Chico me representa
João Paulo Cunha
Roda Viva envergonha sua própria trajetória
Chico Buarque, além de ser o maior poeta da canção popular brasileira, sabe das coisas. Ao proibir a veiculação de sua música Roda Viva na abertura do programa de entrevistas de mesmo nome, da TV Cultura de São Paulo, ele mais uma vez acerta na arte e na política.
O compositor acerta na arte pelo fato de impedir o emparelhamento de sua obra-prima com um programa que, nos últimos anos, envergonha sua própria trajetória. Com isso, mostra que a roda é mesmo viva e o tempo não para, exigindo sempre atenção aos sinais. A canção, que tinha tudo a ver com um programa jornalístico ligado em seu tempo, se torna um elemento dissonante numa produção esvaziada de consistência. A “entrevista” com o presidente não eleito foi a ‘gota d’água’, para lembrar um samba do compositor.
O intelectual acerta em política ao potencializar a crítica ao uso estatal e chapa-branca de uma empresa que já teve sua história ligada à construção de uma comunicação pública no Brasil. Nas mãos dos tucanos, a TV Cultura de São Paulo se tornou uma agência de propaganda ideológica, uma vitrine do mirrado pensamento neoliberal brasileiro, temperado recentemente com o ódio de colunistas e comentaristas importados dos porões da imprensa de direita. O atual comando da bancada, saído da Veja, faz com que o programa venha caindo ‘pelas tabelas’, para ficar no repertório buarquiano.
O Roda Viva tem história, que vem dos primeiros anos da redemocratização, quando entrou no ar como um espaço para a palavra que vinha sendo censurada no país. Se firmou como uma tribuna que acolhia com respeito, mas sempre com firmeza, nomes que percorriam o espectro amplo da política, cultura, economia e pensamento. O importante era dialogar com o país, retomar o jornalismo na televisão, ampliar o debate com a sociedade. O que ocorria nas noites de segunda-feira era uma pauta obrigatória em todas as conversas da semana, sempre com repercussão na imprensa. Uma antena que captava e transmitia a energia do momento.
No centro daquele liquidificador estiveram, entre centenas de outros, Hugo Chávez e Roberto Campos; Vargas Llosa e Saramago; Lula e Fernando Henrique Cardoso, Chomsky e Newton Cruz, Ulisses Guimarães e Collor, Tancredo e Sarney, Fidel Castro e Cabo Anselmo. Curiosamente, muitos entrevistados foram capazes de enfrentar jornalistas naquele Coliseu e se saírem vitoriosos, criando um clima de verdadeiro debate, como deve ser o jornalismo. Brizola deixou mais de um entrevistador sem rebolado com sua altivez; recentemente, o escritor Leonardo Padura fez uma perguntadora da Veja perder o rumo de casa depois que ela vomitou observações desinformadas sobre Cuba.
A recusa de Chico Buarque em fazer parte daquela ação entre amigos que se tornou o Roda Viva sob a gerência tucana é perfeitamente justificada numa simples contabilidade dos últimos programas, do pedante Dória (PSDB) ao insignificante Lorenzoni (DEM), passando pelo golpista Temer (PMDB), no maior vexame do jornalismo da televisão brasileira. Não é preciso que a crítica venha de fora, o próprio Judas fez questão de agradecer de viva voz pela “propaganda”. Para um jornalista, ser chamado de publicitário é como receber uma estaca de madeira no peito. Coisas que vampiro entende.
A história tem suas coincidências. Roda Viva, a canção, fez parte de um musical de mesmo nome, dirigido por José Celso Martinez, que teve sessões interrompidas pelo Comando de Caça aos Comunistas em 1968, com direito a porrada no elenco. Além disso, o personagem principal da montagem, Ben Silver, é um artista que resolve mudar de nome e de postura para agradar ao público, que se deixa seduzir pela mentira maquiada de modernidade. Não tem caráter, mas tem ambição. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Retrato de um outro tempo, há quase 50 anos, em que a ditadura assumia sua face violenta, com medidas antipopulares, programa econômico concentrador, extinção de direitos, subserviência ao capital internacional e instalação de um Estado policial. Qualquer semelhança…
Com a retirada da canção da abertura do programa, os produtores têm agora que arranjar um substituto à altura da lambança que vêm fazendo nos últimos tempos. Podem, quem sabe, lançar mão de um compositor que se notabilizou pelo reacionarismo, imbecilidade e truculência, além da inegável falta de talento. O novo tema pode sair da lavra de Roger, do Ultraje a Rigor. Seu maior sucesso é a cara do programa e de seus mais recentes convidados: A gente somos inútil
O compositor acerta na arte pelo fato de impedir o emparelhamento de sua obra-prima com um programa que, nos últimos anos, envergonha sua própria trajetória. Com isso, mostra que a roda é mesmo viva e o tempo não para, exigindo sempre atenção aos sinais. A canção, que tinha tudo a ver com um programa jornalístico ligado em seu tempo, se torna um elemento dissonante numa produção esvaziada de consistência. A “entrevista” com o presidente não eleito foi a ‘gota d’água’, para lembrar um samba do compositor.
O intelectual acerta em política ao potencializar a crítica ao uso estatal e chapa-branca de uma empresa que já teve sua história ligada à construção de uma comunicação pública no Brasil. Nas mãos dos tucanos, a TV Cultura de São Paulo se tornou uma agência de propaganda ideológica, uma vitrine do mirrado pensamento neoliberal brasileiro, temperado recentemente com o ódio de colunistas e comentaristas importados dos porões da imprensa de direita. O atual comando da bancada, saído da Veja, faz com que o programa venha caindo ‘pelas tabelas’, para ficar no repertório buarquiano.
O Roda Viva tem história, que vem dos primeiros anos da redemocratização, quando entrou no ar como um espaço para a palavra que vinha sendo censurada no país. Se firmou como uma tribuna que acolhia com respeito, mas sempre com firmeza, nomes que percorriam o espectro amplo da política, cultura, economia e pensamento. O importante era dialogar com o país, retomar o jornalismo na televisão, ampliar o debate com a sociedade. O que ocorria nas noites de segunda-feira era uma pauta obrigatória em todas as conversas da semana, sempre com repercussão na imprensa. Uma antena que captava e transmitia a energia do momento.
No centro daquele liquidificador estiveram, entre centenas de outros, Hugo Chávez e Roberto Campos; Vargas Llosa e Saramago; Lula e Fernando Henrique Cardoso, Chomsky e Newton Cruz, Ulisses Guimarães e Collor, Tancredo e Sarney, Fidel Castro e Cabo Anselmo. Curiosamente, muitos entrevistados foram capazes de enfrentar jornalistas naquele Coliseu e se saírem vitoriosos, criando um clima de verdadeiro debate, como deve ser o jornalismo. Brizola deixou mais de um entrevistador sem rebolado com sua altivez; recentemente, o escritor Leonardo Padura fez uma perguntadora da Veja perder o rumo de casa depois que ela vomitou observações desinformadas sobre Cuba.
A recusa de Chico Buarque em fazer parte daquela ação entre amigos que se tornou o Roda Viva sob a gerência tucana é perfeitamente justificada numa simples contabilidade dos últimos programas, do pedante Dória (PSDB) ao insignificante Lorenzoni (DEM), passando pelo golpista Temer (PMDB), no maior vexame do jornalismo da televisão brasileira. Não é preciso que a crítica venha de fora, o próprio Judas fez questão de agradecer de viva voz pela “propaganda”. Para um jornalista, ser chamado de publicitário é como receber uma estaca de madeira no peito. Coisas que vampiro entende.
A história tem suas coincidências. Roda Viva, a canção, fez parte de um musical de mesmo nome, dirigido por José Celso Martinez, que teve sessões interrompidas pelo Comando de Caça aos Comunistas em 1968, com direito a porrada no elenco. Além disso, o personagem principal da montagem, Ben Silver, é um artista que resolve mudar de nome e de postura para agradar ao público, que se deixa seduzir pela mentira maquiada de modernidade. Não tem caráter, mas tem ambição. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Retrato de um outro tempo, há quase 50 anos, em que a ditadura assumia sua face violenta, com medidas antipopulares, programa econômico concentrador, extinção de direitos, subserviência ao capital internacional e instalação de um Estado policial. Qualquer semelhança…
Com a retirada da canção da abertura do programa, os produtores têm agora que arranjar um substituto à altura da lambança que vêm fazendo nos últimos tempos. Podem, quem sabe, lançar mão de um compositor que se notabilizou pelo reacionarismo, imbecilidade e truculência, além da inegável falta de talento. O novo tema pode sair da lavra de Roger, do Ultraje a Rigor. Seu maior sucesso é a cara do programa e de seus mais recentes convidados: A gente somos inútil
Nenhum comentário:
Postar um comentário