Luiz Felipe Miguel
Professor de Ciência Política na UnB
Como previsto, Moro aceitou o cargo que Bolsonaro lhe ofereceu.
O teatrinho feito até agora foi comprometido pela indiscrição do general Mourão, que revelou que o acerto já estava encaminhado desde antes da eleição. Mourão gosta de passar por ingênuo e boquirroto, mas é um esperto. A indiscrição provavelmente é uma jogada das disputas internas por poder, visando desgastar o juiz de primeira instância.
Pela imprensa, muitos liberais lamentam a decisão de Moro, porque ela "confere credibilidade" à "narrativa" de que a Lava Jato não é imparcial e tinha como objetivo principal retirar o PT do poder. Na verdade, não precisava disso, pois o caráter da operação já estava evidente desde muito cedo. O problema, para esses liberais, é que vai ficando cada vez mais difícil separar o avanço neofascista das suas etapas prévias: o golpe de 2016 e a criminalização da esquerda. Se eles não querem ser cúmplices de um, terão que fazer autocrítica dos outros.
Há um precedente à situação de Moro. Francisco Rezek, na qualidade de presidente do TSE, foi responsável pelas eleições de 1989. Em seguida, aceitou o convite de Collor para ser ministro das Relações Exteriores, renunciando ao Supremo para assumir a pasta. Perto do que ocorreu nas últimas semanas, a eleição de 1989 foi uma brincadeira de criança, mas o triunfo de Collor também dependeu de manipulação, intimidação e dinheiro ilícito, com os quais a justiça eleitoral foi complacente. A nomeação de Rezek manchou de suspeição o processo eleitoral. (E, anos depois, completando o círculo com enorme desfaçatez, Collor devolveu Rezek ao Supremo, com uma inédita segunda nomeação.)
O caso de Moro é pior ainda. Não se trata "apenas" de fechar os olhos para a sujeira na campanha, mas de um juiz que agiu criminosamente para, primeiro, destituir uma presidente e, segundo, impedir a candidatura do favorito às eleições presidenciais. Não é exagero dizer que, caso houvesse ocorrido julgamento honesto em Curitiba, Porto Alegre e Brasília, Jair Bolsonaro provavelmente não seria o presidente eleito do Brasil. Ao aceitar um cargo que só é explicável como paga pelos serviços prestados, o juiz Moro se mostra desmerecedor de qualquer respeito como magistrado e torna ainda mais incontestável a exigência de anulação de seus atos.
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