terça-feira, 4 de agosto de 2015

Moro muda o roteiro, pois o objetivo é tentar prender o Lula

Dois artigos analisam as ações dos Procuradores e do Juiz Moro na Lava-Jato.


Por Rodrigo Vianna:




¨ATÉ O FINAL DO ANO, TENTARÃO PRENDER O LULA”: UM DEPOIMENTO EXCLUSIVO


A frase que dá título a esse texto não foi dita por um militante petista desvairado. Nem por um jornalista (como esse que escreve) afeito a teorias da conspiração.

Saiu da boca de um advogado paulistano, bem-sucedido, com sólida formação acadêmica (é também professor de Direito), sócio de um escritório na região da avenida Paulista.

Detalhe: ele votou em Aécio no ano passado, mas não disse a frase em tom de “comemoração”, mas de alerta.

A conversa aconteceu num encontro social privado, há alguns dias, antes portanto da prisão de José Dirceu. O advogado, a quem conheço há mais de 30 anos, tem na sua carteira de clientes alguns empreiteiros. Um deles está em prisão domiciliar, por causa da Lava-Jato, e algumas semanas atrás foi obrigado a depor algemado em Curitiba – como forma de pressão.

“Um homem de quase 60 anos, franzino, que não oferece nenhum risco físico às autoridades, foi obrigado a depor algemado durante várias horas, sob alegação de ameaça à segurança do delegado“, contou.

Prisões sem provas, pressões físicas e psicológicas. A Lava-Jato transita num fio da navalha muito perigoso. Já sabemos disso. Mas é impressionante ouvir quem acompanha o desenrolar dos fatos ali, bem ao lado dos investigados e dos algozes da PF e do Judiciário.

Experiente operador do Direito, minha fonte está impressionada com o grau de truculência de delegados, procuradores e do juiz Sérgio Moro. Perguntei a ele (com veia sempre “conspiratória”) quem seria a cabeça pensante a traçar o roteiro da Lava-Jato: “Moro me parece frágil, mal preparado, tropeçando nas palavras nas inquirições…”, eu disse.

E o advogado: “não se engane, ele pode não ser brilhante ao falar, mas o cérebro é ele. Moro se acha imbuído de uma santa missão, e vai seguir em frente, nem que pra isso tenha que destruir metade da República. Ele é uma personalidade perigosa para a democracia”.

Todos advogados que trabalham na Lava-Jato estão assustados. Mas quase todos (e agora a avaliação é minha) temem enfrentar abertamente Sergio Moro. O juiz de primeira instância – com suas soturnas camisas pretas (ôpa, Itália dos anos 20 e 30!) acompanhadas de gravatas também escuras – virou uma espécie de intocável. Montou uma operação que – mais do que respeitada – é temida por todos que atuam no Judiciário.

“É uma espécie de estado islâmico judicial, onde tudo é permitido; afinal há um objetivo final que é sagrado: combater a corrupção”. Algumas delações premiadas já chegam prontas, feito matéria da “Veja”: primeiro o editor escreve, depois o repórter acha alguma coisa que corrobore a tese. “Eles trazem a delação e dizem ao preso: você assume isso aqui? Sabemos que você sabe, fica mais fácil pra você”.

Mas o que explicaria essa voracidade, voltada não contra todos os corruptos, mas contra o governo (PMDB e PT são os alvos, com o PSDB poupado)? Não haveria uma operação tucana, uma conexão com a mídia?

“Pode haver alianças, mas são circunstanciais. Moro é bem tratado pela Globo, e faz o jogo. Mas não pense que a Globo ou o PSDB controlam cada passo dele e de todos envolvidos na operação”, foram as palavras do advogado, entre um gole e outro de vinho.

Minha fonte, que votou em Aécio sob o argumento pragmático de que “o Brasil e a Dilma não vão aguentar o que vem por aí na Lava-Jato; se o Aécio ganhar, isso tudo estará pacificado” (foi essa, mais ou menos, a frase dele em outubro de 2014, quando nos reunimos num jantar a poucos dias do segundo turno), está convicto de que a guerra santa promovida por Moro tem um alvo: o ex-presidente Lula.

“O Lula ainda não é a bola da vez, mas é a cabeça que os meninos de Curitiba querem sangrando numa bandeja”, disse o advogado. Segundo ele, muitos réus foram indagados nas últimas semanas sobre o que sabiam do “peixe grande”.

A conversa que narro nesse post aconteceu durante um encontro com 6 ou 8 pessoas, em São Paulo. Um dos presentes, que não é advogado, indagou: “então, caminhamos para uma grave crise institucional?

“Não”, respondeu o advogado. “Não caminhamos. Já estamos em plena crise”.

E a prisão de Lula então é inevitável, dada a inação do PT e do governo?

“Avaliação política eu deixo por sua conta” [o advogado disfarça, mas é também um arguto observador político]. “O que posso dizer é na seara jurídica:  posso apostar com você que até o fim do ano vão tentar prendê-lo; vai depender da postura do STJ e do STF nos HCs pendentes”.

Ou seja: Moro precisa ter certeza que não vai passar vergonha, mandando prender Lula, mas tendo sua decisão revogada em 24 horas, num tribunal superior.

“Quais seriam os próximos passos, antes do Lula?”

“Aí não é informação, mas especulação minha e de vários advogados que atuam na Lava-Jato. Não é segredo. Vão tentar prender o Dirceu ou o Palocci, primeiro, nas próximas semanas. Depois vem o Lula.”

Reparem, leitores. A conversa com esse advogado ocorreu na segunda quinzena de julho.

O penúltimo passo foi dado. Dirceu está preso.

Não há mais teoria conspiratória, pois.

Lembremos que Vargas, em 1954, estava na iminência de ser preso pela República do Galeão, e por isso tomou a medida extrema em 24 de agosto.

Espero que não caminhemos para o mesmo desfecho. Politicamente, Vargas salvou o trabalhismo com um tiro no peito. Foi o suicídio que salvou seu campo politico.

Dilma, até aqui, com sua inação, de certa forma faz o caminho inverso. Preserva-se pessoalmente, mas leva todo o campo político do lulismo e do trabalhismo para um suicídio político.

E Lula? A reação não pode mais levar semanas, ou meses. Acordos “pelo alto” (com a banca e a elite empresarial) não vão adiantar. Vargas era estancieiro gaúcho, e foi pro cadafalso. Por que poupariam o metalúrgico nordestino?

Moro não vai parar. Ele é o estado islâmico judicial.

O advogado, minha fonte, fala que tentarão a prisão de Lula “até o fim do ano”. Minha impressão é de que o relógio se acelerou.

Em 2015, o agosto terrível da política pode cair em agosto mesmo. Mas também pode cair em setembro ou outubro. Até lá, teremos um desfecho.





Lava Jato muda narrativa para chegar a Lula


Por Tereza Cruvinel:

José Dirceu foi preso porque em liberdade representava uma “ameaça à ordem”, como disse o juiz Sergio Moro. Cumpre disciplinadamente uma prisão domiciliar sob a supervisão do STF. E se quisesse, teria fugido durante a angustiante espera da nova prisão. Tem know how nisso, viveu na clandestinidade e sob a pele de outra pessoa, o Carlos Henrique de Cruzeiro do Oeste, até reassumir sua identidade com a aprovação da Anistia. Sua prisão, como nos romances e novelas, é um fato que permite a alteração do curso da narrativa.
A narrativa inicial da Lava Jato falava de um cartel de empresas que atuava na Petrobrás em conluio com diretores corruptos que, por sua vez, dividiam as propinas com os partidos que os sustentavam nos cargos: PT, PMDB e PP. Principalmente. Ricardo Pessoa, da UTC, foi amplamente apresentado como “líder” do cartel entre as empreiteiras.
Quem prestar atenção ao texto do despacho de Moro e da entrevista do procurador verá surgir as primeiras linhas da nova narrativa. Vejamos alguns destes indícios.
"Chegamos a um dos líderes principais, que instituiu o esquema, permitiu que ele existisse e se beneficiou dele", disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.
Ora, procurador: O esquema da Petrobrás todo mundo sabe que sempre existiu. O próprio delator Barusco admitiu que já ganhava propina em 1997, na era FHC. O jornalista Paulo Francis infartou-se de indignação depois de ser condenado a pagar multa milionária por ter “caluniado” os então dirigentes da Petrobrás, que acusou de roubarem a empresa. Este crime não pode ser debitado a Dirceu, ainda que ele tenha acolhido a indicação do ex-diretor Renato Duque, feita por Fernando Moura, segundo a Lava Jato.  
Ademais, como escreveu Jânio de Freitas, atribuir o papel de instituidor a Dirceu “é aliviar de um grande peso acusatório os empreiteiros e ex-dirigentes da Petrobras que têm feito delação premiada e, por isso, são chamados pelos componentes da Lava Jato de "colaboradores". Ainda que não seja por deliberação, a transferência de responsabilidades, concentrando-as em um só, é como um prêmio adicional à delação já premiada.
O procurador Lima é um narrador eficiente. Inovou agora dizendo que o esquema na Petrobras reproduziu as características do mensalão, porque parte do dinheiro abasteceu políticos do PT e de partidos aliados. "O DNA é o mesmo: compra de apoio partidário".
Bem contado mas improcedente. Quanto ao DNA, os esquemas são bem diferentes. O do mensalão envolveu empréstimos bancários, que a Justiça considerou fictícios (embora o PT os tenha quitado) e os recursos da Visanet transferidos à agência de Marcos Valério. O julgamento do TSE acolheu a tese de que foram desviados, as defesas sustentam até hoje que os serviços foram executados. O que importa aqui, porém, é apontar a diferença. Na Petrobrás teve continuidade, e deve mesmo ter se sofisticado, o sistema de pagamento de propinas em porcentagem sobre o valor dos contratos que eram repartidos entre as empresas do cartel.
Mais importante para a nova narrativa, entretanto, foi a menção à compra de votos. Ou seja, havia também um “mensalão” na Petrobrás. Mas quais são os deputados ou senadores comprados? Para se falar em compra de voto numa Câmara de 513 deputados e num Senado de 81 senadores é preciso dar nome aos bois. Mas como a ação penal 470 não deu e mesmo assim alguns ministros apontaram um “crime contra a democracia”, a nova narrativa também não se incomodará com isso. Até porque não ocorreu a nenhum jornalista perguntar se a Lava Jato já tinha o nome de pelo menos um vendilhão de voto.
Com muita insistência o procurador afirmou que o esquema teve início “no governo Lula” e os jornalistas perguntaram se o ex-presidente também será investigado. Lima respondeu:"nenhuma pessoa no regime republicano está isenta de ser investigada". É certo. Mas a frase inteira em que ele responsabiliza Dirceu é claramente insinuante:
"Não descarto que existam outros cabeças mas chegamos a um dos líderes principais, que instituiu o esquema, permitiu que ele existisse e se beneficiou dele".
Ora, se Dirceu é um “dos líderes principais”, se os presidentes das maiores empreiteiras já foram presos e alguns viraram delatores, se todos os operadores e funcionários corruptos já foram identificados, quem mais falta? Estão apontando o fuzil para Lula, vão prendê-lo e acusá-lo de ser o grande chefe.
Faltarão provas? Não tem importância. Para isso existe a teoria do domínio do fato, que já não precisará ser aplicada a Dirceu. Fica reservada para Lula, que já nem tem direito ao foro privilegiado. Como presidente da República, tinha responsabilidade sobre tudo o que faziam sob sua liderança política e funcional, como disseram no STF em relação a Dirceu quando chefe do Gabinete Civil.
Esta narrativa está delineada para continuar sendo escrita nas atuais condições políticas: com todo apoio da mídia, com o governo preocupado apenas em se blindar e em blindar Dilma, com o PT encurralado e zonzo, como em 2005, e a oposição no ataque. E, desta vez,  com uma direita na rua disposta até a jogar bombas. Como dificilmente tais condições serão alteradas – a não ser por uma iniciativa de Lula, de ir para a rua para o que der e vier – o folhetim chegará ao desfecho que aparece nas entrelinhas para quem quiser ler.
Mais uma vez o timing de Moro
A 17ª fase da Lava Jato foi desencadeada com precisão político-temporal, a mesma que fez com que as primeiras delações de Paulo Roberto Costa fossem divulgadas no primeiro dia da campanha em segundo turno em 2014 e a de Ricardo Pessoa, confirmando doações à campanha de Dilma, vazassem na véspera da viagem dela aos EUA.
A prisão de Dirceu aconteceu no início da semana em que o PT apresentará seu programa semestral, em defesa do partido e do governo de Dilma Rousseff, que também dele participará. Se não estava, agora está tudo pronto para um panelaço durante a exibição.

Antecede também em 13 dias as manifestações contra Dilma marcadas para o dia 16. Um intervalo suficiente para que as denúncias sejam marteladas e os ouvidos indignados atendam aos chamados do Vem prá Rua, MBL e agora, do PSDB.


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