terça-feira, 25 de junho de 2019

Glenn Greenwald na Comissão da Câmara dos Deputados ao vivo

Assista AO VIVO | Glenn Greenwald participa de audiência sobre a #VazaJato na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados; acompanhe:

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LENIO STRECK: PROMISCUIDADE ENTRE JUIZ E PROCURADOR NÃO É NORMAL!


Do ConJur

Não, não é “normal” a promiscuidade entre juiz e parte. Não é, mesmo!

por Lenio Luiz Streck

Benjamin Franklin dizia: “A cada minuto, a cada hora, a cada dia, estamos na encruzilhada, fazendo escolhas. Escolhemos os pensamentos que nos permitimos ter, as paixões que nos permitimos sentir, as ações que nos permitimos fazer. Cada escolha é feita no contexto do sistema de valores que elegemos. Elegendo esse sistema, estamos também fazendo a escolha mais importante de nossas vidas”.
Na semana passada, ainda no calor dos acontecimentos, falei em diversos veículos que o Direito brasileiro já não seria mais o mesmo: DAI-DDI (Direito Antes de Intercept – Direito Depois de Intercept). Mantenho o que disse. Mas, como disse Ben Franklin, estamos na encruzilhada.
Então é hora de escolher. A mudança será para pior ou para melhor? Qual é o sistema que vai guiar nossas escolhas a partir daqui? Será o atropelo da legalidade e seu consequencialismo ad hoc? Como serão vistos, a partir de agora, a Constituição, o CPP, seus princípios e garantias? Escolheremos, afinal, o Direito ou a barbárie?
Tudo vai depender de algumas coisas como: acha(re)mos normal que juiz não tenha imparcialidade? Concorda(re)mos que juiz possa ser acusador? Juiz pode “comandar” o atuar do MP?
Nossas respostas decidirão o futuro do Direito no Brasil. E, atenção: não esqueçamos que vivemos sob a febre de que temos um sistema de precedentes. Pois se ficar decidido que juiz que fez tudo o que fez Moro é um “juiz normal e legal”, então, pelo precedente que daí exsurgirá, todos os juízes poderão fazer o mesmo. E os membros do Ministério Público também poderão fazer o mesmo que Dallagnol. Eis a escolha: Estado de Direito ou Estado à margem do Direito[1].
Não se pode tapar o sol com uma peneira. Jornalistas e jornaleiros (assim como incontáveis juristas, como, por todos, Marcelo NobreÉrica GorgaJuarez TavaresLeonardo Yarochewsky e o contundente artigo de Miguel Weddy no jornal Zero Hora, intitulado “A Linha”) já sabem de tudo. No âmbito do jornalismo, basta ler de Reinaldo Azevedo a Pompeu de Toledo, passando por Jânio de Freitas, Dora Kramer, Élio Gaspari… Todos reconhecem e apontam o agir ilegal de Moro e Dallagnol[2]. Ou toda essa gente está equivocada, fazendo parte de uma espécie de conspiração?
E a trama é maior do que os vazamentos indicam, pois já se via no agir de Janot (enquanto houver bambu, vai flecha, lembram?) quando à testa do CNMP e PGR, dando a Dallagnol a mesma proteção que o CNJ, o TRF-4 e o STF deram ao agir de Moro (lembremos do episódio da divulgação das escutas telefônicas de Lula e Dilma, que, como se pode ver, o vazamento foi fruto de combinação de Moro e Dallagnol, dando para ler Moro dizendo: “não me arrependo de ter divulgado”, enquanto pedia desculpas insinceras em longa carta escrita ao STF).
Alguém, depois de tudo, ainda tem dúvida de que o agir (estratégico) de Moro e Dallagnol, enfim, da “lava jato” como um todo, foi um exercício de lawfare, o uso político do Direito contra inimigos? E veja-se que isso era tão cuidadosamente planejado a ponto de não querer que amigos fossem melindrados (Intercept de 18/6). E o procurador chega a dizer que a investigação contra FHC — considerada, por Moro, como a possibilidade de melindre de um amigo — era só para demonstrar imparcialidade.
Como disse Élio Gaspari, Moro e Dallagnol se autoenganam, assim como aqueles que não querem enxergar o conjunto de ilegalidades praticadas. Um “magnífico” — as aspas estão na moda — exercício de autoengano, escondido na tese da plebiscitação do escândalo, pelo qual não importa se a “lava jato” agiu ilegalmente; o que importa é saber se você é a favor ou contra a “lava jato”, como se o Brasil pudesse transformar esse escândalo em um simples Fla-Flu. Ou em um programa do Ratinho.
Indubitavelmente, plebiscitar o escândalo — como denuncia Gaspari — é fazer pouco da inteligência de uma boa parcela da população. E ignorar os efeitos colaterais dessa quebra da legalidade.
Vamos esconder as ilicitudes e praticar um consequencialismo ad hoc?
O que fazer com todas as ilegalidades? Juristas e jornalistas já apontaram o elenco de elementos que apontam para a quebra da imparcialidade. Este é o ponto. No depoimento ao Senado, questionado pelo senador Kajuru, Moro chegou a dizer que a indicação de uma testemunha à Dallagnol tinha sido uma notitia criminis enviada via mensagem (repasse de notitia criminis). Dizer o que sobre isso? É a primeira vez que um juiz faz notitia criminis via mensagem de telefone para o próprio órgão acusador que iria se beneficiar desse depoimento. Isso é normal?
Moro e Dallagnol, no início, não negaram o conteúdo dos diálogos. Depois passaram a colocar em dúvida. Mais tarde ainda, passaram a dizer que não se lembram ou que é impossível autenticar tais conteúdos. Dizer que as mensagens são produto de crime não basta, porque se sabe que prova ilícita pode ser utilizada a favor do mais débil, o réu.
Assim, na medida em que o CPP é claro no sentido de que é suspeito (artigo 254) o juiz que aconselha a parte e isso é causa de nulidade absoluta (aliás, sempre alegada pela defesa do ex-presidente Lula), parece que não restará outro caminho que o da anulação da ação penal ab ovo. O melhor conceito de parcialidade e/ou suspeição foi do jornalista Roberto Pompeu de Toledo, na Veja:
“Quando [o juiz] sugere a uma [das partes] que vá atrás de determinadas provas, age como juiz de futebol que, tomado pelo ardor torcedor, ousasse um passe para o atacante na cara do gol”.
Resta saber o caminho que será usado para chegar a esse desiderato, questão afeta à defesa e até mesmo, de ofício — face à nulidade absoluta — ao próprio Supremo Tribunal Federal no caso do julgamento do Habeas Corpus pautado para a próxima terça-feira (25/6).
O Judiciário não pode adotar uma postura consequencialista, algo do tipo “o fato está consumado” e/ou “que seria inviável anular uma ou mais ações penais”. Não se negocia com nulidades. Doa a quem doer.
O que resta(rá) de tudo isso é o efeito ex nunc. Qual é o precedente que exsurgirá? O Direito no Brasil é DAI e DDI. A ver quem vencerá: o Direito, representado no projeto civilizatório do devido processo legal, ou a barbárie de “os fins justificam os meios”. Teremos que escolher.
Numa palavra final, como bem diz o jornalista Jânio de Freitas, “os que apontaram as condutas transgressoras da Lava Jato foram muito atacados, mas eram os que estavam certos”.
Pois é. Fui muito atacado. Mas estou convicto de que as centenas de páginas que escrevi estavam corretas, mesmo que Dallagnol me considere um jurista entre aspas…!
Enfim, comecei e termino com Benjamin Franklin: estamos fazendo a escolha mais importante de nossas vidas. Dela depende o futuro do Direito.
Post scriptum: Promiscuidade é uma coisa normal?
De tudo o que está se vendo, a coisa é pior do que se pensa. Ficamos sabendo, depois da audiência do Senado, pela boca do ex-juiz Moro e de parlamentares aliados, que é da tradição jurídica brasileira essa “coisa” de “comunicação entre juiz e procuradores” e quejandos. Tradição? Disse-se a mil bocas que “quem está lá dentro sabe como funciona”. É mesmo? Ora, há que se ter cuidado para não confundir as coisas. Explicarei.
Um estrangeiro, ouvindo o ministro Moro, diria que, se isso é verdade, não é séria a Justiça brasileira. E concluirá que, se Moro está certo, os brasileiros estão com sérios problemas. E digo eu: se tudo isso é normal, temos de estocar alimentos.
Todavia, na contramão, proponho que façamos um raciocínio diferente: para preservar a honra dos juízes e membros do MP desse Brasil, quem sabe não devamos dizer: isso não é normal. Isto é, devemos dizer que a frase “isso é normal” é ofensiva aos magistrados brasileiros. E admitamos que, sim, Moro e Dallagnol erraram. Isso que os dois fizeram não se confunde com os contatos diários que advogados fazem com juízes pelo Brasil afora. Isto é, o problema está no conteúdo dos contatos, dos diálogos. Ali está demonstrada a quebra da imparcialidade. O ponto é esse.
Por isso, é profundamente ofensivo aos advogados confundir o enunciado performativo “é normal esse tipo de contato e conversação” e chamar a isso de embargos auriculares (sic). Isso está sendo dito para confundir. Ora, advogados têm direito de falar com juízes e membros do MP sobre seus processos. O que não é normal é o juiz aconselhar uma das partes. Isso é que não é normal.
Essa confusão acerca do “isso é normal” faz muito mal ao relacionamento entre advogados e magistrados. Contatos cotidianos feitos por milhares de advogados não podem ser “misturados” — nem contaminados — com essa relação entre Moro e Dallagnol.
Aliás, se “isso é normal” (sic), então que Moro apresente alguma outra mensagem similar trocada com algum advogado, com aconselhamentos similares aos dados a Dallagnol. Ou que se apresente uma única “notitia criminis” (aqui as aspas são necessárias) já feita por algum juiz via WhatsApp ao MP tratando do assunto com o próprio acusador interessado no depoimento da pessoa envolvida na tal “notitia”. Afinal, se é “normal”… Esse é o busílis.
Por isso, parem com esse enunciado “isso é normal”.

[1] Aliás, o senso de humor dos brasileiros é incrível: já existe uma brincadeira que rola nas redes sociais dizendo que, se a tese de Moro vingar, os advogados vão querer ter o telefone pessoal do juiz (será um direito fundamental), poder trocar uats ou Telegram com ele tratando da causa de forma bem intimista, com direito a kkks (direito líquido e certo), pedir dicas e, melhor, receber dicas (decorrência lógica da relação juiz-parte na nova política). Isso, é claro, sem “comprometer a imparcialidade…”! Esse povo brasileiro…!
[2] Aqui um parêntesis: fui promotor e procurador durante 28 anos. E a pior “pergunta” que tinha de ouvir era: quando você será juiz? Ou até a brincadeira infame: você é bandeirinha do juiz. Pois não é que Dallagnol reforçou esse imaginário preconceituoso contra a função do MP? Além de tudo o que fez, Dallagnol dará azo a um monte de piadinhas… Era o que faltava.


 é doutor em Direito (UFSC), pós-doutor em Direito (FDUL), professor titular da Unisinos e Unesa, membro catedrático da Academia Brasileira de Direito Constitucional, ex-procurador de Justiça do Rio Grande do Sul e advogado.

segunda-feira, 24 de junho de 2019

Le Monde: Manifesto de juristas europeus pede liberdade para Lula


“Lula é um preso político. Tem de ser libertado e seu julgamento tem de ser anulado.”
Éramos poucos, em 2018, quando advertimos que o processo contra Lula era parte de uma vontade, por qualquer meio e a qualquer custo, de colocá-lo fora da corrida para as eleições presidenciais que se aproximavam.
Esta estratégia foi bem sucedida, já que ela levou à eleição de Bolsonaro.
As recentes revelações do jornalista Glenn Greenwald e sua equipe derrubaram todas as máscaras. A investigação e o julgamento de Lula foram tendenciosos desde o início. Sergio Moro não só conduziu o processo com parcialidade como comandou de fato a acusação, desafiando as regras de procedimento mais fundamentais no Brasil.
Na prática, ele manipulou os mecanismos da delação premiada, orientou o trabalho do Ministério Público, exigiu a substituição de uma procuradora que não o satisfazia e dirigiu a estratégia de comunicação do Ministério Público.
Sabemos também através destas revelações que tal estratégia foi levada adiante de forma secreta, em estreita colaboração com o Ministério Público.
Isso se soma ao fato de que Sergio Moro havia grampeado os telefones dos advogados de Lula e decidido, por sua própria iniciativa, não cumprir uma decisão de um desembargador ordenando a libertação de Lula, violando a lei de forma flagrante.
Apesar de todos esses esquemas, Sergio Moro teve de se resignar a condenar Lula por “fatos indeterminados”, dada a inexistência material de provas que o implicassem diretamente neste caso de corrupção. Ao fazer isso, tornou Lula um preso político em função do que deve ser considerado, diante dessas novas revelações, como uma conspiração política.
O Supremo Tribunal Federal tem agora o dever de retirar todas as consequências destas gravíssimas irregularidades que conduziram a uma condenação injusta e ilegal e, consequentemente, libertar Lula e anular a sua condenação.
As autoridades brasileiras devem tomar todas as iniciativas necessárias para identificar os responsáveis por este gravíssimo abuso de procedimento.
A luta contra a corrupção é hoje um assunto essencial para todos os cidadãos do mundo, assim como a democracia e o Estado de Direito, mas no caso de Lula, ela foi usada para alimentar estratégias que o eliminassem do jogo político, a fim de permitir que Bolsonaro chegasse ao poder e, em seguida, “recompensasse” Sergio Moro, nomeando-o ministro da Justiça.
Os signatários deste apelo ressaltam que os beneficiários desta conspiração demonstram apenas desprezo pelo interesse geral dos brasileiros, pelas liberdades públicas, pelos direitos dos povos indígenas e, além disso, pela democracia.
Bruce ACKERMAN, Sterling Professor of Law and Political Science, Yale University
John ACKERMAN, Professor, Universidade Nacional Autónoma do México (UNAM)
William BOURDON, Advogado (Paris)
Mireille DELMAS MARTY, Professora, Collège de France
Joan GARCÉS, Advogado (Madrid)
Baltasar GARZÓN, Advogado (Madrid)
Louis JOINET, Juiz, primeiro advogado-geral honorário da Cour de Cassation (França), antigo presidente do grupo de trabalho da ONU sobre detenção arbitrária e da Comissão dos Direitos Humanos
Wolfgang KALECK, Advogado (Berlin)
Henri LECLERC, Advogado (Paris)
Christophe MARCHAND, Advogado (Bruxelas)
Jean-Pierre MIGNARD, Advogado (Paris)
Philippe TEXIER, Juiz, conselheiro honorário na Cour de Cassation (França), antigo presidente do Comité dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas
Philippe WEIL, Professor, Universidade de Paris 1-Sorbonne
Algumas informações complementares
Bruce Ackerman. Um dos maiores juristas dos Estados Unidos, professor na Universidade de Yale, especialista em direito constitucional. Editorialista no New York Times, e membro da Academia Americana de Artes e Ciências. Em 2010, a revista Foreign Policy o nomeou como um dos 100 pensadores mais influentes do mundo.
William Bourdon. Advogado francês, apontado no ano passado como o advogado mais influente da França. Foi advogado da ONG Transparency International e secretario geral da Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH) em 1994 e 2000. Advogado das famílias franco-chilenas vítimas do ditador Augusto Pinochet. Especializado na luta contra a corrupção, pela via da associação SHERPA, que fundou em 2002.
Baltasar Garzón. Ex Juiz da Audiencia Nacional Espanhola, condenou o Ditador chileno Augusto Pinochet pelos crimes contra a Humanidade.
Henri Leclerc. Advogado, decano dos advogados de Paris. Especializado na luta em favor dos direitos humanos no mundo. Presidente de honra da Liga dos Direitos Humanos.
Jean-Pierre Mignard. Advogado, muito próximo de François Hollande. Assessor de Emmanuel Macron na campanha presidencial, é hoje um dos principais conselheiros do Presidente da França em assuntos jurídicos.
Louis Joinet. Juiz, foi o criador, em 1997, dos princípios contra a impunidade do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, chamados de « princípios Joinet », que fazem parte dos princípios de justiça transicional.

Novos vazamentos reforçam a tese do conluio na Lava Jato, por Carol Proner


Novos vazamentos reforçam a tese do conluio na Lava Jato

A cada nova revelação, aprofunda-se a combinação maliciosa entre MP e o Juiz e a comprovação da relação de comando de Moro sobre Dallagnol. Nestas últimas revelações, é nítida a subserviência do procurador e o apoio irrestrito, atuando como um “assessor pessoal”, embora munido dos poderes de Ministério Público Federal, aponta a professora Carol Proner, dos Juristas pela Democracia.

Avaliando as revelações de hoje e somando-me aos que se exasperam com as profundas ilegalidades cometidas por esses criminosos da Lava Jato – repudiando, portanto, qualquer argumento de naturalização das práticas de corrupção funcional, empíricas ou em tese – penso que não é estratégico decepcionar-se com o conteúdo trazido pela Folha só porque (ainda...)“não saíram os áudios”. Precisamos ir com calma e fazer a análise atenta do conteúdo para perceber que este material é o mais grave até agora, demonstrando (cumulativamente) a relação explicita de mando de Sérgio Moro sobre Deltan Dallagnol, e indo além, estendendo a teia de relações disfuncionais junto à PGR, ao CNJ (por intermédio da ANPR) e à própria PF. E, também neste material revelado pela Folha (que assume corresponsabilidade e compromisso na divulgação, o que não é pouca coisa), aparece o cálculo de tempo entre acusação e juiz para encaminhar processos para o STF, explicitando as tensões junto à Suprema Corte. É grave e complica muito a situação de Batman e Robin, em estado “unidos”, na sede da Liga da Justiça. 

Avalio os vazamentos de hoje em 10 pontos:
1. Importantíssimo: a Folha de São Paulo aceitou a parceria com o The Intercept Brasil, assumindo a corresponsabilidade e o compromisso em divulgar material recebido de fonte anônima. E isso não é pouco, dada a credibilidade do Jornal e o avanço das teses que criminalizam as divulgações e os jornalistas;
2. Na parceria da Folha com TIB, está claro que essa é somente a primeira revelação de uma série, reforçando o alerta de que não serve de nada negar o que poderá ser confirmado mais adiante. A parceria reafirma que o acervo inclui áudios, vídeos, fotos e documentos compartilhados no aplicativo Telegram desde 2014; 
3. A Folha destacou um grupo de jornalistas para trabalhar ao lado do site e confirmar a integridade do material. A Folha afirma não ter detectado nenhum indício de que o conteúdo possa ter sido adulterado, checando até mesmo a comunicação da Lava Jato com vários jornalistas. Os envolvidos não negaram a autenticidade dos diálogos revelados, mas passaram a questionar a integridade, sugerindo que pudessem ter sido adulterados; 
4. A riqueza de detalhes das revelações torna a tese da adulteração cada vez mais distante, já que as tratativas entre juiz, procuradores e terceiros é confirmada pela realidade subsequente aos fatos.
5. A cada nova revelação, aprofunda-se a combinação maliciosa entre MP e o Juiz e a comprovação da relação de comando de Moro sobre Dallagnol. Nestas últimas revelações, é nítida a subserviência do procurador e o apoio irrestrito, atuando como um “assessor pessoal”, embora munido dos poderes de Ministério Público Federal;
6. Nesse sentido, fica evidente o frenético ir-e-vir do procurador para “acalmar as coisas” junto à Polícia Federal (o Delegado Anselmo, que teriam feito “lambança”, segundo Moro), bem como junto à Procuradoria Geral da República (Pelella e o pessoal de lá);
7. Fica evidente, nessas últimas revelações, o comprometimento da autonomia da Polícia Federal (o Delegado Anselmo se explica em relação à divulgação de planilhas publicizadas sem a intenção de comprometer a operação), da PGR (determinado parecer passaria pela revisão da Lava Jato), do Conselho Nacional de Justiça (Deltan diz que vai falar com o pessoal deles no CNJ), da Associação Nacional de Procuradores da República (que seria a articuladora junto ao CNJ);
8. É escandalosa a combinação dos tempos do processo, do prazo de denuncia do MPF para que dois processos (do João Santana e do Zwi Skornicki) pudessem “subir” (ao STF, ao Teori, para, então, desmembrar) com as denúncias já feitas pelo MPF;
9. A preocupação de Moro em acalmar o CNJ aparece claramente, bem como a correspondente atuação de Deltan por intermédio da ANPR. 
10. Moro também se preocupa com a atuação do Movimento Brasil Livre – MBL,  perguntando ao Deltan se tem contato, chamando-os de tontos  pelo protesto em frente à casa do Teori e avaliando que “isso não ajuda evidentemente”. Deltan responde “não, com o MBL não.” Fica em aberto, teria contato com outros?

quinta-feira, 20 de junho de 2019

Vídeo: o senador que desconstruiu Sérgio Moro em audiência no Senado


Por Senador Fabiano Contarato

Hoje, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, participei da audiência com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, destinada a termos mais informações e esclarecimentos a respeito das notícias veiculadas na imprensa relacionadas à Operação Lava Jato. Deixo claro: apoio a Lava Jato, um divisor de águas, pois, finalmente, os corruptos, os ricos, os intocáveis foram investigados, responderam à Justiça e foram condenados. Mas isso não significa que podemos fechar os olhos para a situação que, agora, discutimos.
Um juiz falou a uma das partes do processo, a acusação, e não vou nem sequer entrar no mérito dos diálogos trocados. Contra fatos não há argumentos. Violou-se o princípio da imparcialidade, a ética, a Constituição Federal, o Código de Processo Penal, a Lei da Magistratura e a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Fui delegado de polícia, 27 anos. Se eu fizesse contato com as partes de um inquérito por WhatsApp, como delegado, e se isso chegasse ao conhecimento do Ministério Público, ou mesmo do Judiciário, eu acho que sairia preso da delegacia. Não desmereço o mérito da Lava Jato, mas os fins não justificam os meios.



terça-feira, 18 de junho de 2019

The Intercept: Lava Jato protegeu FHC para fingir imparcialidade

Novo Vazamento:
#URGENTE: Moro era contra investigar FHC do PSDB



The Intercept

Um trecho do chat privado entre Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol revela que o ex-juiz discordou de investigações sobre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na Lava Jato porque, nas palavras dele, não queria “melindrar alguém cujo apoio é importante”.

 O diálogo ocorreu em 13 de abril de 2017. ...Naquele dia, Moro chamou Deltan Dallagnol em um chat privado no Telegram para falar sobre o assunto.

...Dallagnol encaminhou a dúvida do juiz para um chat em grupo chamado Conexão Bsb-CWB, no qual estavam procuradores..

FHC foi citado na Lava Jato pelo menos nove vezes. Caso fossem investigados e comprovados, nem todos os possíveis crimes cometidos pelo ex-presidente estariam prescritos...i

Moro estava explicitamente preocupado com investigações da Lava Jato contra um apoiador político de seu trabalho.

VEJA A MATÉRIA COMPLETA EM THE INTERCEPT



domingo, 16 de junho de 2019

A Lava Jato usou o judiciário para fins políticos: The Intercept



The Intercept

SUSPEITAVA-SE que a Lava Jato era um grupo político articulado entre membros do Ministério Público e o judiciário. Os indícios apontavam um conluio entre procuradores e um juiz que atuava para influenciar o jogo político-partidário e manipular a opinião pública. Faltava o batom na cueca. Não falta mais.
Os diálogos revelados pelo Interceptmostram que a Lava Jato desfilava como uma deusa grega da ética na sociedade, mas atuava à margem da lei na alcova. Em nome do combate à corrupção, o conluio atropelou princípios jurídicos básicos e arrombou o estado de direito. As provas são tão explícitas que não há mais espaço para divergências.
A Lava Jato usou indevidamente o aparato jurídico para atender interesses políticos. O Código de Ética do Ministério Público, o estatuto da magistratura e a Constituição foram todos burlados. É um caso claro de corrupção.
Durante o processo que levou um ex-presidente para a cadeia, o juiz orientou, recomendou alterações de estratégias, antecipou uma decisão e até indicou uma testemunha para acusação. A defesa, que reiteradamente pediu a suspeição do juiz, fazia papel de trouxa enquanto ele e o procurador combinavam estratégias de acusação pelos seus celulares.
No grupo do Telegram batizado de “Incendiários ROJ”, integrado por procuradores da Lava Jato, Dallagnol demonstrava preocupação com a principal prova da acusação. A convicção demonstrada em público contrastava com a insegurança no escurinho do Telegram. As conversas mostram a obsessão de Dallagnol em manter o caso de Lula nas mãos de Moro a qualquer custo. Os “incendiários” tinham plena consciência de que estavam ultrapassando os limites da irresponsabilidade.
Moro e Dallagnol enganavam a opinião pública quando em diversas oportunidades garantiram a lisura do processo. O réu não teve direito a um julgamento justo e imparcial. Os diálogos revelam uma articulação de estratégias para condená-lo mesmo antes da apresentação da denúncia. O processo foi corrompido, comprometendo o julgamento das instâncias superiores. Qualquer interpretação diferente dessa está fadada ao ridículo e cairá na lata do lixo da história.
O juiz e os procuradores se viam como heróis com uma missão: “limpar o congresso”. Mas essa limpeza era seletiva. A Lava Jato criaria aliados na política. O então deputado Onyx Lorenzoni dos Democratas se tornou um deles. Ele foi o principal apoiador das “Dez medidas contra a corrupção” — o projeto de lei criado pelos procuradores lavajatistas disfarçado de iniciativa popular.
Quando perguntado pelo Estadão sobre a intenção de “limpar o congresso”, Sergio Moro se mostrou inseguro. Primeiro não reconheceu a autenticidade da frase. Depois a justificou. E, por fim, afirmou não lembrar se é o autor.
Estadão: Em um diálogo que lhe é atribuído, o sr. fala em limpar o Congresso. O sr. reconhece essa fala como sua?
Moro: Não, não reconheço a autenticidade desse tipo de afirmação. Vamos dizer assim, em uma conversa coloquial, pode ser até algo que se diga “olha, tem um problema”. Vamos dizer que estamos falando de um Congresso que na época tinha o Eduardo Cunha como presidente (da Câmara), uma pessoa que comprovadamente cometeu crimes, tinha contas milionárias na Suíça, então era uma situação bastante diferente. Mas eu não tenho como recordar se há dois, três anos atrás eu tenha efetuado uma afirmação dessa espécie
O uso do poder do Estado para interferir nas eleições também está explícito nas conversas entre procuradores. Faltando 12 dias para a eleição, os lavajatistas traçaram estratégias para impedir a entrevista de Lula e dificultar a vitória de Haddad.
Moro chega a chamar réus de “inimigos” em uma conversa com Dallagnol. Está tudo ali, textualmente. Meses depois, a Lava Jato emplacou um ministro da Justiça no governo Bolsonaro. Onyx acabou virando colega de trabalho de Sergio Moro, que o perdoou publicamente pelos casos de caixa 2 (inclusive o da JBS, uma das empresas investigadas pela Lava Jato).
Haverá alguém capaz de continuar negando as intenções políticas da operação?
Acreditava-se que Moro trabalhava como linha auxiliar da acusação, mas ficou claro que ele era o chefe da Lava Jato. Ele dava broncas, cobrava ações e recomendou a Dallagnol que enquadrasse uma procuradora que apresentou mau desempenho nas audiências. Dallagnol prestava reverências a Moro, muitas vezes usando um tom messiânico: “A sociedade quer mudanças, quer um novo caminho, e espera líderes sérios e reconhecidos que apontem o caminho. Você é o cara”.
Em um dos trechos do vazamento, Dallagnol revela que teve uma conversa — “reservada, é claro” — com o ministro do STF Luiz Fux. Nessa época, Moro tinha sido duramente criticado pelo ministro Teori Zavascki, morto num acidente aéreo em 2017, que questionou sua imparcialidade após a divulgação ilegal do áudio da conversa entre Dilma e Lula.
Dallagnol conta para os procuradores que “Fux disse quase espontaneamente que Teori fez queda de braço com Moro e viu que se queimou”. Ou seja, segundo Fux, na queda de braço entre um juiz de primeira instância que cometeu ilegalidade e um juiz da suprema corte, venceu o primeiro. Esse é o tamanho do poder que Sergio Moro tem sobre o judiciário brasileiro.
Dallagnol revelou ainda que, segundo Fux, os procuradores da Lava Jato podiam contar com ele o que fosse preciso. A força-tarefa contava com um homem de confiança no STF. As palavras de Dallagnol deixam claro que Fux não se debruçaria sobre o mérito no caso, mas atuaria de acordo com o que foi combinado com o conluio lavajatista. Ao saber da conversa, Moro comemorou “In Fux we trust” (No Fux, a gente confia).
As primeiras reações de Moro e Dallagnol com a Vaza Jato foram reveladoras. Nenhum deles negou as conversas, o que sugere uma confissão indireta da autenticidade. Preferiram minimizar o conteúdo dos diálogos e investir na imagem de vítimas de violação de privacidade.
Sergio Moro, chamado de “russo” pelos procuradores, não viu “nada demais” na reportagem, mas considerou “bastante grave” a “invasão e a divulgação”. Em entrevista a Pedro Bial em abril, o ministro da Justiça deu uma opinião diametralmente oposta sobre o vazamento ilegal da conversa entre Lula e Dilma: “o problema ali não era a captação ilegal do diálogo e sua divulgação. O problema era o conteúdo do diálogo.”
O desespero tomou conta da força-tarefa. Três notas foram emitidas após a publicação da reportagem, enfatizando a “ação criminosa de um hacker” — o que era apenas uma suposição. Sem ter como negar os fatos, a Lava Jato iniciou uma guerra de narrativas. Manchetes sobre hackers invadindo celulares de procuradores passaram a pipocar no noticiário, numa tentativa de jogar areia nos olhos da opinião pública. Relacionar essas invasões com o que foi publicado pelo Intercept não serve a outro objetivo senão embaçar a realidade.
Moro e Lava Jato mudaram a versão inicial. Passaram a dizer que os hackers poderiam ter adulterado os conteúdos, mesmo após não terem negado nem uma vírgula. Essa não vai colar. A força-tarefa teria totais condições de comprovar a adulteração. Bastaria resgatar os arquivos das conversas no Telegram e comparar com o que foi publicado. Curiosamente, a maioria dos procuradores que foram alvos de ataque cibernético, incluído Dallagnol, tem relutadoem entregar seus celulares para a perícia da Polícia Federal.
A Globo, como tem sido costume da imprensa nos últimos anos, abraçou integralmente a versão lavajatista e atuou como gestora de redução de danos. Uma suposta invasão de hackers ganhou mais relevância no noticiário global que o hackeamento da ordem jurídica comandado pela Lava Jato. Minimizaram um fato e maximizaram uma suposição.
No dia seguinte à publicação da Vaza Jato, O Globo deu o mesmo peso de importância para as “conversas de Moro com procuradores” e para a “ação de hackers”. Diferentemente do que aconteceu em 2016, quando o jornal publicou a conversa entre Lula e Dilma na capa do jornal sem sequer citar a ilegalidade do vazamento. Sergio Moro e Globo estão sintonizados na mesma incoerência.

Capas do jornal O Globo em 17 de março de 2016 e 11 de junho de 2019.
Carlos Sardenberg, um dos principais colunistas do jornal, não viu nada demais nos diálogos. Em sua última coluna, chamou o conluio entre juiz e acusador de “coordenação formal de trabalho” e os métodos da Lava Jato de “inovação na investigação”. Parece que Sardenberg combinou só com o “russo”. Faltou combinar com a Constituição. Ele termina a coluna dizendo que o “pessoal do Intercept Brasil não faz jornalismo. É pura militância”. Isso me leva a crer que o jornalista não publicaria os diálogos se os tivesse recebido. Se dependesse desse tipo de jornalismo, a população não saberia que funcionários públicos atuaram à margem da lei.
Criou-se agora um falso debate sobre a publicação dos vazamentos. Mas não existe dilema ético quando se publica fatos de interesse público que os poderosos queriam esconder. Essa é a função principal e mais nobre do jornalismo.
É importante esclarecer que as revelações da Vaza Jato não provam a inocência de todos os acusados pela operação. Prova apenas que a Lava Jato não é inocente e que os processos comandados por ela estão contaminados por interesses políticos. Essa não é uma história de mocinhos contra bandidos.
A Lava Jato ganhou poderes imensos. Com apoio da imprensa e da população, conseguiu colocar um ex-presidente na cadeia com provas frágeis, peitou o STF e emplacou um ministro da Justiça. A força-tarefa chegou até a pleitear a administração de um fundo bilionário privado, que seria financiado pelas multas pagas pela Petrobrás.
Em nome de um bem maior, boa parte do jornalismo brasileiro abdicou de fiscalizar esse que hoje é o núcleo político mais poderoso do país. Preferiu atuar como porta-voz da República de Curitiba. A história se encarregará de separar os jornalistas que cumpriram o seu papel fiscalizador do poder dos que preferiram ignorar os fatos e surfar a onda fácil do lavajatismo.
O apoio popular estava ancorado na crença de que esses heróis trabalhavam com máxima transparência e rigor ético. O povo foi enganado. Não foi à toa que Sergio Moro perdeu 10 pontos de popularidade logo após à Vaza Jato.
Mas o ministro da Justiça de Bolsonaro ainda é a figura política mais popular do país. Mesmo com os fatos escancarados, ainda vai demorar para o mito se desfazer. Divindades não são desconstruídas do dia pra noite.
Sergio Moro sonhou entrar para a história como Giovanni Falcone, o juiz da Operação Mãos limpas que enfrentou a máfia italiana. Mas pode acabar como o justiceiro “russo”, um miliciano jurídico que hackeou a ordem constitucional para combater seus “inimigos”.

sábado, 15 de junho de 2019

Moro orientou Procuradores da Lava Jato atacarem Lula e defesa na imprensa


The Intercept divulga novos diálogos do "Morogate"

 Os procuradores acataram a sugestão do então juiz Sérgio Moro, em mais uma evidência de que Moro atuava como uma espécie de coordenador informal da acusação no processo do triplex.

Essas conversas provam que Moro estava sugerindo estratégias para que os procuradores realizassem sua campanha pública contra o próprio réu que ele estava julgando. Na posição de juiz, acionou procuradores contra o réu que deveria julgar com imparcialidade.


247 – Em mais um lote inédito de mensagens trocadas entre o ex-juiz Sergio Moro e procuradores da Lava Jato, fica evidente que a função de coordenador informal da operação estava realmente a cargo do atual ministro da Justiça. Num diálogo entre Moro e o procurador Carlos Fernando, fica patente o pedido do ex-juiz a procuradores para que eles divulgassem uma nota à imprensa para rebater o que ele chamou de ‘showzinho’ da defesa do ex-presidente Lula.
A reportagem do Site The Intercept destaca que “os procuradores acataram a sugestão do atual ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, em mais uma evidência de que Moro atuava como uma espécie de coordenador informal da acusação no processo do triplex. Em uma estratégia de defesa pública, Moro concedeu uma entrevista nesta sexta-feira ao jornal o Estado de S. Paulo onde disse que considera “absolutamente normal” que juiz e procuradores conversem. Agora, está evidente que não se trata apenas de “contato pessoal” e “conversas”, como diz o ministro, mas de direcionamento sobre como os procuradores deveriam se comportar.”
Veja o trecho do diálogo entre Moro e Carlos Fernando dos Santos Lima:
“Santos Lima – 22:10 – Achei que ficou muito bom. Ele começou polarizando conosco, o que me deixou tranquilo. Ele cometeu muitas pequenas contradições e deixou de responder muita coisa, o que não é bem compreendido pela população. Você ter começado com o Triplex desmontou um pouco ele.
Moro – 22:11 – A comunicação é complicada pois a imprensa não é muito atenta a detalhes
Moro – 22:11 – E alguns esperam algo conclusivo
Além do depoimento, outro vídeo com Lula também tomava conta da internet e dos telejornais naquele mesmo dia. Depois de sair do prédio da Justiça Federal, o ex-presidente se dirigiu à Praça Santos Andrade, em Curitiba, e fez um pronunciamento diante de uma multidão. Por 11 minutos, Lula atacou a Lava Jato, o Jornal Nacional e o então juiz Sergio Moro; disse que estava sendo “massacrado” e encerrou com uma frase que entraria para sua história judicial: “Eu estou vivo, e estou me preparando para voltar a ser candidato a presidente desse país”. Era o lançamento informal de sua candidatura às eleições de 2018.
Um minuto depois da última mensagem, Moro mandou para o procurador Santos Lima:
Moro – 22:12 – Talvez vcs devessem amanhã editar uma nota esclarecendo as contradições do depoimento com o resto das provas ou com o depoimento anterior dele
Moro – 22:13 – Por que a Defesa já fez o showzinho dela.
Santos Lima – 22:13 – Podemos fazer. Vou conversar com o pessoal.
Santos Lima – 22:16 – Não estarei aqui amanhã. Mas o mais importante foi frustrar a ideia de que ele conseguiria transformar tudo em uma perseguição sua.
Moro, o juiz do caso, zombava do réu e de seus advogados enquanto fornecia instruções privadas para a Lava Jato sobre como se portar publicamente e controlar a narrativa na imprensa.”



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sexta-feira, 14 de junho de 2019

O degradante espectro que sustentou a Lava-Jato, por Tânia M. S. Oliveira

da ABJD – Associação Brasileira de Juristas pela Democracia

Moro, Dallagnol e a Nova Normalidade

por Tânia M. S. Oliveira*

No poema “No caminho com Mayakovsky”, muitas vezes confundido e atribuído erroneamente ao poeta russo, o autor Eduardo Alves da Costa descreve os passos de avanço autoritário e ausência de resistência, dos atos simples até que não seja mais possível resistir. Da retirada de flores do jardim a arrancar a voz da garganta, o inexorável é que, ao permitir que se vá adiante, não há o que fazer quando tudo se consuma. Desde o último domingo, 09 de junho, quando os primeiros conteúdos de conversas entre o então juiz e hoje ministro Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol e demais procuradores da força tarefa da operação Lava Jato foram revelados pelo portal eletrônico The Intercept, muito já se debateu, se escreveu em artigos, reportagens e, sobremaneira, nas redes sociais.
Curiosamente, a disputa de narrativas não se deu entre mentira e verdade, uma vez que as personagens dos eventos cujos diálogos foram publicizados não negaram sua autenticidade, limitando-se a atacar a forma como foram obtidas e afirmando-se vítimas de hackers. Assumiram como legítimos os diálogos que disseram considerar normais, sem qualquer problema. E ao fazê-lo indicavam adotar o comportamento que vem sendo legitimado desde que apareceram no cenário nacional.
É fato que condução coercitiva sem intimação prévia, delações premiadas com réus presos, usadas como prova sem nada que as corroborasse, vazamento de conteúdos de depoimentos e até mesmo de conversas privadas, prisão automática após julgamento em segunda instância sem trânsito em julgado, foram sendo praticados diuturnamente e, quando questionados judicialmente, foram mantidos. Desse modo, a Lava Jato vem praticando abusos há cinco anos como se normal fosse, sem reparos, impunemente. Seus membros, longe de serem questionados, eram ovacionados.
E passaram a operar em uma lógica totalmente midiática, de olho na aprovação popular e nos holofotes, proferindo palestras, dando entrevistas e dialogando com as manifestações nas ruas. Enquanto isso, seus pares do sistema de justiça ignoraram as irresignações e questionamentos que lhes foram feitos, dentro e fora dos autos, e não foram poucos. Não é nenhum absurdo dizer que os conteúdos revelados pelo portal The Intercept não surpreendem ninguém, mesmo que muitos afirmem seu espanto. A Lava Jato, que se em algum momento foi pensada para enfrentar a corrupção sistêmica, não captou as contradições em seu interior, tratando, desde sempre, a política como delito, e escolhendo atores a quem atingir de acordo com as preferências políticas de seus membros.
Operou a utilização do sistema de justiça e especificamente do Poder Judiciário para atingir seus fins, maximizando objetivos particulares e não republicanos. Igualmente não é estranho que, tanto o juiz Sérgio Moro quanto o procurador Deltan Dallagnol, tenham respondido que o conteúdo divulgado são coisas “normais”.
Na lógica lavatista de descumprir normas, princípios constitucionais e processuais legais, nada aconteceu de errado. De tal modo que o magistrado se portar como superior hierárquico do procurador, dando broncas, instruindo a busca de fontes, sugerindo investigações e inversão da ordem das etapas, antecipando decisões ainda não proferidas, em diálogos cotidianos é “normal”, as reuniões e os telefonemas cotidianos para discutir os casos – como mostram o inteiro teor das conversas – são normais.
Grupos de procuradores interessados, não nos dados e rumos das investigações sobre as quais eram titulares, mas em fórmulas e métodos de como impedir uma entrevista autorizada pelo Supremo Tribunal Federal porque ela iria, em tese, ajudar o candidato que eles não simpatizam politicamente, também são normais.
Nesse caminho da nova normalidade, encontram os membros da força-tarefa da operação Lava Jato, o amparo social e político dos que se apoiam no argumento fácil de que tudo fora feito para combater a corrupção, fundamento, a propósito, sempre o mais utilizado em todo o mundo no surgimento ou renascimento de regimes autoritários, como mote de fazer valer o desprezo pelos valores e instituições da democracia.
Em espectro amplo, essas posturas se alinham com a busca da naturalização do absurdo, que vai se impondo paulatinamente em nosso país. Exemplos não nos faltam, desde a exaltação à tortura e torturadores dentro do plenário da Câmara dos Deputados na votação do impeachment, até placa de rua quebrada com o nome de uma vereadora assassinada, ambos os atos sob aplausos de multidões.
E a operação Lava Jato, é preciso reconhecer, virou uma operação famosa não apenas pelos seus números e seu discurso de combate à corrupção, mas por escancarar a seletividade do processo penal brasileiro, e o descumprimento comezinho de normas processuais, sem que jamais qualquer de seus membros, servidores públicos, respondessem por seus atos. As garantias do processo penal são marcos civilizatórios. A realidade incontrastável de que o juiz e os procuradores da operação Lava Jato o desprezaram totalmente, atropelando-o, assume, a partir da revelação trazida, uma dimensão de que não mais cabem as vendas nos olhos de quem tem poder para recolocar as coisas em seu devido lugar.
O The Intercept, que a propósito afirma que revelou 1% de todo o conteúdo que dispõe, evidenciou a ausência de alternativas que indiquem “lixo para debaixo do tapete” como factíveis. Não se pode sustentar a normalidade de relações de conluio, diante de evidências sistematizadas. Não há explicação convincente capaz de modificar o degradante espectro que sustentou essa investigação e custou a liberdade de cidadãos e sua execração pública. Da aberrante divulgação de grampos ilegais envolvendo a Presidenta da República à aceitação do cargo de ministro do governo a quem beneficiou nas eleições, retirando o adversário de cena, Sérgio Moro testou todos os limites, impunemente. Do bizarro Power Point da denúncia de Lula à fundação para gerir recurso públicos, Dallagnol perdeu as balizas de qualquer atuação comedida. Retiraram flores do jardim da legalidade, mataram o cão e invadiram a casa. Agora é preciso gritar enquanto ainda há voz na garganta, agir antes que seja tarde. Se não dissermos nada, é provável que não poderemos mais dizer.
*Tânia M. S. Oliveira é membra da coordenação executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD