Doria e o nazismo na Cracolândia
Por Aldo Fornazieri, no Jornal GGN:
Em nome do combate ao tráfico de drogas, da cidade linda e da reurbanização da região da Luz, o prefeito Dória, com o apoio do governo do Estado, desencadeou um verdadeiro pogrom na região da Cracolândia. Pogrom é um termo de origem russa nascido para designar as ações de massacres contra judeus no século XIX. Mas o termo se generalizou e designa ações violentas (assassinatos, expulsões e agressões) praticadas pelo Estado, por forças policiais ou paramilitares contra grupos sociais ou étnicos específicos.
O pogrom oficial de Dória não chegou a tanto, mas teve dispersão de uma comunidade de doentes e dependentes químicos, várias bombas, agressão policial, lojas fechadas, pessoas despejadas, derrubada de casas sobre moradores, interdição de áreas com uso de força armada, trabalhadores e crianças saindo apenas com a roupa do corpo e pessoas proibidas de entrar em suas próprias casas. Expressando a ideologia típica da elite branca dos Jardins, o prefeito Dória mostrou-se valente contra doentes e moradores de rua e, no alto da sua arrogância, decretou, por ato de vontade, o fim da Cracolândia para todo o sempre. Governar por atos de vontade e ao arrepio da lei é uma conduta típica dos totalitários de todos os tipos e do nazismo em particular.
Com os sucessivos desastres na Cracolândia ao longo da semana, a fama de bom gestor de Dória virou pó, provocando, inclusive, a demissão de sua Secretária de Direitos Humanos que classificou a operação de "desastrosa". O manual de arrogância e violência de Dória contrasta com todas as recomendações internacionais, técnicas e médicas que são taxativas em afirmar que a questão da dependência química é uma questão de saúde pública e não uma questão policial ou criminal. O grande gestor insurgiu-se contra a prudência desse consenso do bom senso. O resultado foi a criação de várias cracolândias e de uma nova Cracolândia, ainda maior, na Praça Princesa Isabel.
O outro quase consenso contra o qual Dória se insurgiu é o de que a estratégia da Guerra às Drogas fracassou. Estudos e a experiência internacional mostram que a Guerra às Drogas, até agora, proporcionou gastos de trilhões de dólares e atingiu principalmente pequenos produtores, traficantes intermediários e os consumidores. Na ação espetaculosa do prefeito contra a Cracolândia foram presos 38 traficantes e apreendidas algumas armas. O que consta é que nenhum desses presos é um grande traficante, um chefe do tráfico em São Paulo. Ou seja, os extraordinários gestores de São Paulo estão enxugando gelo.
Não satisfeito com o desastre de sua violência contra doentes indefesos, o prefeito quis ir mais longe no seu autoritarismo. Anunciou internações forçadas de dependentes químicos e buscou o respaldo na Justiça para perpetrar este ato contra a liberdade das pessoas e contra os direitos civis de doentes. Um juiz, cuja qualificação é inominável, concedeu o aval para o arbítrio, mas logo derrubado pelo desembargador Reinaldo Miluzzi. Em seu despacho o desembargador afirma que o pedido da prefeitura é "impreciso, vago e amplo e, portanto, contrasta com os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, porque concede à municipalidade carta branca para eleger quem é a pessoa em estado de drogadição vagando pelas ruas de São Paulo". Ou seja, o desembargador compreendeu o caráter arbitrário emboscado na petição da prefeitura. Além disso, ele suspendeu o sigilo judicial do pedido, pois isto fere o mais elementar princípio democrático que é o da publicidade e transparência dos atos dos agentes públicos.
Um prefeito contra a cidade
Como se sabe, o consenso médico, técnico e jurídico admite a internação compulsória em casos especiais e com medidas adequadas, sempre a partir de uma abordagem e avaliação individualizadas do dependente. Dória se insurge contra este consenso, não por conta de erro ou de não compreensão das circunstâncias, mas pelo capricho autoritário de querer fazer valer a sua vontade. Vontade que, no caso da Cracolândia, mistura ideologia autoritária, rejeição aos pobres e moradores de rua, racismo, interesses econômicos, especulação imobiliária e pressa em se projetar nacionalmente em face de sua aspiração de ser candidato à presidente da República no próximo ano.
Várias das principais ações de Dória até o momento mostram que ele governa contra a cidade. No caso da Cracolândia, esta sucessão de erros, este ataque ao bom senso e à prudência, são demonstrações de desumanidade e de falta de piedade para com aqueles que precisam de ajuda em face de sua desgraça. O prefeito mandou cortar parte do programa Leve Leite, um programa suprapartidário, pois foi criado por Maluf e mantido por Pitta, Marta, Serra Kassab e Haddad. Da mesma forma, a Virada Cultural, tal como vinha sendo editada, abrigava um consenso suprapartidário, pois os últimos prefeitos, independentemente de partidos, mantinham o mesmo formato. Em sua fúria destruidora, a gestão Dória a modificou, resultando num fracasso.
No seu excesso de esperteza, o prefeito vem fazendo o seguinte: rebatiza programas de gestões anteriores como se fossem novos e paralisa os programas anteriores sem tirar do papel aqueles rebatizados. Vive mais em eventos, festividades, em viagens para Dubai, Seul, Europa e Estados Unidos para promover negócios privados enquanto abandona a cidade à sua própria sorte. Semáforos apagados, buracos nas ruas, lixo espalhado, falta de zeladoria, hospitais municipais sem remédios e leitos, trânsito cada vez mais lento é o que não falta.
Dória não está fundamentalmente focado em governar a cidade de São Paulo. Quer ser presidente. Para isso, busca criar um culto em torno de si. Quer conquistar devotos a partir da imagem de que ele é um grande gestor, um grande transformador. Faz promessas grandiosas, anuncia programas mirabolantes, zera filas, acaba com Cracolândias, faz e desfaz a cidade. A dor, o desemprego, a trágica desgraça dos drogados e dos moradores de rua, as horas perdidas no trânsito, o crescimento das mortes nas marginais, tudo se transforma em "cidade linda" sem que nada aconteça e mesmo que as condições da cidade piorem. Com esse passe de mágica, os devotos crescem, principalmente fora de São Paulo.
Dória inventa títulos entusiasmados para programas que não existem, anuncia o começo e o fim de tudo, sem que nada mude, usa palavras envernizadas para ações que não são nem explicadas e nem detalhadas. No seu manual, ensina-se que é preciso combinar promessas vagas com conceitos nebulosos mas atraentes, tudo embrulhado no entusiasmo ardente da demagogia. Se algo sair errado, Dória se retira de campo e terá sempre um secretário, um auxiliar ou um inimigo como bodes expiatórios.
Para Dória não importa a dor da família dos drogados, não importa o vazio da alma do dependente químico, não importa da desgraça do morador de rua, não importam as atribulações dos trabalhadores, não importam as angústias dos desempregados, não importam a falta do pão e do leite para as crianças. Tudo isto é coisa feita, que atrai mais desgraça. O que importa para ele é o brilho do poder pelo poder, as luzes das festas, a fama da celebridade, o arrogante conforto da riqueza. Dória é o mais lídimo representante da ideologia perversa da elite branca dos Jardins. Esta mesma ideologia que interdita diretos, hipoteca o futuro do povo e condena o Brasil a um passado eterno de iniquidades e injustiças.
Em nome do combate ao tráfico de drogas, da cidade linda e da reurbanização da região da Luz, o prefeito Dória, com o apoio do governo do Estado, desencadeou um verdadeiro pogrom na região da Cracolândia. Pogrom é um termo de origem russa nascido para designar as ações de massacres contra judeus no século XIX. Mas o termo se generalizou e designa ações violentas (assassinatos, expulsões e agressões) praticadas pelo Estado, por forças policiais ou paramilitares contra grupos sociais ou étnicos específicos.
Essas ações transitam desde massacres e extermínios até a dispersão e o desalojamento geográfico desses grupos vitimizados. O nazismo usou os pogroms em larga escala. O pogrom nazista mais famoso é conhecido como "A Noite dos Cristais", ocorrido em 1938, no qual foram queimadas sinagogas, judeus assassinados, lojas saqueadas e destruídas, tudo com o beneplácito do Estado nazista.
O pogrom oficial de Dória não chegou a tanto, mas teve dispersão de uma comunidade de doentes e dependentes químicos, várias bombas, agressão policial, lojas fechadas, pessoas despejadas, derrubada de casas sobre moradores, interdição de áreas com uso de força armada, trabalhadores e crianças saindo apenas com a roupa do corpo e pessoas proibidas de entrar em suas próprias casas. Expressando a ideologia típica da elite branca dos Jardins, o prefeito Dória mostrou-se valente contra doentes e moradores de rua e, no alto da sua arrogância, decretou, por ato de vontade, o fim da Cracolândia para todo o sempre. Governar por atos de vontade e ao arrepio da lei é uma conduta típica dos totalitários de todos os tipos e do nazismo em particular.
Com os sucessivos desastres na Cracolândia ao longo da semana, a fama de bom gestor de Dória virou pó, provocando, inclusive, a demissão de sua Secretária de Direitos Humanos que classificou a operação de "desastrosa". O manual de arrogância e violência de Dória contrasta com todas as recomendações internacionais, técnicas e médicas que são taxativas em afirmar que a questão da dependência química é uma questão de saúde pública e não uma questão policial ou criminal. O grande gestor insurgiu-se contra a prudência desse consenso do bom senso. O resultado foi a criação de várias cracolândias e de uma nova Cracolândia, ainda maior, na Praça Princesa Isabel.
O outro quase consenso contra o qual Dória se insurgiu é o de que a estratégia da Guerra às Drogas fracassou. Estudos e a experiência internacional mostram que a Guerra às Drogas, até agora, proporcionou gastos de trilhões de dólares e atingiu principalmente pequenos produtores, traficantes intermediários e os consumidores. Na ação espetaculosa do prefeito contra a Cracolândia foram presos 38 traficantes e apreendidas algumas armas. O que consta é que nenhum desses presos é um grande traficante, um chefe do tráfico em São Paulo. Ou seja, os extraordinários gestores de São Paulo estão enxugando gelo.
Não satisfeito com o desastre de sua violência contra doentes indefesos, o prefeito quis ir mais longe no seu autoritarismo. Anunciou internações forçadas de dependentes químicos e buscou o respaldo na Justiça para perpetrar este ato contra a liberdade das pessoas e contra os direitos civis de doentes. Um juiz, cuja qualificação é inominável, concedeu o aval para o arbítrio, mas logo derrubado pelo desembargador Reinaldo Miluzzi. Em seu despacho o desembargador afirma que o pedido da prefeitura é "impreciso, vago e amplo e, portanto, contrasta com os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, porque concede à municipalidade carta branca para eleger quem é a pessoa em estado de drogadição vagando pelas ruas de São Paulo". Ou seja, o desembargador compreendeu o caráter arbitrário emboscado na petição da prefeitura. Além disso, ele suspendeu o sigilo judicial do pedido, pois isto fere o mais elementar princípio democrático que é o da publicidade e transparência dos atos dos agentes públicos.
Um prefeito contra a cidade
Como se sabe, o consenso médico, técnico e jurídico admite a internação compulsória em casos especiais e com medidas adequadas, sempre a partir de uma abordagem e avaliação individualizadas do dependente. Dória se insurge contra este consenso, não por conta de erro ou de não compreensão das circunstâncias, mas pelo capricho autoritário de querer fazer valer a sua vontade. Vontade que, no caso da Cracolândia, mistura ideologia autoritária, rejeição aos pobres e moradores de rua, racismo, interesses econômicos, especulação imobiliária e pressa em se projetar nacionalmente em face de sua aspiração de ser candidato à presidente da República no próximo ano.
Várias das principais ações de Dória até o momento mostram que ele governa contra a cidade. No caso da Cracolândia, esta sucessão de erros, este ataque ao bom senso e à prudência, são demonstrações de desumanidade e de falta de piedade para com aqueles que precisam de ajuda em face de sua desgraça. O prefeito mandou cortar parte do programa Leve Leite, um programa suprapartidário, pois foi criado por Maluf e mantido por Pitta, Marta, Serra Kassab e Haddad. Da mesma forma, a Virada Cultural, tal como vinha sendo editada, abrigava um consenso suprapartidário, pois os últimos prefeitos, independentemente de partidos, mantinham o mesmo formato. Em sua fúria destruidora, a gestão Dória a modificou, resultando num fracasso.
No seu excesso de esperteza, o prefeito vem fazendo o seguinte: rebatiza programas de gestões anteriores como se fossem novos e paralisa os programas anteriores sem tirar do papel aqueles rebatizados. Vive mais em eventos, festividades, em viagens para Dubai, Seul, Europa e Estados Unidos para promover negócios privados enquanto abandona a cidade à sua própria sorte. Semáforos apagados, buracos nas ruas, lixo espalhado, falta de zeladoria, hospitais municipais sem remédios e leitos, trânsito cada vez mais lento é o que não falta.
Dória não está fundamentalmente focado em governar a cidade de São Paulo. Quer ser presidente. Para isso, busca criar um culto em torno de si. Quer conquistar devotos a partir da imagem de que ele é um grande gestor, um grande transformador. Faz promessas grandiosas, anuncia programas mirabolantes, zera filas, acaba com Cracolândias, faz e desfaz a cidade. A dor, o desemprego, a trágica desgraça dos drogados e dos moradores de rua, as horas perdidas no trânsito, o crescimento das mortes nas marginais, tudo se transforma em "cidade linda" sem que nada aconteça e mesmo que as condições da cidade piorem. Com esse passe de mágica, os devotos crescem, principalmente fora de São Paulo.
Dória inventa títulos entusiasmados para programas que não existem, anuncia o começo e o fim de tudo, sem que nada mude, usa palavras envernizadas para ações que não são nem explicadas e nem detalhadas. No seu manual, ensina-se que é preciso combinar promessas vagas com conceitos nebulosos mas atraentes, tudo embrulhado no entusiasmo ardente da demagogia. Se algo sair errado, Dória se retira de campo e terá sempre um secretário, um auxiliar ou um inimigo como bodes expiatórios.
Para Dória não importa a dor da família dos drogados, não importa o vazio da alma do dependente químico, não importa da desgraça do morador de rua, não importam as atribulações dos trabalhadores, não importam as angústias dos desempregados, não importam a falta do pão e do leite para as crianças. Tudo isto é coisa feita, que atrai mais desgraça. O que importa para ele é o brilho do poder pelo poder, as luzes das festas, a fama da celebridade, o arrogante conforto da riqueza. Dória é o mais lídimo representante da ideologia perversa da elite branca dos Jardins. Esta mesma ideologia que interdita diretos, hipoteca o futuro do povo e condena o Brasil a um passado eterno de iniquidades e injustiças.