Para o projeto de 'Igreja em saída', o papel da Igreja é libertar a humanidade da injustiça e da desigualdade.
O projeto de Francisco é de uma Igreja descentrada de si e centrada nos graves desafios do mundo atual (Reprodução/ Pixabay)
Por Frei Betto
Semana passada, em Nova Iguaçu (RJ), agentes pastorais, membros de Comunidades Eclesiais de Base, adeptos da Teologia da Libertação, do Movimento Fé e Política e de movimentos sociais se reuniram para aprofundar a proposta do papa Francisco de “uma Igreja em saída”.
Diminui o número de católicos no Brasil. A pesquisa Datafolha, de dezembro de 2016, comprovou redução de 9 milhões de fiéis em dois anos. Naquela data, apenas 50% dos entrevistados se autodeclararam católicos.
O papa Francisco está ciente da crise do catolicismo. Por isso, propõe uma “Igreja em saída”. Isso significa romper os muros clericalistas que amarram a Igreja aos templos; flexibilizar as leis canônicas (como admitir o recasamento de divorciados); e modificar os parâmetros ideológicos (que consideram o catolicismo conatural ao capitalismo).
Esse projeto de Francisco se choca com a “restauração identitária” ou, nas palavras do teólogo e meu primo João Batista Libanio, “volta à grande disciplina”, defendida por João Paulo II e Bento XVI. Propunham a leitura dos documentos do Concílio Vaticano II à luz do Vaticano I: predominância do Direito Canônico; Catecismo da Igreja Católica; desestímulo às Comunidades Eclesiais de Base; aceitação da liturgia tridentina; valorização dos movimentos papistas; e desconfiança diante da sociedade (tida como relativista e niilista).
Para o projeto de “restauração identitária”, o papel da Igreja é salvar almas. Para o de “Igreja em saída”, é libertar a humanidade da injustiça e da desigualdade. As pessoas se salvam salvando a humanidade de tudo que a impede de ser a grande família dos filhos e filhas de Deus. Daí a proposta de Francisco ao incentivar os movimentos sociais a lutar por três T: terra, teto e trabalho.
O primeiro projeto quer uma Igreja centrada na liturgia e nos sacramentos, na noção de pecado, na submissão dos leigos ao clero. Guarda nostalgia dos tempos em que a Igreja Católica ditava a moral social; merecia a reverência do Estado, que a cobria de privilégios; e, hoje, seus adeptos se sentem incomodados frente à secularização da sociedade e aos avanços da ciência e da tecnologia.
Ora, quantos jovens batizados na Igreja Católica estão hoje preocupados com a noção de pecado? Quantos temem ir para o inferno ao morrer? Quantos se preservam virgens até o casamento?
O projeto de Francisco é de uma Igreja descentrada de si e centrada nos graves desafios do mundo atual: preservação da natureza; combate à idolatria do capital; diálogo entre as nações; acolhimento dos refugiados; misericórdia às pessoas; protagonismo dos movimentos populares; centralidade evangélica nos direitos dos pobres e excluídos.
Bento XVI renunciou por reconhecer o fracasso do projeto de “restauração identitária”, ainda apoiado por expressivo número de bispos, padres e religiosas, incomodados com as orientações do papa Francisco, a quem alguns criticam abertamente.
O novo jeito de ser católico, proposto por Francisco, corresponde ao que dizia são Domingos, fundador da Ordem religiosa a que pertenço: “O trigo amontoado apodrece; espalhado, frutifica”. Sair da sacristia para a sociedade; encarar o mundo como dádiva de Deus; descobrir a presença de valores evangélicos em pessoas e situações desprovidas de fé ou religiosidade; buscar o diálogo ecumênico e inter-religioso; estar menos na Igreja para se fazer mais presente no Reino de Deus – categoria que, na boca de Jesus, se contrapunha ao reino de César, e significa o mundo no qual a paz seja fruto da justiça, e não do equilíbrio de armas.
A meta é o Reino de Deus, no qual “Deus será tudo em todos”, como prenunciou o apóstolo Paulo (I Coríntios 15, 28). O caminho para atingi-lo inclui os movimentos sociais, as instituições da sociedade, as ferramentas políticas. E a Igreja funciona como “posto de gasolina” para abastecer-nos na fé e na espiritualidade capaz de nos estimular como militantes da grande utopia - o mundo que Deus quer para seus filhos e filhas viverem com dignidade, liberdade, justiça e paz.
As forças golpistas estão em uma encruzilhada. Elas patrocinaram uma aventura perigosa ao abortar a jovem democracia brasileira, depondo uma presidenta legitimamente eleita e alçando ao poder a quadrilha de Michel Temer. Com uma velocidade alucinante, elas impuseram uma pauta regressiva sem precedentes na história – que inclui, entre outras maldades, a PEC da Morte que congela por 20 anos os investimentos em saúde e educação; a “reforma” trabalhista que extingue a CLT; e o projeto de “reforma” da Previdência que elimina com a aposentadoria dos trabalhadores. Este plano, batizado de “Ponte para o futuro” – mas que na verdade é uma “pinguela para inferno” –, está sendo execrado pela sociedade em todas as pesquisas de opinião. O covil golpista tem apenas 3% de aprovação – dentro da chamada margem de erro.
Neste cenário devastador, as eleições marcadas para outubro de 2018 – quando deveriam ser escolhidos o novo presidente da República, os governadores dos 26 Estados e Distrito Federal, 513 deputados federais e 54 senadores – viraram um pesadelo para os golpistas. Mantidas as regras democráticas, eles temem perder importantes espaços de poder. Os parlamentares que se corromperam neste show de horrores e esfaquearam os direitos dos trabalhadores estão desgastados e correm o risco de não se reeleger. Eles são vaiados nos locais públicos e têm seus nomes estampados em vários cantos. Já os governadores que apoiaram as regressões também padecem com a queda de popularidade e são tragados por uma crise econômica que paralisa os Estados. O maior temor dos golpistas, porém, é com a eleição presidencial. O “fantasma” de Lula assombra a direita nativa. O golpe ficaria inconcluso com o retorno das forças de esquerda e centro-esquerda ao Palácio do Planalto.
Até agora, mesmo com o apoio da mídia chapa-branca e das elites empresariais, as forças golpistas não conseguiram construir um nome em condições de disputar o pleito com competitividade. Já fizeram vários ensaios, mas todos deram chabu. Henrique Meirelles, o queridinho do “deus-mercado”, nem aparece nas pesquisas eleitorais. Ele prometeu recuperar a econômica de maneira “instantânea”, mas o que se vê no país é o aumento do desemprego e da miséria. Além disso, o ex-executivo da JBS foi atropelado por várias denúncias de corrupção e de enriquecimento ilícito. João Doria, o “prefake” turista de São Paulo, virou capa de revistas e destaque na tevê, mas sua ambição logo virou farinata – como a que compõe sua desastrosa “ração para os pobres”. Luciano Huck, o garoto-propaganda da TV Globo, também já desistiu da disputa com medo de uma necessária devassa na sua vida empresarial. Sobraram o governador Geraldo Alckmin, o “picolé de chuchu”, que nunca convenceu o eleitorado brasileiro, e o fascista aloprado Jair Bolsonaro, que não inspira confiança nem na chamada “zelite”.
Três saídas golpistas A ausência de alternativas tende a estimular nas forças da direita – que têm no seu DNA os golpes e as saídas autoritárias – a busca de saídas ainda mais traumáticas para a combalida democracia brasileira. Três hipóteses parecem estar no tabuleiro. A primeira é a impugnação de uma nova candidatura do ex-presidente Lula. Sergio Moro e os seus cúmplices na midiática Operação Lava-Jato trabalham incansavelmente para realizar este trabalho sujo, que representaria um atentado à soberania do voto popular e à democracia. Sem provas, mas com muita convicção, eles correm atrás do tempo. O atraso na degola, porém, pode atrapalhar os planos golpistas, gerando forte reação na sociedade. A cada dia que passa, o líder petista se consolida ainda mais na simpatia do eleitorado. Há um típico “efeito saudade” do ex-presidente.
Caso esta manobra não se viabilize a tempo, as forças da direita podem apelar para outras duas saídas ainda mais bruscas. Uma seria a da imposição de um “parlamentarismo” de fachada, para aprisionar o presidente eleito em 2018. O jagunço Alexandre de Moraes, guindado ao posto de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo usurpador e compadre Michel Temer, já opera abertamente para viabilizar esta alternativa. Vale lembrar que esta saída antidemocrática já foi testada em 1961 contra o trabalhista João Goulart, mas durou pouco tempo. Um plebiscito anulou a mutreta. A outra seria a da pura e simples suspensão das eleições do próximo ano. Parece uma manobra extremada – mas é bom evitar novamente as ilusões como as dos que não acreditavam no golpe do impeachment contra Dilma Rousseff.
O que está em jogo no país é algo de dimensão colossal. O Brasil, com suas riquezas, potencialidades e bilionários interesses, não pode ser transformado em uma republiqueta de última categoria. Ou as vozes que almejam a democracia, o progresso e a justiça social se levantam com urgência e maior radicalidade, ou a direita nativa vai destruir de vez o Brasil. A questão democrática, com a defesa da soberania do voto popular, adquire hoje maior centralidade na luta de classes nesta sofrida nação.
O país enfrenta hoje um desmonte geral em todas as políticas de proteção social, especialmente contra o Sistema Único de Saúde, desta forma torna-se importante historiar a luta dos movimentos sociais pelo SUS e a sua concepção de saúde pública; pelo médico sanitarista Heider Pinto.
Vídeo-aula que Heider Aurelio Pinto fez na Fundação Perseu Abramo como parte de um curso de formação para os trabalhadores e lideranças dos sindicatos do país.
O Curso de “Difusão do Conhecimento”
A 1° vídeo-aula é o “O SUS enquanto luta dos movimentos populares e a concepção de saúde pública por trás do SUS” onde tento historiar a luta do movimento de reforma sanitária e analisar o sentidos e significados, práticos, políticos e ideológicos, dos princípios do SUS.
Rádio Vaticano : A Conferência tem a proposta de aprofundar o magistério da Igreja desde a Populorum progressio do Beato Paolo VI, que completa 50 anos, até a Laudato si do Papa Francisco, que afirma: “O trabalho é uma necessidade, faz parte do sentido da vida nesta terra, é caminho de maturação, desenvolvimento humano e realização pessoal”.
Além de representantes da Santa Sé, o encontro terá a presença de expoentes dos principais sindicatos do mundo, especialistas no campo das ciências sociais, delegações de mais de 40 países e representantes de movimentos cristãos de trabalhadores.
Na tarde de sexta-feira (24/11), no final dos trabalhos, está prevista a audiência com o Papa Francisco.
O objetivo será abrir uma reflexão sobre o mundo do trabalho e os aspectos ligados às atividades profissionais nas estruturas sociais existentes. O patrimônio da Doutrina Social da Igreja e suas perspectivas e a análise das novas realidades sociais.
Vice-presidenta da CUT alertou para os graves ataques aos direitos sociais e trabalhistas que caracterizam o golpe no Brasil.
Escrito por: Marize Muniz, CUT Brasil
Divulgação
Em discurso no Encontro Internacional de Organizações Sindicais, na sala Novo do Sínodo, na Cidade do Vaticano, a vice-presidenta da CUT Nacional, Carmen Foro, falou sobre a realidade atual e os desafios do movimentos sociais e sindicais ante a globalização do paradigma tecnocrático e denunciou os ataques do governo ilegítmo de Michel Temer (PMDB-SP) aos direitos sociais e trabalhistas.
Segundo ela, no Brasil, a classe trabalhadora e a população mais pobre, que mais necessita de políticas públicas para sobreviver com o mínimo de dignidade, lida no momento com uma agenda de ataques a CLT, ao direito à aposentadoria, à casa própria, saúde e educação e tantas outras conquistas que veem sendo exterminadas pelo governo Temer.
“A sanha do mercado ultraneoliberal, que produziu um golpe parlamentar com apoio da mídia e de parte do judiciário, que derrubou uma presidenta legitimamente eleita, para implantar uma agenda que está acabando com os programas sociais, da reforma agrária e apoio a agricultura familiar, com a legislação de proteção aos trabalhadores/as e de combate ao trabalho escravo”, denunciou a vice-presidenta da CUT ao iniciar seu discurso na manhã desta uinta-feira (23), em Roma.
Carmen lembrou as leis recentemente criadas para facilitar a venda de terras a grupos estrangeiros e permitir a privatização da água, da produção agrícola, dos recursos naturais como o pré-sal abundantes em nosso país e do congelamento por 20 anos dos recursos para a saúde e educação, entre outras áreas atingidas pelas medidas tomadas pelos golpistas que usurparam a Presidência da República no ano passado.
“Retrocedemos quase 100 anos. Falta apenas revogação da Lei Àurea, que aboliu a escravidão no país em 1883!”, denunciou Carmen com indignação.
E criticou o uso dos avanços tecnológicos que “só servem para aumentar os lucros já obscenos das grandes corporações e o poder – dos empresários - de movimentar recursos por meio dos paraísos fiscais, sem pagar os devidos impostos aos países, que poderiam ser revertidos em benefícios para toda sociedade”.
Ela ressaltou que o progresso tecnológico trouxe avanços e conquistas como empregos, progressos científicos que melhoraram a qualidade de vida da humanidade, “mas a apropriação dos seus benefícios sempre foi desigual”. E citou pensamentos do Papa Francisco sobre o uso da política e da economia a serviço da vida, especialmente a vida humana, salientando que o movimento sindical do Brasil e do mundo concorda com Sua Santidade.
Em uma encíclica o Papa Francisco afirmou: “A política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia. (...) hoje precisamos imperiosamente que a política e a economia, em diálogo, se coloquem decididamente a serviço da vida, especialmente da vida humana”.
E é neste sentido que a CUT luta por um mundo melhor e para todos, com justiça e inclusão social, disse Carmen. Para ela, a defesa que o Papa faz dos direitos sociais fortalece a luta por um mundo melhor e mais justo, “um mundo capaz de proporcionar desenvolvimento sustentável, crescimento econômico, com distribuição de renda, inclusão e justiça social. Por um breve período de 13 anos pudemos experimentar e comprovar isso no Brasil”.
Carmen prosseguiu falando sobe a importância do avanço tecnológico ser incorporado à produção e ao cotidiano da população, garantindo benefícios aos trabalhadores/as e a sociedade, não apenas do dono da máquina ou da invenção, sugeriu pontos para pensar o futuro do mundo do trabalho, como você poderá ver na íntegra do discurso abaixo, e encerrou pedindo ajuda ao Papa na luta dos movimentos sociais e trabalhistas.
“Acredito que a Igreja Católica pode dar uma grande ajuda através de sua ampla rede espalhada em todos os países, contribuindo nesse processo de conscientização, mobilização, pressão e lutas que serão necessárias para a construção de um novo mundo com igualdade, justiça e inclusão social”, concluiu a vice-presidenta da CUT.
Integra do discurso:
Sua Eminência Cardeal Peter Turkson, Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral
Companheiros Sindicalistas,
Em 1891 o Papa Leão XIII publicou a encíclica Rerum Novarum (“Das Coisas Novas”) e abordou a questão da classe trabalhadora e os sindicatos.
Disse o Papa: “A sede de inovações, que há muito tempo se apoderou das sociedades e as tem numa agitação febril, devia, tarde ou cedo, envolver toda a sociedade (...) os progressos incessantes da indústria (...) a alteração das relações entre os operários e os patrões, a influência da riqueza nas mãos de um pequeno número ao lado da indigência da multidão (...) sem falar da corrupção dos costumes, deu resultado final um temível conflito”.
E acrescentou “... pouco a pouco, os trabalhadores, isolados e sem defesa, têm-se visto, com o decorrer do tempo, entregues à mercê de senhores desumanos e à cobiça duma concorrência desenfreada. A usura voraz veio agravar ainda mais o mal. (...). A tudo isto deve acrescentar-se o monopólio do trabalho e dos papéis de crédito, que se tornaram o quinhão dum pequeno número de ricos e de opulentos, que impõem assim um jugo quase servil à imensa multidão dos proletários”.
Passado mais de de século, quem lê pode pensar que o Papa está analisando a situação atual dos trabalhadores e das trabalhadoras do Brasil e do mundo.
Se é verdade que o progresso tecnológico trouxe mais empregos, progressos científicos, em especial na medicina que melhoraram a qualidade de vida da humanidade, também é verdade que a apropriação dos seus benefícios sempre foi desigual.
Só com muita pressão, negociação e muitas lutas – que inclusive custou a vida de milhares de trabalhadores e trabalhadoras – podemos dizer que ainda hoje apenas uma pequena parcela dos que estão organizados consegue usufruir de uma pequena parte desse progresso.
A globalização tecnocrática vem se dando sob a égide do mercado que busca a maximização dos lucros a qualquer preço, da concentração de renda, da retirada dos direitos dos trabalhadores/as em todo o mundo, da exploração irracional do meio ambiente e dos recursos naturais, condenando milhões de trabalhadores/as ao desemprego, a fome e a miséria tanto nos centros urbanos quanto nas áreas rurais.
Para esse mercado invisível, a globalização tecnológica só serve para aumentar os lucros já obscenos das grandes corporações e poder movimentá-los por meio dos paraísos fiscais, sem pagar os devidos impostos aos países, que poderiam ser revertidos em benefícios para toda sociedade.
No Brasil, orientados por essa sanha do mercado ultra neoliberal, se produziu um golpe parlamentar com apoio da mídia e de parte do judiciário, que derrubou uma presidenta legitimamente eleita, para implantar uma agenda que está acabando com os programas sociais, da reforma agrária e apoio a agricultura familiar, com a legislação de proteção aos trabalhadores/as e de combate ao trabalho escravo.
Aprovam leis que facilitam venda de terras a grupos estrangeiros e permitem a privatização da água e a produção agrícola a essas corporações transnacionais, sem falar dos recursos minerais abundantes em nosso país.
Com a privatização da exploração do petróleo localizado no pré-sal (grandes profundidades) bilhões de dólares oriundos dos royalties que seriam destinados para a educação (75%) e saúde (25%) vão desaparecer, ao mesmo tempo as empresas compradoras serão beneficiadas com bilhões de dólares em isenção fiscal.
Não satisfeitos, congelaram os investimentos do Estado em educação e saúde por 20 anos e querem acabar com a aposentadoria.
Retrocedemos quase 100 anos. Falta apenas revogação da Lei Àurea, que aboliu a escravidão no país em 1888!
Como bem constatou o Papa Francisco na Encíclica “Laudato Si” (“Louvado Sejas”):
“O paradigma tecnocrático tende a exercer o seu domínio também sobre a economia e a política. A economia assume todo o desenvolvimento tecnológico em função do lucro, sem prestar atenção a eventuais consequências negativas para o ser humano. Não se aprendeu a lição da crise financeira mundial...”.
Essa política tem a sua disposição um grande aparato midiático que tenta a todo custo convencer os cidadãos – algumas vezes com sucesso – de que o mercado, o simples crescimento econômico e as iniciativas individuais vão resolver os problemas da pobreza, da miséria e do meio ambiente.
É uma luta desigual, mas é preciso enfrentá-la para desmascarar o engodo que ela significa na prática.
“A política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia. (...) hoje precisamos imperiosamente que a política e a economia, em diálogo, se coloquem decididamente a serviço da vida, especialmente da vida humana. ” Afirma ainda o Papa Francisco.
O movimento sindical do Brasil, e creio que do mundo, concorda totalmente com Sua Santidade.
Acreditamos que um outro mundo é possível e que é capaz de proporcionar desenvolvimento sustentável, crescimento econômico, com distribuição de renda, inclusão e justiça social. Por um breve período de 13 anos pudemos experimentar e comprovar isso no Brasil.
Aos trabalhadores/as não interessa lutar contra o avanço tecnológico e sua incorporação na produção e no cotidiano. Mas garantir que o avanço tecnológico se reverta em benefício dos trabalhadores/as e da sociedade, não apenas do dono da máquina ou da invenção.
Para isso, gostaria de sugerir quatro pontos centrais para pensar o futuro do trabalho no mundo da globalização e do paradigma tecnocrático:
Primeiro, é preciso um grande investimento em educação, formação e conscientização para capacitar os trabalhadores para essa nova era. Os trabalhadores devem ser capazes de realizar as tarefas propriamente humanas e que não podem ser realizadas por uma máquina ou computador. As máquinas ficam obsoletas, mas não podemos admitir a obsolescência humana.
Segundo, os estados precisam ter políticas e programas voltados para incluir os trabalhadores que perderam seus postos de trabalho por causa do avanço tecnológico. A introdução de novas tecnologias não pode se dar ao custo do desemprego de milhares de homens e mulheres atingidos pelas inovações. Isso significa que a adoção de novas formas de produção não pode ser feita à revelia dos sindicatos e das comunidades que serão impactadas pelas mudanças. Para isso é preciso construir amplos processos de negociação e diálogo que levem ao bem comum e onde a sociedade sinta-se representada. As inovações devem contribuir para a melhoria dos empregos, das condições de vida e da construção de um novo ser humano.
Terceiro, precisamos garantir que a os benefícios da introdução de novas tecnologias não alimentem a desigualdade e a concentração de riqueza. O conhecimento atual não é obra apenas individual, mas social, fruto de milhares de anos de conhecimento acumulado da humanidade. A globalização tecnológica deve ser inclusiva e abrir novas perspectivas para os trabalhadores.
Quarto, é necessário um amplo diálogo entre o movimento sindical, para, juntamente com os movimentos sociais, comunitários e religiosos, comprometidos com essa proposta de desenvolvimento sustentável, inclusivo e solidário construirmos propostas globais, regionais, nacionais e locais que possam contribuir na conscientização e a mobilização necessária da maioria dos cidadãos que com muito trabalho e suor constroem verdadeiramente a riqueza das nações. Esse esforço conjunto é ainda mais necessário se levarmos em conta que aqueles que defendem o atual modelo excludente e impiedoso de exploração do meio ambiente, dos recursos naturais e dos trabalhadores/as, detém não apenas muito capital, como também os meios de comunicação com os quais procuram enganar a maioria da população.
Acredito que a Igreja Católica pode dar uma grande ajuda através de sua ampla rede espalhada em todos os países, contribuindo nesse processo de conscientização, mobilização, pressão e lutas que serão necessárias para a construção de um novo mundo com igualdade, justiça e inclusão social.
SOBRE A FALÁCIA RACISTA DO "DIA DA CONSCIÊNCIA HUMANA"
Ontem, Dia da Consciência Negra, voltou a onda de brancos e brancas e alguns negros e negras ricos de menosprezar a data, defendendo que deveria ser substituída pelo "Dia da Consciência Humana".
A proposta é ela própria expressão do racismo introjetado na sociedade brasileira e uma demonstração eloquente de seu caráter de classe.
Em primeiro lugar, é curioso que nunca tenhamos assistimos tal questionamento em outras datas. Não vemos ninguém propondo que o Dia de Nossa Senhora Aparecida seja substituído por um Dia de Todas as Nossas Senhoras, ou que o feriado do Natal seja abolido por ser uma festa cristã que exclui os ateus ou religiões de outras matrizes.
Significativamente, a implicância é só com a data que evoca o racismo.
O Dia que celebramos ontem existe para manter viva a consciência de que em mais da metade da história deste país uma parcela significativa da população (em algumas regiões a maioria) foi escravizada.
Não foi um evento medieval, dos "primeiros tempos". Aconteceu por 300 anos até pouco tempo atrás. Não nos esqueçamos: durante 300 anos negros e negras não eram considerados pessoas neste país; eram objeto, coisa, pertenciam a outrem, eram seres sem direitos, inferiores até aos animais. Apenas às vésperas do século 20 a escravidão foi abolida no Brasil e de tal maneira -negros e negras foram lançados à própria sorte sem qualquer apoio, suporte, indenização- que os efeitos da escravidão prolongaram-se anos a fio.
Na verdade, prolongam-se até hoje -e é disso que trata o Dia da Consciência Negra. Um nome alternativo para ele, apesar de longo, talvez fosse: Dia da Consciência De Que Os Efeitos da Escravidão Estão Presentes na Sociedade Brasileira Hoje.
Veja a fotomontagem postada originalmente pelo amigo José Luis Fevereiro. É esse o tema do Dia da Consciência Negra.
O Dia da Consciência Negra não é para congratularmo-nos por sermos bonzinhos e boazinhas (sinhozinhos e sinhazinhas), como a proposta do "Dia da Consciência Humana".
O Dia da Consciência Negra é para manter diante dos olhos as duas fotos abaixo e informações como as seguintes (que deveriam envergonhar o país e são motivo de luta para negros e negras e todos os pobres, todos os que têm fome de pão, justiça e paz):
- Um dado preliminar: os que se declaram negros, negras, pardos e pardas para o IBGE compõem 54% da população.
- Os negros são 71% das vítimas de homicídios.
- Um jovem negro é assassinado a cada 23 minutos.
- Quase 70% dos presos são negros.
- 3 em cada 4 pessoas dos mais pobres são negras.
- Nos bancos das universidades, apenas 12% são negros/negras.
- 2/3 dos desempregados do país são negros/negras.
- Negros e negras ganham o equivalente a metade da renda de brancos/brancas.
- Mais ainda: todos os dados relativos a renda e violência pioraram para negros e negras nos últimos dez anos.
O tal "Dia da Consciência Humana" é mais uma dessas invenções do racismo (às vezes) camuflado que vigora no país.
na foto de cima , formandos de medicina da UFRJ; na de baixo garis da Comlurb.O racismo explicito nas classes sociais da sociedade brasileira (José Luis Fevereiro)
Um dos traços definidores da mensagem de Jesus é a escolha de seus interlocutores. Ele não escolheu dialogar com reis, príncipes, chefes de governo, com os ricos. Sua escolha foi a da interlocução com os pobres, os marginalizados. O Sermão da Montanha é um momento culminante dessa escolha (Mt 5-7). Jesus subiu ao monte para falar à “multidão” de gente sem nada. Assim foi durante toda sua jornada de três anos. Examine-se a agenda de Francisco. É a essa mesma “multidão” que ele fala, com ela encontra-se, senta-se para partilhar o pão e a esperança.
Três encontros próximos são especialmente eloquentes quanto a essa escolha do Papa. No domingo (19), quando será celebrado o 1º Dia Mundial dos Pobres, instituído por ele, Francisco rezará a Missa com 4 mil deles, e almoçará com 1.500 em plena Sala Paulo VI (sacrilégio, gritarão os católicos conservadores, como o fizeram quando o Papa almoçou com um grupo de pessoas pobres na basílica de São Petrônio em Bolonha, em setembro).
No dia 24 de novembro, o Papa falará em Roma com sindicalistas do mundo inteiro reunidos num encontro promovido pelo Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, liderado pelo cardeal ganês Peter Turkson, o mesmo que é responsável do lado do Vaticano pelos Encontros Mundiais dos Movimentos Populares. A reunião com os sindicalistas ocorrerá sob o título O trabalho e o movimento dos trabalhadores no centro do desenvolvimento humano integral, sustentável e solidário.
Há uma conversa que será especialmente impactante, única. Em sua viagem ao Chile e Peru, em janeiro, Francisco irá à cidade peruana de Puerto Maldonado, encravada na Floresta Amazônica, para um encontro com lideranças dos povos indígenas da Amazônia, sem a presença de autoridades governamentais.
Esta agenda de Francisco é evidentemente inspirada pela de Jesus durante sua vida pública.
O brilhante intelectual espanhol Jorge Semprún, membro do Partido Comunista espanhol, preso em Paris pelos nazistas em 1943, violentamente torturado e deportado para o campo de concentração de Buchenwald, disse uma vez: “a cabeça pensa onde os pés pisam”. Francisco pisa no mesmo território de Jesus, a convivência com os descartados pelo sistema.
Preso no Zimbábue, frei brasileiro relata disputa de poder por diamantes
Franciscano Rodrigo Péret teve que deixar país rapidamente às vésperas de golpe militar
O Globo
POR HELOÍSA TRAIANO
RIO e UBERLÂNDIA — O frei franciscano brasileiro Rodrigo Péret viveu dias de tensão no Zimbábue às vésperas do golpe militar que, nesta semana, forçou o presidente Robert Mugabe a abandonar o poder e confinar-se na sua mansão na capital, Harare. Numa missão com mais dois brasileiros e outros 19 ativistas de sete países em favor das comunidades pobres que vivem da mineração no país africano, foi preso ao participar de um encontro com as famílias vítimas de remoções forçadas e um brutal massacre em 2008. Foi levado a uma cela precária e apertada, sob a acusação de ter entrado numa área de acesso restrito, mas sem explicações claras das autoridades, que controlam rigidamente a garimpagem de diamantes, um setor altamente lucrativo e exploratório em grande parte do território nacional, com forte influência chinesa.
Membro da Comissão Pastoral da Terra de Uberlândia, o frei atua ativamente a nível internacional pelos direitos das comunidades que vivem em zonas de garimpo. Seu trabalho é estudar os impactos dessa atividade nas populações locais, discutindo modelos comunitários e artesanais que possam surgir como alternativa à grande mineração. Chegou no dia 8 de novembro ao Zimbábue, país extremamente rico em pedras preciosas, numa missão ambiental da rede Diálogos dos Povos. Mas a visita de fato só durou dois dias: os ativistas foram presos durante um encontro com cerca de 2 mil membros da comunidade Mukwada, na região de Marange, onde se concentram campos de garimpo muito ricos em diamantes.
Em 27 de outubro de 2008, cerca de 1,3 mil famílias desta área, que trabalhavam em atividades de mineração artesanal, começaram a ser brutalmente removidas por forças do Exército, das Forças Armadas da Inteligência de Harare, na Operação Sem Retorno. Com nome bastante expressivo, a ação tornou-se um massacre que marcou a História regional. Foram 214 mortos em três semanas de brutalidade. O trabalho forçado, as remoções em massa e os abusos sexuais eram violações registradas diariamente. Segundo organizações internacionais, como a Human Rights Watch, as mulheres relatavam sofrer tratamentos altamente degradantes pela polícia. Elas eram obrigadas, por exemplo, a se despirem completamente, para que agentes homens inserissem os dedos nas suas genitálias, supostamente à procura de diamantes escondidos.
O grande objetivo da Operação Sem Retorno era destruir a resistência dos mineiros artesanais que ali viviam, considerados ilegais pelas autoridades, para proteger os interesses de exploração da Anjin Investiments e da Jinan Mining, subsidiárias da companhia chinesa Anhui Foreign Economic Construction Company (AFECC). Hoje em dia, no entanto, quem controla cerca de 50% do setor na região é o próprio governo do Zimbábue, através da Zimbabwe Consolidate Diamondbacks Company (em português, Companhia Consolidada de Diamantes do Zimbábue). A legislação nacional coloca nas mãos do presidente o comando sobre toda a atividade mineradora, enquanto o conceito de propriedade privada não existe para as comunidades.
E as relações entre China e Zimbábue são antigas. Durante a guerra contra o governo da Rodésia, dominado por brancos, o então líder rebelde Mugabe voltou-se para Pequim para obter apoio ao grupo militante da União Nacional Africana. Pequim e Harare estabeleceram formalmente relações diplomáticas no dia da independência do Zimbábue, 18 de abril de 1980. À medida que o isolamento internacional do africano cresceu ao longo dos anos, ele buscou ainda mais a ajuda chinesa.Em 2003, o Zimbábue buscava novos parceiros internacionais depois que as relações com a Europa foram dificultadas. A China logo dominou a nova política. Entre 2010 e 2015, o país asiático concedeu ao Zimbábue mais de 1 bilhão de dólares em empréstimos a juros baixos, e o governo retribuiu a ajuda ao tornar o yuan chinês sua moeda oficial.
No encontro com os ativistas da missão do frei Péret, em que o massacre de 2008 era relembrado com pesar pelo seu oitavo aniversário, chegaram autoridades para reprimir o evento comunitário. Com ele, estavam os também brasileiros Maria Julia Gomes Andrade e Jarbas Vieira, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), além de ativistas de países como Quênia, Uganda, África do Sul e Zâmbia.
— A mineração cria áreas de sacrifício. E, no Zimbábue, o país é praticamente todo uma grande área de sacrifício. Em Marange, eles reivindicavam o mínimo: o diálogo com o governo para que fosse criado um fundo comunitário para infra-estrututra básica. As indenizações individuais nem passam pela cabeças deles, porque existe uma perspectiva de vida comunal. Eles só querem energia, água, escola e um posto de saúde — diz o frei, relatando o encontro de que participou, interrompida por agentes de segurança: — Chegou a polícia da imigração, tentou atrapalhar a cerimônia e nos pediram os passaportes, que estavam regulares e com vistos de negócios. Então, a Inteligência de Mugabe assumiu, e fomos presos sem saber o motivo. Quando chegamos a Harare, soubemos que o nosso crime era ter ultrapassado um lugar restrito. Mas não estávamos nas áreas de extração de diamante. É uma área habitada, com uma aldeia de 6 mil pessoas.
DECLARAÇÃO DE CULPA
Depois de os 22 ativistas e os seus dois motoristas zimbabuanos passarem uma noite no cárcere em Harare — numa cela altamente precária, escura e cheia de homens entre 19 e 25 anos —, os membros da missão conseguiram ser libertados com a ajuda da embaixada brasileira e de advogados em favor dos direitos humanos. Numa audiência em tribunal, tiveram que se declarar culpados, para acelerar sua libertação e, em seguida, saída do Zimbábue. Cada um pagou US$ 100, por decisão do juíz. No entanto, os ativistas souberam que ainda estavam na mira da Inteligência, que queria prendê-los assim que saíssem da corte. Às pressas, conseguiram deixar o país em segurança.
A rápida saída veio quando o Zimbábue estava prestes a entrar numa grave crise política, em que os militares forçaram Mubage a deixar o poder e confinar-se na sua mansão residencial. Por dias, não houve confirmação oficial de onde estavam ele e sua esposa, a poderosa primeira-dama Grace Mugabe.
Até esta sexta-feira, o ditador apenas fez uma aparição pública, mas não está clara qual a sua situação política ou o seu futuro próximo. Segundo Péret, o clima no país durante sua estadia era pacífico, mas já rondavam diversos rumores sobre a iminente queda do presidente e especulações sobre as eleições gerais convocadas para 2018.
— Com tanta riqueza mineral e um governo autoritário, que controla a extração porque a própria legislação permite que tudo fique sob a tutela do presidente, a gente entende melhor o que acontece neste momento. Há, por trás, uma série de outros interesses, porque é muita riqueza. Por isso, é muito importante entender os impactos dessa atividade, que provoca conflitos na África inteira — explica.
Ao longo da Operação Lava Jato, tornou-se evidente a existência de uma aliança entre o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e a mídia, que fez a sua parte com uma cobertura espetaculosa, desprezando a presunção da inocência dos investigados e executando a divulgação seletiva das delações premiadas vazadas por procuradores ou delegados federais. Os veículos do grupo Globo foram parceiros especiais desta aliança, comparecendo com suas equipes na hora exata para documentar prisões e conduções coercitivas.
Até agora, o Ministério Público Federal fez silêncio absoluto sobre as revelações do empresário argentino Alejandro Burzaco a uma corte de Justiça de Nova York, apontando a TV Globo como um dos veículos que teriam pago propina para garantir exclusividade na compra de direitos de transmissão dos jogos da Copa Libertadores da América e da Copa Sulamericana de Futebol. Passado o feriado desta quarta-feira, a persistência do silêncio do Ministério Público sobre o assunto será suspeita, fortalecendo a percepção de que sua vigilância também é seletiva.
A TV Globo - que recentemente reestruturou toda a área de esportes, entregando seu comando a Roberto Marinho Neto, filho de José Roberto Marinho - negou as acusações, alegou a realização de sindicância interna que não encontrou irregularidades e colocou-se à disposição da justiça americana. Como todas as pessoas físicas e jurídicas, faz jus à presunção da inocência mas, agora, a situação exige que o assunto seja examinado também pelas autoridades nacionais. A situação complicou-se nesta quarta-feira com novo depoimento de Buzarco afirmando que a Globo participou de um esquema de propinas da ordem de US$ 15 milhões, o equivalente a R$ 50 milhões, para garantir a exclusividade nas transmissões das Copas de 2026 e 2030. Forneceu detalhes sobre a operação, que teria envolvido depósitos numa conta na Suíça em favor de um ex-dirigente da Fifa, Julio Grondona, já falecido.
A empresa de Buzarco teria sido intermediária do pagamento, segundo informação do site Buzzfeed, que tem feito a cobertura mais aguerrida do escândalo no futebol global, investigado pela justiça americana. Delatores mentem ou podem mentir, em busca de proteção judicial, não podendo suas delações ser tomadas como base para condenação. Mas aqui no Brasil, especialmente em relação a alvos do PT, a mídia em bloco, Globo incluída, sempre tomou as delações como base para condenações midiáticas antes do proferimento de sentença.
Outro elemento fundamental para o êxito da Lava Jato foi a cooperação internacional com autoridades judiciárias estrangeiras de combate à corrupção. Tanto o juiz Sergio Moro como o ex-procurador-geral Rodrigo Janot estabeleceram uma sólida aliança com juízes e procuradores dos Estados Unidos. Se o Ministério Público resolver demonstrar seu interesse pelo assunto, pode começar pedindo a cooperação da Justiça americana neste caso.
No tribunal do Brooklyn, em Nova York, terá seguimento nos próximos dias o julgamento da acusação de procuradores americanos, que acusam dirigentes mundiais de futebol de terem recebido R$ 500 milhões em propinas nas últimas décadas. Os procuradores brasileiros certamente vêm acompanhando o assunto. O que os silencia é o desconforto de ter que investigar um parceiro nacional tão estratégico, observando o devido processo legal, embora não o tenham feito em relação a muitos investigados da Lava Jato.
A utopia contra a escola racista, excludente e com partido
Primeira entrevistada do programa "Entre Vistas", da TVT, a secretária da Educação de Minas Gerais é intransigente na defesa da educação pública e da democracia, contra os retrocessos
por Redação RBApublicado 15/11/2017
REPRODUÇÃO/TVT
Família educa e a escola ensina. Para Macaé, esse debate é falacioso: 'A sociedade, a escola, as instituições, as pessoas, todos nós educamos e deseducamos'
São Paulo – Racismo, discriminação, inclusão social, o partido por trás da ideologia da Escola sem Partido, reforma do ensino médio, privatização e Emenda Constitucional (EC) 95/2016, que congela investimentos federais e prejudica o setor. Tudo isso, entre outros temas, foi abordado na noite de ontem (14) pela secretária estadual da Educação de Minas Gerais, Macaé Evaristo, durante entrevista no primeiro programa Entre Vistas, da TVT.
A partir de perguntas formuladas pela presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Marianna Dias, a diretora da Faculdade de Educação da PUC de São Paulo, Madalena Guasco Peixoto, a pedagoga Selma Rocha e o professor do Cursinho da Poli Gilberto Alvarez – com mediação da apresentadora Carol Pinho –, Macaé critica a decisão da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF).
No último dia 4, a ministra negou pedidos da Procuradoria Geral da República (PGR) e Advocacia Geral da União (AGU) para que redações do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) com teor considerado ofensivo aos direitos humanos pudessem ser zeradas.
“Da mesma maneira que você não aceita um erro de concordância, de gramática, acho péssimo poder aceitar que em uma prova do Enem a gente possa promover discursos de ódio, que ferem princípios constitucionais, principalmente em momento de cisão no tecido social brasileiro, como agora", disse. "Eu avalio essa medida deseducadora quando passamos a ser permissivos com esse tipo de narrativa e a gente volta à origem dessa matriz que estruturou o Estado brasileiro, racista, sexista, machista, excludente, que acha que tem cidadão de segunda categoria.”
Ela considera falacioso o debate sobre o papel da família, de educar, e da escola, de ensinar. "A sociedade, a escola, as instituições, as pessoas, a gente educa e deseduca, em ambientes educadores ou que deseducam. Por exemplo: uma criança aprende sobre racismo na escola. No ambiente familiar ela não tem consciência do racismo. O primeiro ambiente que ela vai conviver fora do ambiente doméstico que ela aprende que tem alguma coisa que a coloca em situação desigual a outras crianças. Então se a gente aprende sobre racismo na escola, a gente também pode aprender a respeitar as outras pessoas independentes da sua origem, raça, condição social, orientação sexual."
Século 19
Para a dirigente da Educação mineira, a EC 95 equivale a decretos do governo brasileiro do final do século 19, que impedia a escolarização de escravizados. E depois da Lei do Ventre Livre, um decreto que impedia a escolarização de negros libertos.
“Negros só poderiam ter educação se tivessem mais de 14 anos, se fosse no período noturno, e se o professor o aceitasse. Então, para mim, a Emenda 95 é tão destruidora como esses dois decretos, por levar nosso país de volta ao final do século 19. Excluir a maioria das nossas crianças, dos nossos jovens ao direito da educação”, disse.
Na avaliação de Macaé, a ideologia da chamada "Escola sem Partido", cujo debate avança pelo país, é a de uma escola com partido. "Não querem revelar, mas tem o lado da censura, do atraso, da opressão que se levanta contra um processo de democratização da educação que garantiu a entrada de crianças, jovens e adultos que haviam ficado de fora durante um bom tempo."
"É perversa porque usa da desinformação, faz um chavão que todo mundo acredita nisso – escola sem partido – mas a escola tem de saber da agenda e das pautas de todos os partidos e todos os movimentos. Não existe uma neutralidade a partir do desconhecimento. O direito de aprender está diretamente ligado a liberdade de ensinar e liberdade de pesquisa. Essa incursão, na verdade, é a mesma que estamos vendo de censura nas artes, a toda produção".
Primeira negra a ocupar uma secretaria estadual da Educação, Macaé é responsável pela contratação de 50 mil profissionais de educação e pela criação de um programa estadual discutido com alunos e professores para aumentar atividades extracurriculares em cultura, esportes, saúde, ciência, tecnologia, direitos humanos e educação profissional no ensino médio. Bem diferente do Ministério da Educação de Michel Temer, que "reformou" essa etapa do ensino sem ouvir o que pensa a comunidade.
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"Solidariedade exige resistência e tranquilidade", disse frei Rodrigo Péret após chegar em Uberlândia nesta segunda-feira (13). O membro da comissão da Pastoral da Terra integrava um grupo de ativistas que foi preso na última sexta-feira (10) na região de Marange, no Zimbábue. Acusadas de invasão de propriedade particular, 24 pessoas de oito países foram liberadas no sábado (11) mediante pagamento de uma fiança individual no valor de 100 dólares.
A prisão dos ativistas mobilizou entidades internacionais e a embaixada brasileira no fim de semana. O grupo fazia parte uma missão do movimento internacional de direitos humanos People's Dialogue (Diálogo dos Povos) e, segundo frei Rodrigo, só soube o que motivou as detenções quando chegou de camburão na delegacia de Mutare, a 270 km da capital Harare.
"Foi uma surpresa porque tínhamos autorização para estar naquela área, que é uma área de mineração onde vivem mais de 6 mil famílias", explica o frei. "A polícia de imigração pediu para ver nossos documentos e nos levou para a delegacia. Percebemos que estavam procurando fazer as coisas de uma forma legal. Uma situação como essa é claro que nos causa medo, mas a busca pela legalidade era um sinal de que as pressões [externas] estavam surtindo efeito."
Fim de semana de tensão
Do Brasil, além do frei, também foram detidos os membros do Movimento de Atingidos pela Mineração, Maria Júlia Gomes de Andrade e Jarbas Vieira. Frei Rodrigo relata que a missão estava há dois dias no Zimbábue quando o incidente aconteceu. Depois de passarem a noite de sexta para sábado em celas, houve uma audiência no tribunal local.
Quatro advogados representaram o grupo, que foi orientado a se declarar culpado de invadir uma propriedade particular. "A estratégia era nos tirar dali o mais rápido possível. Se fôssemos contestar a aplicação do crime, poderia gerar um processo mais longo. Nós todos assumimos a culpa, mas o juiz acolheu o argumento da defesa que a área possui uma situação ambígua- não tinha placa que a identificasse como propriedade particular e há moradores no local. Como pena, poderíamos ficar cinco dias presos ou pagar 100 dólares por pessoa."
De Mutare, o grupo seguiu para a capital do Zimbábue, Harare, e, de lá, foi levado para a capital da África do Sul, Johanesburgo. Frei Rodrigo embarcou ainda no domingo para São Paulo. Ele chegou em Uberlândia por volta de 0h30 desta segunda-feira.
Preocupação
Na noite do último sábado (11), o frei de Uberlândia fez um comunicado à imprensa por e-mail relatando a situação vivida no país africano.
"Enquanto participávamos de um encontro com 2.000 pessoas na região de Marange, cuja pauta era a discussão sobre os impactos da atividade mineraria de diamante na área e a criação de um fundo comunitário para a melhoria das condições de vida das comunidades atingidas. Todos os estrangeiros foram presos logo no início do encontro, no começo da tarde do dia 10. Fomos conduzidos para o posto policial de Marange. De lá, levados para a Delegacia Central de Polícia de Mutare, onde fomos fichados e encarcerados", escreveu o frei.
No texto, o religioso ainda relatou o receio dos ativistas em deixarem o Zimbábue. "Nos preocupam a segurança e integridade físicas das mesmas [...]. A conjuntura é delicada e exige que se mantenha a mobilização e solidariedade internacional até a finalização total da situação”, diz em outro trecho do texto.
Em entrevista nesta segunda-feira, frei Rodrigo explicou que a preocupação dele e dos demais ativistas é com a situação de colegas de missão que moram no Zimbábue. Segundo ele, o país africano vive uma grave crise política e econômica.
Em relato à Rádio Vaticano, Fr. Rodrigo Peret, da Comissão Pastoral da Terra de Uberlândia, falou do dia que passaram na prisão e manifesta seu agradecimento a advogados, diplomatas e autoridades eclesiásticas, pela assistência e resolução do caso.
Fr. Péret faz um convite aos ouvintes do Programa Brasileiro, para que continuem a manifestar solidariedade, apoiando as famílias que sofrem os impactos da mineração “O povo fica na miséria, com a destruição do meio ambiente. Todos temos a responsabilidade de cuidar da nossa casa comum.”
Fr. Rodrigo recorda ainda que uma jovem inglesa pertencente ao grupo ainda está detida no Zimbábue.
Ouça aqui:
Comunicado do Frei: Graças a Deus fomos todos liberados eu já me encontro em Uberlândia. Maria Julia e o Jarbas Vieira, ambos do MAM, já chegaram também ao Brasil. Éramos um grupo, em uma missão de solidariedade, de 24 pessoas, 8 países, promovida pela Rede Diálogo dos Povos (África - América Latina). Conhecer e experimentar o cárcere de um país como o Zimbábue, não é coisa simples. Mas a solidariedade exige muita resistência. Um país tão rico em minerais, onde nada fica para o povo é um desafio para nossa consciência humana e cristã. Essa situação revela a triste realidade da mineração, pelo mundo afora. A situação política do Zimbabué é grave, a economia em colapso e uma grande pobreza. Convidamos a todos a nos solidarizarmos com esse povo sofrido. Tudo que possamos fazer é muito pouco. Obrigado pelo apoio de vocês. Um fraterno abraço de Paz e Bem!