Estamos solidários ao povo francês. Todos nós condenamos este absurdo atentado contra a liberdade, mas este ato terrorista poderá causar danos em escala gigantesca em todos nós. O fascismo islâmico retroalimenta a xenofobia e o fascismo europeu. Não se pode com as mortes reforçar posições ainda mais intolerantes. Leia abaixo a análise do jornalista Altamiro Borges:
Atentado fortalece o fascismo europeu
Por Altamiro Borges
O atentado terrorista à sede da revista Charlie Hebdo, na manhã desta quarta-feira (7), em Paris, gera
ainda maiores temores sobre o futuro do velho continente. A onda fascista que
contagiou a Europa nos últimos anos, em decorrência da grave crise econômica,
tende a ganhar maior impulso – com o fortalecimento de organizações racistas e
xenófobas, o crescimento de grupos paramilitares e as vitórias eleitorais dos
partidos da direita. Ainda sem a confirmação da autoria dos responsáveis pelo
crime, a acusação já recai sobre os grupos fundamentalistas islâmicos. A
perseguição à comunidade mulçumana, numa região já contaminada pelo ódio e o
preconceito, deve crescer. O fascismo ronda a Europa.
Segundo as agências de notícia, 12 pessoas
foram covardemente assassinadas, entre chargistas de renome, jornalistas e dois
policiais. Elas foram alvejadas por homens encapuzados, armados com fuzis AK-47,
que invadiram o prédio da Charlie Hebdo – revista que ficou famosa por publicar
charges agressivas e irreverentes contra Maomé e o islamismo. O diretor da
publicação, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb, foi um dos mortos. Ao
lado dele, também morreram os cartunistas Cabu (Jean Cabut), Tignous (Bernard
Verlhac) e Wolinski (Georges Wolinski). Além dos 12 assassinados, cerca de dez
pessoas ficaram feridas, quatro delas em estado grave.
O atentado gerou forte comoção na França. Em várias localidades
ocorreram manifestações contra o terrorismo e a intolerância. Os participantes
carregaram cartazes com a frase “Je Suis Charlie” (Eu sou Charlie). Em Paris, o
protesto foi convocado por sindicatos e partidos políticos e reuniu milhares de
pessoas na Praça da República, próxima ao local do atentado. Em Nice, uma
multidão também ocupou as ruas. François Hollande, o desgastado presidente da
França, decretou luto oficial e prometeu rigor na apuração e prisão dos
responsáveis pela ação criminosa. Também ocorreram manifestações de
solidariedade às vítimas do terror na Inglaterra, Holanda, Bélgica, Kosovo,
Suécia, Dinamarca e Espanha.
A presidenta Dilma
Rousseff enviou mensagem ao governo francês. “Foi com profundo pesar e
indignação que tomei conhecimento do sangrento e intolerável atentado terrorista
ocorrido nesta quarta-feira contra a sede da revista ‘Charlie Hebdo’, em Paris.
Esse ato de barbárie, além das lastimáveis perdas humanas, é um inaceitável
ataque a um valor fundamental das sociedades democráticas – a liberdade de
imprensa. Nesse momento de dor e sofrimento, desejo estender aos familiares das
vítimas minhas condolências. Quero expressar, igualmente ao presidente Hollande
e ao povo francês a solidariedade de meu governo e da nação brasileira”.
Os governos dos EUA, Rússia e Alemanha, entre outros
países, também repudiaram o atentado. Já o Papa Francisco classificou a ação
como “uma dupla violência” – contra a vida humana e a liberdade de expressão. As
notas mais emblemáticas, porém, partiram do próprio mundo islâmico. A
Universidade de Al Azhar, a segunda mais antiga do mundo e principal autoridade
do Islã sunita, destacou a “extrema gravidade” do crime. Já o Conselho Francês
do Culto Muçulmano, instância representativa dos muçulmanos na França, alertou:
“Num contexto político internacional de tensões, alimentado por delírios de
grupos terroristas que se aproveitam injustamente do Islã, apelamos a todos os
que estão associados aos valores da República e da democracia para que evitem as
provocações, que apenas servem para jogar gasolina no fogo”.
Ainda é difícil prever os desdobramentos deste trágico episódio. Mas,
como alerta o professor de história Henrique Carneiro, em artigo no site Opera
Mundi, ele será explorado ao máximo pelos grupos fascistas. “Com dezenas de
milhares indo às ruas da Alemanha contra a ‘islamização da Europa’ e a
extrema-direita francesa de Marine Le Pen crescendo eleitoralmente, os
assassinos de Paris não só atingiram vidas humanas e a liberdade de expressão
como contribuem para a polarização entre dois tipos de fundamentalismo: o
islâmico e o neofascista”. Ele prevê que o atentado desta quarta-feira dará
ainda mais força ao fascismo, que “é a forma contemporânea da máxima opressão,
exploração e intolerância”.
Conforme observa, esta
corrente extremista vem tomando diversas formas na Europa e cresce de maneira
vertiginosa. “Há um fascismo católico, como foi o espanhol e como é o do
terrorista norueguês Breivik. Há um fascismo pagão e de inspiração até mesmo de
uma leitura enviesada do hinduísmo, como foi o de Hitler. Há um fascismo
evangélico. Há um fascismo judeu. E há um fascismo islâmico, que se alimenta da
insatisfação dos imigrantes discriminados na Europa, mas que tem como
financiadores as fortunas bilionárias do petróleo saudita ou de outros
lugares... Os maiores atentados terroristas na Europa foram feitos por um
fascista católico como Breivik na Noruega, por fascistas islâmicos na Espanha, e
agora na França, e por fascistas cristãos ortodoxos na derrubada do avião
holandês sobre a Ucrânia... O ano de 2015 começa mal”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário