da Carta Maior
Mello abre a boca porque o silêncio apenas fortaleceu a prática de Gilmar de fazer política de toga.
Maria Inês Nassif
O ministro Marco Aurélio Mello não merece o reconhecimento apenas por suas manifestações equilibradas numa conjuntura política facilmente sujeita à combustão, mas porque se dispôs a dar a cara a bater para libertar o Supremo Tribunal Federal (STF) das armadilhas que são colocadas diuturnamente ao Judiciário pelo ministro Gilmar Mendes, pela oposição e pela mídia.
O STF, desde o escândalo do chamado mensalão, por ação ou omissão de seus integrantes, tem sido um importante instrumento a serviço de forças políticas de moralidade e intenções democráticas duvidosas.
Por conveniência dos grupos que instrumentalizam o STF, à parcela dos ministros que se opõe ao uso político do Judiciário é exigida a discrição dos juízes, enquanto Mendes reina, sozinho, junto à opinião pública, para corroborar teses e, sem constrangimentos, dar ganhos de causa a determinados partidos políticos independentemente da justeza jurídica de seus pleitos.
Mello se rebelou contra essa lógica. Está deixando claro a quem quer ouvir que Gilmar Mendes não é o Supremo; e que, para alívio dos democratas do país, existem ministros que não pensam como o ex-procurador geral da República do governo do PSDB. Que, enfim, existem ministros do STF que pensam como ministros do STF.
Ao que tudo indica, Mello resolveu não aceitar mais a instrumentalização do Supremo por determinadas forças políticas. Entendeu que existe um limite muito claro que a Corte, por ação ou omissão, não pode transpor: a democracia. É ela que está ameaçada quando a maior instância do Judiciário não garante a todos, sem distinção, o direito à Justiça. E, a bem da democracia, os ministros do STF não podem se curvar a chantagens, ameaças ou simplesmente ao desejo de reconhecimento público.
Ao expor suas opiniões às claras, para quem quiser ouvir, Mello não inventa a roda. Na verdade, apenas lança mão de uma estratégia usada à exaustão por Gilmar Mendes desde que este se tornou ministro do Supremo, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Ao sair a público para contestar argumentos montados por forças políticas, como se jurídicos fossem, e propagados por uma máquina midiática com recursos de marketing, Mello tenta evitar que o STF sirva ao golpe institucional que se prepara contra a presidenta Dilma Rousseff. Ele está certíssimo. Não há nenhum conforto na perspectiva de tornar-se, por omissão, um instrumento de forças políticas que querem derrubar um governo legítimo.
O jogo de Mendes tem sido continuadamente o seguinte: em momentos decisivos, ele entra em cena e faz um discurso agressivo na defesa dos interesses da oposição aos governos petistas (antes disso, prestava-se a apoiar assuntos de interesse do governo FHC). Assim, avaliza juridicamente teses de claro viés partidário, com o devido apoio da mídia. Internamente, mantém alguns ministros sob a sua órbita de influência. Alguns deles são incondicionalmente leais ao chefe e o acompanham mesmo nas suas mais absurdas manifestações e votos.
Aos que a Mendes se opõem, é cobrada a posição equidistante do juiz. Quando aceitam isso, os ministros que são efetivamente juízes ficam enfraquecidos porque deixam Gilmar Mendes livre para atuar – às claras e também nas sombras – para constituir maiorias que tomam decisões no mínimo questionáveis, como a de condenar sem provas, por “domínio do fato”. Quando se submetem à lógica de que a Gilmar Mendes tudo é permitido, mas eles devem ficar calados, deixam a Corte ser contaminada por chantagens ou interesses políticos.
A parcela dos ministros que admiravelmente insistem em ser juízes, enquanto Mendes coloca o STF a serviço da política oposicionista, têm deixado a Corte ser engolida por manobras políticas internas por medo de expor a instituição à opinião pública e desmoralizá-la. A tentativa de preservar a imagem do Supremo pelo silêncio, todavia, além de ter feito muitas vítimas – condenações e decisões que a história julgará não necessariamente a favor da Corte – é um engano. A instituição não pode controlar os fatos. Agora, por exemplo, o vazamento da lista de clientes da empresa de advocacia Mossack Fonseca, especializada em montar offshores para lavar dinheiro ou com o objetivo de sonegação de impostos, expõe o seu ex-presidente Joaquim Barbosa. Se os ministros do STF que são juízes não reagirem à partidarização do Judiciário, a chance desse vexame se repetir é enorme. O silêncio deixa a Corte vulnerável a práticas condenáveis da política que a Justiça teoricamente quer extirpar da vida do país.
Por isso o ministro Marco Aurélio Mello deve ser aplaudido. Ele desafiou o silêncio do Supremo exatamente porque insiste em ser juiz. O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, continua a fazer política com a sua toga.
O STF, desde o escândalo do chamado mensalão, por ação ou omissão de seus integrantes, tem sido um importante instrumento a serviço de forças políticas de moralidade e intenções democráticas duvidosas.
Por conveniência dos grupos que instrumentalizam o STF, à parcela dos ministros que se opõe ao uso político do Judiciário é exigida a discrição dos juízes, enquanto Mendes reina, sozinho, junto à opinião pública, para corroborar teses e, sem constrangimentos, dar ganhos de causa a determinados partidos políticos independentemente da justeza jurídica de seus pleitos.
Mello se rebelou contra essa lógica. Está deixando claro a quem quer ouvir que Gilmar Mendes não é o Supremo; e que, para alívio dos democratas do país, existem ministros que não pensam como o ex-procurador geral da República do governo do PSDB. Que, enfim, existem ministros do STF que pensam como ministros do STF.
Ao que tudo indica, Mello resolveu não aceitar mais a instrumentalização do Supremo por determinadas forças políticas. Entendeu que existe um limite muito claro que a Corte, por ação ou omissão, não pode transpor: a democracia. É ela que está ameaçada quando a maior instância do Judiciário não garante a todos, sem distinção, o direito à Justiça. E, a bem da democracia, os ministros do STF não podem se curvar a chantagens, ameaças ou simplesmente ao desejo de reconhecimento público.
Ao expor suas opiniões às claras, para quem quiser ouvir, Mello não inventa a roda. Na verdade, apenas lança mão de uma estratégia usada à exaustão por Gilmar Mendes desde que este se tornou ministro do Supremo, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Ao sair a público para contestar argumentos montados por forças políticas, como se jurídicos fossem, e propagados por uma máquina midiática com recursos de marketing, Mello tenta evitar que o STF sirva ao golpe institucional que se prepara contra a presidenta Dilma Rousseff. Ele está certíssimo. Não há nenhum conforto na perspectiva de tornar-se, por omissão, um instrumento de forças políticas que querem derrubar um governo legítimo.
O jogo de Mendes tem sido continuadamente o seguinte: em momentos decisivos, ele entra em cena e faz um discurso agressivo na defesa dos interesses da oposição aos governos petistas (antes disso, prestava-se a apoiar assuntos de interesse do governo FHC). Assim, avaliza juridicamente teses de claro viés partidário, com o devido apoio da mídia. Internamente, mantém alguns ministros sob a sua órbita de influência. Alguns deles são incondicionalmente leais ao chefe e o acompanham mesmo nas suas mais absurdas manifestações e votos.
Aos que a Mendes se opõem, é cobrada a posição equidistante do juiz. Quando aceitam isso, os ministros que são efetivamente juízes ficam enfraquecidos porque deixam Gilmar Mendes livre para atuar – às claras e também nas sombras – para constituir maiorias que tomam decisões no mínimo questionáveis, como a de condenar sem provas, por “domínio do fato”. Quando se submetem à lógica de que a Gilmar Mendes tudo é permitido, mas eles devem ficar calados, deixam a Corte ser contaminada por chantagens ou interesses políticos.
A parcela dos ministros que admiravelmente insistem em ser juízes, enquanto Mendes coloca o STF a serviço da política oposicionista, têm deixado a Corte ser engolida por manobras políticas internas por medo de expor a instituição à opinião pública e desmoralizá-la. A tentativa de preservar a imagem do Supremo pelo silêncio, todavia, além de ter feito muitas vítimas – condenações e decisões que a história julgará não necessariamente a favor da Corte – é um engano. A instituição não pode controlar os fatos. Agora, por exemplo, o vazamento da lista de clientes da empresa de advocacia Mossack Fonseca, especializada em montar offshores para lavar dinheiro ou com o objetivo de sonegação de impostos, expõe o seu ex-presidente Joaquim Barbosa. Se os ministros do STF que são juízes não reagirem à partidarização do Judiciário, a chance desse vexame se repetir é enorme. O silêncio deixa a Corte vulnerável a práticas condenáveis da política que a Justiça teoricamente quer extirpar da vida do país.
Por isso o ministro Marco Aurélio Mello deve ser aplaudido. Ele desafiou o silêncio do Supremo exatamente porque insiste em ser juiz. O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, continua a fazer política com a sua toga.
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