sexta-feira, 22 de maio de 2015

Dom Oscar Romero será beatificado neste sábado (23/05)

Radio Vaticano


Dom Romero, mártir da paz
"Se me matarem, ressuscitarei na vida do meu povo"

Mural em San Salvador dedicado a Dom Romero - AP


Cidade do Vaticano (RV) – Cerca de 250 mil fiéis participarão da missa de beatificação de Dom Óscar Arnulfo Romero, marcada para este sábado, 23 de maio, na capital salvadorenha, San Salvador.

A comunidade católica local se prepara para o evento com uma peregrinação nesta sexta-feira, partindo da Catedral até a capela onde se encontra o túmulo do Arcebispo.
O país está em festa, porque a luta de Romero é mais atual do que nunca, como confirma o porta-voz da beatificação, Pe. Cesar Sanchez:

O país explodiu em alegria, em unidade. Nos unimos todos através do sangue de Dom Romero pedindo a paz para este país, que continua sofrendo. As palavras de Dom Romero seguem vigentes. Nos encontramos num ambiente de violência, porque há muita delinquência, organizações juvenis que delinquem, que roubam, que matam. E hoje mais do que nunca a voz de Dom Romero é importante para nós, em El Salvador. Por isso nós estamos felizes. É uma graça especial para este pequeno e sofrido país.

Trajetória de Dom Romero

Oscar Arnulfo Romero nasceu em agosto de 1917 numa família modesta em Ciudad Barrios (El Salvador). Aos 14 anos, ingressa no seminário, mas seis anos depois se afasta para ajudar a família que estava com dificuldades. Passa a trabalhar nas minas de ouro com os irmãos. Retoma os estudos e é enviado a Roma para estudar teologia, na Pontifícia Universidade Gregoriana. Romero é ordenado sacerdote em 1942, regressa a El Salvador e assume uma paróquia do interior. Logo é transferido para a catedral de San Miguel, onde fica por 20 anos. Sacerdote dedicado à oração e à atividade pastoral, dedica-se a obras de caridade, mas sem engajamento reconhecidamente social.

Em 1970 é nomeado Auxiliar de San Salvador. O Arcebispo Luis Chávez y Gonzalez busca atualizar a linha pastoral de acordo com o Concílio Vaticano II e a Conferência de Medellín. Mas Romero não se identifica integralmente com a linha pastoral proposta. Em 1974 é nomeado bispo da diocese de Santiago de Maria, em meio a um contexto político de forte repressão, sobretudo contra as organizações camponesas.

No ano seguinte, a Guarda Nacional executa cinco camponeses e dom Romero celebra missa em intenção das vítimas. Ele não faz denuncia explícita do crime, mas escreve uma carta severa ao presidente Molina.

Em 1977, Dom Oscar Romero é nomeado Arcebispo de San Salvador. Pouco tempo depois, é assassinado o jesuíta padre Rutílio Grande, engajado na luta do povo e ligado a dom Oscar. Este é o momento em que ele reavalia sua posição e se coloca corajosamente junto aos oprimidos, denunciando a repressão, a violência do Estado e a exploração imposta ao povo pela aliança entre os setores político-militares e econômicos, apoiada pelos Estados Unidos. O Arcebispo denuncia também a violência da guerrilha revolucionária. Suas homilias são transmitidas pela rádio católica dando esperança à população e provocando a fúria dos governantes.

Em outubro de 1979, um golpe de Estado depõe o ditador Humberto Romero. Uma junta de civis e militares assume o poder, e nesse cenário, exército e organizações paramilitares assassinam centenas de civis (entre eles sacerdotes). A guerrilha responde com execuções sumárias.

Em fevereiro de 1980, Dom Romero escreve ao presidente dos EUA, Jimmy Carter, um apelo para que ele não envie ajuda militar e econômica ao governo salvadorenho, para não financiar a repressão ao povo. Em 24 de março do mesmo ano, Dom Oscar Romero é assassinado por um franco-atirador, enquanto celebrava a missa na capela do Hospital da Divina Providência em São Salvador

Mártir

Para inúmeras comunidades cristãs do continente, Oscar Romero foi desde o dia do seu martírio considerado santo e invocado como São Romero da América Latina por seu empenho em favor da paz, sua luta contra a pobreza e a injustiça.

Para o Pe. José Oscar Beozzo, “a santidade de Romero é também uma santidade programática que remete à evangélica opção preferencial pelos pobres, a uma fé atuante no mundo e à profecia como inarredável tarefa dos pastores e de todos os batizados, num continente nominalmente cristão, que convive em aparente indiferença, com as seculares desigualdades e injustiças que marcam nossas sociedades dos tempos coloniais até hoje”.

O Bispo emérito de São Felix do Araguaia, Dom Pedro Casaldáliga, no dia seguinte ao assassinato de Oscar Romero associou prontamente sua morte ao martírio e ao sangue derramado pelo próprio Cristo na cruz e dedicou-lhe este poema:

Dia 25

Ontem morreu, assassinado, Dom Oscar Romero, o bom pastor de El Salvador. Enquanto celebrava a eucaristia. Seu sangue se misturou para sempre com o sangue glorioso de Jesus e com o sangue, ainda profanado, de tantos salvadorenhos, de tantos latino-americanos.

Romero, flor de uma paz que parece impossível nesta América Central sofrida.
A impressão que se tem, sem dúvida possível, é que o Império o matou.  (...) Era demasiado poderosa e livre a sua voz, era necessário apagá-la. Ele o sabia e estava preparado para este sacrifício.

Foi na véspera da Anunciação. O anjo do Senhor se antecipou para anunciar, com esta morte, a chegada de um tempo de vida para El Salvador, para América Central, para todo o Continente.

São Romero da América, nosso pastor e mártir

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Beatificação de Dom Romero. Cardeal Amato: homem virtuoso
Dom Oscar Romero em agosto de 1977 - AP


Cidade do Vaticano (RV) - Dom Oscar Arnulfo Romero y Galdamez, assassinado em 24 de março de 1980, será beatificado, no próximo sábado (23/05), em El Salvador.
A nossa emissora entrevistou o Prefeito da Congregação das Causas dos Santos, Cardeal Angelo Amato, que irá ao país representando o Papa Francisco. Eis o que disse a propósito do martírio de Dom Romero.

Cardeal Amato: “O Papa Francisco resume bem a identidade sacerdotal e pastoral de Romero, quando o chama de ‘bispo e mártir, pastor segundo o coração de Cristo, evangelizador e pai dos pobres, testemunha heroica do Reino de Deus, Reino de justiça, fraternidade e paz’. Romero era um sacerdote bom e um bispo sábio, mas sobretudo era um homem virtuoso. Amava Jesus, o adorava na Eucaristia, amava a Igreja, venerava a Virgem Maria e amava o seu povo. O seu martírio não foi uma improvisação, mas teve uma longa preparação. Jovem seminarista em Roma, pouco antes da ordenação sacerdotal escreveu em suas anotações: ‘Este ano farei a minha grande entrega a Deus! Meu Deus, ajuda-me, prepara-me. Você é tudo, e eu não sou nada, todavia, o seu amor quer que eu seja muito. Coragem! Com o seu tudo e com o meu nada faremos muito.”

Muitas vezes se fala de uma conversão de Romero mais aberto ao aspecto social de seu ministério

Cardeal Amato: “Na realidade, uma reviravolta em sua vida de pastor manso e quase tímido foi a morte, em 12 de março de 1977, de Padre Rutilio Grande, sacerdote jesuíta salvadorenho que deixou o ensino universitário para ser pároco dos campesinos, oprimidos e marginalizados. Foi este o evento que tocou o coração do arcebispo Romero, que chorou pelo sacerdote como uma mãe chora pelo filho. Ele foi a Aguilares para a missa de sufrágio, passando a noite chorando, velando e rezando pelas três vítimas inocentes, Pe. Rutilio e os dois camponeses que o acompanhavam. Os campesinos ficaram órfãos de seu bom pai. Em sua homilia o arcebispo disse: ‘a libertação que o Pe. Rutilio pregava é inspirada pela fé, uma fé que fala de vida eterna, uma fé que agora ele com o seu rosto dirigido ao céu, acompanhado pelos dois camponeses, mostra em sua totalidade, em sua perfeição: a libertação que termina com a felicidade em Deus, a libertação que surge do arrependimento do pecado, a libertação que se fundamenta em Cristo, única força salvadora”.

Parece que a partir daquele momento a sua linguagem se tornou mais explícita na defesa do povo oprimido e dos sacerdotes perseguidos, não obstante as ameaças cotidianas que recebia.

Cardeal Amato: "Na realidade é assim. Ele escreve de fato: ‘Considero um dever colocar-me em defesa da minha Igreja e ao lado do meu povo tão oprimido e perseguido’. As suas palavras não incitavam ao ódio e à vingança, mas era uma exortação de um pai aos seus filhos divididos, que eram convidados ao amor, ao perdão e à concórdia. Contemplando a beleza da natureza e o esplendor da paisagem salvadorenha, o arcebispo dizia que o céu iniciava aqui na terra. Olhava a sua querida pátria atormentada com a esperança no coração. Sonhava que um dia nas ruínas do mal iria brilhar a glória de Deus e o seu amor.”
O que o senhor diz sobre sua proximidade aos camponeses e aos pobres de seu país?
Cardeal Amato: "A sua opção pelos pobres não era ideológica, mas evangélica. A sua caridade se estendia também aos perseguidores para os quais pregava a conversão ao bem e aos quais assegurava o perdão, não obstante tudo. Era acostumado a ser misericordioso. A generosidade em doar a quem pedia era, segundo as testemunhas, munificente, total e abundante.  A quem pedia ele dava. Algumas vezes dizia que se as pessoas lhe restituíssem o dinheiro que distribuiu, ficaria milionário." (MJ)

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