia: Queriniana, 1983, p. 406-414), a teologia da libertação nunca foi um fenômeno unitário, mas sim caracterizado por correntes também muito diversificadas entre si.

Dentro dessa diversidade, existe uma Teologia da Libertação argentina, compartilhada pelo cardeal Bergoglio, hoje papa Francisco, que, "como a Teologia da Libertação, utiliza o método ´ver-julgar-agir´, liga práxis histórica e reflexão teológica, e recorre à mediação das ciências sociais e humanas. Porém, privilegia uma análise histórico-cultural em vez de uma análise socioestrutural de tipo marxista" (Scannone, La teologia di Francesco, in Il Regno, Attualità 6/2013, p. 128).

Mas voltemos ao livro em questão, escrito a quatro mãos por dois teólogos de exceção. O já citado padre Gutiérrez (padre, pode-se dizer, em dois sentidos: seja porque, como padre diocesano, se fez dominicano e, portanto, agora pertence à Ordem dos Freis Pregadores, seja porque, em bom direito, é considerado o "pai da teologia da libertação", p. 77) e o atual prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o arcebispo Gerhard Ludwig Müller, professor honorário da Universidade Ludwig-Maximilian de Munique e editor da opera omnia de Joseph Ratzinger-Bento XVI.

O livro – traduzido ao italiano em coedição pelas Edizioni Messaggero Padova e pela Editrice Missionaria Italiana – é, de fato, um texto que apareceu originalmente em língua alemã em 2004 (Augsburg, Sankt Ulrich Verlag). O título permanece idêntico (An der Seite der Armen; "do lado dos pobres"), enquanto o subtítulo alemão que diz Theologie der Befreiung, "a teologia da libertação", é ampliado com o acréscimo de "teologia da Igreja". Com o intuito de evidenciar o sumo da publicação inteira, ou seja, o valor eclesial de uma teologia que, em muitos de seus expoentes, dentre os quais se destaca Gutiérrez, desenvolveu um caminho que, sem dúvida, a coloca no sulco da catolicidade e a seu serviço, como teologia da Igreja e para a Igreja.

Das 183 páginas de texto, 117 (em três contribuições) são do teólogo peruano, enquanto 76 (em quatro intervenções) foram escritas pelo arcebispo Müller. Chama a atenção o tom pacato, às vezes meditativo, da exposição e, principalmente, o fato de que é banido toda intenção reivindicativa: quem fala são os fatos, as argumentações, as referências voltadas tanto aos textos das Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano, quanto aos textos do Magistério romano.

Os dois autores vão, embora com passo diferente, na mesma direção, a de uma teologia que, como afirma a recente encíclica escrita a quatro mãos por Bento XVI e pelo papa Francisco, Lumen fidei, "compartilha a forma eclesial da fé", para a qual "a sua luz é a luz do sujeito crente que é a Igreja. Isto implica, por um lado, que a teologia esteja ao serviço da fé dos cristãos, vise humildemente preservar e aprofundar o crer de todos, sobretudo dos mais simples; e por outro, dado que vive da fé, a teologia não considera o magistério do papa e dos bispos em comunhão com ele como algo de extrínseco, um limite à sua liberdade, mas, pelo contrário, como um dos seus momentos internos constitutivos, enquanto o magistério assegura o contacto com a fonte originária, oferecendo assim a certeza de beber na Palavra de Cristo em toda a sua integridade" (n. 36).

Essa linha, perseguida com confiança pelos nossos dois autores, contrasta com os clichês jornalísticos de uma Teologia da Libertação inquieta, perenemente sob o ataque de um Magistério pelo qual ela se sentiria incompreendida, ainda colorida demais de ideologia. A teologia, escreve Gutiérrez, é uma "função eclesial" e oferece o seu serviço à comunicabilidade da fé: "O seu conteúdo é a proclamação de Cristo e da sua libertação integral, anúncio que deve ser feito em uma linguagem fiel à mensagem e que seja eloquente para os nossos contemporâneos" (p. 6).

É preciso notar que se fala de libertação "integral", portanto, de todo o ser humano de todos os males (a partir da raiz de todo o mal, que é o pecado), e de um renovado estilo de anúncio.

Não é por acaso que João Paulo II falou de modo estruturado de nova evangelização ("Nova em seu ardor, em seus métodos, em sua expressão"), justamente falando ao Conselho Episcopal Latino-Americano, no Haiti, no dia 9 de março de 1983. A expressão "nova evangelização", sublinha Gutiérrez (p. 150), encontra-se no documento preparatório de Medellín (Colômbia), berço da teologia da libertação, e na Mensagem dessa conferência, e estamos em 1968.

Um reconhecimento implícito da teologia da libertação como "nova evangelização" veio do último Sínodo dos Bispos sobre esse tema, em outubro passado: "A proclamação do Evangelho compromete a Igreja a estar com os pobres e a ocupar-se dos seus sofrimentos, como Jesus. (…) Pôr-se ao lado de quem está ferido pela vida não é só uma prática de socialidade, mas antes de tudo um fato espiritual. (…) A presença do pobre nas nossas comunidades é misteriosamente poderosa: muda as pessoas mais do que um discurso, ensina fidelidade, faz compreender a fragilidade da vida, pede oração: em síntese, conduz a Cristo" (Mensagem ao Povo de Deus, 26 de outubro de 2012, n. 6 e 11).

A questão dos pobres, portanto, é, em perspectiva evangélica, a grande questão, o que realmente faz a diferença, tanto que deu origem a uma reflexão teológica, a latino-americana em primeiro lugar (como se dizia, não devemos esquecer que hoje é preciso falar de teologias da libertação, no plural), que gira em torno desse ponto: isso, porém, não acrescenta um novo tema de reflexão à teologia, mas sim determina "um novo modo de fazer teologia" (Teologia della liberazione, Bréscia: Queriniana, 1972, p. 25).

Como escreveu Johann Baptist Metz em um artigo publicado em 1993 pela revista Stimmen der Zeit, "a teologia da libertação é algo mais e algo diferente de uma teoria social de esquerda ou de uma consequente teologia pastoral. Ela é teologia". Com que peculiaridade? Enquanto as teologias europeias, mesmo as mais envolvidas com as questões sociais (como a "teologia política" e a "teologia da esperança") sempre têm como interlocutor o ser humano adulto e emancipado de memória bonhoefferiana, o não crente que luta para reconhecer Deus e o marginaliza, a teologia da libertação tem a ver com o não ser humano, o pobre (ou, melhor, o empobrecido, no sentido de que a pobreza nunca é apenas uma fatalidade), aquele que é privado de direitos e não tem voz.

Os teólogos latino-americanos falam, a esse propósito, de "povo crucificado" (Ignacio Ellacuría), também por causa do difuso e doloroso fenômeno do martírio: de fato, a América Latina é o único "continente pobre e ao mesmo tempo cristão" (p. 55), onde alguns que se dizem cristãos matam outros cristãos alinhados em favor dos pobres.

Se, na Europa, portanto, o problema de ontem era o ateísmo militante e, o dos nossos dias, a opaca indiferença, a teologia da libertação está sempre lutando contra a idolatria do dinheiro e do poder, que derrama o sangue do pobre para dele tirar lucro. Uma idolatria que é morte e cujo oposto é o Deus da vida (cf. Gutiérrez, Il Dio della vita, Bréscia: Queriniana, 1992), o único capaz de restaurar dignidade ao pobre: gloria Dei vivens pauper, como gostava de dizer o bispo Óscar Arnulfo Romero, ecoando a célebre expressão de Santo Irineu.

Fique claro que, no centro da teologia da libertação, não está o pobre, mas o Deus dos pobres, de modo que a razão principal da ´´opção preferencial pelos pobres" não é a análise social (como defendem os opositores da teologia da libertação), mas sim o Deus em quem os cristãos acreditam na comunhão da Igreja.

Isso faz da teologia da libertação uma teologia contextual, em sentido pleno (mesmo que dizer "teologia contextual", especifica o teólogo peruano, é, por si só, uma tautologia), uma teologia plenamente católica, que nasce de uma prática de espiritualidade vivida e de uma solidariedade concreta: de fato, a teologia continua sendo sempre "ato segundo", diante de um "ato primeiro" que é a dimensão ativa da práxis em favor dos pobres.

E é isso o que realmente importa, como afirma Gutiérrez na conclusão da sua terceira e última intervenção: "Devo confessar que estou menos preocupado com o interesse ou a sobrevivência da teologia da libertação do que com os sofrimentos e as esperanças do povo a que pertenço, e especialmente com a comunicação da experiência e da mensagem de salvação em Jesus Cristo. Esta última é matéria da nossa caridade e da nossa fé. Uma teologia, por mais relevante que seja a sua função, nada mais é do que um meio para aprofundá-las. A teologia é uma hermenêutica da esperança vivida como um dom do Senhor. Com efeito, trata-se disto: de proclamar a esperança ao mundo no momento que vivemos como Igreja" (p. 174).

E, acima de tudo, de levantar as grandes questões, como faz a Escritura, quando YHWH comunica a Moisés uma prescrição a ser transmitida ao povo, a de se preocupar com onde dormirão aqueles que não têm com o que se cobrirem (cf. Êxodo 22, 25-26). Pergunta-se Gutiérrez a respeito desse texto: "Onde vão dormir os pobres no mundo que se prepara e que, de um certo modo, já deu os primeiros passos? O que será dos preferidos por Deus no futuro próximo?" (p. 112).

As intervenções do arcebispo Müller, que não esconde a sua amizade com o teólogo peruano, se voltam a valorizar a teologia da libertação, definida como "uma nova compreensão da teologia", e, mais especificamente, "reflexão teológica a serviço da práxis libertadora de Deus" (p. 22).

Recordando as suas origens em uma conferência realizada em 1968 por Gutiérrez em Chimbote, no norte do Peru (ele, na verdade, tinha que falar sobre teologia do desenvolvimento, mas, preparando a palestra, se deu conta de que era mais bíblico e mais teológico deslocar a ênfase para a teologia da libertação [cf. Rosino Gibellini, Il dibattito sulla teologia della liberazione, Bréscia: Queriniana, 1986, p. 126]), material que depois confluiu no famoso e emblemático Teologia da Libertação. Perspectivas (dezembro de 1971, Lima, na edição peruana, e março de 1972 na edição italiana, que foi lançada antes da espanhola [a brasileira é de 1979]), Müller faz referência à décima edição do livro (1992), na qual o autor, em uma ampla introdução, esclarece algumas expressões passíveis de mal-entendidos, entre elas "opção preferencial pelos pobres", "luta de classes", "teoria da dependência", "pecado estrutural e social".

"Aqui, ele também desmonta de modo convincente as acusações que foram feitas contra ele de horizontalismo e imanentização do cristianismo, que nunca deve ser instrumentalizado por uma ideologia voltada à edificação de um suposto paraíso na terra criado pelo homem. Ao contrário da teologia existencial de matriz europeia, a teologia da libertação se pergunta – mas não só – o que Deus, a graça e a revelação comportam com relação à compreensão de si dos cristãos inseridos em um contexto de sociedade do bem-estar e socialmente garantida. A teologia da libertação entende o trabalho teológico como participação ativa, prática – e, portanto, transformadora – do agir libertador integral, abrangente, inaugurado por Deus, graças ao qual o agir histórica do homem é feito capaz e chamado ao serviço da libertação e da humanização do próprio homem. Deve-se notar que a teologia da libertação não é uma construção teórica nascida abstratamente. Ela se vê em continuidade com o desenvolvimento global da teologia católica nos séculos XX e XXI" (p. 22).

Em seguida, Müller identifica as sua fontes principais na Populorum Progressio, de Paulo VI, na Constituição Pastoral Gaudium et Spes do Vaticano II e na visão expressada pela Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja como sacramento de salvação para o mundo, mas também nas grandes Conferências do Episcopado Latino-Americano de Medellín (1968), Puebla (1979) e Santo Domingo (1992), que receberam e atualizaram a teologia católica do século XX no contexto sociocultural e espiritual do subcontinente latino-americano (sendo o texto de 2004, não é citada a Assembleia Geral de Aparecida, de 2007).

Assim amadurecida e fortalecida, "a Teologia da Libertação não é apenas uma sociologia coberta de teologia ou uma espécie de de socioteologia. A Teologia da Libertação é teologia em sentido estrito" (p. 28). Não por acaso, o primeiro dos dois pronunciamentos vaticanos de 1984 (Libertatis Nuntius) – sintetiza Müller – evidencia que "as antropologias empíricas devem ser esclarecidas à luz de uma antropologia filosófica e teológica, tornando-se, assim, fecundas para uma investigação de tipo teológico" (p. 29).

A segunda instrução vaticana (Libertatis conscientia, 1986) especifica, por sua vez, o sentido cristão da liberdade e da libertação, e, dada a centralidade desse tema, o discurso é retomado no sétimo e último capítulo do livro: "Vagliate ogni cosa e tenete ciò che è buono". A 25 anni dall’istruzione Libertatis conscientia sulla teologia della liberazione ["Examinem tudo e fiquem com o que é bom". A 25 anos da instrução Libertatis conscientia sobre a teologia da libertação] (p. 181-187).

Aqui Müller indica a finalidade de ambas as intervenções da Congregação para a Doutrina da Fé, citadas acima: "Elas se propõem a preservar as ´teologias da libertação´ de se tornarem ideologias, perdendo assim o seu caráter de teologia" (p. 182). A segunda, em particular, reconhece que, por sua natureza, o Evangelho "é mensagem de liberdade e libertação" (n. 1), embora a liberdade cristã não equivalha a anarquia e nunca é sem vínculos, enquanto a missão libertadora da Igreja deve fugir de todo tipo de violência (cf. n. 62). A instrução Libertatis conscientia também identifica os conteúdos positivos das novas abordagens elaboradas pela teologia da libertação, mostrando a sua fecundidade.

Deve-se lembrar que, no mesmo ano, 1986, em uma carta à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil do dia 9 de abril (a instrução vaticana traz a data de 22 de março), João Paulo II afirmou que, "na medida em que se empenha por encontrar aquelas respostas justas (…), a teologia da libertação é não só oportuna mas útil e necessária".

Encerramos esta resenha com os agradecimentos que o arcebispo Müller dirige ao amigo teólogo Gutiérrez pelo seu precioso trabalho em favor da teologia europeia e da Igreja universal, selo de uma visão de Igreja que precisa de todas as melhores contribuições: "Justamente Gustavo Gutiérrez indica ao nosso olhar totalmente concentrado na perspectiva europeia o que significa Igreja universal. Com a teologia da libertação, a Igreja Católica pôde aumentar ainda mais o pluralismo dentro dela. A teologia da América Latina revela e propõe hoje novos aspectos da teologia que integram uma perspectiva europeia muitas vezes incrustada" (p. 178).