sábado, 30 de janeiro de 2016

O jornalismo decadente

Isso não é jornalismo

Trecho do comentário de Mino Carta:

..Vivemos tempos de incompetência desbordante, de irresponsabilidade, de irracionalidade. De decadência moral, de descalabro crescente.
Falei em 1954: foi também o ano do suicídio de Getúlio Vargas, alvejado pelo ataque reacionário urdido contra quem dava os primeiros passos de uma industrialização capaz de gerar proletariado, ou seja, cidadãos conscientes de sua força, finalmente egressos da senzala.
Não cabe, porém, comparar Carlos Lacerda com os golpistas atuais, alojados na mídia, grilos falantes dos barões, a serviço do ódio de classe. Lacerda foi mestre na categoria vilão, excelente de fala e de escrita.
Os atuais tribunos de uma pretensa, grotesca aristocracia, são pobres-diabos a naufragar na mediocridade. Muitos deles, como Lacerda, começaram na vida adulta a se dizerem de esquerda, tal a única semelhança. Do meu lado, sempre temi quem parte da esquerda para acabar à direita.
Os sintomas do desvario reinante multiplicam-se, dia a dia. Alguns me chamam atenção. Leio, debaixo de títulos retumbantes de primeira página, que o ex-ministro Gilberto Carvalho admitiu ter recebido certo lobista.
Veicula-se a notícia como revelação estarrecedora, e só nas pregas do texto informa-se que Carvalho convidou o visitante a procurar outra freguesia. De todo modo, vale perguntar: quantos lobistas passam por gabinetes ministeriais ao praticar simplesmente seu mister? Mesmo porque, como diria aquela personagem de Chico Anysio, advogado advoga, médico medica, lobista faz lobby.
Outro indício, ainda mais grave, está na desesperada, obsessiva busca de envolver Lula em alguma mazela, qualquer uma serve. Tanto esforço é fenômeno único na história contemporânea de países civilizados e democráticos. Não é difícil entender que a casa-grande está apavorada com a possibilidade do retorno de Lula à Presidência em 2018, mesmo o mundo mineral percebe.
Mas até onde vai a prepotência insana, ao desenrolar o enredo de um apartamento triplex à beira-mar que Lula não comprou? A quem interessa a história de um imóvel anônimo? Que tal falarmos dos iates, dos jatinhos, das fazendas, dos Rolls-Royce que o ex-presidente não possui?
Este não é jornalismo. Falta o respeito à verdade factual e tudo é servido sob forma de acusação em falas e textos elaborados com transparente má-fé. Na forma e no conteúdo, a mídia nativa age como partido político.

Brasil 247:


:

O mérito da reportagem da Folha deste sábado, sobre o "barco" de Lula, foi descobrir que o ex-presidente Lula, acusado nas redes sociais de possuir uma das maiores fortunas do planeta, possui uma "canoa de lata"; "Arranjem para o Lula ou algum de seus filhos uma 'maracutaia' que preste, algo grande, como aquilo que enriqueceu a filha de José Serra", apontou o escritor Luiz Fernando Emediato; "O que o barquinho mixuruca prova a não ser a absoluta modéstia do sujeito que, quatro anos atrás, escandalizava essa gente carregando um isopor para a praia?", disse Fernando Brito, editor do Tijolaço


De Fernando Brito, a partir do seu Tijolaço:

O “iate” do Lula e o jornalismo “sem noção”

Folha hoje se supera.

Apresenta como “prova” da ligação de Lula com o sítio que ele nunca negou frequentar, em Atibaia, um barco comprado por D. Mariza, sua mulher e mandado entregar lá.

A “embarcação”, como se vê no próprio jornal,  é um bote de lata comprado por R$ 4.100.

Presta para navegar num laguinho, com a mulher, dois amigos e o isopor, se ninguém fizer muita gracinha de se pigar em pé, fazendo graça.

É o “iate do Lula”, quase igual ao Lady Laura do Roberto Carlos e só um pouco mais modesto do que as dúzias de lanchas que você vê em qualquer destes iate clubes que existem em qualquer cidade praiana.

A pergunta, obvia, é: e daí que o Lula frequente o sítio? E daí que sua mulher tenha comprado um bote, sequer a motor, para pescar umas tilápias, agora que já não pedem, como nos velhos tempos, fazer isso na represa Billings?

Qual é a prova de que a reforma do sítio foi paga pela Odebrechet (segundo a Folha) ou pela OAS (segundo a Veja)?

E se o Lula frequentasse a mansão de um banqueiro? E se vivesse nos iates – os de verdade – da elite rica do país?

O que o barquinho mixuruca prova a não ser a absoluta modéstia do sujeito que, quatro anos atrás, escandalizava essa gente carregando um isopor para a praia?

Os jornais, a meganhagem e a turma do judiciário – que já não se separam nisso – estão dedicados a destruir o “perigo lulista”.

Esqueçam o barquinho: o que eles querem é ter de novo o leme do transatlântico.

Perderam até a noção do ridículo, convencidos de que já não há resistência a ele nas mentes lavadas do país.

E acabam revelando que, em suas mentes,  o grande pecado  de Lula, que ganha em  palestras pagas o suficiente para comprar uma “porquera” daquelas por minuto que passe falando, ou para alugar uma cobertura na Côte D’Azur do Guarujá  é continuar pensando como pobre:  querendo comprar apartamento em pombal e barquinho de lata para ficar de caniço, dando banho em minhoca.

É que ter nascido pobre é um crime que até se perdoa, imperdoável mesmo é continuar se identificando com eles.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

O livre direito à manifestação está em grande risco hoje no Brasil

Carta Maior

Artistas, professores universitários, ativistas e militantes sociais alertam: 'o livre direito à manifestação está em grande risco hoje no Brasil'.


Mídia Ninja
Artistas, professores universitários, ativistas e militantes sociais alertam: “o livre direito à manifestação está em grande risco hoje no Brasil”.

Em repúdio aos sucessivos e truculentos episódios de repressão policial contra manifestantes nas ruas, eles lançam o Mani-f-esta livre!, denunciando ameaças em curso e propondo uma série garantias ao livre exercício da manifestação popular.

“O manifesto pretende expressar a voz da esquerda das ruas”, afirma o sociólogo Jean Tible, um dos signatários do documento. “Partindo da perspectiva de que o cidadão faz política no seu cotidiano, e não apenas no momento das eleições, nós colocamos em debate essa situação absurda, na qual as pessoas que reivindicam determinadas pautas acabam sendo reprimidas de uma forma totalmente violenta e antidemocrática”, explica.

Segundo o sociólogo, existe um consenso no atual momento político do país: “só teremos mais conquistas sociais e mais igualdade a partir da luta e das manifestações populares. A democracia das ruas é decisiva neste sentido”. Em contrapartida, “qualquer pessoa que faça uma manifestação, em qualquer lugar, vai se deparar com uma repressão desproporcional”. 

Entre os pontos defendidos pelo Manifesto está a proibição do uso de armas (letais ou menos letais) durante os atos populares. Além do livre exercício do trabalho de jornalistas, advogados, primeiros socorros e defensores legais durante as manifestações. “Defendemos o direito de cada cidadão de lutar sem correr o risco de “perder um olho, de sair com uma perna queimada. As pessoas estão sendo alvejadas por estarem lutando democraticamente”, denuncia Tible.
Repressão cotidiana
Além da denúncia da repressão policial contra os manifestantes, como os violentos episódios registrados na capital paulista, na última semana, durante o quinto ato público organizado pelo Movimento Passe Livre (MPL), o Mani-f-esta livre! repudia a cotidiana repressão das instituições policiais contra os cidadãos nas periferias e nos centros urbanos, nas florestas e no campo.
Tible destaca que uma das propostas apresentadas pelo Manifesto é, justamente, a reforma da polícia e a desmilitarização da Polícia Militar. “A violência da PM é cotidiana nas periferias e no campo. O número de mortes dos povos indígenas é altíssimo. A questão é ´como não ficamos chocados com o grau de violência produzida a todo momento?´”.
O documento defende, também, o fim imediato da criminalização dos movimentos sociais, posicionando-se contrário à Lei Antiterrorismo, em tramitação no Congresso Nacional; e contra qualquer uso da lei de organizações criminosas para enquadrar manifestantes.
Lei Antiterrorismo é um grande perigo
Destinado a tipificar o crime de terrorismo no país, o projeto de Lei Antiterrorismo, apresentado ao Congresso pelos ministérios da Justiça e da Fazenda, em junho de 2015. Frente à subjetividade do conceito de “terrorismo”, ele abre brechas na legislação brasileira para a criminalização de organizações e movimentos sociais no país.
Mesmo assim, o projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados, com a garantia de que lei não se aplicaria “à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, como objetivo de defender direitos, garantias e liberdades”.  
No Senado Federal, porém, o artigo que mantinha essa garantia foi retirado do texto original. As penas ficaram mais duras: 16 a 24 anos de reclusão para quem for enquadrado no crime de terrorismo; 24 a 30 anos caso o ato resultar em morte; e reclusão de 10 a 16 anos para quem recrutar, aliciar, organizar ou aparelhar pessoas para atos de terrorismo.
O projeto aguarda nova votação no plenário da Câmara.
“Essa lei é um grande perigo para as lutas a médio e longo prazo. Quem vai às ruas já está desfavorável diante do uso indiscriminado das forças de repressão, isso [Lei Antiterrorismo] pode aguçar mais ainda”, avalia o sociólogo. Citando as manifestações populares no Egito, nos Estados Unidos e na Argentina, Tible destaca que nos últimos anos “houve um levante de uma multidão mundo afora e, ao mesmo tempo, as leis e forças policiais em vários países se aguçaram”.
Longe das polarizações, aponta o sociólogo, o manifesto visa congregar as sensibilidades da esquerda brasileira para essas questões que dizem respeito ao livre direito de manifestação no país. Entre seus 500 signatários, conta Tible, estão “desde anarquistas a representantes de uma esquerda mais moderada”.
“Há também um peso bastante significativo do pessoal da cultura. Cineastas, músicos, pessoal do teatro, tanto que a lista é encabeçada pelo José Celso Martinez Corrêa, do Teatro Oficina”, complementa.
Confiram a íntegra do manifesto e cliquem aqui para a assiná-lo:
Mani-f-esta livre!
“Está em grande risco hoje no Brasil um direito elementar e fundante dos direitos humanos, que define a qualidade e vitalidade das nossas democracias: o livre direito à manifestação.
Demonstrações diárias de uma inaceitável repressão: bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo, gás de pimenta, balas de borracha e de chumbo assim como cercamentos são convocadas pelas instituições policiais, nas periferias e nos centros, nas florestas e no campo, usadas contra os cidadãos comuns, justamente aquelas e aqueles que estão lutando contra as cercas.
Em 13 de junho de 2013, uma certa editoria paulista (a folha) clamava por "retomar as ruas", isto é, tirar os manifestantes dela para que o fluxo "normal" dos carros motorizados e individuais retomasse a paisagem urbana. Nesse mesmo dia, a infeliz e brutal repressão à manifestação chamada pelo MPL virou o jogo na opinião pública. Desde então está em plena disputa a ocupação das ruas por manifestantes.
É nas ruas que os direitos são epicamente conquistados, desde o direito ao voto, o de realizar greves ou a abolição da escravidão. E é nas ruas que arrancaremos o combate às desigualdades, a reforma das polícias, o fim do extermínio da juventude negra, do etnocídio dos povos indígenas e do encarceramento em massa - e assim será também com o direito a um transporte público de qualidade, democrático e com o pleno direito às nossas cidades.
Por isso, defendemos:
- o livre exercício do trabalho de jornalistas, advogados, primeiros socorros e defensores legais nas manifestações;
- proibição do uso de armas (letais e menos letais) pelas forças policiais nas manifestações;
- reforma das polícias (com a desmilitarização da PM);
- o rechaço à lei anti-terrorismo, pelo seu caráter anti-democrático, e ao uso da lei de organizações criminosas para enquadrar manifestantes;
- o fim imediato da criminalização das lutas e dos movimentos sociais;
- o debate democrático sobre políticas públicas e a construção de decisões, sobretudo a respeito do transporte público."

sábado, 23 de janeiro de 2016

O que há de mais velho se apresentando como novo

Outras Palavras:

Sobre velhos e velhacos

Por Guilherme Boulos
Quando questionado por sustentar ideais de igualdade e justiça social aos 70 anos de idade, o saudoso Plínio de Arruda Sampaio (1930-2014) respondeu: “Ficar velho não é virar velhaco”. Há pessoas que, mesmo velhas, permanecem jovens de espírito. Abertas para o novo. E há outros que, mesmo jovens, carregam os medos e preconceitos das velhas gerações. Jovens, mas com o espírito de velhos rançosos. É o caso de Kim Kataguiri, que lidera o MBL (Movimento Brasil Livre) e tornou-se agora colunista da Folha.
Não é exatamente uma surpresa a Folha tê-lo contratado. A maior parte de seus colunistas é liberal em economia e politicamente conservadora, assim como sua linha editorial. Neste quesito, Kim estará à vontade.
Talvez a surpresa de muitos seja por conta de seu despreparo, mais do que por sua posição política. Difusor de piadas machistas, com discurso repleto de argumentos rasos e com uma prepotência própria de quem ainda não recebeu a notícia, Kim não está qualificado sequer como uma voz coerente da direita.
Mas o que de fato surpreende é ver Kim e seu MBL tratados por alguns como representantes do “novo”, do autêntico espírito de revolta da juventude contra a velha política. Na verdade, eles são precisamente o contrário disso.
Há uma percepção cada vez mais ampla de que estamos vivenciando a crise de uma época. De que este sistema político é incapaz de representar as maiorias. De que este modelo econômico só atende aos interesses privilegiados do 1%. Daí uma série de movimentos que nasceram nos últimos anos com ojeriza à velha política e clamando por transformações profundas.
Como o movimento Ocuppy Wall Street, lançado em Nova York (EUA), que reuniu milhares de pessoas numa ocupação permanente em Manhattan, depois estendida com protestos em várias cidades norte-americanas, contra a ganância desmedida da elite financeira.
Como o 15M, quando o povo indignado espanhol tomou as ruas e praças contra as políticas liberais de austeridade, os despejos em massa por conta das hipotecas “subprime” (segunda linha) e a corrupção da “porta giratória”. Dessa energia nasceu o Podemos.
Como também as grandes lutas dos estudantes chilenos por reformas do ensino, que levaram multidões de jovens às ruas contra o modelo liberal-privatista de educação, herança da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
Esses ventos também chegaram por aqui: as ocupações de escolas em São Paulo, as lutas contra o aumento das tarifas de transporte e as batalhas cotidianas pelo direito à cidade, nos centros e periferias urbanos, espalhadas pelo Brasil.
Poderíamos falar dos jovens do Ocupe Estelita, em Recife, que se insurgiram contra a especulação imobiliária e a apropriação privada do espaço público. Da resistência negra, no Capão ou em Ferguson (Missouri, nos EUA), que expressa a revolta da juventude contra o extermínio policial. Ou ainda da bela luta das mulheres –as mesmas que Kim comparou a “miojo”– contra os projetos retrógrados do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Aí está o novo. Por esses ares passa o legítimo sentimento de repulsa à velha política, aos seus representantes e privilégios. Defender os mecanismos sociais que produzem desigualdades, a ideologia meritocrática e a repressão a quem luta é o que há de mais velho. É o programa da ordem, sempre a postos para prestar seus serviços à Casa Grande.
Kim é isso: um garoto da ordem. Ergueu-se no rescaldo da crise do petismo, expressando de forma confusa os anseios de uma classe média sem projeto nem visão de país, que –sentindo-se insegura– busca apoio nas bengalas do conservadorismo. As crises fazem surgir o novo, mas também dão roupa nova ao velho.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

PT: à esquerda no aperto e à direita no governo

Viomundo:

Lula faz o pêndulo do PT se mover à esquerda; é a campanha eleitoral de 2016

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por Luiz Carlos Azenha
O ex-presidente Lula viajou o Brasil várias vezes.
Ele conhece o país física e intuitivamente.
Tem o Nordeste no DNA. Cresceu com os deserdados de São Paulo.
Lutou com a elite operária do ABC industrial. Não há outro líder com a sensibilidade social de Lula.
Fernando Henrique Cardoso, o líder intelectual da oposição, é um sociólogo de elite. Que só montou num jegue e se declarou com “um pé na cozinha” durante campanhas eleitorais. A relação entre FHC e o povo brasileiro é de água e óleo. O povo sabe que FHC não é “dos seus”.
Lula, não. Ele usa muitas metáforas no discurso. Algumas não fazem o menor sentido, mas garantem que seu discurso chegue ao povão. Ele adora falar como o pai e a mãe que administram o Brasil como se fosse uma imensa família, quando não é. Pelo contrário: a História do Brasil é a história da insurreição e da supressão dos que lutam por direitos. Mas Lula, o conciliador, parece realmente acreditar que o empresário Gerdau e o sindicalista Vicentinho podem conviver harmoniosamente. Em outras palavras, Lula incorpora a ideia de que o pobre brasileiro “sabe o seu lugar”.
O ex-presidente diz que Dilma está à sua esquerda. Confere. Diz-se que Golbery, o fiador da abertura lenta, gradual e restrita da ditadura militar, preferia Lula aos comunistas. O irmão de Lula era comunista. Ele, nunca foi. Lula é um social democrata, cujo horizonte é dar casa própria e automóvel a todos. Num país de deserdados e de imensa desigualdade social, como o Brasil, isso é revolucionário. Lula fala sempre nos bagres e nos sapos como um estorvo ao desenvolvimento. Ele ainda não chegou ao ponto de reconhecer que sem os bagres e os sapos nós, seres humanos, não sobreviveremos nesta Terra.
Como diz Paulo Henrique Amorim, sempre um observador arguto de nossa realidade, os tucanos vivem na e da mídia. Tiram o oxigênio dos colunistas de jornais, emissoras de rádio e TV. Não têm qualquer afinidade com o povo brasileiro. Eleitoralmente, sobrevivem na negação do outro. São, assim, cópia fiel da UDN. Criam uma realidade paralela, a do eterno “mar de lama”, para se apresentarem como “alternativa” à corrupção — da qual, aliás, fazem parte intimamente. PHA diria: qual é a ideia política original dos tucanos, além de entregar o patrimônio público para financiar seus governos? Eles sobrevivem vendendo a soberania brasileira.
Lula, na entrevista aos blogueiros, admitiu hoje que o PT se tornou um partido igualzinho a todos os outros. Fato. Quando ele fala que alguns companheiros “erraram”, provavelmente está se referindo aos crimes cometidos por gente como o ex-líder do governo Dilma no Senado, Delcídio do Amaral, que armava para tirar uma testemunha-chave do Brasil.
Todos os escândalos tucanos sobreviveram ao PT no poder: sanguessugas, vampiros, mensalão, petrolão. Em torno deles, o famoso pacto das elites.
O ex-presidente tem razão quando diz que o PT é perseguido pela mídia desde que ele assumiu o poder, em 2002. Vi isso de dentro da redação da TV Globo. Eu estava presente — e abominei — quando colegas jornalistas aplaudiram Lula antes da entrevista que ele deu ao Jornal Nacional, depois que se elegeu. E abominei quando, na onda das primeiras denúncias do mensalão, a Globo entrou na onda de criminalizar o PT, o que já dura mais de 12 anos. Testemunhei pessoalmente: a Globo colocou todos os seus recursos materiais e profissionais para investigar o PT, quando não fez o mesmo com nenhum outro partido.
A postura da mídia como linha auxiliar da oposição, no entanto, não deve ser usada como desculpa para o “reformismo fraco” do PT. Desde que José Dirceu, com suas alianças a qualquer custo, levou Lula ao poder, o PT se tornou ferramenta da “modernização conservadora” do Brasil. Um partido da ordem, que proporcionou migalhas aos mais pobres enquanto os mais ricos enchiam as burras de dinheiro.
O governo de coalizão do PT só pode se dar ao luxo de ser social democrata na bonança.
Na crise, banca a lei antiterrorismo contra os movimentos sociais, a reforma da Previdência, os leilões do pré-sal, o desmanche da Petrobras e da Eletrobras.
Na entrevista aos blogueiros, Lula mais uma vez mexeu com o pêndulo. Como líder mais importante do PT, se disse contra a lei antiterrorismo, a venda da Gaspetro e da Transpetro e propôs uma política econômica distinta do austericídio de Dilma.
É como se fosse aquele jogo do bad cop (Dilma) e do good cop (Lula).
Lula prega o apoio a Dilma, mas se distingue dela com propostas à esquerda, para não perder o campo político essencial, onde se encontra a militância do partido.
É sempre assim, desde a campanha de 2002: à esquerda durante a campanha, à direita no governo, à esquerda às vésperas do próximo período eleitoral, à direita depois da composição do governo.
Um pêndulo que, apesar de hipnotizar alguns blogueiros, se move de forma oportunista.
Mantém, como cenoura no horizonte, as reformas que realmente importam: democratização da mídia, reforma tributária que obrigue os ricos a assumirem carga tributária hoje carregada pela classe média e os mais pobres, soberania nacional sobre setores estratégicos (energia, comunicações e recursos naturais), um banco central que não esteja a serviço eminentemente do sistema financeiro.
O PT continua acreditando que pode se perpetuar como o menos ruim dos partidos.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Macri abre geral para o mercado e toma medidas anti-democráricas

Da Folha

Macri quer brilhar em Davos , mas avança contra as instituições na Argentina

POR SYLVIA COLOMBO
Os mercados estão felizes com Mauricio Macri, que desembarca nesta quarta-feira (20) em Davos tentando marcar o retorno da Argentina ao mundo dos negócios e dos investimentos internacionais. Sua agenda está lotada de entrevistas com empresários, políticos e investidores. O presidente venderá uma Argentina sem travas, sem restrições ao dólar, sem protecionismos, sem burocracia e com uma administração pró-mercado. Tudo isso é uma boa notícia para uma economia que, urgentemente, precisa retomar o crescimento. E também para empresários brasileiros, cansados de topar com as barreiras impostas nos últimos anos pelo kirchnerismo.
O primeiro mês de gestão do novo mandatário, porém, deixou mostras de como será seu comportamento com relação a instituições e oposição do país. E o resultado é no mínimo preocupante: medidas autoritárias, personalistas, anti-democráticas. Ou seja, o contrário do tom conciliatório que Macri havia prometido durante a campanha. Abaixo, alguns exemplos.
JUÍZES NOMEADOS POR DECRETO
“Nem Cristina faria algo tão absurdo”, disse o mais célebre constitucionalista argentino, Daniel Sabsay, no que foi ecoado por colegas, magistrados e líderes da oposição. Apenas cinco dias depois de assumir o cargo, Macri designou por decreto dois juízes para a Suprema Corte do país. Alegou que havia um vazio pelo fato de o Congresso estar em recesso e o novo parlamento ainda não ter tomado posse. Os senadores protestaram, porque o presidente poderia perfeitamente ter feito uma convocação para uma sessão extraordinária e tomar a decisão como manda a lei. A ex-candidata Margarita Stolbizer, que apoiou Macri no segundo turno, disse: “É um enorme retrocesso institucional, nem Cristina se animou a tanto”.
TENTATIVAS DE ALTERAR A LEI DE MEIOS SEM PASSAR PELO CONGRESSO
A Lei de Meios argentina foi polêmica do começo ao fim. Parte dela, de fato, dedicava-se a obrigar o “Clarín” a desinvestir. Como um todo, porém, ela é relevante e atualiza uma legislação que vinha vigente desde a ditadura militar (1976-1983). Mesmo grandes empresários da mídia independente, como Jorge Fontevecchia, eram favoráveis à necessidade dessa reforma. Polêmica ou não, o fato é que a Lei de Meios é uma legislação que foi devidamente aprovada pelo Congresso argentino em 2009. Portanto, virou lei seguindo as regras democráticas. Macri pode não gostar dela, assim como seus eleitores e as forças que ajudaram-no a eleger-se. Porém, se o objetivo é altera-la, ou até revoga-la, o presidente precisa percorrer o mesmo caminho. Ou seja, apresentar um projeto de mudança da Constituição ao Congresso e, obtendo dois terços de aprovação, fazer as modificações. A questão é que Macri não possui esses dois terços do Congresso. Ou seja, pela via legal, jamais conseguirá seu objetivo. O que fez, então? Passou a emitir as DNUs, (decreto de necessidade e urgência), medidas de exceção nas quais o mandatário prescinde do Congresso para tomar decisões. Além da Lei de Meios, Macri usou outras DNUs para fazer reformas na estrutura de ministérios e em outros setores do governo. Em apenas 26 dias, lançou mão de 5 DNUS, metade do que usou Raúl Alfonsín em todo o seu mandato. A Justiça, porém, tem colocado barreiras para que sejam aprovadas.
AVANÇO CONTRA A AFSCA
A Argentina possui um ente autárquico e autônomo que regula os serviços de comunicação audiovisual, a chamada AFSCA, também estabelecida por lei. É certo que o kirchnerismo não a usou bem, e sim para que funcionasse como reguladora mudanças estabelecidas pela Lei de Meios. Mas isso não dá legitimidade para que Macri intervenha nesse órgão independente, como o fez, com outro decreto presidencial, eliminando-o e demitindo seu titular, Martín Sabatella.
DEMISSÕES EM ESTATAIS
Macri e sua vice, Gabriela Michetti, iniciaram uma série de demissões no Senado e em várias estatais, alegando diferenças ideológicas e tratando os funcionários de “militantes” ou de “ñoquis” (termo usado para designar empregados que cobram salário mas não comparecem). Já se contam em dezenas de milhares os demitidos de cargos públicos. Macri e Michetti alegam que esses funcionários eram todos kirchneristas e portanto usavam seus postos para militância. Sindicatos vêm se reunindo para tomar providências e organizar protestos por discriminação ideológica.
AMEAÇAS À PROCURADORA-GERAL
O mais grave desses avanços, porém, é o promovido pelo governo contra a procuradora-geral da República, Gils Carbó, outro posto que não responde ao Executivo. Macri a acusa de alinhamento com o kirchnerismo e escalou funcionários para exercer pressão para que abandone o cargo. Seus apoiadores partiram, inclusive, para uma campanha de difamação, em que a qualificam de incompetente para o cargo por conta de seu “fanatismo político”. Gils Carbó fala em tentativa de golpe.
MEDIDAS DE EMERGÊNCIA NA SEGURANÇA
Com seu discurso linha-dura contra o narcotráfico, o governo anunciou nesta terça (19) medidas que dão poderes extras às Forças Armadas para enfrentar o que o governo chama de “situação de perigo coletivo”. Isso inclui redobrar o controle do espaço aéreo, convocar oficiais aposentados e autorizar o uso da força para derrubar ou destruir aeronaves “consideradas hostis”.
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Medidas assim preocupam, até porque Macri se vendeu ao eleitorado como alguém que promoveria o consenso e o diálogo, e não uma caça às bruxas e aos “delinquentes”. Pouco antes da eleição, entrevistei o analista político Jorge Castro (que não é kirchnerista), que me deu uma explicação que parece se encaixar perfeitamente ao que vemos agora. Para ele, como na Argentina as instituições são frágeis, o resultado das urnas não garante ao eleito uma autoridade tranquila e legitima por um longo tempo. A lua-de-mel dura pouco. Segundo Castro, uma boa votação precisa logo ser renovada por uma série de medidas que mostrem mão-forte e personalidade, para que as pessoas vejam no presidente um líder capaz. É triste que seja assim, mas Macri parece ter entendido a lição. Com uma base de apoio minoritária no Congresso, e tendo ganhado com uma diferença de apenas 580 mil votos de seu adversário, o mandatário sabe que precisa tomar medidas com personalidade, duras, e que legitimem sua autoridade para além do resultado da eleição. Parece ser isso o que está por trás das medidas acima.
Em sua campanha, Macri acenou com um governo de direita moderno, transparente e eficiente. Infelizmente, estamos vendo velhas práticas no lugar disso. Resta torcer para que Macri não caia na tentação de se transformar num governante populista de direita, tipo Fujimori (Peru) ou Uribe (Colômbia). Esse filme a América Latina também já viu.

sábado, 16 de janeiro de 2016

Cotas raciais são um avanço

Cotas raciais são um avanço, e não um retrocesso

Walmyr Junior *Jornal do Brasil
O assunto das cotas volta a ser polêmica na sociedade brasileira após jornalista da Rede Globo do DF, Alexandre Garcia, afirmar que os cotistas que entraram na Universidade de Brasília (UnB) não possuem méritos e estão lá por "pistolão". As frágeis argumentações não convencem porque os dados mostram que os cotistas vêm tendo desempenho melhor do que os não cotistas em diversas universidades do país, contrariando a narrativa apresentada pelo jornalista. 
Não podemos esquecer que o debate da meritocracia medíocre e hipócrita é uma camuflagem da discriminação racial em argumentos legalistas, revelando diversos preceitos étnico-raciais e sociais.
Com a legalidade das políticas de ações afirmativas, reconhecemos que a dívida histórica do estado brasileiro com o povo negro precisa ser paga. O racismo, ainda presente no país, coloca em xeque a autonomia e empoderamento do povo negro. No momento da política de encarceramento, do genocídio da juventude negra por parte do estado, da ausência de garantias do direito a moradia e a terra, da ocupação dos postos mais precarizados de trabalho, vemos quais são os apontamentos que nos auxilia a identificar o racismo institucional brasileiro.
Apesar de argumentações das pessoas contrárias às cotas, vemos que o objeto da crítica meritocrática interfere diretamente na retomada dos direitos dos negros e negras e na perda de privilégios da classe hegemonicamente econômica.
Agora não se trata mais das cotas nas universidades, mas das cotas em concursos públicos e a garantida da presença do corpo negro em todos os espaços de participação social. Segundo dados oficiais, do IBGE, mais de 50% da população brasileira é negra, porém, é sub-representada em menos de 30% entre os servidores públicos, ocupamos apenas 26% das vagas nas universidades e estamos ainda com a faixa salarial 50% menor do que a população não negra com os mesmos cargos no mercado do trabalho.
Para nós esse debate é muito importante pois, a partir dele, garantimos um maior empoderamento da população negra e veremos mais negros e negras ocupando espaços que são nossos por direito.
O jornalista citado acima de fato deve se preocupar. O avanço das políticas de ações afirmativas de fato vem mudando a cara das universidades brasileiras. Hoje, pintando o ensino superior com a cara do povo negro e indígena, vamos mostrando que muitos privilegiados vãos ter que engolir a seco nossos corpos, culturas e identidades ocupando todos os espaços. 
* Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor e representante do Coletivo Enegrecer como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JMJ.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Rompimento da barragem de Bento Rodrigues é o maior desastre do gênero da história mundial nos últimos 100 anos.

Segundo consultoria americana de gestão de riscos relativos à construção pesada, apenas cinco acidentes com barragens de rejeitos excederam 10 milhões de metros cúbicos de lançamentos, até hoje, em todo o mundo
por Noelle Oliveira, do Portal EBC publicado Rede Brasil Atual
AGÊNCIA BRASIL
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Lama vazada da Samarco quebra recorde em termos de distância percorrida, são 600 quilômetros até o momento
Brasília – O rompimento da barragem de rejeitos da Samarco em novembro de 2015 - que destruiu o distrito mineiro de Bento Rodrigues - é o maior desastre do gênero da história mundial nos últimos 100 anos. Se for considerado o volume de rejeitos despejados - 50 a 60 milhões de metros cúbicos (m³) - o acidente em Mariana (MG) equivale, praticamente, à soma dos outros dois maiores acontecimentos do tipo já registrados no mundo - ambos nas Filipinas, um em 1982, com 28 milhões de m³; e outro em 1992, com 32,2 milhões de m³ de lama.  Os dados estão presentes em estudo da Bowker Associates - consultoria de gestão de riscos relativos à construção pesada, nos Estados Unidos - em parceria com o geofisico David Chambers.
Apenas cinco acidentes com barragens de rejeitos excederam 10 milhões de m³ de lançamentos, até hoje, em todo o mundo.
Mas não é apenas nessa métrica (volume de rejeitos) que a tragédia mineira sai negativamente na frente. Em termos de distância percorrida pelos rejeitos de mineração, a lama vazada da Samarco quebra outro recorde. São 600 quilômetros (km) de trajeto seguidos pelo material, até o momento. No histórico deste tipo de acidente, em segundo lugar aparece um registro ocorrido na Bolívia, em 1996, com metade da distância do trajeto da lama, 300 quilômetros.
O ineditismo numérico continua em um terceiro quesito: o custo. O investimento necessário para reposição das perdas ocasionadas pelo desastre, no caso brasileiro, está orçado pela consultoria norte-americana em US$ 5,2 bilhões até o momento. O maior valor contabilizado com a mesma finalidade, após os anos 1990, foi de um acidente com perdas próximas a R$ 1 bilhão, na China. "Essas avaliações não levam em consideração a 'limpeza' das áreas afetadas, nem a 'correção' de danos diversos os quais os reparos podem não ser economicamente viáveis ou tecnicamente realizáveis", acrescenta o estudo da consultoria norte-americana.
"Embora os números exatos permaneçam um pouco distorcidos, a diferença de magnitude em relação a catástrofes passadas torna inequivocamente claro que o caso da Samarco é o pior registrado na história sobre essas três medidas de gravidade", pontua Lindsay Newland Bowker, coordenadora da Bowker Associates. O estudo registra, de 1915 a 2015, um total de 129 eventos com barragens - de 269 conhecidos - e projeta, em média, um acidente grave por ano no período de uma década.
Até 2015, foram registrados 70 eventos "muito graves" com barragens em todo o mundo. A classificação leva em conta o fato de esses acidentes terem ocasionado o vazamento de, no mínimo, 1 milhão de metros cúbicos de rejeitos, cada. De acordo com a pesquisa, enquanto na década que se encerra em 1965 havia sido contabilizado 6 milhões de m³ vazados em desabamentos de barragens, na década que termina em 2015, esse número saltou para 107 milhões de m³.
O estudo prevê que a década que se encerrará em 2025 registre 123 milhões de m³ de vazamentos de barragens de rejeitos. Em termos de quilometragem, também é registrada a tendência de crescimento. Na primeira década pesquisada, eram 126,7 quilômetros tomados por lama de rejeitos. Na última década, foram 722,2 quilômetros totais, já incluindo a falha da Samarco. A expectativa para os dez anos que se encerram em 2025 é de 723,5 km.
"Todas as catástrofes na mineração são ocasionadas por erro humano e falhas ao não se seguir as melhores práticas estabelecidas, o melhor conhecimento, a melhor ciência", pondera Lindsay.
A consultora complementa que os acidentes são, também, "falhas dos parceiros públicos"."Uma das preocupações é que o Brasil permite a utilização de barragens à montante, o método menos estável de construção, com barragens grandes. Trata-se de um desvio aos conhecimentos e práticas globalmente aceitas", explica. "No caso específico da Samarco, essa instabilidade inerente foi exacerbada por uma taxa de deposição de rejeitos e uma taxa de aumento na barragem muito superiores aos melhores padrões globais", complementa Lindsay.
O estudo lembra, ainda, outro acidente ocorrido com barragens no Brasil, em setembro de 2014, em Itabirito, também no estado de Minas Gerais. A Herculano Mineração é a responsável pela obra. Na ocasião, dois trabalhadores morreram e um desapareceu.
"As falhas da Samarco e da Herculano são apenas os dois exemplos mais recentes de um Estado que tem falhado na política nacional de mineração. Nenhuma ação foi tomada pelo governo em nível estadual ou federal para a identificar quais foram os problemas e evitar a sua manifestação com novas falhas repentinas", conclui Lindsay.
Esta semana, o subsecretário de Regularização Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais, Geraldo Vítor de Abreu, em depoimento à comissão da Assembleia Legislativa do Estado que investiga o desastre da barragem de Mariana, afirmou que Minas Gerais quer proibir o sistema de alteamento de barragens à montante na unidade da Federação. Procurada pelo Portal EBC, a empresa Samarco não se manifestou, até o momento, sobre os dados apresentados pelo estudo da Bowker Associates.

França libera lista de brasileiros do HSBC à CPI

Agência Brasil:

O governo francês aceitou o pedido da CPI do HSBC, do Senado, e decidiu que vai compartilhar os dados de correntistas brasileiros do banco na Suíça, vazados no escândalo conhecido comoSwissleaks

A decisão do governo da França de compartilhar toda a documentação do escândalo do HSBC-Swissleaks deve ressuscitar CPI sobre o tema no Senado. O relator Ricardo Ferraço (PMDB-ES) já foi informado pelo Ministério Público a respeito da liberação.

“Pensavam que a CPI estava enterrada, mas estamos renascendo das cinzas, como uma fênix”, disse Ricardo Ferraço ao blog do jornalista Fernando Rodrigues, do Uol, que integra o pool internacional de profissionais com acesso aos documentos.

O SwissLeaks refere-se ao vazamento de arquivos de uma agência do HSBC na Suíça. O número de contas de brasileiros passa de 8.000, com cerca de US$ 7 bilhões depositados. A maioria não declarou os valores à Receita Federal.

A CPI foi uma iniciativa do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), mas não decolou porque o Uol, que detinha os dados completos, não forneceu os dados sob alegação de seria “incorreto divulgar listas de nomes sem uma checagem prévia de cada um e sem que fique estabelecida a relevância jornalística e o interesse público”.

Ferraço queria convocar os brasileiros com os maiores volumes depositados em contas secretas no HSBC de Genebra. Mas a maioria dos integrantes da CPI freou essa iniciativa, pois o Senado não tinha acesso aos dados originais do vazamento.

Agora, a situação pode mudar.

A CPI do HSBC-SwissLeaks receberá os dados do governo francês com o compromisso de não divulgar as informações. Mas poderá agora requerer oficialmente uma checagem dos dados por parte da Receita Federal – que já tem a mesma documentação.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

PF indicia Vale, presidente e diretores da Samarco

Brasil 247:

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A Polícia Federal indiciou as mineradoras Vale e Samarco e a Vogbr, empresa que vistoria barragens, pela rompimento da barragem de Fundão, em Minas; as companhias foram indiciadas como pessoa jurídica; outras sete pessoas foram indiciadas, dentre elas o diretor-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, além de diretores da empresa; eles responderão por "tornar área, urbana ou rural, imprópria para ocupação humana", "dificultar o uso público de praias", "causar poluição hídrica" e "lançamento de resíduos em desacordo com as exigências estabelecidas"; a pena para estes casos pode chegar a cinco anos de prisão

PF indiciou as mineradoras Vale e Samarco e a Vogbr, empresa que vistoria barragens, pela rompimento da estrutura de Fundão, no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na região central de Minas. As companhias foram indiciadas como pessoa jurídica. 
A PF também indiciou sete pessoas: o diretor-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, o Diretor de Operações, o Gerente Geral de Operações, o Coordenador de Monitoramento das barragens, o Gerente Geral de Projetos, a Gerente de Geotecnia, e responsável técnico pela barragem de Fundão, além do engenheiro responsável por assinar a Declaração de Estabilidade da estrutura meses antes do rompimento.
Os indiciados também vão responder por "tornar área, urbana ou rural, imprópria para ocupação humana", "dificultar o uso público de praias", "causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água", e "lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas". A pena para estes casos pode chegar a cinco anos de prisão.
A tragédia provocou a morte de 17 pessoas e, segundo a Samarco, despejou cerca de 62 milhões de metros cúbicos de lama no meio ambiente, o suficiente para encher 24 mil piscinas olímpicas. De acordo com o Ibama, 663 quilômetros de rios foram atingidos pela lama, que chegou ao litoral do Espírito Santo.
Segundo comunicado da PF, pode haver novos indiciamentos "conforme o que for apurado no inquérito policial". A corporação reforçou que tem "atribuição para investigar crimes ambientais" porque os rejeitos de minério de ferro atingiram o leito do Rio Doce, que é um bem da União e banha dois Estados, Minas e Espírito Santo.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Justiça Social e Democracia caminham juntas

Editorial do site Vermelho:

É inovador, e de extrema importância, o estudo publicado em dezembro pelos pesquisadores Pedro H. G. F. Souza e Marcelo Medeiros sobre a concentração de renda no Brasil. Ele abrange o período que vai de 1928 até 2012, e tem o título de Top Income Shares and Inequality: 1928­2012 (A fatia de renda do topo e a desigualdade, em tradução livre). O estudo foi publicado no Journal of the Brazilian Sociological Society / Revista da Sociedade Brasileira de Sociologia, edição de julho/dezembro de 2015.

A novidade do estudo está na extensão de tempo que envolve – quase nove décadas. O mais comum é que estudos desse tipo tratem sobretudo períodos posteriores à Segunda Grande Guerra, quando informações referentes ao PIB, PEA e outros indicadores correntes começaram a ser usadas pelos estudos estatísticos.

Seus autores investigaram outras fontes de dados, e chegaram a conclusões previsíveis. Uma delas mostra que a concentração de renda no Brasil tem sido historicamente alta. Há outra conclusão que também já se poderia imaginar: nos períodos de maior democracia a luta do povo e dos trabalhadores floresce e, em consequência, há redução na desigualdade na distribuição de renda.

A luta pela democracia no Brasil tem sido árdua. O primeiro período democrático mais longo, embora limitado, vai do final da Segunda Grande Guerra até o golpe militar de 1964. O estudo mostra que, entre 1942 e 1963 a desigualdade de renda diminuiu fortemente. Ela voltou a crescer depois de 1964, quando o movimento pelas reformas de base do governo constitucional de João Goulart foi derrotado militarmente, sendo imposta ao país a ditadura que o infelicitaria durante 21 anos. A aliança entre os setores mais reacionários da classe dominante e representantes do capital estrangeiro (antepassados diretos do conluio direitista neoliberal que domina a oposição em nossos dias) tomou o poder e impôs a ditadura sangrenta para fazer retroagir, de coturno nos pés e fuzis nas mãos, aquela tendência de redução da concentração de renda.

Os autores do estudo argumentam corretamente que a classe dominante que está no topo da sociedade (os 1% mais ricos) faz de tudo para controlar a seu favor os mecanismos que determinam o aumento ou queda da desigualdade de renda.

Em 2012 esses privilegiados tinham a renda média anual estimada de 552,9 mil reais. A riqueza que controlam – que, juntamente com a riqueza dos 10% mais ricos, pode chegar a mais da metade do total – dá à classe dominante um poder político que não pode ser desprezado.

É uma concentração que, apesar da visível redistribuição ocorrida nos últimos anos, mantém padrões escandalosos. O estudo mostra que entre 2006 e 2012, o 1% mais rico continuava concentrando mais renda do que todos os 50% mais pobres da população.

Uma conclusão é inevitável: “É razoável concluir que a ditadura realmente promoveu desigualdade maior em seus primeiros anos”, explicam os autores. 

Outra conclusão que se impõe contraria o pensamento neoliberal hegemônico na direita e reconhece o papel do Estado – e do governo – para promover políticas de redistribuição de renda. Medeiros foi claro, a respeito: “uma coisa importante que o estudo de longo prazo mostra é que a desigualdade depende de como o Estado trata as elites”.

A retomada da redistribuição de renda e da melhoria das condições salariais e de vida do povo trabalhador que o país vive desde 2003 explica, sem dúvida, a fúria da direita e seus porta-vozes contra os governos democráticos e patrióticos de Lula e Dilma. A falsa moralidade daqueles que investem contra mares de lama midiáticos mal esconde seu verdadeiro: o vale tudo direitista para reverter qualquer processo de distribuição de renda e manter seus privilégios escandalosos. E reduzir o povo e os trabalhadores à pobreza e às dificuldades que sempre enfrentaram.
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segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

A linguagem fascista, por Márcia Tiburi

Carta Capital

O Jogo da Linguagem Fascista

Uma aberração política exprime, com frases feitas e clichês veiculados nas redes sociais, a miséria subjetiva de nossa época


Fascismo é uma expressão que vem sendo usada para definir formas espetaculares deexposição de preconceitos raciais, sexuais, de gênero, de classe e vários outros no nível do cotidiano concreto ou virtual.
Podemos lembrar do fascismo italiano e sua imitação dos rituais de poder da Roma antiga. Mas o fenômeno atual caracteriza-se por explosões de ódio que causam espanto a quem olha o mundo e a sociedade em termos democráticos. 
Guardados na intimidade, preconceitos são sementes de fascismos potenciais. Mas a potência não é o ato e ninguém pode avaliar o sentimento dos outros, senão por meio de sua expressão. A prova que temos do fascismo de qualquer um é, portanto, sua expressão verbal, gestual ou prática. 
Humilho, logo existo!
O fascismo é uma espécie de teoria prática de ação que começa com atos de fala ética epoliticamente empobrecidos
O código verbal é um dispositivo comum e simples que usamos tanto para produzir a mais básica socialização quanto a mais complexa metafísica. Hoje, ele mesmo se torna espetáculo. A gritaria, o xingamento e a falta de respeito não se expressam apenas em palavras e frases, mas em notícias e formas discursivas em geral. 
A grave incapacidade de se relacionar com aquela figura da diversidade que podemos denominar de “outro”, da qual essas formas de linguagem são prova, põem em questão a transformação do verbal em “capital”. Aqueles que, operando dentro de um regime de pensamento democrático, ficam perplexos ou revoltados com isso, contrapõem-se aos que se deixam fascinar.
Se os primeiros interpretam a negação do outro como perda ética, política e social, os segundos, deslumbrados e fetichizados pela palavra transformada em mercadoria, descobrem o lucro que a negação do outro pode lhes fornecer em termos subjetivos. Participam do espetáculo verbal da gritaria sentindo-se capitalizados subjetivamente. 
Mussolini
Podemos lembrar do fascismo italiano, mas o fenômeno atual caracteriza-se por explosões de ódio (Bundesarchiv)
Em termos simples, isso quer dizer que há uma vantagem pessoal impagável no ato de negar o outro e de expressar essa negação com palavras. Essas palavras são publicitárias. Ditas na forma de slogans fáceis de repetir, elas garantem ao fascista um lucro.
Incansável no ato de repetir frases feitas e clichês, ele parece colocar moedinhas em um cofre. A moedinha pode ser a frase nas redes sociais. Essa busca por lucro por meio de uma repetição torna-se literalmente um modo de ser. 
Incapaz de supor a existência da “alteridade”, o fascista encontra um modo de ser. Como experiência de si podemos considerar o fascismo um logro, mas não para quem, vivendo um profundo empobrecimento subjetivo, não tem outra saída. A negação do outro é funcional para quem dela se serve. Ela pode ser o único jeito de garantir que se existe. Em termos simples: de conquistar um lugar no mundo. 
O fascismo é, em qualquer sentido, uma aberração política, mas cujo fundo existencial é a profunda miséria subjetiva de nossa época. Seucogito: humilho, logo existo. Ele serve como prova de si para quem vive vazio relativamente ao pensamento, aos afetos e à própria ação. O fascista deve pensar que “é alguém” por meio da transformação do outro em “ninguém”.  
As vantagens do fascista 
A humilhação produzida esconde a humilhação vivida. Sabemos que se aprende a humilhar sendo humilhado. Talvez mostrar no outro o que se esconde em si mesmo possa explicar um lucro no estilo do velho “levar vantagem”.
Ora, a humilhação verbal é fácil; está disponível, sobretudo, nas redes sociais. O discurso preconceituoso permite hoje em dia, além de tudo, conquistar fãs, dirigir mentalidades, determinar comportamentos.
O fascista real tem algo de um sacerdote ou de um publicitário altamente expressivo que, em vez de pregar o amor, vende, sem-vergonha, o ódio contra o outro. E, num mecanismo de inversão, típico do seu raciocínio fundado na chance de aniquilar o outro, ao contrário da vergonha – que seria inevitável caso ele percebesse a si mesmo –, ele se orgulha do que diz. 
Do “orgulho hétero” ao “racismo reverso”, da “culpabilização das vítimas” ao “fazer-se de vítima enquanto é algoz”, é sempre a mesma lógica de ocultamento de si pela humilhação – ou afirmação negativa – do outro que está em cena. A própria democracia muitas vezes é alegada em termos os mais autoritários. 
Impotente para a compreensão do outro, para perguntar, para mudar de ideia, resta-lhe tentar sentir-se sempre cheio de razão. A impotência para o questionamento tem um nome metafórico cuja validade técnica, infelizmente, foi banalizada.
Trata-se da “burrice” como impotência não apenas relativa ao saber sobre as coisas, mas relativa ao outro que sempre nos serve de espelho.


* Marcia Tiburi, filósofa, acaba de publicar o livroComo Conversar com um Fascista (Ed. Record