quarta-feira, 31 de agosto de 2016

É Golpe: Rasgaram a Constituição




POR 61 A 20, SENADORES CONFIRMAM O GOLPE DE 2016


"A elite predadora acaba, pois, de resolver seus problemas com o golpe de 2016, derrubando a presidenta que inutilmente tentava mostrar-se confiável para os donos do poder, mas que não podia ir tão longe quanto eles queriam. Eles queriam tudo, particularmente matar a Constituição de 1988 no que ela tem de justiça social.¨


Política no Face:

Sem crime, Dilma Rousseff tem o mandato cassado. O golpe está dado. Praticado por um conjunto de parlamentares e políticos velhos, brancos, ricos e em sua maioria acusados de corrupção. Associados a uma mídia em crise falimentar, política e mentirosa, que se agarra aos cofres públicos como medida de sobrevivência. E a um programa econômico, não votado nas urnas, que submete os pobres aos ricos, que aliena patrimônio do povo, que arrebenta direitos de décadas e volta a botar o Brasil de quatro, uma província de suas matrizes.

Mas se o método do Golpe é mais moderno, da prática antiga das bananeiras só traz a velha mídia, sem tanques nas ruas, por outro lado os que o materializam são as velhas elites e as velhas políticas. Carcomidas, corruptas e de palavreado colonial. Ainda se tentará completar a obra, com ataques a tudo o que é progressista.


Mas as trevas serão breves. Essa gente não sobrevive aos tempos modernos. E nem a terra lhes será leve.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

“Canalha, canalha, canalha”: a homenagem de Requião a Aécio fica para a história. Por Kiko Nogueira

Diário do Centro do Mundo


Com a contundência que lhe é peculiar, Roberto Requião foi direto ao coração da besta em seu último pronunciamento no julgamento do impeachment.
“Não pretendo, nesta sessão, moderar a linguagem ou asfixiar o que penso. Não vou reprimir a indignação que me consome. ‘Canalha! Canalha! Canalha!’”, falou.
Requião não se dirigiu nominalmente a ninguém, mas não precisou. No plenário, Aécio Neves, ao lado de Antonio Anastasia, sabia que era para ele. O câmera da TV Senado também. Teve a gentileza de focalizar Aécio mais adiante no discurso, escarrapachado na poltrona, visivelmente desconfortável.
Em 2 de abril de 1964, o avô de Aécio, Tancredo, deu o mesmo grito para Auro de Moura Andrade, que declarou vaga a presidência da República quando João Goulart estava em Porto Alegre (ouça abaixo).
“A Constituição Federal está sendo rasgada e estamos diante de um golpe de Estado”, disse Requião.
“Duvido que um só de nós esteja convencido de que a Presidente Dilma deva ser impedida por ter cometido crimes. Não são as pedaladas ou a tal irresponsabilidade fiscal que a excomungam. O próprio relator da peça acusatória praticou-as à larga, só que lá, em Minas, não havia um providencial e desfrutável Eduardo Cunha nem um centrão querendo sangue, salivando por sinecuras e pixulecos.”
Prosseguiu: “A inocência do relator é a mesma de Moura Andrade, declarando vaga a presidência. Ah!, as palavras de Tancredo coçam-me a garganta. Este Senado está prestes a repetir a ignomínia de março de 64. O que se pretende? Que daqui a alguns anos se declare nula esta sessão, como declaramos nula a sessão que tirou o mandato de Goulart, e peçamos desculpas à filha e aos netos de Dilma?”
Assim como o depoimento de Dilma na farsa do impedimento foi seu ápice, aquele foi o de Roberto Requião. Aécio sai dessa fraude ainda menor do que entrou.
Canalhas. Canalhas. Canalhas.

Dilma deu início ao julgamento dos canalhas perante a História, por Jeferson Miola

Jeferson Miola
A consumação do golpe de Estado baseado no processo fraudulento de impeachment da Presidente Dilma é uma questão de horas.
A liturgia que está sendo seguida neste julgamento, com longas sessões no Senado presididas pelo Presidente do STF, é apenas um verniz para aparentar normalidade de funcionamento das instituições que, na verdade, estão sendo destroçadas com o golpe.
A maioria do tribunal de exceção em que se transformou o Senado da República é formada por senadores e senadoras golpistas que já condenaram por antecipação a Presidente Dilma, muito antes do início do processo e independentemente da inexistência de fundamentos jurídicos e legais.
Esse tribunal de exceção não fará um julgamento justo, honesto e imparcial, porque decidirá fascistamente, com base apenas numa maioria conspiradora que violenta a Lei e a Constituição para tomar de assalto o poder de Estado.
Uma maioria que forjou argumentos jurídicos fraudulentos através de militantes partidários infiltrados nas instituições do Estado como o Tribunal de Contas da União, para derrubar uma adversária que não conseguiram vencer nas urnas.
Não existe racionalidade, razoabilidade e, menos ainda, verdade na decisão pré-concebida desta maioria que se vale unicamente da condição majoritária, mas não de eventual crime de responsabilidade que poderia justificar a cassação do mandato presidencial.
Nas quase 15 horas de depoimento no tribunal de exceção, Dilma desmascarou os algozes de 2016 que não trajam a farda militar que trajavam seus algozes da ditadura civil-militar de 1964 que também tinham sociedade com o Grupo Globo, mas que nem por isso deixam de ser gorilas oligárquicos que atentam contra a democracia e o Estado de Direito.
pronunciamento da Presidente Dilma na abertura da sessão do tribunal de exceção é uma peça memorável que organiza a narrativa sobre o golpe e instrumentaliza a resistência democrática e popular do próximo período.
É um discurso que adquire a mesma transcendência histórica de libelos famosos de vítimas da opressão e da tirania burguesa como a carta aberta Eu acuso, de Émile Zola [1898]; como A história me absolverá, de Fidel Castro [1953]; e como a Carta Testamento, de Getúlio Vargas [1954].
O gesto de Dilma é equiparável à trajetória de militantes revolucionárias como Olga Benário e Rosa Luxemburgo, que enfrentaram corajosamente e frontalmente seus opressores.
Os canalhas sofreram uma derrota estratégica na “assembléia geral de bandidos” de 29 de agosto de 2016. Eles foram surpreendidos por uma mulher que não só é mais madura que a jovem corajosa e ousada que enfrentou pela primeira vez um tribunal de exceção com 23 anos de idade em janeiro de 1970, mas que continua sendo uma “brava mulher brasileira” lutadora da igualdade e da justiça social.
Dilma teve uma atuação magistral. Gigante, contrastou com o nanismo moral dos seus algozes. Ela ensinou aos golpistas a diferença entre o golpe militar que destrói a árvore da democracia a machadadas e o golpe parlamentar dos fungos, que parasita a árvore da democracia silenciosamente.
Dilma foi uma mulher destemida, que revelou temor pela única morte que um ser humano digno e decente pode temer, que é a morte da democracia.
Este 29 de agosto de 2016 entra para a história não como mais uma etapa da farsa do impeachment da Presidente da República que está em vias de ser perpetrado, mas como o dia em que Dilma decretou o início do julgamento histórico dos canalhas.
A partir desse dia, esses canalhas fascistas foram reduzidos à condição de fungos desprezíveis que parasitam a árvore da democracia. Eles serão julgados e condenados pelo povo muito mais cedo que tarde.
Assim como seus inquisidores de janeiro de 1970 escondiam seus rostos para não serem reconhecidos, os fascistas que em 2016 cassarão seu mandato legítimo também viverão escondendo seus rostos, e serão escravos de uma vergonha que os acompanhará pela eternidade da História.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Lindberg aponta os responsáveis pelo golpe: "Eu acuso!"

O DISCURSO ANTOLÓGICO DE LINDBERGH: EU ACUSO!

Assim como Émile Zola escreveu seu célebre "J'accuse", o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) também produziu um discurso histórico, o seu "Eu acuso", em que aponta as forças responsáveis pelo golpe parlamentar de 2016; "Eu acuso Eduardo Cunha e Michel Temer de liderarem uma conspiração parlamentar contra o seu mandato, que culminou naquela sessão de 17 de abril, que foi chamada de uma assembleia de bandidos comandada por um bandido", disse ele, que comparou o Senado ao tribunal de exceção que julgou Dilma quando jovem; "a Globo, que há três anos pedia desculpas ao País por seu apoio ao golpe militar de 1964, agora embarca em outro golpe"; assista

Lindbergh: Eu acuso Temer e Cunha, FIESP, Globo, as elites brasileiras e o PSDB por este Golpe de Estado

29 de agosto de 2016

Discurso histórico de Dilma no Senado

Foto: Jornalistas Livres
Por Altamiro Borges

Sem se intimidar diante dos seus algozes - com a mesma altivez que enfrentou os generais no tribunal de exceção da ditadura militar -, a presidenta Dilma Rousseff apresentou a sua defesa na sessão do Senado desta segunda-feira (29). "Coração valente", ela encarou os senadores: "Diante das acusações que contra mim são dirigidas, não posso deixar de sentir novamente o gosto amargo da injustiça e do arbítrio. Mas como no passado, resisto. Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes". Ao falar sobre o êxito das Olimpíadas no Brasil, ela chorou. Dilma também criticou o papel nefasto da mídia no golpe. Vale conferir a íntegra do seu discurso, que entrará para a história:

*****

Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski
Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal Renan Calheiros,
Excelentíssimas Senhoras Senadoras e Excelentíssimos Senhores Senadores,
Cidadãs e Cidadãos de meu amado Brasil,

No dia 1° de janeiro de 2015 assumi meu segundo mandato à Presidência da República Federativa do Brasil. Fui eleita por mais de 54 milhões de votos.
Na minha posse, assumi o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, bem como o de observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.

Ao exercer a Presidência da República respeitei fielmente o compromisso que assumi perante a nação e aos que me elegeram. E me orgulho disso. Sempre acreditei na democracia e no Estado de direito, e sempre vi na Constituição de 1988 uma das grandes conquistas do nosso povo.
Jamais atentaria contra o que acredito ou praticaria atos contrários aos interesses daqueles que me elegeram.
Nesta jornada para me defender do impeachment me aproximei mais do povo, tive oportunidade de ouvir seu reconhecimento, de receber seu carinho. Ouvi também críticas duras ao meu governo, a erros que foram cometidos e a medidas e políticas que não foram adotadas. Acolho essas críticas com humildade.
Até porque, como todos, tenho defeitos e cometo erros.
Entre os meus defeitos não está a deslealdade e a covardia. Não traio os compromissos que assumo, os princípios que defendo ou os que lutam ao meu lado. Na luta contra a ditadura, recebi no meu corpo as marcas da tortura. Amarguei por anos o sofrimento da prisão. Vi companheiros e companheiras sendo violentados, e até assassinados.
Na época, eu era muito jovem. Tinha muito a esperar da vida. Tinha medo da morte, das sequelas da tortura no meu corpo e na minha alma. Mas não cedi. Resisti. Resisti à tempestade de terror que começava a me engolir, na escuridão dos tempos amargos em que o país vivia. Não mudei de lado. Apesar de receber o peso da injustiça nos meus ombros, continuei lutando pela democracia.
Dediquei todos esses anos da minha vida à luta por uma sociedade sem ódios e intolerância. Lutei por uma sociedade livre de preconceitos e de discriminações. Lutei por uma sociedade onde não houvesse miséria ou excluídos. Lutei por um Brasil soberano, mais igual e onde houvesse justiça.
Disso tenho orgulho. Quem acredita, luta.
Aos quase setenta anos de idade, não seria agora, após ser mãe e avó, que abdicaria dos princípios que sempre me guiaram.
Exercendo a Presidência da República tenho honrado o compromisso com o meu país, com a Democracia, com o Estado de Direito. Tenho sido intransigente na defesa da honestidade na gestão da coisa pública.
Por isso, diante das acusações que contra mim são dirigidas neste processo, não posso deixar de sentir, na boca, novamente, o gosto áspero e amargo da injustiça e do arbítrio.
E por isso, como no passado, resisto.
Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes. No passado, com as armas, e hoje, com a retórica jurídica, pretendem novamente atentar contra a democracia e contra o Estado do Direito.
Se alguns rasgam o seu passado e negociam as benesses do presente, que respondam perante a sua consciência e perante a história pelos atos que praticam. A mim cabe lamentar pelo que foram e pelo que se tornaram.
E resistir. Resistir sempre. Resistir para acordar as consciências ainda adormecidas para que, juntos, finquemos o pé no terreno que está do lado certo da história, mesmo que o chão trema e ameace de novo nos engolir.
Não luto pelo meu mandato por vaidade ou por apego ao poder, como é próprio dos que não tem caráter, princípios ou utopias a conquistar. Luto pela democracia, pela verdade e pela justiça. Luto pelo povo do meu País, pelo seu bem-estar.
Muitos hoje me perguntam de onde vem a minha energia para prosseguir. Vem do que acredito. Posso olhar para trás e ver tudo o que fizemos. Olhar para a frente e ver tudo o que ainda precisamos e podemos fazer. O mais importante é que posso olhar para mim mesma e ver a face de alguém que, mesmo marcada pelo tempo, tem forças para defender suas ideias e seus direitos.
Sei que, em breve, e mais uma vez na vida, serei julgada. E é por ter a minha consciência absolutamente tranquila em relação ao que fiz, no exercício da Presidência da República que venho pessoalmente à presença dos que me julgarão. Venho para olhar diretamente nos olhos de Vossas Excelências, e dizer, com a serenidade dos que nada tem a esconder que não cometi nenhum crime de responsabilidade. Não cometi os crimes dos quais sou acusada injusta e arbitrariamente.
Hoje o Brasil, o mundo e a história nos observam e aguardam o desfecho deste processo de impeachment.
No passado da América Latina e do Brasil, sempre que interesses de setores da elite econômica e política foram feridos pelas urnas, e não existiam razões jurídicas para uma destituição legítima, conspirações eram tramadas resultando em golpes de estado.
O Presidente Getúlio Vargas, que nos legou a CLT e a defesa do patrimônio nacional, sofreu uma implacável perseguição; a hedionda trama orquestrada pela chamada “República do Galeão, que o levou ao suicídio.
O Presidente Juscelino Kubitscheck, que construiu essa cidade, foi vítima de constantes e fracassadas tentativas de golpe, como ocorreu no episódio de Aragarças.
O presidente João Goulart, defensor da democracia, dos direitos dos trabalhadores e das Reformas de Base, superou o golpe do parlamentarismo mas foi deposto e instaurou-se a ditadura militar, em 1964.  
Durante 20 anos, vivemos o silêncio imposto pelo arbítrio e a democracia foi varrida de nosso País. Milhões de brasileiros lutaram e reconquistaram o direito a eleições diretas.
Hoje, mais uma vez, ao serem contrariados e feridos nas urnas os interesses de setores da elite econômica e política nos vemos diante do risco de uma ruptura democrática. Os padrões políticos dominantes no mundo repelem a violência explícita. Agora, a ruptura democrática se dá por meio da violência moral e de pretextos constitucionais para que se empreste aparência de legitimidade ao governo que assume sem o amparo das urnas. Invoca-se a Constituição para que o mundo das aparências encubra hipocritamente o mundo dos fatos.
As provas produzidas deixam claro e inconteste que as acusações contra mim dirigidas são meros pretextos, embasados por uma frágil retórica jurídica.
Nos últimos dias, novos fatos evidenciaram outro aspecto da trama que caracteriza este processo de impeachment. O autor da representação junto ao Tribunal de Contas da União que motivou as acusações discutidas nesse processo, foi reconhecido como suspeito pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Soube-se ainda, pelo depoimento do auditor responsável pelo parecer técnico, que ele havia ajudado a elaborar a própria representação que auditou. Fica claro o vício da parcialidade, a trama, na construção das teses por eles defendidas.
São pretextos, apenas pretextos, para derrubar, por meio de um processo de impeachment sem crime de responsabilidade, um governo legítimo, escolhido em eleição direta com a participação de 110 milhões de brasileiros e brasileiras. O governo de uma mulher que ousou ganhar duas eleições presidenciais consecutivas.
São pretextos para viabilizar um golpe na Constituição. Um golpe que, se consumado, resultará na eleição indireta de um governo usurpador.
A eleição indireta de um governo que, já na sua interinidade, não tem mulheres comandando seus ministérios, quando o povo, nas urnas, escolheu uma mulher para comandar o país. Um governo que dispensa os negros na sua composição ministerial e já revelou um profundo desprezo pelo programa escolhido pelo povo em 2014.
Fui eleita presidenta por 54 milhões e meio de votos para cumprir um programa cuja síntese está gravada nas palavras “nenhum direito a menos”.
O que está em jogo no processo de impeachment não é apenas o meu mandato. O que está em jogo é o respeito às urnas, à vontade soberana do povo brasileiro e à Constituição.
O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos: os ganhos da população, das pessoas mais pobres e da classe média; a proteção às crianças; os jovens chegando às universidades e às escolas técnicas; a valorização do salário mínimo; os médicos atendendo a população; a realização do sonho da casa própria.
O que está em jogo é o investimento em obras para garantir a convivência com a seca no semiárido, é a conclusão do sonhado e esperado projeto de integração do São Francisco. O que está em jogo é, também, a grande descoberta do Brasil, o pré-sal. O que está em jogo é a inserção soberana de nosso País no cenário internacional, pautada pela ética e pela busca de interesses comuns.
O que está em jogo é a auto-estima dos brasileiros e brasileiras, que resistiram aos ataques dos pessimistas de plantão à capacidade do País de realizar, com sucesso, a Copa do Mundo e as Olimpíadas e Paraolimpíadas.
O que está em jogo é a conquista da estabilidade, que busca o equilíbrio fiscal mas não abre mão de programas sociais para a nossa população.
O que está em jogo é o futuro do País, a oportunidade e a esperança de avançar sempre mais.
Senhoras e senhores senadores,
No presidencialismo previsto em nossa Constituição, não basta a eventual perda de maioria parlamentar para afastar um Presidente. Há que se configurar crime de responsabilidade. E está claro que não houve tal crime.
Não é legítimo, como querem os meus acusadores, afastar o chefe de Estado e de governo pelo “conjunto da obra”. Quem afasta o Presidente pelo “conjunto da obra” é o povo e, só o povo, nas eleições. E nas eleições o programa de governo vencedor não foi este agora ensaiado e desenhado pelo Governo interino e defendido pelos meus acusadores.
O que pretende o governo interino, se transmudado em efetivo, é um verdadeiro ataque às conquistas dos últimos anos.
Desvincular o piso das aposentadorias e pensões do salário mínimo será a destruição do maior instrumento de distribuição de renda do país, que é a Previdência Social. O resultado será mais pobreza, mais mortalidade infantil e a decadência dos pequenos municípios.
A revisão dos direitos e garantias sociais previstos na CLT e a proibição do saque do FGTS na demissão do trabalhador são ameaças que pairam sobre a população brasileira caso prospere o impeachment sem crime de responsabilidade.
Conquistas importantes para as mulheres, os negros e as populações LGBT estarão comprometidas pela submissão a princípios ultraconservadores.
O nosso patrimônio estará em questão, com os recursos do pré-sal, as riquezas naturais e minerárias sendo privatizadas.
A ameaça mais assustadora desse processo de impeachment sem crime de responsabilidade é congelar por inacreditáveis 20 anos todas as despesas com saúde, educação, saneamento, habitação. É impedir que, por 20 anos, mais crianças e jovens tenham acesso às escolas; que, por 20 anos, as pessoas possam ter melhor atendimento à saúde; que, por 20 anos, as famílias possam sonhar com casa própria.
Senhor Presidente Ricardo Lewandowski, Sras. e Srs. Senadores,
A verdade é que o resultado eleitoral de 2014 foi um rude golpe em setores da elite conservadora brasileira.
Desde a proclamação dos resultados eleitorais, os partidos que apoiavam o candidato derrotado nas eleições fizeram de tudo para impedir a minha posse e a estabilidade do meu governo. Disseram que as eleições haviam sido fraudadas, pediram auditoria nas urnas, impugnaram minhas contas eleitorais, e após a minha posse, buscaram de forma desmedida quaisquer fatos que pudessem justificar retoricamente um processo de impeachment.
Como é próprio das elites conservadoras e autoritárias, não viam na vontade do povo o elemento legitimador de um governo. Queriam o poder a qualquer preço.
Tudo fizeram para desestabilizar a mim e ao meu governo.
Só é possível compreender a gravidade da crise que assola o Brasil desde 2015, levando-se em consideração a instabilidade política aguda que, desde a minha reeleição, tem caracterizado o ambiente em que ocorrem o investimento e a produção de bens e serviços.
Não se procurou discutir e aprovar uma melhor proposta para o País. O que se pretendeu permanentemente foi a afirmação do “quanto pior melhor”, na busca obsessiva de se desgastar o governo, pouco importando os resultados danosos desta questionável ação política para toda a população.
A possibilidade de impeachment tornou-se assunto central da pauta política e jornalística apenas dois meses após minha reeleição, apesar da evidente improcedência dos motivos para justificar esse movimento radical.
Nesse ambiente de turbulências e incertezas, o risco político permanente provocado pelo ativismo de parcela considerável da oposição acabou sendo um elemento central para a retração do investimento e para o aprofundamento da crise econômica.
Deve ser também ressaltado que a busca do reequilíbrio fiscal, desde 2015, encontrou uma forte resistência na Câmara dos Deputados, à época presidida pelo Deputado Eduardo Cunha. Os projetos enviados pelo governo foram rejeitados, parcial ou integralmente. Pautas bombas foram apresentadas e algumas aprovadas.
As comissões permanentes da Câmara, em 2016, só funcionaram a partir do dia 5 de maio, ou seja, uma semana antes da aceitação do processo de impeachment pela Comissão do Senado Federal. Os Srs. e as Sras. Senadores sabem que o funcionamento dessas Comissões era e é absolutamente indispensável para a aprovação de matérias que interferem no cenário fiscal e encaminhar a saída da crise.
Foi criado assim o desejado ambiente de instabilidade política, propício a abertura do processo de impeachment sem crime de responsabilidade.
Sem essas ações, o Brasil certamente estaria hoje em outra situação política, econômica e fiscal.
Muitos articularam e votaram contra propostas que durante toda a vida defenderam, sem pensar nas consequências que seus gestos trariam para o país e para o povo brasileiro. Queriam aproveitar a crise econômica, porque sabiam que assim que o meu governo viesse a superá-la, sua aspiração de acesso ao poder haveria de ficar sepultada por mais um longo período.
Mas, a bem da verdade, as forças oposicionistas somente conseguiram levar adiante o seu intento quando outra poderosa força política a elas se agregou: a força política dos que queriam evitar a continuidade da “sangria” de setores da classe política brasileira, motivada pelas investigações sobre a corrupção e o desvio de dinheiro público.
É notório que durante o meu governo e o do Presidente Lula foram dadas todas as condições para que estas investigações fossem realizadas. Propusemos importantes leis que dotaram os órgãos competentes de condições para investigar e punir os culpados.
Assegurei a autonomia do Ministério Público, nomeando como Procurador Geral da República o primeiro nome da lista indicado pelos próprios membros da instituição. Não permiti qualquer interferência política na atuação da Polícia Federal.
Contrariei, com essa minha postura, muitos interesses. Por isso, paguei e pago um elevado preço pessoal pela postura que tive.
Arquitetaram a minha destituição, independentemente da existência de quaisquer fatos que pudesse justificá-la perante a nossa Constituição.
Encontraram, na pessoa do ex-Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha o vértice da sua aliança golpista.
Articularam e viabilizaram a perda da maioria parlamentar do governo. Situações foram criadas, com apoio escancarado de setores da mídia, para construir o clima político necessário para a desconstituição do resultado eleitoral de 2014.
Todos sabem que este processo de impeachment foi aberto por uma “chantagem explícita” do ex-Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, como chegou a reconhecer em declarações à imprensa um dos próprios denunciantes. Exigia aquele parlamentar que eu intercedesse para que deputados do meu partido não votassem pela abertura do seu processo de cassação.​
Nunca aceitei na minha vida ameaças ou chantagens. Se não o fiz antes, não o faria na condição de Presidenta da República. É fato, porém, que não ter me curvado a esta chantagem motivou o recebimento da denúncia por crime de responsabilidade e a abertura deste d processo, sob o aplauso dos derrotados em 2014 e dos temerosos pelas investigações.
Se eu tivesse me acumpliciado com a improbidade e com o que há de pior na política brasileira, como muitos até hoje parecem não ter o menor pudor em fazê-lo, eu não correria o risco de ser condenada injustamente.
Quem se acumplicia ao imoral e ao ilícito, não tem respeitabilidade para governar o Brasil. Quem age para poupar ou adiar o julgamento de uma pessoa que é acusada de enriquecer às custas do Estado brasileiro e do povo que paga impostos, cedo ou tarde, acabará pagando perante a sociedade e a história o preço do seu descompromisso com a ética.
Todos sabem que não enriqueci no exercício de cargos públicos, que não desviei dinheiro público em meu proveito próprio, nem de meus familiares, e que não possuo contas ou imóveis no exterior. Sempre agi com absoluta probidade nos cargos públicos que ocupei ao longo da minha vida.
Curiosamente, serei julgada, por crimes que não cometi, antes do julgamento do ex-presidente da Câmara, acusado de ter praticado gravíssimos atos ilícitos e que liderou as tramas e os ardis que alavancaram as ações voltadas à minha destituição.
Ironia da história? Não, de forma nenhuma. Trata-se de uma ação deliberada que conta com o silêncio cúmplice de setores da grande mídia brasileira.
Viola-se a democracia e pune-se uma inocente. Este é o pano de fundo que marca o julgamento que será realizado pela vontade dos que lançam contra mim pretextos acusatórios infundados.
Estamos a um passo da consumação de uma grave ruptura institucional. Estamos a um passo da concretização de um verdadeiro golpe de Estado.

Senhoras e Senhores Senadores,
Vamos aos autos deste processo. Do que sou acusada? Quais foram os atentados à Constituição que cometi? Quais foram os crimes hediondos que pratiquei?
A primeira acusação refere-se à edição de três decretos de crédito suplementar sem autorização legislativa. Ao longo de todo o processo, mostramos que a edição desses decretos seguiu todas as regras legais. Respeitamos a previsão contida na Constituição, a meta definida na LDO e as autorizações estabelecidas no artigo 4° da Lei Orçamentária de 2015, aprovadas pelo Congresso Nacional.
Todas essas previsões legais foram respeitadas em relação aos 3 decretos. Eles apenas ofereceram alternativas para alocação dos mesmos limites, de empenho e financeiro, estabelecidos pelo decreto de contingenciamento, que não foram alterados. Por isso, não afetaram em nada a meta fiscal.
Ademais, desde 2014, por iniciativa do Executivo, o Congresso aprovou a inclusão, na LDO, da obrigatoriedade que qualquer crédito aberto deve ter sua execução subordinada ao decreto de contingenciamento, editado segundo as normas estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. E isso foi precisamente respeitado.
Não sei se por incompreensão ou por estratégia, as acusações feitas neste processo buscam atribuir a esses decretos nossos problemas fiscais. Ignoram ou escondem que os resultados fiscais negativos são consequência da desaceleração econômica e não a sua causa.
Escondem que, em 2015, com o agravamento da crise, tivemos uma expressiva queda da receita ao longo do ano – foram R$ 180 bilhões a menos que o previsto na Lei Orçamentária.
Fazem questão de ignorar que realizamos, em 2015, o maior contingenciamento de nossa história. Cobram que, quando enviei ao Congresso Nacional, em julho de 2015, o pedido de autorização para reduzir a meta fiscal, deveria ter imediatamente realizado um novo contingenciamento. Não o fiz porque segui o procedimento que não foi questionado pelo Tribunal de Contas da União ou pelo Congresso Nacional na análise das contas de 2009.

Além disso, a responsabilidade com a população justifica também nossa decisão. Se aplicássemos, em julho, o contingenciamento proposto pelos nossos acusadores cortaríamos 96% do total de recursos disponíveis para as despesas da União. Isto representaria um corte radical em todas as dotações orçamentárias dos órgãos federais. Ministérios seriam paralisados, universidades fechariam suas portas, o Mais Médicos seria interrompido, a compra de medicamentos seria prejudicada, as agências reguladoras deixariam de funcionar. Na verdade, o ano de 2015 teria, orçamentariamente, acabado em julho.
Volto a dizer: ao editar estes decretos de crédito suplementar, agi em conformidade plena com a legislação vigente. Em nenhum desses atos, o Congresso Nacional foi desrespeitado. Aliás, este foi o comportamento que adotei em meus dois mandatos.
Somente depois que assinei estes decretos é que o Tribunal de Contas da União mudou a posição que sempre teve a respeito da matéria. É importante que a população brasileira seja esclarecida sobre este ponto: os decretos foram editados em julho e agosto de 2015 e somente em outubro de 2015 o TCU aprovou a nova interpretação.
O TCU recomendou a aprovação das contas de todos os presidentes que editaram decretos idênticos aos que editei. Nunca levantaram qualquer problema técnico ou apresentaram a interpretação que passaram a ter depois que assinei estes atos.
Querem me condenar por ter assinado decretos que atendiam a demandas de diversos órgãos, inclusive do próprio Poder Judiciário, com base no mesmo procedimento adotado desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2001?
Por ter assinado decretos que somados, não implicaram, como provado nos autos, em nenhum centavo de gastos a mais para prejudicar a meta fiscal?
A segunda denúncia dirigida contra mim neste processo também é injusta e frágil. Afirma-se que o alegado atraso nos pagamentos das subvenções econômicas devidas ao Banco do Brasil, no âmbito da execução do programa de crédito rural Plano Safra, equivale a uma “operação de crédito”, o que estaria vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Como minha defesa e várias testemunhas já relataram, a execução do Plano Safra é regida por uma lei de 1992, que atribui ao Ministério da Fazenda a competência de sua normatização, inclusive em relação à atuação do Banco do Brasil. A Presidenta da República não pratica nenhum ato em relação à execução do Plano Safra. Parece óbvio, além de juridicamente justo, que eu não seja acusada por um ato inexistente.
A controvérsia quanto a existência de operação de crédito surgiu de uma mudança de interpretação do TCU, cuja decisão definitiva foi emitida em dezembro de 2015. Novamente, há uma tentativa de dizer que cometi um crime antes da definição da tese de que haveria um crime. Uma tese que nunca havia surgido antes e que, como todas as senhoras e senhores senadores souberam em dias recentes, foi urdida especialmente para esta ocasião.
Lembro ainda a decisão recente do Ministério Público Federal, que arquivou inquérito exatamente sobre esta questão. Afirmou não caber falar em ofensa à lei de responsabilidade fiscal porque eventuais atrasos de pagamento em contratos de prestação de serviços entre a União e instituições financeiras públicas não são operações de crédito.
Insisto, senhoras senadoras e senhores senadores: não sou eu nem tampouco minha defesa que fazemos estas alegações. É o Ministério Público Federal que se recusou a dar sequência ao processo, pela inexistência de crime.
Sobre a mudança de interpretação do TCU, lembro que, ainda antes da decisão final, agi de forma preventiva. Solicitei ao Congresso Nacional a autorização para pagamento dos passivos e defini em decreto prazos de pagamento para as subvenções devidas. Em dezembro de 2015, após a decisão definitiva do TCU e com a autorização do Congresso, saldamos todos os débitos existentes.
Não é possível que não se veja aqui também o arbítrio deste processo e a injustiça também desta acusação.
Este processo de impeachment não é legítimo. Eu não atentei, em nada, em absolutamente nada contra qualquer dos dispositivos da Constituição que, como Presidenta da República, jurei cumprir. Não pratiquei ato ilícito. Está provado que não agi dolosamente em nada. Os atos praticados estavam inteiramente voltados aos interesses da sociedade. Nenhuma lesão trouxeram ao erário ou ao patrimônio público.
Volto a afirmar, como o fez a minha defesa durante todo o tempo, que este processo está marcado, do início ao fim, por um clamoroso desvio de poder.
É isto que explica a absoluta fragilidade das acusações que contra mim são dirigidas.
Tem-se afirmado que este processo de impeachment seria legítimo porque os ritos e prazos teriam sido respeitados. No entanto, para que seja feita justiça e a democracia se imponha, a forma só não basta. É necessário que o conteúdo de uma sentença também seja justo. E no caso, jamais haverá justiça na minha condenação.
Ouso dizer que em vários momentos este processo se desviou, clamorosamente, daquilo que a Constituição e os juristas denominam de “devido processo legal”.
Não há respeito ao devido processo legal quando a opinião condenatória de grande parte dos julgadores é divulgada e registrada pela grande imprensa, antes do exercício final do direito de defesa.
Não há respeito ao devido processo legal quando julgadores afirmam que a condenação não passa de uma questão de tempo, porque votarão contra mim de qualquer jeito.
Nesse caso, o direito de defesa será exercido apenas formalmente, mas não será apreciado substantivamente nos seus argumentos e nas suas provas. A forma existirá apenas para dar aparência de legitimidade ao que é ilegítimo na essência.
Senhoras e senhores senadores,
Nesses meses, me perguntaram inúmeras vezes porque eu não renunciava, para encurtar este capítulo tão difícil de minha vida.
Jamais o faria porque tenho compromisso inarredável com o Estado Democrático de Direito.
Jamais o faria porque nunca renuncio à luta.
Confesso a Vossas Excelências, no entanto, que a traição, as agressões verbais e a violência do preconceito me assombraram e, em alguns momentos, até me magoaram. Mas foram sempre superados, em muito, pela solidariedade, pelo apoio e pela disposição de luta de milhões de brasileiras e brasileiros pelo País afora. Por meio de manifestações de rua, reuniões, seminários, livros, shows, mobilizações na internet, nosso povo esbanjou criatividade e disposição para a luta contra o golpe.
As mulheres brasileiras têm sido, neste período, um esteio fundamental para minha resistência. Me cobriram de flores e me protegeram com sua solidariedade. Parceiras incansáveis de uma batalha em que a misoginia e o preconceito mostraram suas garras, as brasileiras expressaram, neste combate pela democracia e pelos direitos, sua força e resiliência. Bravas mulheres brasileiras, que tenho a honra e o dever de representar como primeira mulher Presidenta do Brasil.
Chego à última etapa desse processo comprometida com a realização de uma demanda da maioria dos brasileiros: convocá-los a decidir, nas urnas, sobre o futuro de nosso País. Diálogo, participação e voto direto e livre são as melhores armas que temos para a preservação da democracia.
Confio que as senhoras senadoras e os senhores senadores farão justiça. Tenho a consciência tranquila. Não pratiquei nenhum crime de responsabilidade. As acusações dirigidas contra mim são injustas e descabidas. Cassar em definitivo meu mandato é como me submeter a uma pena de morte política.
Este é o segundo julgamento a que sou submetida em que a democracia tem assento, junto comigo, no banco dos réus. Na primeira vez, fui condenada por um tribunal de exceção. Daquela época, além das marcas dolorosas da tortura, ficou o registro, em uma foto, da minha presença diante de meus algozes, num momento em que eu os olhava de cabeça erguida enquanto eles escondiam os rostos, com medo de serem reconhecidos e julgados pela história.
Hoje, quatro décadas depois, não há prisão ilegal, não há tortura, meus julgadores chegaram aqui pelo mesmo voto popular que me conduziu à Presidência. Tenho por todos o maior respeito, mas continuo de cabeça erguida, olhando nos olhos dos meus julgadores.
Apesar das diferenças, sofro de novo com o sentimento de injustiça e o receio de que, mais uma vez, a democracia seja condenada junto comigo. E não tenho dúvida que, também desta vez, todos nós seremos julgados pela história.
Por duas vezes vi de perto a face da morte: quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida; e quando uma doença grave e extremamente dolorosa poderia ter abreviado minha existência.
Hoje eu só temo a morte da democracia, pela qual muitos de nós, aqui neste plenário, lutamos com o melhor dos nossos esforços.
Reitero: respeito os meus julgadores.
Não nutro rancor por aqueles que votarão pela minha destituição.
Respeito e tenho especial apreço por aqueles que têm lutado bravamente pela minha absolvição, aos quais serei eternamente grata.
Neste momento, quero me dirigir aos senadores que, mesmo sendo de oposição a mim e ao meu governo, estão indecisos.
Lembrem-se que, no regime presidencialista e sob a égide da nossa Constituição, uma condenação política exige obrigatoriamente a ocorrência de um crime de responsabilidade, cometido dolosamente e comprovado de forma cabal.
Lembrem-se do terrível precedente que a decisão pode abrir para outros presidentes, governadores e prefeitos. Condenar sem provas substantivas. Condenar um inocente.
Faço um apelo final a todos os senadores: não aceitem um golpe que, em vez de solucionar, agravará a crise brasileira.
Peço que façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal, na vida pessoal ou nas funções públicas que exerceu. Votem sem ressentimento. O que cada senador sente por mim e o que nós sentimos uns pelos outros importa menos, neste momento, do que aquilo que todos sentimos pelo país e pelo povo brasileiro.
Peço: votem contra o impeachment. Votem pela democracia.
Muito obrigada

Supostas sessões de um suposto julgamento: o impeachment está nu

Por Alex Solnik 



A burrice é infinita





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Estou tentando desde ontem encontrar palavras para descrever as cenas hediondas que a TV Senado tem mostrado nos últimos três dias transmitindo supostas sessões de um suposto julgamento a respeito de supostos crimes que supostos senadores estão levantando contra a primeira presidente da República da nossa história.
   Não sei em que outro momento da história do Brasil reuniram-se tantas pessoas pusilânimes, indecentes, caricatas, subhumanas, canalhas, imbecis, malandras, obtusas, espertalhonas, malvadas, descerebradas, ignóbeis, celeradas, picaretas, irresponsáveis, inconsequentes, traidoras, imorais, insensíveis, alienadas sobre as quais recaiu a suprema tarefa de decidir os destinos de um país tão grande, tão belo, tão rico quanto a sua população. Mas a população, que tem mais o que fazer, ocupada em sobreviver como pode, a maioria ou em escolher onde vai passar o fim de semana, se em Campos de Jordão ou em Miami, a minoria não assistiu o que eu e alguns poucos milhares de brasileiros assistimos e não vai saber pelo noticiário da TV Globo nem pelos jornais na dimensão exata, somente vai ter que aguentar as consequências desse pandemônio.
   Não sou capaz de reproduzir tudo o que meus olhos viram e meus ouvidos ouviram. Talvez consiga um dia, mas não hoje. O que posso dizer é que algumas pessoas inteligentes, estudiosas, sensatas, normais, insuspeitas, honradas, decentes, responsáveis, generosas mostraram pacientemente e de forma irrefutável e cabal que o impeachment está nu, que os dois crimes de responsabilidade arrolados no processo não existiram e, no entanto, além de não serem ouvidas foram achincalhadas por aquelas que eu descrevi acima.
   Estávamos no momento-chave de qualquer julgamento – penal ou político-penal – que é quando são ouvidas as testemunhas, mas pasmem (primeiro sinal de nulidade) somente as testemunhas de acusação receberam atenção. E (segundo sinal de nulidade) elas deram um tiro no pé, expondo um conluio dentro do Tribunal de Contas da União que serviu de base para o duplamente réu deputado Eduardo Cunha dar o sinal verde para a ignomínia que arrasta o Brasil para a companhia dos países mais vergonhosos do planeta.
   Na hora e vez das testemunhas de defesa o que se viu foram cadeiras vazias. Os poucos pusilânimes que permaneceram (terceira nulidade, mas nunca a última) ou tentaram desqualificá-las, presentes ou ausentes ou fizeram discursos que não tinham nada a ver com os assuntos em pauta, condenando a ré por haver 12 milhões de desempregados, inflação e “uma crise sem precedentes” apesar da decisão do STF de que não podia ser assim, de que todos deveriam se ater às duas acusações. Eles usaram, claramente, argumentos parlamentaristas (quarta nulidade), o que caracteriza de forma ainda mais veemente o golpe contra a constituição e contra a população, pois o parlamentarismo já foi derrotado em plebiscito por duas vezes.
   O STF estava lá, na figura de um presidente que rebateu alguns absurdos da maioria celerada, mas que fechou os olhos a essa desobediência às regras do jogo e que em poucos momentos prestou atenção ao que estava acontecendo, na maior parte do tempo flagrado em conversas com sua assessoria, alheio a tudo, distraído, trocando as bolas, chamando um senador de Cristóvão Colombo, fazendo piadinhas (“notei que pela manhã vocês estão com mais energia para brigar, mas à tarde a energia vai declinando”), um juíz aquém das responsabilidades das quais estava imbuído.
   A ausência de crimes de responsabilidade não demanda muito esforço para ser entendida. A negociação do Plano Safra (primeira acusação) não tem nenhuma participação da presidente da República, e, ainda assim, só poderia ser enquadrada em crime se constituísse operação de crédito, o que não foi o caso. Os decretos de verbas suplementares (segunda acusação) são assinados pela presidente depois de serem submetidos e aprovados por mais de trinta técnicos, que não viram neles ilegalidade alguma porque vinham sendo feitos dessa maneira há 15 anos, tendo sido reprovados somente em 2015 pelo TCU (no conluio de que falei antes) e (absurdo dos absurdos) foram aplicados de forma retroativa! Ou seja: a decisão exarada em outubro valeu para o que foi feito em julho! E mais ainda: não implicaram em nenhum gasto, apenas em remanejamento de verbas.
   Mas, acreditem: essas duas acusações, que não se sustentam por 15 minutos de um debate sério foram usadas pelos pusilânimes para explicar a “crise sem precedentes no país”. E milhões de brasileiros acreditam nesses palermas!
   “O Processo” de Kafka, onde o réu tem que se defender de acusações que não conhece é fichinha comparado com o que temos diante de nossos olhos. O julgamento de Sacco e Vanzetti é apenas uma vírgula. O Caso dos Irmãos Naves foi menos escandaloso.
   Das muitas situações esdrúxulas mostradas ao mundo pela TV Senado quero apresentar apenas duas, para ratificar as sábias palavras de Renan Calheiros, personagem principal de “Julgamento no hospício” de que ali “a burrice é infinita”: o senador Magno Malta, que mais uma vez repetiu que é “analfabeto funcional” e sempre se gaba de ter tomado pau três vezes no vestibular de Direito revelou mais uma vez a pobreza de seu caráter atacando uma testemunha (ou informante) que acabara de se retirar: “Quem é esse Luiz Gonzaga Belluzzo para nos ensinar Economia se quebrou o Palmeiras quando foi presidente do clube”?
   Mas chocante mesmo foi a conclusão a que chegou o supostamente bem formado senador Cristóvão Buarque, a quem Lewandowski chamou de Cristóvão Colombo e ele, para completar o chiste involuntário aduziu “prefiro que me chame de Cristóvão Colombo Buarque de Hollanda”.
   Do alto de seus diplomas, ele, que já foi ministro da Educação e governador do Distrito Federal, depois de acusar a presidente com os mesmos argumentos parlamentaristas de outros (“provocou uma crise econômica sem precedentes”) admitiu que tinha dúvida se houve ou não crime de responsabilidade, mas, em vez de adotar o “in dubio pro reu”, que é a regra nos tribunais brasileiros saiu-se com “in dubio pro società”.
   Se para ele Temer é a “società” deve ser uma “società secreta”.
Fonte: Brasil 247