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segunda-feira, 25 de julho de 2016

Grande Sertão: Veredas; Antônio Cândido sobre Guimarães Rosa

O maior crítico literário brasileiro completou 98 anos. Sociólogo, literato e professor, Antonio Candido desenvolveu uma obra crítica extensa e respeitada, não se limitando à literatura brasileira.


                        Nasceu no dia 24 de julho de 1918. 
Além dos estudos acadêmicos voltados à literatura, Antonio Candido também desempenhou papel forte na política do Brasil. Por meio de documentos, textos e artigos, Candido demonstrou sua militância política na vertente socialista para lutar contra os inúmeros embates com os modos oligárquicos e autoritários. A partir do Estado Novo, passando pela Ditadura Militar, Antonio Candido fez uma reflexão da complexidade política vivenciada no país.

Ao longo de seus 98 anos de vida, O crítico já recebeu quatro Prêmios Jabuti e um Prêmio Camões. Destacar suas principais obras é tarefa difícil, devido à importância de cada uma delas, mas há obras que são consideradas os pilares da crítica sociológica e da literatura brasileira, como Ficção e confissão: estudo sobre a obra de Graciliano Ramos (1956), Formação da literatura brasileira: momentos decisivos (1959),Literatura e sociedade: estudos de teoria e história literária (1965), Formação da literatura brasileira (1975),A educação pela noite e outros ensaios (1987), O estudo analítico do poema (1987), O discurso e a cidade (1993) e O Romantismo no Brasil (2002).
Fonte: livre opinião

Veja a análise de Antônio Cândido sobre a obra de Guimarães Rosa, destacando Grande Sertão: Veredas




Grande Sertão Veredas: Antônio Cândido sobre Guimarães Rosa

GGN
Gilberto Cruvinel


O regionalismo que não é regionalismo, uma universalidade a mais particular possível
Antonio Candido

O grande milagre do Guimarães Rosa que é a ambiguidade suprema, que neste caso está não no livro, mas nele também, é o seguinte: é que ele tomou uma tendência muito cansada da literatura brasileira que é o regionalismo. O pitoresco da linguagem, o arcaismo, o tema caipira, o tema regional, o tema jagunço, o tema caboclo. Isso já era uma coisa muito sovada, muito gasta. Praticamente, considerava-se que a literatura brasileira já tinha saído disso.
No momento em que se considera, a crítica pensava mais ou menos isso, surge um homem que fechado, fechado hermeticamente dentro do universo do sertão com uma exuberância verbal extraordinária, com aquilo que era considerado ruim na tradição brasileira que era a exuberância de linguagem, com aquilo que era considerado ruim que era o regionalismo, com aquilo que era considerado perigoso, que era o pitoresco. Ele parte de tudo isso e consegue fazer uma coisa inteiramente nova, consegue fazer uma ficção, como eu disse, de tipo realmente universal com todos os grandes problemas do homem, tanto assim que eu pensando neste caso, como é que se pode resolver este paradoxo? De um regionalismo que não é regionalismo e de uma universalidade que é mais particular possível.
Ele fez o livro que supera o regionalismo, ele fez através do regionalismo. Esse, do ponto de vista da composição literária, a meu ver é o paradoxo supremo. Tanto assim que eu me senti obrigado a criar uma nova categoria que é transregionalismo ou surregionalismo. Assim como você fala em surrealismo, você pode falar, no caso de Guimarães Rosa, em surregionalismo. Fenômeno, aliás, que nós verificamos, pouco depois ou ao mesmo tempo em outros lugares da América Latina. Nós encontramos, por exemplo, em Gabriel Garcia Marquez, nós encontramos em Juan Rulfo, nós encontramos em Mario Vargas Lhosa, nós encontramos em Alcides Arguedas. Esse enraizamento profundo no temário regional pitoresco com uma linguagem transfiguradora, moderna que não tem nada a ver com a linguagem do regionalismo tradicional.



quarta-feira, 20 de julho de 2016

Andrequicé, distrito de 400 casas e 2 mil habitantes, respira Guimarães Rosa

Após 60 anos de 'Grande Sertão: Veredas', distrito mineiro respira Guimarães Rosa

Andrequicé, pequeno distrito da cidade de Três Marias, é tomado a cada esquina pela obra de Guimarães Rosa. Do restaurante 'Veredas' até a Praça 'Uma Estória de Amor'
por Léo Rodrigues, da Agência Brasil   
Frases de Guimarães Rosa tomam as ruas de Andrequicé (MG)
Andrequicé (MG) – Do Cine Manuelzão, passando pelo restaurante Veredas até a Praça Uma Estória de Amor, a obra de Guimarães Rosa (1908-1967) ocupa cada esquina de Andrequicé. No pequeno distrito do município de Três Marias (MG), a 280 quilômetros de Belo Horizonte, mesmo aqueles que nunca leram Grande Sertão: Veredas sabem relatar algum detalhe da aventura entre Riobaldo e Diadorim. Sobre Manuelzão, o protagonista de Uma Estória de Amor, contam muito além do que diz a literatura roseana. É que justamente em Andrequicé viveu Manuel Nardi, o Manuelzão de carne e osso, inspirador de um dos personagens mais famosos do universo de Guimarães Rosa.
A diversidade cultural do distrito foi apresentada na XV Semana Cultural Festa de Manuelzão. Ao longo de oito dias, shows, filmes, quadrilha, contação de histórias, teatro, dança de ciganos, folia de reis, cavalgada e cortejo de carros de boi ilustraram a riqueza do sertão eternizado por Guimarães Rosa. Uma visita a locais citados pelo escritor levou os presentes a se sentirem nas páginas dos livros. Duas jovens encenaram, às margens do rio De-janeiro, o primeiro encontro entre Riobaldo e Diadorim. A festa terminou neste domingo (17).
A história de Guimarães Rosa com o sertão mineiro tem na boiada de 1952 um de seus mais importantes marcos. O escritor decidiu reunir um grupo de vaqueiros para realizar um percurso de 240 quilômetros em 10 dias, da Fazenda Sirga, a 60 quilômetros de Andrequicé, até Araçaí (MG), município vizinho a Cordisburgo (MG). Ao longo do trajeto, o escritor fez anotações sobre lugares e pessoas. É dessa realidade que Guimarães Rosa vai extrair a matéria-prima para lançar, há exatos 60 anos, Grande Sertão: Veredas e Corpo de Baile, que posteriormente seria desmembrado em três volumes: Manuelzão e MiguilimNo Urubuquaquáno Pinhém eNoites do Sertão.
A boiada também permitiu a Guimarães Rosa observar atentamente o linguajar sertanejo. "Ele anotou muitos termos, muitos 'causos' e muitos vocábulos sertanejos que vão ganhar vida na sua literatura. É através dessa linguagem que ele vai apresentar para o Brasil um país ainda desconhecido de si mesmo", analisa Telma Borges, professora de literatura da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
O texto de Guimarães Rosa mostra uma forma peculiar de escrita, recheada de recursos linguísticos, que faz com que muitos leitores considerem a leitura difícil. Segundo Telma, ele criou uma linguagem original, mas com correspondência na linguagem sertaneja. A professora explica que o escritor mineiro usa a gramática, mas não a normativa e tradicional. "Ele desloca os termos da oração e se sente um estranhamento. O leitor tropeça nas palavras. É mais fácil entender o texto lendo devagar, voltando atrás para recuperar o sentido das frases, ou lendo em voz alta. Daí é interessante como a leitura em voz alta produz uma significação muito mais acelerada. A literatura de Guimarães Rosa tem uma marca de oralidade, que permite a identificação com o sertanejo".
Ao longo do evento, Telma conduziu alguns passeios e ministrou oficinas para alunos do ensino fundamental. Ela destaca o conhecimento que as crianças já têm de Guimarães Rosa. "Eles preparam ao longo de todo o ano atividades para a Semana Cultural, como teatro e contação de história. É muito explícito como a formação dessas crianças se dá a partir da literatura e sobretudo sobre a literatura de Guimarães Rosa", diz.

Linguagem complexa

No distrito de 400 casas e 2 mil habitantes, o gosto pela literatura foi calejado pelo tempo. "Eu nunca gostei muito de ler. No meu tempo, as escolas faziam uma pressão muito grande pela leitura e acho que criei uma aversão. Não era prazeroso, era obrigado. Depois de muito tempo, começaram a organizar as rodas de leitura. A cada 15 dias, nos reunimos por duas horas para ler trechos de Grande Sertão: Veredas. Decidi ir a primeira vez por curiosidade e tomei gosto. É legal porque é uma linguagem complexa, mas lendo em grupo, fica mais fácil entender", conta a moradora Maria Borges de Souza.
Esta linguagem complexa e particular atrai também o interesse de estrangeiros, e a obra tem dezenas de traduções. Com a cultura de quem dominava seis idiomas e tinha algum conhecimento em pelo menos outros cinco, Guimarães Rosa foi bem duro com algumas versões, como a inglesa de 1963. "Não viram, principalmente, que o livro é tanto um romance, quanto um poema grande, também. É poesia ou pretende ser, pelo menos", escreve ele em uma carta datada de 17 de junho de 1963.
Presente na XV Semana Cultural Festa de Manuelzão, o alemão radicado no Brasil Berthold Zilly anunciou que irá encarar o desafio de fazer uma nova tradução de Grande Sertão: Veredas. Professor e crítico literário, seu objetivo é justamente oferecer um relato mais fiel à linguagem de Guimarães Rosa. A única versão alemã da obra, lançada em 1964, narra os acontecimentos sem transmitir a originalidade da escrita do autor mineiro.
A linguagem de Guimarães Rosa também foi levada para as telas. Grande Sertão: Veredas virou uma série produzida pela Rede Globo em 1985, dirigido por Walter Avancini e com a atuação de Tony Ramos, Tarcísio Meira e Bruna Lombardi. A cena de abertura foi rodada em Andrequicé, às margens do rio De-janeiro. Mais tarde, o distrito foi novamente palco de uma grande produção: o filme Mutum, dirigido pela cineasta Sandra Kogut. Única película brasileira selecionada para o Festival de Cannes de 2007, a obra adapta o conto Campo Geral presente no livro Manuelzão e Miguilim. O conto apresenta a história de Miguilim, um garoto pobre que vivencia alguns eventos trágicos na infância até que desenvolve uma amizade com um médico e é levado para estudar na cidade.
O jornalista Pedro Fonseca, que recebeu uma comitiva da equipe de produção, lembra que alguns defenderam que o filme fosse rodado no estado de Goiás, argumentando que o sertão mineiro não seria mais o mesmo retratado por Guimarães Rosa. Ele levou-os para uma passeio, inclusive a pontos citados pelo escritor, o que teria convencido a produção. Mesmo assim, o jornalista lamenta a falta de preservação do meio ambiente. "Os eucaliptos tomaram a paisagem. Para mim, está provado que a falta de água na região se deve ao eucalipto. Não chove. Andrequicé está com problemas de abastecimento. As veredas estão secas e devastadas. Dá uma tristeza muito grande e um sentimento de impotência", lamenta.

60 anos de Grande Sertão: Veredas

O evento é organizado pela Sociedade dos Amigos do Memorial Manuelzão e de Revitalizacão de Andrequicé (Samarra) e conta com o apoio do Ministério da Cultura. Nesta edição, a festa celebrou seus 15 anos e lembrou os 60 anos dos livros Grande: Sertão Veredas e de Manuelzão e Miguilim, que reúne os contos Uma Estória de Amor e Campo Geral. O aniversário das obras lançadas em 1956 é motivo para um sertão em festa. A data foi também celebrada na semana passada durante o FestiVelhas 2016, em Morro da Garça (MG), e na 28ª Semana Roseana, em Cordisburgo (MG), cidade natal do escritor.
Segundo o presidente da Samarra, José Antônio Vicente de Souza, a festa coroa o engajamento da cidade em torno da preservação da obra de Guimarães Rosa e do legado de Manuelzão. "A gente percebia que o distrito precisava de cuidados, ao mesmo tempo que tínhamos o desejo de preservar a história de Manuelzão. Daí surge a Samarra. Para revitalizar o Andrequicé através da cultura. Olha que legal, não é uma coisa bacana?", explica José Antônio, que é também sobrinho da ex-mulher de Manuelzão.
A Samarra conta cada vez com mais instrumentos para estimular o mergulho na literatura roseana. Durante o evento, o Memorial Manuelzão, sediado na casa onde morou Manuel Nardi, ganhou um reforço: o Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB/USP) entregou ao memorial uma versão digital das cadernetas de Guimarães Rosa. Elas contêm as anotações que serviram de base para a publicação de Grande Sertão: Veredas.
Um dos pontos altos da XV Semana Cultural Festa de Manuelzão foi o desfile das roupas produzidas pelas bordadeiras de Andrequicé. O grupo, que foi formado na primeira edição do evento com o apoio de Furnas, faz reuniões semanais. Até então, elas trabalhavam em painéis, capas de almofadas e colchas, sempre inspiradas em frases extraídas da obra de Guimarães Rosa. Para produzir as roupas, elas realizaram encontros desde o início do ano onde receberam orientação do designer de moda Marcos Pessoa Morais, de Belo Horizonte.
Márcia Alves, de 56 anos, é dona de um bar em Andrequicé e integra o grupo. "Bordo nas horinhas de descuido, como dizia Guimarães Rosa", se diverte. "Cada dia que eu bordo uma frase de Guimarães Rosa, eu me sinto na faculdade. Acho que estou aprendendo mais", acrescenta. Ela conta que a coleção de roupas apresentada foi toda inspirada no romance de Riobaldo e Diadorim e se emociona com o resultado. "Não pensava nunca que iríamos chegar nesse patamar".
Fonte: Rede Brasil Atual

segunda-feira, 11 de julho de 2016

60 Frases De “Grande Sertão: Veredas” Em Comemoração Aos Seus 60 Anos De Publicação


Portal Raízes:

“Grande Sertão: Veredas” de Guimarães Rosa é uma das mais importantes obras literárias da literatura brasileira. Por sua linguagem e a originalidade de estilo presentes no relato de Riobaldo, ex-jagunço que relembra suas lutas, seus medos e o amor reprimido por Diadorim.
O romance foi publicado em 1956 e inicialmente chama atenção por sua dimensão – mais de 600 páginas – e pela ausência de capítulos. Guimarães Rosa fundiu nesse romance elementos do experimentalismo linguístico da primeira fase do modernismo e a temática regionalista da segunda fase do movimento para criar uma obra singular e inovadora.

Separamos alguns dos melhores trechos de Grande sertão: veredas

“O real não está no início nem no fim, ele se mostra pra gente é no meio da travessia”.
 “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”.
“Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo”.
“Se eu fosse filho de mais ação e menos ideia, isso sim, tinha escapulido, calado “.
“Um dia ainda entra em desuso matar gente”.
“O senhor saiba: eu toda a minha vida pensei por mim, sou nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o mundo”.
“A gente morre é para provar que viveu”.
“Viver é muito perigoso: sempre acaba em morte”.
“Quem ama é sempre muito escravo, mas não obedece nunca de verdade”.
“Como é que posso com este mundo? A vida é ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo no meio do fel do desespero”.
“Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por que é que é”.
Tem horas em que penso que a gente carecia, de repente, de acordar de alguma espécie de encanto”.
“Uma coisa é pôr ideias arranjadas, outra é lidar com país de pessoas”.
“E a gente, isso sei, às vezes é só feito menino. Se tem alma, e tem, ele é de Deus”.
“E o chiim dos grilos ajuntava o campo”.
“Ah, a mangaba boa só se colhe já caída no chão, de baixo…”.
 ”A colheita é comum, mas o capinar é sozinho”.
“Viver é um descuido prosseguido”.
O senhor ache e não ache. Tudo é e não é …
Passarinho que debruça – o voo já está pronto”.
Sou só um sertanejo, nessas altas ideias navego mal. Sou muito pobre coitado. Inveja minha pura é de uns conforme o senhor, com toda leitura e suma doutoração”.
Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa”.
“Deus é paciência. O contrário é o diabo”.
O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando”.
“A gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou. Viver nem não é muito perigoso?”
“Quem-sabe, a gente criatura ainda tão ruim, tão, que Deus só pode às vezes manobrar com os homens é mandando por intermédio do diá?”.
O que não é Deus, é estado do demônio. Deus existe mesmo quando não há. Mas o demônio não precisa de existir para haver – a gente sabendo que ele não existe, aí é que ele toma conta de tudo”.
Cavalo que ama o dono, até respira do mesmo jeito”.
Quem desconfia fica sábio”.
Passarinho cai de voar, mas bate suas asinhas no chão”.
Ser ruim, sempre, às vezes é custoso, carece de perversos exercícios de experiência”.
O espírito da gente é cavalo que escolhe estrada”.
Medo, não, mas perdi a vontade de ter coragem”.
O jagunço Riobaldo. Fui eu? Fui e não fui. Não fui! – porque não sou, não quero ser”.
“Eu careço de que o bom seja bom e o ruim ruim, que dum lado esteja o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza! (…) Este mundo é muito misturado …”.
Mas, na ocasião, me lembrei dum conselho de Zé Bebelo, na Nhanva, um dia me tinha dado. Que era: que a gente carece de fingir às vezes que raiva tem, mas raiva mesma nunca se deve de tolerar de ter. Porque, quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a ideia e o sentir da gente”.
A morte é para os que morrem”.
A vida da gente vai em erros, como um relato sem pés nem cabeça, por falta de sisudez e alegria. Vida devia de ser como sala do teatro, cada um inteiro fazendo com forte gosto seu papel, desempenho”. 
Preto é preto? branco é branco? Ou: quando é que a velhice começa, surgindo de dentro da mocidade”.
No centro do sertão, o que é doideira às vezes pode ser a razão mais certa e de mais juízo!”.
Sertão é isto: o senhor empurra para trás, mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera”.
O bom da vida é para cavalo, que vê capim e come”.
E sei que em cada virada de campo, e debaixo de sombra de cada árvore, está dia e noite um diabo, que não dá movimento, tomando conta.
Tudo que é bonito é absurdo – Deus estável”.
“Liberdade – aposto – ainda é só alegria de um pobre caminhozinho, no vão dos ferros de grandes prisões”.
Sertão é o sozinho”.
Sertão: é dentro da gente”.
Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende”.
Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura”.
Tudo que já foi, é o começo do que vai vir, toda a hora a gente está num cômpito”.
Um sentir é do sentente, mas o outro é o do sentidor”.
Para o prazer e para ser feliz, é que é preciso a gente saber tudo, formar alma, na consciência; para penar, não se carece”.
Obedecer é mais fácil do que entender”.
Onde é que está a verdadeira lâmpada de Deus, a lisa e real verdade?”.
Tive medo não. Só que abaixaram meus excessos de coragem”.
O sertão é sem lugar”.
Rir, antes da hora, engasga”.
Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só fazer outras maiores perguntas”.
Somente com a alegria é que a gente realiza bem – mesmo até as tristes ações”.
O senhor sabe o que é silêncio é? É a gente mesmo, demais”.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Grande sertão: veredas- Um jovem sexagenário, por Walnice N. Galvão

Carta Educação:



Grande sertão: veredas – Um jovem sexagenário

Os 60 anos do livro de Guimarães Rosa vêm a propósito para apreciarmos seu trunfo máximo: o foco narrativo, manipulado pelo narrador Riobaldo e que servirá para analisar o romance




Guimarães Rosa internou-se pelas terras mineiras, interrogando as pessoas, registrando as histórias que ouvia e as peculiaridades da linguagem
Os 60 anos de Grande sertão: veredas vêm a propósito para apreciarmos seu trunfo máximo: o foco narrativo. Manipulado por Riobaldo, narrador protagonista, esse elemento estrutural servirá para analisar o romance e expandir nossa compreensão de seus muitos desdobramentos.
O Riobaldo que se antepõe ao interlocutor que veio de longe para conhecê-lo, é um homem idoso, deitado em rede na varanda da sede de sua fazenda, procedendo às honras da casa. A face final do protagonista já velho é essa, de homem apaziguado e assentado na vida, dono de terras com muitos agregados e dependentes.

Nesse romance tudo decorre da escolha do foco narrativo, que acaba sendo seu alicerce e seu fundamento. Quem conta a história que lemos? É Riobaldo, que fala em primeira pessoa. E de quem é a história que ele conta? É a dele mesmo. Portanto, Riobaldo se apodera de dois pontos de vista: o do narrador e o do protagonista. Dessa alternância resulta todo o volumoso romance.
Mais um elemento complicador vem se juntar logo de saída a essa dupla perspectiva: o interlocutor, a quem o narrador dá o tratamento cerimonioso de “o senhor”. Todo o romance assumirá a forma de um relato autobiográfico feito a uma pessoa, invisível e calada, que é quem provoca a narração. Anônima, essa pessoa veio de fora do sertão, procurando por Riobaldo e dispondo-se a extrair dele a história de sua vida. O depoimento que então se desenrola subentende um diálogo que é apenas pressuposto e contido dentro do monólogo – iniciado e nunca fechado pelo primeiro sinal gráfico do texto, um travessão, índice de fala.
Como não podia deixar de ser, as diferenças culturais entre ambos são numerosas: um deles é sertanejo tosco, o outro, cidadão cultivado. E é de assinalar, portanto, a semelhança do interlocutor com o antropólogo ou o psicanalista.
Essa equação nos habilita, em primeiro lugar, a entender a intriga bastante emaranhada. Em segundo lugar, a travar conhecimento com os demais personagens, aos quais a voz de Riobaldo dá vida. Em terceiro lugar, a compreender quem ele próprio é. Com Riobaldo estabelecemos, enquanto leitores – mesmo cientes de que se trata de um romance, portanto de uma história inventada – um pacto sob palavraIsso posto, podemos começar a leitura.
Riobaldo não é um narrador direto ou fluente: demora muito a entabular sua história, é manhoso, tenta driblar o interlocutor. Boa parte do livro decorre antes que se resolva a abrir o jogo. Mas, enquanto isso, ele vai expondo ao leitor sua personalidade atual, a que assume depois de velho, quando se retira de tarefas anteriores, quando foi jagunço e chefe de jagunços. O romance começa pelo fim, quando todo o enredo já se passou e Riobaldo vive de reminiscências.
Chegou à fazenda, vindo da cidade, um personagem a que estamos chamando de interlocutor, pois ele não tem nome, procurando por um antigo chefe de jagunços de quem ouvira falar. Quer entrevistá-lo, indagando sobre seu passado, suas batalhas, das peripécias em que tomara parte, de onde viera, quem tinham sido seus pais, quais seus amores; enfim, como vivera sua vida. O interlocutor é então quem instiga a narração, e ela se faz em sua intenção, em resposta às múltiplas inquirições que vai formulando, para precisar melhor certos passos ainda vagos do enredo.


Parque Nacional Grande Sertão Veredas, na divisa entre Minas Gerais e Bahia

Desse modo, poderíamos dizer que, embora demore a se configurar, o interlocutor poderia ser compreendido como a primeira personagem a ser delineada por Riobaldo. Quem é ele? Não é um sertanejo como Riobaldo, fica logo claro. Chegou de longe, da cidade, conduzido por um jipe. Veio para conhecê-lo e para estimulá-lo a falar de suas experiências. Usa óculos, tem título de doutor e toma notas em uma caderneta, incessantemente.
Como é que ficamos sabendo de tudo isso? Pela voz de Riobaldo, que dirige ao interlocutor comentários sobre uso de óculos, título de doutor, anotações feitas na caderneta. Sendo o romance constituído por uma fala só, emitida por Riobaldo, o conjunto dos acontecimentos é decretado por essa fala.
Tudo indica que João Guimarães Rosa tenha contrabandeado um simulacro seu para dentro do livro. E isso porque muitas vezes se colocou na posição de ouvinte de um narrador sertanejo, cujo relato instigou. Apesar de oriundo de uma vila no sertão, o escritor partiria para a cidade, primeiro para São João del Rei e em seguida para Belo Horizonte, em função de seus estudos secundários e depois superiores, em medicina. E mais tarde, ao ingressar na carreira diplomática, passaria a residir no exterior, antes de morar no Rio de Janeiro, onde passaria a última fase de sua vida.
Atinando a certa altura com o opulento veio entre o histórico e o fabuloso que seria a fonte de sua obra – as sagas do sertão –, para ali voltou inúmeras vezes, tangendo boiadas, internando-se pelas terras mineiras, interrogando as pessoas, registrando as histórias que ouvia e as peculiaridades da linguagem. Suas cadernetas de anotações, hoje depositadas no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da Universidade de São Paulo, tornaram-se um tesouro. Uma das fotos mais divulgadas mostra-o em uma dessas excursões, a cavalo, com a indefectível caderneta pendurada por um barbante ao pescoço. Ademais, sim, usava óculos e era médico.
Mas o interlocutor lança mão de outros saberes para ajudar Riobaldo à medida que ambos, conjuntamente, vão concretizando um texto biográfico, que cada um dos dois seria incapaz de levar a cabo separadamente. É do atrito dos dois personagens, tal como aparece unilateralmente na fala ininterrupta de Riobaldo, que toda a narrativa se institui enquanto texto.
A fala do protagonista, como se viu, inicialmente é relutante, dada à desconversa. Apenas a persistência do interlocutor vai forçando as comportas de tanta história sonegada, decorrente de um emaranhado de motivos que vão desde a perplexidade até vestígios de culpa difusa: incluindo o luto por Diadorim, de cuja morte Riobaldo se viu cúmplice, e o remorso pelo pacto com o diabo.
Ao fim e ao cabo, ainda bem que ambos se entregaram à ficção dessa empreitada, que só nos beneficia com as belezas de um dos mais extraordinários romances da língua portuguesa.
***
Saiba mais:
Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.
Espaços e caminhos de João Guimarães Rosa, de Ligia Chiappini Moraes Leite e Marcel Vejmelka.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.
O foco narrativo, de Lígia Chiappini Moraes Leite. São Paulo: Ática, 1985.
O léxico de Guimarães Rosa, de Nilce Sant’Anna MartinsSão Paulo: Edusp, 2001.
Mínima mímica – Ensaios sobre Guimarães Rosa, de Walnice Nogueira GalvãoSão Paulo: Companhia das Letras, 2008.
***
*Walnice Nogueira Galvão é professora de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP, que tem 26 livros sobre Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, crítica literária e cultural

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Conhecendo mais sobre Guimarães Rosa : Parte IV (final)

A última parte da matéria sobre Guimarães Rosa : a posse na Academia Brasileira de letras e seu falecimento após três dias da cerimônia de consagração literária. 

Do site elfikurten.com.br


ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS
É o dia 16 de novembro de 1967. João Guimarães Rosa, aos 59 anos, veste o fardão e prepara-se para ir à Academia Brasileira de Letras tomar posse na cadeira n.º 2, que tem como patrono o escritor Álvares de Azevedo, e pertenceu a seu amigo e antigo chefe no Itamarati, João Neves da Fontoura.

Eleito em 6 de agosto de 1963, há quatro anos adia esta posse. Rosa pensa que seu coração não irá agüentar tanta emoção. Mas agora, deve enfrentar a cerimônia e receber a consagração. Na época, seu nome era cogitado para o prêmio Nobel de Literatura. A indicação vinha por iniciativa dos seus editores alemães, franceses e italianos.
João Guimarães Rosa, posse na ABL, nov/1967.


A notícia de sua posse na Academia foi dada por mim.”, conta Otto Lara Rezende. “Uma vez um jornal mencionou seu nome como possível candidato ao Prêmio Nobel. Procurou-me aflito e pediu-me que, por favor, evitasse associar o seu nome ao Nobel. Por quê? “O Nobel mata” – disse ele, brincando a sério. E pediu-me ainda que desse uma nota sobre a candidatura de outro brasileiro ao mesmo Prêmio Nobel....”Pode dar, com ele não acontece nada” – disse. Esse mesmo temor da morte estava associado à sua posse na Academia, talvez porque tomasse a Academia como “consagração”, isto é, fim de uma obra e portanto fim da vida.”

Neste dia, Rosa almoça com a mãe na casa de seu tio, o também escritor Vicente Guimarães Rosa, que atribui o adiamento da posse a uma outra causa: “De seus sete tios amigos, quatro morreram quando viviam os 58 anos. Posse na Academia só mesmo depois dos 59 anos completos e ainda com alguns meses distanciados, me disse, temeroso”.

Já o escritor Antônio Callado pergunta-lhe sobre o porquê de tanto empenho em se eleger para a Academia, ao que Rosa responde:

"O enterro, meu querido, os funerais. Vocês, cariocas, são muito imprevidentes. A academia tem mausoléu e quando a gente morre cuida de tudo."

“Quando se candidatou à Academia pela primeira vez, (continua Otto Lara Rezende) disse-me, num almoço no Itamarati, que só se candidatava por duas razões:

1) porque sua mãe só acreditaria que ele era um grande escritor se entrasse para a Academia;

2) porque não podia negar a glória acadêmica à sua pequena cidade de Cordisburgo”.

Bom seria uma banda, um dobrado fogoso e meia dúzia de foguetes, pedia ele.

A seu amigo Geraldo França de Lima, que vai buscá-lo em casa, Rosa revela o temor de desmaiar na tribuna, de perder a voz, de chorar e sobretudo de o coração parar!

“- Parar, Rosétis (assim ele o chamava), que é isto? Você vai fazer bonito na tribuna. ....

João Guimarães Rosa, posse na ABL, nov/1967.
“ - A Academia é muito para mim. Sou tão pequeno como a cidade em que nasci - disse-me”.

Na quinta-feira, noite de 16 de novembro, não escurecera e lá eu estava”, conta França de Lima. Jantamos. Ele nada comeu. Beliscou uma lingüiça, que eu lhe trouxera de Araguari. Dois ou três goles de chá. Nada mais. Percebi que havia anormalidade. ...Vi que não se apressava em vestir-se... Pediu-me que escolhesse o sapato, pontudo ou de bico quadrado. Abotoei-lhe o fardão. Não descobríamos a alcinha em que ficava a espada. Rosa perdeu a calma, até conseguirmos achá-la. De repente começa a tremer. Chorava. Hesitava em sair. Tinha medo.... Ao entrarmos no automóvel, tremia e rezava. Pediu ao chofer que andasse devagar, e perguntou-lhe:

- Ubirajara, estou bonito?

- Sim , embaixador. ....

Ao aproximar-se da Academia principiou a ficar emocionado.

- Geraldo, não tenho segredo para você. Mas guarde reserva: eu não chego ao fim deste ano.

Senti-me esmagado, mas levei a revelação em brincadeira:

- Me faça o favor de chegar ao fim do discurso, porque gente de sua família não morre antes dos 80.

Ele apertou a minha mão. Sua mão estava fria e suava”.

Caía forte chuva na cidade. Mesmo assim o Salão da Academia estava repleto.

Minutos antes de entrar, Rosa, mentalmente, repassa trechos de seu discurso. Faz longas pausas e respira fundo para controlar a ansiedade. Revê momentos de sua vida. Relembra Cordisburgo, seu vilarejo natal, e o mundo por onde andou como diplomata e escritor...


O presidente Juscelino Kubitschek e João Guimarães Rosa,
na cerimônia de posse na Academia Brasileira de Letras, 1967.
[foto Acervo Família Tess]



O DESEJO NÃO REALIZADO
"No dia em que completar 100 anos, publicarei um livro, meu romance mais importante: um dicionário. E este fará as vezes de minha autobiografia."
- João Guimarães Rosa, em entrevista a Günter Lorenz - "Dialogo com Guimarães Rosa".

Aracy e João Guimarães Rosa, com seus gatos no apartamento, no Rio de Janeiro.

O DESAPARECIMENTO PREMATURO 
Ainda no vigor de seus 59 anos intensamente vividos, ao anoitecer de um domingo de novembro de 1967, Rosa surpreendeu mais uma vez sua família, seu círculo de amigos e a multidão de leitores de sua obra, pouco após o dobre dos sinos, anunciando a Hora do Ângelo. "As pessoas não morrem, elas ficam encantadas", dissera o romancista apenas três dias antes, em concorrida cerimônia na Academia Brasileira de Letras. E naquele ocaso - acaso? - de um 19 de novembro, Rosa ficou para sempre encantado - tornou-se um mito, talvez o maior e mais duradouro dos mitos da cultura brasileira.


João Guimarães Rosa
 

CRONOLOGIA DA VIDA E OBRA DE JOÃO GUIMARÃES ROSA
1908 - No dia 27 de junho, em Cordisburgo, pequeno vilarejo de Minas Gerais, nasce o futuro diplomata-romancista, uma pessoa marcada por forte religiosidade e misticismo. Primeiro dos seis filhos de Florduardo Pinto Rosa e Francisca Guimarães Rosa.
1918 - O menino prodígio, que já conhece a língua francesa e holandesa, inicia seus estudos em uma escola de Belo Horizonte, Minas Gerais. Em seus momentos de lazer, escreve inúmeras cartas em forma de logogrifos e charadas.

1925 - Aos 16 anos, ingressa na Faculdade de Medicina. Durante esse período de estudos universitários, o jovem estudante conquista diversos prêmios com seus contos, entre os quais se destaca "Chronos Kai Anagke", a misteriosa história de um enxadrista que conclui um pacto com o demônio para receber... um prêmio - o tema do pacto será retomado em Grande sertão: veredas, romance que, por sua vez, receberá... diversos prêmios.
1928  Em 27 de dezembro é nomeado para o cargo de Agente Itinerante da Diretoria do Serviço de Estatística Geral do Estado de Minas Gerais/ Secretaria da Agricultura.
1929 – Tomando posse em 03 de janeiro, no cargo de Agente Itinerante da Diretoria do Serviço de Estatística Geral do Estado de Minas Gerais/ Secretaria da Agricultura, percebendo o salário anual de quatro contos e oitocentos mil-réis. E em 7 de dezembro, publica o conto “Mistério de Highmore Hall” na revista O Cruzeiro, que fora selecionado em concurso promovido pelo mesmo periódico.
1930 – Em 9 de fevereiro, publica o conto “Maquiné” no suplemento dominical de O jornal; - Em 27 de março, é designado para Auxiliar Apurador da Diretoria do Serviço de Estatística Geral do Estado de Minas Gerais/ Secretaria da Agricultura, em caráter de substituição; - Em 21 de junho, publica, na revista O Cruzeiro, o conto “Chronos Kai Anagke (Tempo e destino)", “a mais extraordinária história de xadrez já explicada aos adeptos e não-adeptos do tabuleiro, num conto de João Guimarães Rosa”; No dia 27 de junho, casa-se com Lygia Cabral Penna; Dia 12 de julho, publica, na revista O Cruzeiro, o conto “Caçadores de camurças”. E em 21 de dezembro, forma-se em Medicina, pela Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais, tendo sido o orador da turma. Nesse ano, Getúlio Vargas comanda a célebre Revolução que muda radicalmente o destino nacional e marca o espírito de uma geração de brasileiros.
1931 - Em 5 de fevereiro, solicita extração e registro do diploma de médico e inicia a carreira de médico em Itaguara, município de Itaúna (MG). No dia 5 de junho, nasce Vilma, primeira filha de JGR e Lygia Cabral Penna.
1932 - É nomeado para o cargo de Inspetor da Secretaria da Educação e Saúde Pública, no distrito de Itaguara, município de Itaúna (MG), em 28 de abril. Neste ano atua como voluntário da Força Pública, durante a Revolução Constitucionalista, indo servir no setor do Túnel.
1933 - Entra para a Força Pública, por concurso, integrando como Oficial-Médico o 9º Batalhão de Infantaria, sediado em Barbacena (MG). Aprende o russo e o japonês. Em companhia de Geraldo França de Lima, Rosa sonha com as cerimônias de gala da prestigiosa Academia Brasileira de Letras, à época, um prestigioso reduto de intelectuais.

1933 a1935 - Trabalha no Serviço de Proteção ao Índio.
1934 – No dia 17 de janeiro nasce Agnes, a segunda filha de JGR e Lygia Cabral Penna. Em abril, solicita documento de reservista do Serviço Militar, a fim de prestar concurso para o Ministério das Relações Exteriores. E em maio, é nomeado para o cargo de Capitão-Médico do Serviço de Saúde da Força Pública do Estado de Minas Gerais, com vencimentos anuais de 10:200$000. No dia 6 de julho, presta concurso para o Itamarati, sendo aprovado em segundo lugar, graças ao leque de conhecimentos de Rosa que é vasto: do Direito à Geografia, da Filosofia à Botânica. Nomeado Cônsul de Terceira Classe, ingressando então na carreira diplomática, no dia 11 de julho.
1936 - Participa e recebe o primeiro lugar no concurso de poesia da Academia Brasileira de Letras, com o volume de poesias Magma.
João Guimarães Rosa
1937 - Escreve os contos de Sagarana e concorre ao Prêmio Humberto de Campos, da Livraria José Olympio, obtendo o segundo lugar. Nota de pesquisa: O título original do volume inscrito no concurso era Contos; continha 12 histórias. Pseudônimo de JGR: Viator.

1938 - É nomeado Cônsul-Adjunto em Hamburgo, onde conhece sua segunda esposa, Aracy Moebius de Carvalho. Ajudam a salvar dezenas de judeus do extermínio nazista.
1941 - Em 20 de maio, vai a Lisboa na qualidade de correio diplomático da Embaixada do Brasil em Berlim.
1942 - De 28 de janeiro a 23 de maio, é internado, junto com Cícero Dias e Cyro de Freitas Vale, em Baden-Baden, em conseqüência da ruptura de relações entre o Brasil e a Alemanha. E no dia 1 de julho é enviado para a Embaixada em Bogotá, como Segundo Secretário.
1944 - Em junho volta ao Rio de Janeiro, para a Secretaria de Estado.

1945 - Viaja a Cordisburgo e Paraopeba, com o Dr. Pedro Barbosa. Em 25 de outubro, torna-se Sócio Titular da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro.
1946  Publica Sagarana, coletânea de contos que recebe o Prêmio Felipe de Oliveira. Consagração literária. O escritor afirma ter escrito certos contos em estado de transe hipnótico, mediúnico - semeia-se o enigma; - Em 19 de maio, José César Borba publica no Correio da manhã (Rio de Janeiro), entrevista de JGR; - Em 26 de maio, Ascendino Leite publica, em O jornal (Rio de Janeiro), reportagem sobre JGR; - É nomeado Chefe de Gabinete do Ministro João Neves da Fontoura. Enviado a Paris como Secretário da delegação brasileira à Conferência de Paz.
1947 - Em carta a seu tio Vicente Guimarães, Rosa anuncia o início de uma "guerra literária"; - Recebe o Prêmio da Sociedade Felipe d’Oliveira, com Sagarana; - Viaja ao pantanal mato-grossense – Nota de pesquisa: Dessa viagem resulta “Com o Vaqueiro Mariano”, publicado no Correio da manhã, de 26 de outubro de 1947 a 7 de março de 1948.
1948 - Segue para Bogotá, em 19 de março, como Secretário-Geral da delegação brasileira à IX Conferência Pan-Americana. E no dia 10 de dezembro é nomeado Primeiro Secretário da Embaixada do Brasil em Paris.
1949 - É promovido a Conselheiro da Embaixada do Brasil em Paris.
1951 - É promovido a Ministro de Segunda Classe. No dia 29 de março, volta ao Brasil e é, novamente, nomeado Chefe de Gabinete do Ministro João Neves da Fontoura. Em 10 de novembro é aceito como Sócio Efetivo da Sociedade Brasileira de Geografia, antiga Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro.
1952 – Em Maio, viaja a Sirga, fronteira de Minas Gerais com a Bahia, acompanhando uma boiada, com Manuelzão; - Viaja à Bahia, com Assis Chateaubriand; e publica em edição restrita, Com o Vaqueiro Mariano.
1953 - É nomeado Chefe da Divisão de Orçamento do Ministério das Relações Exteriores.
1954 - Getúlio Vargas executa a corajosa decisão de escolher o momento para sua travessia final: "Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História."
1956 - Publicação de Corpo de Baile e Grande sertão: veredas. São 1.400 páginas impecáveis publicadas em um único ano. O romancista declara que concluiu sua obra prima em três dias e duas noites, em estado de possessão, sem dormir. O romance recebe três grandes: “Machado de Assis”, Instituto Nacional do Livro; “Carmen Dolores Barbosa”, São Paulo; “Paula Brito”, Municipalidade do Rio de Janeiro.

1957 - Rosa candidata-se à Academia, mas é preterido na eleição. 
1958 - É nomeado Embaixador por seu amigo e conterrâneo Juscelino Kubitschek.
1960 a 1961 – Publica, na página literária de O globo, uma série de narrativas, que depois formariam o livro Primeiras estórias.
1961 Recebe o Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto de sua obra. Publicação de poemas sob os pseudônimos anagramáticos de Soares Guiamar, Sá Araújo Segrim e Meuriss Aragão. Sob forma de logogrifos, o conjunto de seus personagens traz nomes que sugerem desdobramentos ficcionais do próprio autor: Moimeichego (moi-me-ich-ego), Rosendo, Dona Rosalina, Orósio, João Porém... Neste ano é publicado em Portugal pela Ed. Livros do Brasil, o livro Sagarana. E na França, é traduzido parte de Corpo de baile, sob o título Buriti, Editions du Seuil, tradução de J. J. Villard.

1962 - Publica Primeiras estórias; - É traduzida, na França, a segunda parte de Corpo de baile, sob o título Les nuits du sertao, Editions du Seuil, tradução e nota de J. J. Villard. E assume, no Itamarati, a Chefia do Serviço de Demarcação de Fronteiras.
1963 - Candidata-se, pela segunda vez, à Academia Brasileira de Letras, na vaga de João Neves da Fontoura, e visita acadêmicos, em campanha eleitoral, firmemente decidido a obter vitória. É eleito, em 08 de agosto, por unanimidade, membro da Academia Brasileira de Letras. Misteriosamente, começa a adiar, sine die, a cerimônia de posse; - É traduzida, na Itália, parte de Sagarana, sob o título Il duelo, Nuova Accademia Editrice, tradução de Edoardo Bizzarri e P. A. Jannini, apresentação de P. A. Jannini; - E nos Estados Unidos, é traduzido Grande sertão: veredas, sob o título The devil to pay in the Backlands, Alfred A. Knopf, tradução de James L. Taylor e Harriet de Onis, prefácio de Jorge Amado, “The place of Guimarães Rosa in Brazilian Literature”. Neste ano ainda é premiado pelo livro Primeiras estórias pelo Pen Club Brasileiro.
João Guimarães Rosa e seus gatos de 
estimação em 1944.
1964 - É traduzido, na Alemanha, Grande sertão: veredas, sob o título Grande sertão, Kiepenheuer & Witsch, tradução de Curt Meyer-Clason, com quem Rosa, troca intensa correspondência, pois deseja fazer dessa versão uma matriz para futuras traduções em outros idiomas. - É editada, em Portugal, parte de Corpo de baile, sob o título Miguilim e Manuelzão, Ed. Livros do Brasil.

1965 - É adaptado para o cinema Grande sertão: veredas, sob o título Grande sertão, adaptação, produção e direção de Geraldo Renato Santos Pereira. Neste ano, é traduzido, na França, Grande sertão: veredas, sob o título Diadorim - Le diable dans la rue, au milieu du tourbillon, Editions Albin Michel, tradução de J. J. Villard; O conto “A hora e vez de Augusto Matraga”, com o mesmo título, é adaptado para o cinema com produção e direção de Roberto Santos.
1965 a 1967 - Colabora no jornal Pulso, até 1967, quando recolhe sua produção para editar em livro: Tutaméia.
1966 - Recebe do governador Israel Pinheiro a Medalha da Inconfidência; - É traduzido, na Tchecoslováquia, o conto “A terceira margem do rio”, Svetová Literatura, Ed. Odeon, tradução de Pavla Lidmilova. E em 2 de dezembro, recebe a condecoração da Ordem de Rio Branco. Meyer-Clason anuncia o fim próximo da tradução do conjunto da obra, espaçando-se a correspondência entre ambos. O romancista fixa, por fim, a data da cerimônia de posse da Academia Brasileira de Letras. Estranhamente, o dia escolhido é uma quinta-feira, 16 de novembro de 1967 - no fim do ano seguinte.
1967 – Em abril, vai ao México, representando o Brasil no II Congresso Latino-Americano de Escritores, no qual atua como vice-presidente, até apresentar renúncia motivada pelas críticas feitas pelos delegados de Cuba e do Panamá ao governo dos Estados Unidos. Pronuncia seu único discurso em castelhano. Em julho, publica Tutaméia ("tudo meu"), uma forma de guia de leitura para o conjunto da obra, segundo Assis Brasil. Em julho é adaptado para teatro o conto “Conversa de bois”, sob o título Boi de carro, apresentado pelo Teatrinho Chique-Chique (BA), no II Festival de Marionetes e Fantoches da Guanabara; - Integra a comissão julgadora do II Concurso Nacional de Romance Walmap. Em outubro, elabora, como membro do Conselho Federal de Cultura, extenso pronunciamento sobre o acordo ortográfico. É traduzido, na Espanha, Grande sertão: veredas, sob o título Gran sertón: veredas, Editorial Seix Barral, tradução, nota e glossário de Angel Crespo. Na quinta-feira, 16 de novembro, dia da cerimônia de posse na Academia Brasileira de Letras, adiada durante quatro anos. E no domingo, 19 de novembro, terceiro dia após a cerimônia de consagração literária, falece em sua casa, no Rio de Janeiro.

1968 É publicado o volume Em Memória de João Guimarães Rosa, pela Editora José Olympio.
1969 - Publica-se, postumamente, Estas estórias.
1970 - Publica-se, postumamente, Ave, palavra.
1997 - Publica-se, postumamente, Magma.


 
"... às vezes quase acredito que eu mesmo, João,
sou um conto contado por mim mesmo. É tão imperativo..."
- João Guimarães Rosa, em entrevista a Günter Lorenz - "Dialogo com Guimarães Rosa".