sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Quem vai pagar pela morte da natureza atingida pela Samarco?

Dom Total:

Tragédia de Mariana: quem vai pagar pela morte da natureza atingida pela Samarco?

Autoridades não se preocupam em realizar a contagem exata dos animais mortos e afetados de forma direta e indireta pelo crime ambiental. Os animais têm direito ou não?
Peixes agonizam no Rio Doce: animais foram afetados direta e indiretamente pela tragédia.
Peixes agonizam no Rio Doce: animais foram afetados direta e indiretamente pela tragédia.
Por Kiwonghi Bizawu*
Nas vésperas do triste aniversário, do maior desastre socioambiental do Brasil, o presente artigo pretende abordar as consequências do mar de lama gerado pelo rompimento da barragem de Fundão para os animais.
É evidente que a perda de vidas humanas, ganha destaque no noticiário, separando-se a contagem de corpos encontrados, dos ainda desaparecidos, buscando-se o reconhecimento de cada um.
E claro que não deveria ser diferente. Contudo, parece que os holofotes não se preocupam em realizar a contagem exata dos animais mortos, e ainda afetados de forma direta e indireta. E porque tal descaso? Ou seria necessário para não se perder o foco do “mais importante”? Os animais têm também direito ou não? São sujeitos de direitos ou não?
Para responder a essas perguntas, o primeiro passo é definir o que é mais importante para a tutela do direito ambiental e como previsto no artigo 225 da Constituição Federal: manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado para presentes e futuras gerações.
E pela própria definição constitucional, não há como olvidar-se dos direitos dos animais, haja vista que se não forem amplamente defendidos, restará comprometido o tão almejado equilíbrio ecológico.
Equilíbrio ecológico este, que é de interesse de toda a humanidade, como já frisou o Papa Francisco na Encíclica Laudato Sí sobre a casa comum. Assim faz-se necessária uma reflexão da sociedade, sobre os animais que tiveram a vida levada pelo mar de lama, e ainda a consequência de sua perda para seus proprietários e para o ecossistema de um modo geral. Qual o valor econômico e intrínseco desses animais levados pela lama da Samarco?

Quando se pensa no Rio Doce, logo vem à tona a imagem dos milhares de peixes mortos, asfixiados pelos rejeitos da atividade minerária, representando a ganancia do homem, pelo crescimento econômico.
É importante destacar que milhares de animais bebiam diariamente daquela água, e foram afetados direta e indiretamente pelo desastre. Para ilustrar o alcance do problema, basta pensar em um pequeno produtor que perdeu sua vaca leiteira cujos prejuízos vão muito além da perda afetiva de um animal querido, mas afetam consideravelmente sua subsidência.
E eis o segundo tópico do presente artigo, que é explicar que como ocorreram danos diversos, deve haver indenizações de diversas naturezas, como passa-se a explicar.
Quanto ao proprietário que perdeu seu animal de estimação ou de valor econômico inestimável, e tido como um membro da família cabe-lhe uma indenização por dano moral pela violação de seu direito subjetivo e, sem dúvida, psicologicamente e emocionalmente afetado e bastante abalado. Deve-se, então, receber indenização por dano material, não só pelo valor de mercado de seu animal, mas também pelos danos emocionais causados pela ausência do animal.
Já para o pequeno produtor que perdeu a vaca leiteira, ou o pescador que não tem mais peixes sadios para pescar, cabe ainda indenização por lucros cessantes, pelos valores que deixaram de receber em razão do desastre.
E quanto ao fato de que o ecossistema da área atingida precisa ser restabelecido, em vários aspectos da vida animal, como o de cadeia alimentar, importante destacar que o meio ambiente deve ser ressarcido, por meio de obrigação de fazer, sob pena de multas diárias a serem arbitradas.
E quem paga o pato, tanto para obrigações de fazer quanto de pagar, no que diz respeito à reparação do dano para a vida animal? O poluidor paga, e graças a lei da Política Nacional do Meio Ambiente, paga mesmo se for poluidor direto ou indireto, e pela responsabilidade civil ambiental, paga ainda independentemente da prova de culpa, bastando dois requisitos: o dano e nexo causal.  E a vida do animal? Tem sentido ou não em uma sociedade que preza mais pelo lucro do que pela vida e preservação e conservação do meio ambiente, seus ecossistemas e biodiversidade.
Crime ambiental e suas implicações

Em artigo publicado nesta Super Manchete, Vânia Ágda de Oliveira Carvalho aponta que, além da morte causada no interior dos rios, a lama provocou o perecimento de toda a vegetação próxima à região. "Implica em dizer que, aproximadamente 1.469 hectares de vegetação foram drástica e onerosamente atingidos. Quantidade enorme de mata ciliar foi completamente destruída. Isso sem mencionar os danos ao solo, visto que os resíduos da mineração também causam desestruturação química, afetando o PH da terra", destaca. Ou seja, desenvolvimento de espécies que existiam na região se vê dificultado, modificando completamente a vegetação local.

Por sua vez, Camila Cristina de Souza Rossi argumenta que a sujeira de lama ainda causou dezenas de prejuízos socioeconômicos com flagrante violação de direitos humanos. "O desastre afetou severamente a vida de muitos brasileiros que vivem às margens do rio Doce. Diversos municípios tiveram o fornecimento de água interrompido, esgoto sanitário e energia elétrica comprometidos", afirma. Rossi cobra a efetiva limpeza e restauração da bacia do Rio Doce.

E o que é mais importante: manter empregos da Samarco ou proteger o meio ambiente? Apesar dos visíveis danos causados pela Samarco, moradores cobram a permanência da empresa em Mariana. Thiago Loures Machado Moura Monteiro evoca Legião Urbana, ao argumentar que todos querem desenvolvimento, mas é necessário atuação de todos da defesa do meio ambiente.
"É preciso da educação ambiental implementada na sociedade, e mais do que isso, o amadurecimento social pela conscientização, de que conforme disse a Constituição, para que haja um futuro da nação, e da humanidade, é preciso uma consciência global, de preservação do meio ambiente, mesmo que para tanto, se percam alguns benefícios econômicos", defende.
* Kiwonghi Bizawu é professor de graduação e Mestrado e pró-reitor de Pós-Graduação da Dom Helder Escola de Direito. Doutor e Mestre em Direito pela PUC Minas.

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