quinta-feira, 30 de abril de 2020

O “E DAÍ?” DE CAIM A BOLSONARO 

PANDEMIA E PHATOS: O “E DAÍ?” DE CAIM A BOLSONARO — O TRISTE FIM DE UM PRESIDENTE AUTORITÁRIO, MAS NÃO ALTERITÁRIO

(um diálogo com a filosofia de Emmanuel Levinas)


As perguntas dirigidas ao presidente Jair Messias Bolsonaro sobre os mortos pelo Covid-19, no fundo, reeditam a pergunta que Deus faz a Caim pelo sangue de Abel: “onde está o teu irmão?”. E Caim responde: “sou eu responsável por meu irmão?”. A resposta zangada de Caim, na perspectiva filosófica de Emmanuel Levinas, o filósofo da alteridade, é a gênese da imoralidade; ela reverbera o descompromisso ou desinteresse para com o sangue do outro — o irmão. Em outras palavras, diz Caim a Deus: “NÃO TÔ NEM AÍ!”.
Embora use expressão diferente, no conteúdo, é exatamente a mesmíssima resposta que CAIM-BOLSONARO dá aos jornalistas diante do sangue de milhões de brasileiros mortos pelo coronavírus: “E DAÍ?” (“não sou coveiro”; “não faço milagre”).
Nesse momento, mais que respostas, Caim-Bolsonaro revela o que jaz em seu coração sem Coração: a morte do outro (afora os da minha família e do meu gado) não me interessa. Não respondo por eles/elas: “NÃO TÔ NEM AÍ!”. É o “je m’en fiche” presidencial em tempo de pandemia. William James na obra “Variedades da Experiência Religiosa” traduz: “‘Je m’en fiche’ é o vulgar equivalente francês da nossa expressão ‘Não estou nem aí’”.
Marcelo Leite em artigo intitulado “Governo desnaturado chega ao fim” oferece claro e direto diagnóstico sobre a alma do presidente. Escreve: “o gabinete do ódio não é uma salinha no palácio do planalto… Mas o coração do próprio presidente”. Explicando o título do artigo diz Marcelo Leite: “‘desnaturado’, aqui, como sinônimo de cruel, perverso, desumano, depravado. E de desequilibrado, aquele que não recua de seus delírios…”. E sublinha ainda: “Bolsonaro e seus filhos são sociopatas, gente sem responsabilidade moral nem consciência… Pouco lhes importa que o coronavírus inicie sua marcha macabra…”.
A parte o fato questões partidárias ou de identificações político-ideológicas (direita, esquerda, centro, etc.), qualquer cidadão com um censo mínimo de humanidade, tendo votado ou não no capitão, não pode deixar de ver a gravíssima situação de um Brasil em pandemia ser dirigido, não por um louco, mas por alguém cuja alma é incapaz de “phatos”. Esse alguém já não é mais humano. Repito: não se trata de ser de direita ou de esquerda, mas de ser ou não ser HUMANO. O presidente-capitão é autoritárário e não alteritário! Como bem diz a canção: “o rei mal coroado não queria o amor no seu reinado, pois sabia que não ia ser amado”.
Phatos é a capacidade humana de sentir, de se afetar ou sofrer; donde vem empatia. Para o filósofo Emmanuel Levinas a ética se funda na capacidade de responder ao apelo nascido do rosto do outro. O rosto do outro provoca o meu coração. Não posso ser indiferente ao seu apelo. Nisso o ser humano revela sua competência alteritária, isto é, sua disposição sincera de ser responsável pelo outro.
Conforme atesta o Antigo Testamento, Caim não se responsabilizou pelo sangue derramado do irmão (“sou eu responsável por meu irmão?”). Lamentável e perigosamente, na mesma desumana direção, o “E DAÍ?” de Caim-Bolsonaro que, a propósito, por incrível que pareça, é capaz de produzir diabólicos risos no seio de seus cegos e idolátricos apoiadores, é prova inequívoca de que o Brasil tem, por enquanto, no mais alto grau do poder Executivo, um ser no mais baixo grau de humanidade; se é que ainda lhe resta alguma…
Diz o Papa Francisco: “certas realidades da vida só se veem com olhos limpos pelas lágrimas”. Inexiste, pois, em Caim-Bolsonaro a “graça das lágrimas”, nos termos de Francisco.
E isso é triste, isso é fato, isso é trágico!
Contudo, apesar disso, sem pesar ou dó, dirão em defesa os terrivelmente entorpecidos e devotados Cains-apoiadores (entre os quais, bispos, padres e pastores):

“E DAÍ?”

***
Geraldo Jose Natalino (pe. Gegê)
*Pároco da Paróquia Santa Bernadete (Higienópolis/Manguinhos)
Membro do grupo Fé e Politica pe. João Cribbin
Psicólogo(PUC-RJ) com Pós-graduação em psicologia junguiana
Mestre em Teologia Sistemático-Pastoral pela PUC-RJ
Doutor em Ciência da Religião pela PUC/SP

As implicações sociais e políticas da fé na vida em sociedade


“Padre não pode falar de política, deveria cuidar da religião”

Artigo de P. Jaime C Patias

 Ouvi muitas vezes essa afirmação ou algo parecido que resolvi escrever sobre o assunto. Quer dizer que “padre não pode falar de política”, mas “político” inescrupuloso pode instrumentalizar a religião para fazer politicagem.

A contradição salta aos olhos pela sua contradição.

 Quem não tem argumentos para discutir política tenta censurar. E quando se trata de um cristão católico eu me pergunto: qual foi a sua formação religiosa? Onde é que a nossa Igreja falou?

 Por isso é importante esclarecer: religião não é o que você pensa ou vê praticado por aí. A palavra religião vem do latim ‘religare’, significa “ligar de novo o ser humano com o divino”, como o sagrado, fonte e origem da vida.

 Quais são suas características? A fonte e motivo desta religação é: o divino no humano. Deus encarnado (carne humana) na realidade. A necessidade de religação é a não extinção dos humanos, ou seja: cuidar da vida em sua integridade e totalidade (espiritual, econômica, política, social, física, biológica, sexual, humana...). O 5º Mandamento diz: não matarás! (Ex 20,13).

 O mediador da religação no cristianismo é Deus encarnado e revelado ao mundo: Jesus Cristo. A condição de religação: crer em Cristo Redentor (não em falsos profetas, charlatões e picaretas).

A abrangência da religação é o Planeta, a Casa Comum onde tudo está interligado (o meio ambiente, os seres humanos, o ar, a água, a terra, a mata, enfim, toda criação). O resultado desta religação é a vida em abundância, sinônimo de Vida eterna.

 Portanto, quando um padre, um bispo, um pastor, um religioso ou religiosa, ou um cristão comprometido com a verdadeira Religião fala de política e denuncia atitudes que atentam contra a vida do ser humano e do Planeta, como o descaso do Estado brasileiro nessa pandemia de Coronavírus, está exercendo a sua missão profética.

 Não estamos falando de politicagem. Estamos falando de mais de 5.000 mortes pela Covid-19. Não são números, mas são vidas de pessoas sagradas aos olhos de Deus.

 Um padre não só pode se manifestar, mas tem o dever sagrado de falar. Politicagem faz o político insensível e genocida que em vez de tomar medidas para cuidar de vidas com políticas públicas de qualidade se omite da sua missão dizendo: “quer que eu faça o quê?” Morreram. "E DAÍ?" É resposta de um presidente da República diante de tamanha tragédia? Começa com "Brasil acima de tudo", "Deus no comando". E termina com "E daí, eu não posso fazer nada". Tirem vossas conclusões.

 Para voltar ao tema inicial é oportuno lembrar que nós os padres fomos ungidos e consagrados pelo Espírito Santo para o serviço do sacerdócio de Jesus Cristo que é o Profeta de Deus (para ensinar à luz da Palavra de Deus), o Sacerdote (para santificar) e o Pastor (para guiar). Poucos se dão conta desse Tríplice Ofício de Cristo na missão do presbítero. Por isso a Igreja católica ao longo da história desenvolveu, entre outros conteúdos, o seu “Ensino Social” ou a "Doutrina Social” com orientações muito precisas sobre as implicações sociais e políticas da fé na vida em sociedade.

À luz do Evangelho o Ensino Social da Igreja trata da política, da economia, da organização social, vida plena com justiça, paz, boas condições de trabalho, respeito recíproco e, acima de tudo, dignidade humana.

Política nada mais é do que a arte de administrar (governar) o bem comum. Perceberam que não falei em partidos políticos. Na missão, o nosso modelo é Cristo, Bom Pastor que não abandona o povo quando o “lobo chega para matar e roubar”.

 Nas palavras de Frei Betto, "Jesus não morreu de alguma doença, deitado numa cama, nem de desastre de camelo, em uma esquina de Jerusalém. Ele morreu como um prisioneiro político: foi preso, torturado, julgado por dois poderes políticos e morto pelas forças de opressão do Estado.

Este é o Jesus de Nazaré que deu sua vida para que todos tenham vida e vida em abundância (Jo 10,10). "O ladrão não vem senão para roubar, matar e destruir... Eu acredito nesse Jesus e a Ele sirvo como presbítero religioso com todas as minhas limitações, mas comprometido com a sua causa. E estou consciente das implicações da minha opção por Cristo e o seu Evangelho.

 A vida é feita de escolhas e respeito opiniões divergentes nesse mundo plural. Mas por princípios, não posso concordar com atitudes irresponsáveis que desrespeitam a vida. Por isso, os que ousam defender incondicionalmente o presidente nunca entenderam o que é professar a fé em Jesus Cristo, o verdadeiro Messias de Deus. Não entenderam igualmente o que é e para que existe a religião.

 (Pe. Jaime C. Patias, IMC, Roma, 29 de abril 2020).

quarta-feira, 29 de abril de 2020

País não vai esquecer a responsabilidade de Bolsonaro na tragédia do Covid-19, por Paulo Moreira Leite



Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia
Quando o Brasil superou a China na contabilidade de mortos pela covid-19, Bolsonaro reagiu como se não tivesse nada a ver com o assunto: "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre".
A reação seria inadequada na boca de qualquer governante, mesmo que tivesse uma atuação impecável no luta contra o novo coronavírus.
No caso de Bolsonaro, não passa de uma tentativa desrespeitosa de esconder suas imensas responsabilidades pela dor, o luto e as milhares de mortes em função de uma epidemia que seu governo jamais encarou com seriedade e nunca enfrentou com o cuidado necessário, contribuindo para agravar uma situação que hoje se encontra perto do insuportável.
Após um ano e quatro meses de governo, o Brasil não espera milagres de um presidente com uma gestão medíocre, marcada pela irresponsabilidade social e o servilismo aos grandes interesses. Mas tem o direito de exigir que não tome iniciativas para agravar uma epidemia terrível, sem cura nem vacina, exatamente como tem feito até agora. São vários exemplos.
Foi sua a iniciativa de substituir um ministro da Saúde que praticava o feijão-com- arroz da Organização Mundial de Saúde para empossar um assessor de campanha incapaz de produzir uma única ideia útil para enfrentar uma pandemia que desafia a medicina mundial.
"É crime comum, praticado a luz do dia", acusa o professor Conrado Hubner Mendes, da cadeira de Direito Constitucional da Universidade de São Paulo.
O artigo 268 foi escrito em 1940 e hoje permite qualificar o papel de Bolsonaro diante do covid-19 como ato criminoso, a ser punido com cadeia.
Naquele Brasil que duas décadas antes enfrentara a gripe espanhola, numa época anterior aos antibióticos e às técnicas modernas de respiração artificial, o artigo 268 agrava a pena em um terço caso o crime que tenha sido cometido por funcionário público, categoria que obviamente inclui o Presidente da República.
Se as hostilidades contra o quarentena implicam em sabotar a única providência conhecida, até hoje, para impedir "propagação de doença contagiosa", estimulando parcelas crescentes da população a enfrentar riscos desnecessários de contágio, as responsabilidades de Bolsonaro são anteriores.
Na posse, em 2019, seu governo conservou a Lei do Teto de Gastos, que retirou R$ 20 bilhões do Sistema Único de Saúde, recursos que seriam suficientes para equipar a rede pública de material e pessoal. AS UTIs não seriam tão raras, nem seus equipamentos, tão deteriorados.
Capaz de prejudicar a saúde da população carente das periferias e bairros afastados apenas para alimentar a propaganda contra o regime de Cuba, Bolsonaro organizou o desmonte do Mais Médicos antes de tomar posse, desmobilizando 6000 médicos naturais daquele país. Com isso, brasileiros e brasileiras mais carentes ficaram menos assistidos, menos protegidos -- contribuindo para transformar um quadro de dificuldades controláveis numa bola de neve a caminho do colapso do sistema de saúde, já visível em vários pontos do horizonte.
Querendo tirar foto em posição ombro-a-ombro com o topete de Trump em suas pressões imperiais sobre a China, os filhos e amigos de Bolsonaro multiplicaram declarações ofensivas contra Pequim, dificultando negócios com um país que possui o monopólio mundial de equipamentos e insumos médicos.
"Bolsonaro está começando a colher o que semeou ao acusar ou deixar que seu filho acusasse a China de ser responsável pela pandemia”, resumiu o diplomata Rubens Ricupero, assim que surgiram as primeiras dificuldades com o gigante asiático que, além de tudo, é nosso maior parceiro comercial.
Diante de uma tragédia com a envergadura da Covid-19, a postura de Bolsonaro mostra apenas uma tentativa de desmobilizar brasileiros que arregaçaram as mangas para lutar por suas vidas, seus filhos e suas famílias.
Com tamanha falta de respeito, essa atitude demonstra, mais uma vez, a pequena estatura do presidente.
Neste momento, o país está testando a própria História, engajando-se num processo de superação nacional para ir além dos próprios limites para garantir a sobrevivência com o menor dano, o menor sofrimento possível. É um momento que ninguém será capaz de esquecer.
Quem não compreendeu isso, e prefere atrapalhar em vez de ajudar, como o desprezível Bolsonaro, será chamado a prestar contas em seu devido momento.
Alguma dúvida?

sábado, 25 de abril de 2020

Bolsonaro, Moro e Globo nos tratam como manada - Por Rudá Ricci 




Bolsonaro, Moro e Globo nos tratam como manada

Por Rudá Ricci

 É estarrecedor a realidade ser jogada em nossa cara da forma como foi ontem. Somos governados por um dos mais desqualificados brasileiros de todos os tempos.

 Como alguém, ocupando o cargo mais importante da República, fala, em pronunciamento à nação, a palavra "escrotização"?

 O que faz um Presidente da República descer tão baixo a ponto de, num pronunciamento público, afirmar que seu filho é um pegador de meninas do condomínio onde reside, expondo a intimidade de mulheres que não o autorizaram a expor sua vida em cadeia nacional?

 O que faz, num ato de incontinência verbal, informar à nação que tem parentes que falsificam documentos e já foram condenados pela justiça?

 Não, não se trata de expiação. Bolsonaro não se redimiu publicamente. Ao contrário, enalteceu crimes e abusos. O Presidente da República!!!!

 O que faz um ex-juiz, mais uma vez, vazar conversas reservadas e, pior, expor que pediu uma ajuda ilegal à sua família com dinheiro público?

Um ex-juiz que diz que luta contra a corrupção resolveu atualizar a carta de Pero Vaz de Caminha?

 O que fizemos para deslizar tanto moralmente e chegar a este circo mambembe de final de estrada?

Imagino o desserviço na formação moral de tantos jovens que olham a lavação de roupa suja de dois desnorteados brasileiros que parecem ter assaltado a alma da nação.

 Ontem, soubemos, Bolsonaro e Moro cometeram crimes. Os dois. Vários. Ambos merecem ter seus direitos políticos suspensos. É o mínimo para restabelecermos parâmetros morais na política nacional.

 Os dois estão errados. Um, ao menos, mentiu. E fica por isso mesmo? Agora, mentir se tornou arma de ascensão política? É assim que os marqueteiros do caos orientam seus clientes? "Mintam que os brasileiros gostam?"

 É hora de exigirmos uma punição exemplar. Recuperar nossos valores básicos. Acabar com esse abuso diário de distorção da base dos valores dos brasileiros.

 Não somos uma nação de mentirosos, de escroques, de gente safada. Somos gente que cria redes espontâneas de ajuda aos desalentados. Aliás, os bolsonaristas não estão nas redes de solidariedade que envolvem igrejas, sindicatos, movimentos sociais, organizações populares. Não. Eles estão nas redes xingando e afirmando que nada está ocorrendo.

Criam um mundo paralelo que desconsidera o próximo. Sindicatos abrem suas portas para acolher a população de rua; doam recursos para ONGs produzirem máscaras; sindicatos de professores distribuem cestas básicas para professores temporários que perderam seus contratos em virtude da suspensão de aulas.

Onde estão os apoiadores de Bolsonaro e Moro? Temos que dar um basta a esse pessoal sem parâmetro moral algum. Gente que só sabe usar nossos valores para distorcê-los na sua cruzada contra a lista de inimigos que aumenta diariamente. É gente doente, sem perspectiva e autocontrole. Gente que nos intoxica diariamente.

 E, ainda, temos a rede Globo, tentando nos manipular como sempre. Trabalha com o infantil script do bandido contra o mocinho. Tenta, há anos, fazer o Presidente da República.

Mas, quem acompanha os dados sabe que a Globo não interfere mais na opinião pública sobre política. Dados do ESEB (Estudo Eleitoral Brasileiro), a maior pesquisa nacional sobre perfil do eleitor, indicam que desde 2006, a maioria dos brasileiros não segue o JN para tomar posição.

A Globo não conteve a eleição de Lula e Dilma, não conteve a rejeição a Temer, não elegeu Alckmin.

 Ontem, o JN tentou nos manipular, apresentando um “paladino da justiça” que comete crimes. Só não foi pior que a CNN que deu voz ao esquema todo da Lava Jato, já desmascarado pelo The Intercept. Fez um jornalismo desequilibrado, tendencioso, novamente confundindo notícia com opinião.

 Somos vistos assim: um bando de incautos facilmente manobrados, uma manada. Basta!

quinta-feira, 16 de abril de 2020

As prioridades na pandemia da Covid-19



As prioridades na pandemia da Covid-19 – Artigo de Élida Graziane e Maria Bucci


Vivemos atualmente o desvendamento da extrema caça às rendas públicas: farinha pouca, meu pirão primeiro – mesmo tirando o pirão de quem tem fome.
No enfrentamento da depressão que se avizinha, chama atenção a diferença de prioridade para a chegada dos socorros. A agilidade do governo em repassar recursos para o setor financeiro é digna da Bélgica, enquanto os entraves para aumentar o custeio do SUS e pagar a renda mínima dos vulneráveis se arrasta, como na Índia, para lembrar da figura da Belíndia usada no passado como símbolo da desigualdade no país.
O debate sobre a “PEC do Orçamento de Guerra”, por baixo de teses aparentemente técnicas, escancara essa desigualdade de prioridades.
De um lado, acena-se com autonomia irrestrita ao Banco Central pra dar liquidez ao mercado financeiro. Mesmo sem essa autonomia formalizada em PEC, mais de R$1,2 trilhão já foi liberado na semana passada. Mas o crédito não chegou às empresas, está “empoçado”. Pior, e inacreditável, está sendo usado para aumentar a taxa de juros (spread) cobrada no varejo, o que prejudica empresas e cidadãos que não têm capital de giro diante da paralisação abrupta da atividade econômica causada pela necessidade sanitária de isolamento social horizontal.
Esse empoçamento trilhionario da liquidez traz o efeito colateral de fazer crescer a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), já que os bancos preferem manter os recursos liberados pelo Banco Central em operações compromissadas, que são uma espécie muito cara de dívida (praticamente um overnight da riqueza financeira), deteriorando ainda mais o quadro fiscal. E não será surpresa se essa piora, no futuro, cair na conta dos direitos sociais, com a redução de custeio das despesas primárias e o corte nos salários do funcionalismo.
Manter agilidade na liberação de despesas financeiras, enquanto se restringe a execução orçamentária da renda básica de cidadania e mesmo enquanto se nega a expansão ampla e veloz no custeio das ações e serviços públicos de saúde no SUS é sinal dessa iniquidade fiscal genocida.
No médio prazo, quando a pandemia passar, ainda há o risco de culparem as despesas primárias pela expansão da DBGG, quando a sua expansão mais rápida até agora veio das despesas financeiras. O que é absolutamente injusto e falso, pois com um mínimo de gestão da liquidez e coordenação entre o Tesouro Nacional e o Banco Central seria possível tomar medidas mais significativas, como vem fazendo o Peru e a Alemanha.
Socorrer com prioridade as perdas dos investidores na bolsa e no mercado financeiro, ao mesmo tempo em que se posterga o custeio da política pública de saúde e o socorro aos mais pobres, além de uma imoralidade, é algo indefensável, do ponto de vista da ordem jurídica.
Negar custeio suficiente ao SUS e às consequências sociais e econômicas da pandemia agora só aumentará a depressão do produto interno bruto e, por conseguinte, acelerará a dívida e agravará a crise.
* Élida Graziane Pinto é procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo. Maria Paula Dallari Bucci é professora da Faculdade de Direito da USP.
Artigo originalmente publicado no portal do Le Monde Diplomatique Brasil.

domingo, 12 de abril de 2020

Vamos relembrar a entrevista de Frei Cláudio: Deus, Páscoa e Religião

Atualmente frei Cláudio encontra-se afastado de suas atividades, desde o final do ano passado, devido a problemas de saúde.

Ainda bem que temos livros, DVDs, boletins da missa, entrevistas que podemos recorrer para continuarmos aprendendo com ele.

Neste domingo de Páscoa vamos relembrar a entrevista do Frei Cláudio van Balen no programa Palavra Ética, na TVC/BH, realizada em 2014. Portanto, há 6 anos.

Frei Cláudio fala sobre Deus, Páscoa e Religião. Como é bom ouvi-lo. Sempre atual e mostrando o verdadeiro evangelho e mensagem de Jesus.

Reforça a ideia de uma fé comprometida com um Deus que está inserido na realidade humana a serviço da transformação, pessoal e social. Deus não está acima, mas dentro de nós.

A ¨mesa¨ do pão implica para todos um convite incondicional. É de inclusão. Dessa forma, longe de nós gestos de excluir diferentes.

Como afirma Frei Cláudio no seu livro ¨Ouvir a Escritura¨ :
Prestar culto a Deus não é simplesmente ir á missa, cantar, bater palmas ou colocar-se de joelhos. Louvar a Deus implica solidariedade, relações fraternas, respeitar todos os seres, lutar por justiça.
A prática da fé vale por atitudes; há de fazer-se autêntica ¨cidadania¨ que, em sua essência, é o mais sagrado: presença transformadora no mundo.

¨ Mesa posta, a Igreja contemporânea há de ser inclusiva. A prática de Jesus é movimento que, por cidadania, visa beneficiar todos. Conviver com diferenças, não discriminar. Esta é a conversão, à qual o Mestre nos convida. Todos podem sentir-se atraídos, inspirados e mobilizados a fazer parte da festa
da vida. Na terra: paz; alegria no céu!"
(Frei Cláudio)


Assista a entrevista  (2014) :

Frei Cláudio e o sentido da Semana Santa, Deus, Páscoa e Religião

terça-feira, 7 de abril de 2020

Criada a rede nacional de solidariedade


“Vamos precisar de todo mundo/ Um mais um é sempre mais que dois/ Pra melhor juntar as nossas forças/ É só repartir melhor o pão”
“Vamos precisar de todo mundo” é uma ação de solidariedade ao povo brasileiro, articulada pela Frente Brasil Popular e pela Frente Povo Sem Medo. Diante da pandemia do covid-19, crise agravada pelo desmonte das políticas públicas e pelos posicionamentos genocidas de Bolsonaro, criamos esta plataforma.

O objetivo é dar visibilidade e fortalecer às iniciativas populares de solidariedade, para que mais gente possa participar e colaborar da forma como puder. Este é um espaço militante, interativo e participativo, e sua função só se concretiza se for usado e ocupado por mais pessoas e organizações.

A proposta é gerar um grande movimento nacional que dê sentido à superação das crises que vivemos. Não é uma iniciativa de um ou outro partido. É uma proposta de construir uma inspiração nacional de todo o campo democrático e popular para agregar todas as pessoas e movimentos que se identifiquem com a Democracia, a Solidariedade e com o Povo Brasileiro.

É muito drástica a realidade que vivemos hoje. A pandemia escancara a insuficiência desse sistema que prioriza os lucros e não a vida. O que está em jogo é a vida das pessoas – não só de quem está nos grupos de risco, mas de todo mundo, especialmente quem vive em situações de maior vulnerabilidade e precariedade.

Por isso, é preciso: exigir medidas concretas [link do plano de emergência?], denunciar as políticas genocidas de Bolsonaro e levar a sério procedimentos como o isolamento. O individualismo não irá garantir a sustentabilidade da vida das pessoas em um país tão desigual, com tanto desemprego, trabalho informal e fome. Para problemas coletivos, precisamos de saídas coletivas.

A solidariedade é um princípio das organizações populares. É uma prática política permanente, que concretiza nossas ações no presente e, ao mesmo tempo, aponta para o novo mundo que queremos construir. A solidariedade é um eixo fundamental da transformação social e, hoje, ela se faz especialmente necessária.

Frente Brasil Popular
Frente Povo Sem Medo

quinta-feira, 2 de abril de 2020

‘Três meses de renda básica é pouco. A crise vai se alastrar’, alerta economista

Rede Brasil Atual

“No mínimo seis meses”, defende Monica de Bolle
Reprodução
São Paulo – “O governo está embromando. Todos esses dias são uma eternidade terrível para quem está passando necessidade. A pessoa acaba tendo de sair de casa, deixar de se proteger para ganhar o que precisa para comer e se contaminar pelo vírus. Isso choca.”
A declaração da economista Monica De Bolle, professora da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, deu o tom do debate promovido hoje (2) pela Oxfam Brasil para discutir a importância da renda básica contra os impactos do coronavírus no país. Até o momento da conclusão desta reportagem, a sanção presidencial do auxílio emergencial de R$ 600 aprovado por unanimidade no Congresso não havia sido publicada no Diário Oficial da União.
A economista, que defende a renda básica como política permanente e universal em um país de tamanha desigualdade como o Brasil, para ser acessada em momentos críticos como agora, entende que três meses de duração sejam insuficientes.
“Três meses é pouco. A crise vai se alastrar. Tinha de ser pelo menos seis meses. Doze prorrogáveis seria o ideal”, disse, destacando a importância do auxílio. “É a economia a serviço das pessoas; inclui, torna as pessoas cidadãs. É um tema que se discute há décadas e não tem nada a ver com ideologia atrelada. Tem direita, centro, esquerda.”
Monica considera que os projetos de lei que tramitam no Congresso para estender a duração da renda básica são exitosos. “Sabemos dos benefícios para a sociedade e para a economia, por isso acho difícil voltar atrás. Esperamos que essa renda emergencial se torne permanente”.
Para ela, não seria por falta de recursos. Há a cota única do tesouro, a União tem superávit por operações financeiras e há uma reserva de US$ 370 bilhões internacionais. “Não falta dinheiro. O que tem de fazer é o que muitos governos estão fazendo: emitir dívidas. Que a dívida vai aumentar, vai. Mas depois há como resolver”, disse.

Genocídio

Belchior: população mais pobre não tem como se proteger da Covid 19. (Foto: Reprodução)
“Se acontecer aqui o que acontece em países ricos, em cidades ricas, com ruas largas, arborizadas, como vai ser aqui? Temos de estar preparados para o pior. E se o afastamento é o mais indicado para prevenir o contágio e uma imensa parcela da população não pode se afastar, o que isso significa?”, questionou o professor e ativista do movimento negro Douglas Belchior.
Participante do debate da Oxfam Brasil, Belchior lembrou que os trens continuam lotados, as ruas continuam cheias. “Para essas pessoas, a prevenção está sendo negada. Falta água na torneira, comida em casa. Se a vacina é o afastamento, grande parte não tem acesso”.
Destacou ainda a falta de assistência para as periferias. Morador do extremo leste da capital paulista, ele lembrou que não há em quebradas como a dele investimentos proporcionais aos que estão sendo feitos nas regiões mais ricas da cidade de São Paulo, como hospital de campanha no estádio do Pacaembu.
E acredita que todos os desdobramentos relativos ao coronavírus no Brasil se devem ao fato de a doença ter se espalhado pela elite, colocando o estado em alerta. “E se fosse diferente? Teriam isolado todo mundo e que morressem”, disse, referindo-se à possibilidade de a covid-19 ter se disseminado primeiro entre os mais pobres.
E destacou que, se a população pobre e negra em sua maioria sofre com o racismo estrutural que dificulta o acesso aos serviços de saúde – as estatísticas para essa população para mortalidade, inclusive infantil e a realização de pré-natal são as piores – o momento é grave. “Desde a abolição da escravatura, em 1888, esse é o momento mais propício para deixar morrer. É genocídio”.
Assista na íntegra: