terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

O carnaval FORA CONFÚCIO da imprensa brasileira, Por Fábio de Oliveira

GGN:

Hostilidade jornalística foi transformada em manifestações antes e durante processo de Impedimento mediante fraude"

Por Fábio de Oliveira

Dilma Rousseff foi intensamente hostilizada na imprensa desde que tomou posse após derrotar Aécio Neves. A hostilidade jornalística foi transformada em manifestações de rua antes e durante o processo de Impedimento mediante fraude conduzido por Eduardo Cunha. As redes de TV deram grande visibilidade às manifestações contra o PT. A esquerda reagiu ironicamente chamando de Carnacoxinhas as passeatas que ocorreram Av. Paulista.

O apelido pegou  e rapidamente se transformou num fenômeno virtual importantehttp://www.huffpostbrasil.com/2015/08/16/carnacoxinha-twitter-dilma_n_7995334.html. Apesar de ridicularizados, os Carnacoxinhas ajudaram o Congresso Nacional a derrubar a presidenta eleita pelos brasileiros.

A brincadeira política se tornou séria quando Michel Temer foi empossado. A imprensa internacional denunciou o golpe de estado que ocorreu no Brasil. A imprensa brasileira continuou afirmando que o Impedimento era válido porque tinha ocorrido na forma da CF/88. O abismo entre o fato e sua representação dentro do Brasilhttp://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/hannah-arendt-e-o-golpe-de-estado-em-curso-no-brasil-por-fabio-de-oliveira-ribeiro segue devastando econômica e politicamente nosso país.

O governo Michel Temer é frágil e só se sustenta favorecendo políticos corruptos que são blindados pela imprensa. Nossa política externa se tornou errática, os parceiros internacionais se afastaram do Brasil, os investimentos externos minguaram e a crise econômica se aprofundou. A seriedade, porém, não retornou à política brasileira.

Temer rapidamente desmantelou programas sociais importantes. Nas última semanas,  com ajuda dos vetores jornalísticos do neoliberalismo, o usurpador passou a atacar ferozmente os direitos trabalhistas e previdenciários dos brasileiros. Os fatos evidenciam que Michel Temer adotou um programa econômico semelhante àquele que foi rejeitado nas urnas.  

A reação popular, registrada nas pesquisas de opinião que demonstram a imensa impopularidade de Michel Temer, já se faz ouvir nas ruas.  O Carnaval de 2017 será para sempre lembrado como aquele em que o povo gritou FORA TEMER. A imprensa televisiva, contudo, está se esforçando para minimizar este fenômeno político extremamente visível no Facebook e no Twitter.

Numa passagem memorável dos Tratados Morais e Políticos de Confúcio pode-se ler o seguinte:

7. Tsé-kung interrogó a Confucio sobre la administración de los asuntos públicos. El Maestro respondió: <<El que administra los asuntos públicos, debe tener cuidado de que los víveres no falten, que las fuerzas militares sean suficientes, que el pueblo le dé su confianza.>> Tsé-kung dijo: <<Si es absolutamente necesario desistir de una de estas tres cosas, ¿cuál conviene abandonar?>> <<Las fuerzas militares>> respondió Confucio. <<Y si es absolutamente necesario desistir aún de outra - dijo Tsé-kung -, ¿cuál será?>> <<Los víveres - repuso Confucio -. Sin duda, si faltan los víveres, el hombre hará víctimas; pero, en todo tiempo, los hombres han estado sujetos a la muerte. Si el pueblo no tiene confianza en los que gobiernam, todo está perdido.>>(Tratados Morales y Políticos, Confucio, Obras Maestras, Editorial Iberia, Bacelona - Espanã, 1959, p.121)  

O divórcio entre o Estado e o povo se tornou possível porque a imprensa brasileira se divorciou da imprensa internacional depois de ter se apartado da verdade factual. A politização exacerbada da imprensa antes e durante os Carnacoxinhas se repete de maneira diametralmente oposta no Carnaval FORA TEMER de 2017.

A grande imprensa colocou tudo a perder fazendo o povo desconfiar de Dilma Rousseff. Apesar do desastre econômico aprofundado por Michel Temer, ela segue colocando tudo a perder ao tentar esconder que o povo demonstra sua desconfiança no incompetente usurpador. Até quando o ódio dos jornalistas ao PT continuará alimentando esta guerra civil sem tiros?  

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Jobim critica atuação de Moro: há  “espetacularização” e “arbitrariedades”

Jobim verbaliza no Estadão o corte das asas de Moro

jobimmoro
Nélson Jobim está longe de ser esquerdista, muito menos santo de meu altar.
Foi ministro da Defesa dos governos Lula e Dilma, mas também foi Ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, que o nomeou para o Supremo Tribunal Federal, do qual foi presidente  e onde ainda tem grande interlocução.
Por isso, a sua entrevista ao Estadão – que, salvo surpresas, será a matéria de política mais importante do domingo de Carnaval –  tem um peso imenso e é um dos mais duros golpes assestados na atuação do MP e do juiz Sérgio Moro.
Ao dizer que há  “espetacularização” e “arbitrariedades” na Operação Lava Jato, Jobim não está falando por si.
E não fala pelo PT ou por Lula, porque se absteve de falar até agora.
Mas está falando pelos políticos, pelo governo e pela cúpula do Judiciário, com um som de tesoura pronta a cortar as asas do juiz Sérgio Moro e da tal “força tarefa”.
Jobim, sem citar nomes, não se furtou a apontar casos concretos dos quais todos sabem quem são os autores.
Inclusive contra o tribunal revisor das decisões de Moro, o Tribunal Regional Federal da 4a. Região, que tem homologado, por princípio, o que é decidido em Curitiba. E vai além de insinuar que Moro quer projeção política com o que faz.
Leia este trecho da entrevista de Jobim:
(…)há também, digamos, uma tendência, um equívoco, em que alguns juízes acham que têm de fazer justiça e não aplicar a lei. Quem diz ‘não, eu não vou aplicar a lei porque o que julgo é ilícito’, de onde vem esse poder? Do concurso público que o transformou em juiz? Essa discussão do projeto das 10 medidas anticorrupção (projeto que está na Câmara a ser enviado para o Senado), que foi oferecido pelo Ministério Público, inclui posições de alguns promotores ridículas. Tinha absurdos completos em termos de atribuição de uma espécie de um poder sacerdotal para efeito investigatório.
A Lava Jato tem ferido os direitos das defesas, por exemplo?
Há exageros. Inclusive nas prisões que são feitas em Curitiba (sede da operação sob responsabilidade do juiz federal Sérgio Moro), em que as coisas vão se prolongando e resultam em delações. Outro exemplo, condução coercitiva. Ela só é admissível quando alguém se nega a ir em uma audiência em que foi previamente intimado. Mas não se admite que alguém que não foi convocado para depor seja levado coercitivamente para depor.
A do Lula foi arbitrária?
Sim, não tenha dúvida. Isso é muito bom quando você está de acordo com o fim, mas quando o fim for outro… O dia muda de figura quando acontece contigo. O que nós temos de deixar claro é essa coisa da exposição dos acusados. Vão pegar um sujeito em um apartamento e aparece gente com metralhadora, helicóptero. Tudo isso faz parte daquilo que hoje nós chamaríamos de ação-espetáculo, ou seja, a espetacularização de todas as condutas. O Judiciário não é ambiente para você fazer biografia individual. Biografia se faz em política. 
O sr. acredita em “desmonte” da Lava Jato?
Não, isso faz parte do discurso político. Evidente que quem está sendo perseguido vai querer fazer isso (desmontar), agora se afirmar que está acontecendo, é só discurso. Evidente que você tem de afastar a prática de violências de qualquer natureza. Nós não podemos pensar de que se algo foi malfeito, autoriza que seja mal feito também a forma de persegui-los.
Por exemplo?
A divulgação da gravação da presidente Dilma com Lula depois que havia encerrado o tempo de gravação, autorizado pelo próprio juiz que havia determinado a gravação. Você acha isso legítimo? Qual é a consequência disso? Esse episódio é seríssimo. Houve algum processo para verificar se houve algum abuso? Há um inquérito sobre isso? Que eu sabia, houve várias tentativas por parte dos interessados e que não aconteceu nada. Lembro bem que chegaram até a dizer: ‘Casos excepcionais requerem medidas excepcionais’. 
E conclui dizendo que densidade eleitoral “é uma coisa que não se constrói dentro do tribunal.”

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Além de Padilha e Temer, denúncia de Yunes compromete Moro

Além de Padilha e Temer, denúncia de Yunes compromete Moro

Jeferson Miola
O depoimento que José Yunes prestou ao MP assumindo-se como simples “mula” para transportar os R$ 4 milhões da propina da Odebrecht destinada a Eliseu Padilha, é demolidor para o governo golpista.
 A denúncia do amigo de mais de meio século do Michel Temer põe luz sobre acontecimentos relevantes da história do golpe, e pode indicar que os componentes do plano golpista foram estruturados em pleno curso da eleição presidencial de 2014:

  1. a Odebrecht atendeu o pedido do Temer, dos R$ 10 milhões [os R$ 4 milhões ao Padilha são parte deste montante] operados através de Lucio Funaro, ainda durante o período eleitoral de 2014;
  2. mesmo sendo o candidato a vice-presidente da Dilma, na campanha Temer trabalhava pelo esquema do Eduardo Cunha [que na eleição apoiou Aécio Neves, e não a chapa do seu partido, o PMDB], que tinha como meta eleger uma grande bancada de deputados oposicionistas ao governo Dilma;2. a organização criminosa financiou com o esquema de corrupção a campanha de 140 deputados para garantir a eleição de Eduardo Cunha à Presidência da Câmara;
  3. Lúcio Funaro, tido até então exclusivamente como o “operador do Eduardo Cunha”, na realidade também atuava a mando de Eliseu Padilha e, tudo indica, de Michel Temer – José Yunes diz que Temer sabia tudo sobre o serviço de “mula” que Padilha lhe encomendara;
  4. em janeiro/fevereiro de 2015, na disputa para a presidência da Câmara, embora em público Temer dissimulasse uma posição de “neutralidade”, nos subterrâneos trabalhou pela eleição do Cunha;
  5. mesmo sendo vice-presidente da Presidente Dilma, o conspirador conhecia o plano golpista desde sempre, e participou desde o início da conspiração para derrubá-la. O primeiro passo, como se comprovou, seria dado com a vitória do Eduardo Cunha à presidência da Câmara para desestabilizar o ambiente político, implodir os projetos de interesse do governo no Congresso e incendiar o país.
A denúncia de Yunes reabre o questionamento sobre a decisão no mínimo estranha, para não dizer obscura e suspeita, do juiz Sergio Moro. Em despacho de 28/11/2016, Moro anulou por considerar “impertinentes” as perguntas sobre José Yunes que o presidiário Cunha endereçou a Temer, arrolado como sua testemunha de defesa.

Moro tem agora a obrigação de prestar esclarecimentos mais convincentes e objetivos que o argumento subjetivo de “impertinência”, alegado no despacho. Caso contrário, ficará a suspeita de ter prevaricado para proteger Temer e encobrir o esquema criminoso que derrubaria o governo golpista. Afinal, sabendo do envolvimento direto de Michel Temer no esquema criminoso, Moro teria agido para ocultar o fato?
 A cada dia fica mais claro que o Brasil está dominado pela cleptocacia que assaltou o poder de Estado com o golpe. O melhor que Temer faria ao país seria demitir toda a corja corrupta – a começar pelo Eliseu Padilha – e renunciar, porque perdeu totalmente a confiança política e a credibilidade.

A permanência ilegítima de Temer na cadeira presidencial é um obstáculo instransponível à recuperação do Brasil, que assim seguirá o caminho acelerado do abismo.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Os desafios da esquerda brasileira, por Guilherme Boulos

Le Monde Diplomatique
Brasil








OFENSIVA CONSERVADORA, CONFUSÃO ESTRATÉGICA

O DUPLO DESAFIO DA ESQUERDA BRASILEIRA

No dia 31 de agosto de 2016, o Senado brasileiro votou pela destituição da presidenta Dilma Rousseff. A chegada ao poder do vice-presidente, o conservador Michel Temer, coloca a esquerda diante de uma dupla frente de luta: as extravagâncias do Partido dos Trabalhadores abalaram sua credibilidade antes mesmo de a direita partir para a ofensiva
por: Guilherme Boulos
20 de fevereiro de 2017


esquerda-brasileira
Após quatro eleições presidenciais vencidas pelo PT desde 2002, as forças conservadoras se reorganizaram para afastar a presidenta Dilma Rousseff e substituí-la pelo vice-presidente Michel Temer. Além de duvidosa no âmbito jurídico,1 a manobra teria sido mais difícil se o PT não houvesse cometido tantos equívocos. O partido renunciou à mobilização popular, costurou repetidas alianças com diversos setores da direita (que mais tarde trabalhariam contra ele) e escolheu responder à crise econômica com medidas de austeridade, correndo o risco de ampliar a insatisfação social.2 Essas decisões não contribuíram para o surgimento de uma reação ampla diante da ofensiva da direita…
Uma vez no poder, Temer não demorou a lançar-se ao trabalho. Sua receita: um liberalismo frenético no plano econômico e um conservadorismo militante no âmbito político. Suas primeiras decisões desenham desde já um capítulo de retrocesso social sem precedentes na história recente do país.
A composição de seu governo deixa claro que diversidade e paridade não estão entre suas prioridades. Nenhuma mulher, nenhum negro: somente homens brancos ligados às oligarquias regionais, muitos sob suspeita de corrupção. Ministérios como de Direitos Humanos e Reforma Agrária desapareceram. Foi por pouco que o novo presidente não desfez também o Ministério da Cultura: voltou atrás depois de uma onda de protestos de um meio artístico menos escandalizado pela supressão de outras pastas.
Se por um lado o programa de Temer tem o apoio do setor bancário e de grandes empresas, por outro jamais foi submetido ao voto. Em encontro com grandes nomes do patronato brasileiro, o novo presidente ainda prometeu que “não seria candidato à reeleição”, antes de ressaltar que isso o deixava com as mãos livres para “dar prioridade ao ajuste orçamentário”.3 Em outros termos, mostrou que manterá sua determinação porque não vai pagar o preço político das medidas impostas à população – que se anunciam severas.
O programa econômico de Temer se organiza em torno de três propostas: a emenda constitucional destinada a criar um teto para os gastos públicos (a PEC 55), a “reforma” da Previdência Social e a “flexibilização” da legislação trabalhista. Todas elas implicam retrocessos de direitos conquistados por fortes lutas sociais.

A hora é de enfrentamento
A PEC 55, aprovada em 13 de dezembro, impõe o congelamento dos investimentos públicos por um período de vinte anos. As despesas federais não podem crescer acima da inflação até 2037; portanto, elas não aumentarão em termos reais, contrariamente à demografia. A medida significa o colapso dos serviços públicos e a morte de programas sociais – sem precedentes em nível internacional. Pretexto evocado pelo poder: urgência de diminuir o déficit orçamentário e reembolsar a dívida pública. Em alta desde 2014, esta representa apenas 66% do PIB, índice inferior ao registrado na União Europeia.
A reforma da Previdência não é menos alarmante. Temer retomou uma ideia avançada por Dilma que já implicava redução de direitos e levou-a ainda mais longe, com a definição da idade mínima para aposentadoria em 65 anos. Em muitas regiões do país, a esperança de vida nem sequer chega a esse patamar.
Terceira ambição: flexibilizar a legislação trabalhista e reduzir o “custo” da mão de obra. Como? Autorizando a terceirização em todos os setores e tornando a negociação patrão-empregados superior à lei (uma medida que pode lembrar aos leitores franceses as disposições da “Lei Trabalho”). Esse último ponto retoma um projeto de lei já em estudo no Congresso, que estabelece a legalização de contratos desvinculados da legislação, desde que sejam negociados entre patrões e empregados.
Esse conjunto de propostas fez as elites econômicas legitimarem o projeto de destituição de Dilma concebido pela direita parlamentar – em relação ao qual estavam hesitantes no início. A presidenta não teria tentado ela mesma apaziguá-los lançando as bases de um ajuste estrutural em 2015 e de uma reforma da Previdência Social? Calculou mal: essas medidas agravaram a recessão e a insatisfação popular, enquanto as empresas e os bancos, de seu lado, julgaram suas medidas insuficientes e preferiram substituí-la por Temer.
A destituição de Dilma marca o fim de um ciclo no Brasil. Durante treze anos, os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e depois os de Dilma trabalharam para reforçar um “arranjo” que consistiu em promover certos avanços sociais e uma melhoria de vida dos mais pobres, sem, contudo, ameaçar os interesses dos mais ricos. A miséria recuou, enquanto os lucros decolaram. Lula foi, assim, o grande arquiteto de uma política de “conciliação”.4
O “setor inferior” da sociedade se beneficiou de políticas de revalorização do salário mínimo, do reforço da capacidade de consumo dos trabalhadores, assim como de programas sociais de luta contra a miséria e a favor do acesso à universidade, moradia e saúde. O “setor superior”, por sua vez, recebeu créditos oferecidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e generosas isenções fiscais. Seus privilégios históricos jamais foram colocados em questão. O sistema tributário, regressivo, não foi modificado, nem o nível de concentração das propriedades rurais e urbanas. O PT manteve – ou melhor, reforçou – a política de redirecionar um excedente primário para garantir o reembolso de uma dívida em grande parte das classes dominantes do país. Jamais contestou o controle do setor privado sobre os meios de comunicação ou tentou erradicar a corrupção, lubrificante do sistema político por ele herdado.5
Esse acordo, apresentado como “ganha-ganha”, não teria sido possível sem crescimento. E ele foi significativo (4% em média durante os dois governos de Lula), notadamente em função de uma situação internacional favorável: alta nos preços de produtos primários e crescimento da China. Esse contexto facilitou o aumento das reservas de divisas do Estado e permitiu aumentar os investimentos sociais sem que fosse preciso passar por reformas estruturais.
Com a crise de 2008 e a mudança do contexto internacional, esse modelo colapsou. Em 2009, a política anticíclica de Lula conseguiu, em um primeiro momento, manter o crescimento e retardar a catástrofe. Mas em 2011, enquanto Dilma dirigia o país, o acordo “ganha-ganha” começou a dar sinais de esgotamento. A margem de manobra para manter a conciliação de interesses tornou-se mais restrita, e a resposta da presidenta – a austeridade – precipitou a crise.

Esta tornou-se flagrante a partir das manifestações de junho de 2013,6que marcaram o fim do consenso social que assegurava a hegemonia do PT. A operação de luta contra a corrupção “Lava Jato” abalou a imagem do partido e reduziu a capacidade de investimento da Petrobras e outras grandes empresas. A base parlamentar do governo implodiu, e a direita se reorganizou. Impossível, desde então, ignorar a derrocada estratégica do PT e sua crise institucional.
Essa situação coloca a esquerda brasileira e os movimentos sociais diante de novas dificuldades. A derrota do PT atingiu todo o campo progressista, facilitando a ofensiva dos conservadores e dos liberais. Os escândalos de corrupção abalaram fortemente a autoridade moral daqueles que encarnam a esquerda aos olhos da população. E a incapacidade do partido de realizar uma autocrítica real ou reconhecer o esgotamento de sua estratégia agrava a crise.
O PT foi a força hegemônica da esquerda brasileira durante 35 anos. Representou o lugar onde se reuniam as forças do movimento social e as de setores progressistas. Hoje, a capacidade de desempenhar esse papel está enfraquecida. Isso não significa morte, como pretendem os editorialistas. Lula ainda é a principal liderança política do país e está à frente nas pesquisas para eleições presidenciais, apesar do linchamento jurídico-midiático que tem sofrido. Mas o partido perdeu muito de seu dinamismo e de sua capacidade de mobilização. Envelheceu.
Como a esquerda vai reagir, na medida em que não apareceu ainda nenhuma força capaz de ocupar o espaço deixado pelo PT? Observam-se, sem dúvida, resistências importantes, notadamente contra a PEC 55 e a corrupção de dirigentes políticos – o presidente do Senado, Renan Calheiros, tornou-se réu acusado de desvio de fundos públicos, julgamento que jogou lenha na fogueira da cólera popular. Os sem-teto realizaram grandes mobilizações em centros urbanos. No plano político-partidário, o Partido Socialismo e Liberdade (Psol), apesar de minoritário, reúne um grupo de parlamentares combativos que deixaram o PT para criar uma formação mais à esquerda. Mas essas iniciativas são ainda insuficientes para representar uma solução.
A esquerda se encontra, assim, confrontada por dois grandes desafios. O primeiro: ampliar o protesto contra o governo Temer, o que dependerá da capacidade dos movimentos sociais de reunir suas forças e mobilizar trabalhadores para a gravidade desses ataques. O segundo: construir um novo campo político de esquerda, assumindo o fato de que o período de consenso acabou. No momento atual, não é possível pleitear nenhum avanço social sem mobilizar a rua. A elite e a direita já entenderam; parte da esquerda ainda hesita.
A renovação das forças dependerá da capacidade da esquerda de encarnar uma solução contra-hegemônica – sem a qual a insatisfação social e política, amplificada pela crise, será canalizada por essa “nova direita” que, em nível internacional, soube recuperar o descontentamento e direcioná-lo para os chamados outsiders, como Donald Trump nos Estados Unidos, Nigel Farage no Reino Unido ou ainda Marine Le Pen na França. Um fenômeno que não poupa o Brasil.
A esquerda deve retomar a radicalidade que conscientemente negligenciou. Radicalidade democrática, com o objetivo de participação política e representação da diversidade brasileira. Radicalidade estratégica, com um programa ambicioso de transformação social, capaz de reanimar a esperança. A forma institucional que esse novo campo terá ainda não está clara, assim como o tempo que exigirá sua construção. Mas sua necessidade torna-se cada dia mais evidente.

*Guilherme Boulos é coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da Frente Povo Sem Medo.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

A Nova Direita, por Rudá Ricci






Por vício de disputa partidária, a maioria dos comentários críticos sobre a realidade política tupiniquim, nesta quadra da vida do país, se destina ao campo institucional. A gritaria maior – com razão – foi direcionada nas últimas horas à nomeação do novo ministro do STF.
Contudo, gostaria de sugerir que esta não é a novidade mais perigosa do mundo político nacional. O perigo está rondando como o espectro invertido percebido por Marx e em virtude da concessão radical que parte da esquerda fez à direita, parece existir uma cortina de fumaça que dificulta a visão da tempestade que se forma (pode ser apenas ameaça de chuva, mas o tempo revelará o seu verdadeiro destino).
Cito a nova direita.
A nova direita é jovem e de classe média universitária. O mais importante é que rouba as bandeiras e formato da esquerda mais festiva para se inserir num campo que parece jovial (na forma), mas cujo conteúdo é no mínimo confuso, diversionista, mas que numa análise mais apurada, revela valores de direita.
Comecemos por esta “novidade” do concurso público para assessoria de gabinete de vereadores. Surgiu pelas mãos do vereador eleito para a Câmara de Rio Branco Emerson Jarude (PSL). O incrível é que foi recém copiada por duas vereadoras do PSOL de Belo Horizonte. Aqui, cabe um destaque. A justifica de PSL e PSOL é exatamente a mesma, sem nenhuma mudança de conteúdo e com frases mimeticamente exatas. Pensemos um pouco. Um mandato parlamentar é uma representação da vontade do eleitor. Na nossa tradição política, denomina-se de “representação delegada”, ou seja, está estritamente vinculada à vontade do mandante que votou. Neste caso, a composição da assessoria parlamentar é um direito político concedido pelo voto. Trata-se, portanto, não de um serviço público vinculado à uma carreira, mas a um desejo político do eleitor. Ao instalar um concurso público, o voto vai para o espaço e o eleito passa a possibilitar o ingresso de quem não pensa como o eleitor, apenas porque teria “currículo” técnico adequado a algum valor que não é o político. O que sugere que o eleito não tem um mandato popular. Caso contrário, seria difícil acreditar que não haveria entre seus apoiadores e eleitores alguém que não fosse advogado ou motorista (cargos em disputa pelo concurso anunciado). Em suma, há uma imensa confusão – para dizer o menos provável – em relação ao que significa o mandato parlamentar. Tentar fugir do clientelismo para cair neste empresariamento da política é afundar de vez a democracia que duramente construímos neste país. Pior: é dar à direita um presente de Natal antecipado e desideologizar a disputa de projetos. Algo que caminha para sugerir o fim dos cargos comissionados, um direito político secular, íntimo da lógica democrática (que, aliás, não é fruto de abuso no Brasil, pelo contrário, significando 16% do total de cargos públicos do país).
Em seguida, surge uma direita que utiliza as bandeiras históricas da luta por direitos civis em nosso país. Uma direita que edulcora tais bandeiras. Em relação às bandeiras anti-racistas, se esgueira por aí o tal empreendedorismo, como se fosse um direito que não é realizado no Brasil porque os negros não se organizaram para tanto. O esvaziamento da análise sobre os motivos para os negros serem os mais presos em nosso país, não conseguirem chegar em número significativo ao ensino médio, se tornarem os que mais repetem nas escolas, os que sofrem mais com atendimento médico ou os salários mais baixos é de uma desfaçatez desconcertante. Um “mundo rosa” parece surgir no horizonte, bastando fazer negócios em favelas e periferias sofridas. É uma nova roupagem para o velho discurso ultraliberal: a culpa do desemprego é do desempregado que não se preparou e não teve garra para se empregar ou criar seu próprio negócio. Por aí, o discurso ideológico (no sentido clássico de inverter o mundo real a partir de uma fantasia discursiva) tenta capturar incautos que serão os consumidores dos produtos vendidos pelos autores deste “boa nova”. Algo parecido com a Teologia da Prosperidade ou mera coincidência?
No que diz respeito à luta feminista, se insinua um discurso raivoso, anti-humanista, que coloca no sexo oposto o erro da natureza e a origem da opressão às mulheres. O discurso assexuado só vence barreiras e inebria a inteligência básica porque exagera na forma. Tantas grosserias e violência verbal assustam, intimidam e dificultam o diálogo. Alguns, menos atentos, caem nesta rede de adrenalina e pouca massa cinzenta.
Finalmente, os Militantes Pokemon. Trata-se de uma juventude que sente-se realizada pelo número de curtidas. Alguns, tentam se passar por uma esquerda nova, taça de vinho na mão ou chapéu Panamá com fita de cetim. Fazem gracejos e disparam sua metralhadora giratória para, na quantidade, sugerir alguma qualidade. Os discursos são vazios, pouco fundamentados historicamente ou conceitualmente. Não interessa a verdade, mas a ilação. Ameaçam sem ter um pingo de força real. Não aparecem em reuniões nas periferias ou comunidades rurais. Estão sempre nos gabinetes fechados ou à frente de seu computador ou iphone. Esta é sua “militância social”. Algo que se assemelha em muito ao colunismo social que calunia de lado e ameaça se assemelhando à chantagem. Poucos fazem história ou são lembrados como alguém que contribuiu para a espécie. Mas conseguem mais que os 15 minutos de fama detectados por Andy Warhol.
Aí está a nova direita. Uma direita de grife, sem grandes pretensões para além das curtidas nas redes sociais, mas que se aproveita da fama instantânea para se apropriar de lutas populares históricas. O mais interessante é que sentem a necessidade de se aproximarem da lógica da esquerda para transmuta-la. O que revela fragilidade conceitual e teórica. Não vai muito além da esquina. O que sabem fazer é pastiche. E como sabem.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

A associação indigna entre Executivo, Legislativo e o judiciário: o contubérnio, por Fernando Brito


Fotógrafo Dida Sampaio, do Estadão, registrou a imagem que simboliza o Brasil pós-golpe


O contubérnio

contubernio
Se inteligencia não fosse algo tão raro no Brasil de hoje, a capa do Estadão causaria no país o mesmo que provoca em todas as pessoas que entendem a vergonha que passamos neste país, consumado ontem e pronto para receber, hoje, o carimbo de autenticação.
O velho Leonel  Brizola, que trazia das décadas passadas, do gauchismo e do espanhol da fronteira e do exílio, algumas palavras incomuns, tinha uma para descrever o que está se passando: contubérnio.
Embora também tenha este sentido em português, é no espanhol que ele tem adefinição precisa“la  noción de contubernio, que tiene su fuente etimológica en el latín (contubernĭum), se utiliza para nombrar a un acuerdo o una asociación que resulta censurable o indigna. El término puede aplicarse sobre pactos ilícitos, conspiraciones y  otros entendimientos que merecen repudio”.
Pois é o sentido exato do que se fez: a associação indigna entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário com o claro propósito de que a Justiça, aqui, passe a ser a ferramenta de punir quem lhes desagrada, enquanto a si mesmos cobrem-se com a impunidade.
Sei que há muitos comentários sobre o que virá à frente, assim que o ameganhado ministro vestir a toga e, com a sem-cerimônia que revelou na sabatina, passe a exercitar sua “imparcialidade” e “isenção” de julgador.
Mas nada, neste momento, supera a sensação de nojo, de vergonha, de ver ser organizada na corte suprema brasileira a “suruba generalizada” desejada por Romero Jucá.
Logo teremos mais, os encontros “privê” com Michel Temer, ou les ménages também com Gilmar Mendes, enquanto Edson Fachin, fica com suas razões de fuinha humilde, Luís Alberto Barroso transcende em suas filosofias, Cármem Lúcia agarra-se a seus santos , Ricardo Lewandowski  mantém seu ar de “cansei” e Marco Aurélio Mello segue em sua carreira de “voto vencido”.
Enquanto isso, os alemães “sobram” em campo.
O 6 a 5 (ou pouco mais, porque os nossos diletantes ministros são dados a exercícios da quinta-essência rabelaiseana , avaliando o salto das pulgas e traçando preciosos  desenhos na água) são o 7 a 1 de nosso Estado de Direito.
É possível voltar a vencer, necessário mesmo.
Mas a vergonha ficará, pelos tempos, na figura torpe que, por um quarto de século, dará ao nosso Supremo uma face lombrosiana.

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Papa aprova a beatificação do maior nome da Teologia da Libertação

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Reprodução: Infobae.com
Do El País:

Papa aprova a beatificação do maior nome da Teologia da Libertação


O arcebispo salvadorenho Óscar Arnulfo Romero, assassinado enquanto celebrava missa em 1980, será reconhecido como beato pela Igreja, 21 anos após o início desse processo, que antecede à canonização. O papa Francisco aprovou nesta terça-feira o decreto que reconhece o “martírio” do religioso “in odium fidei”, ou seja, por “ódio à fé”, e por isso ele poderá ser beatificado sem a necessidade de que um milagre seja comprovado.

(...) Romero, principal representante da chamada Teologia da Liberação e incansável na denúncia da repressão militar, foi assassinado em março de 1980 por um tiro enquanto celebrava missa para pacientes de câncer na capela do Hospital da Divina Providência. Um franco-atirador executou uma conspiração encabeçada pelo major de inteligência Roberto D’Aubuisson, que em 1983 fundou o mais importante partido direitista do país, a Aliança Republicana Nacionalista (ARENA), no poder por 20 anos. Ninguém foi condenado pelo crime.

Considera-se que a morte de Romero, aos 63 anos, foi a gota d’água que deu início à guerra civil salvadorenha (1980-1992) entre a Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) e o Exército, com o apoio de Washington.

O pontífice argentino já havia declarado em agosto, ao retornar de uma viagem à Coreia do Sul, que o arcebispo de San Salvador era um “homem de Deus” e que nada deveria impedir sua beatificação.